Carta aos Hebreus




            Índice

           (1) Introdução 
(2) Conceitos bem precisos 
(3) Os blocos da carta 
(4)  O esquema mental do autor
(5) Conteúdo temático
(6) A lógica da exposição
(7) A forma da exposição
(8) Argumentação
(9) Resumo 
(10) Chave de leitura 
(11) Intuito da carta
(12) Destinatários
(13) Conteúdo das palavras de exortação
(14) O combate contra o pecado
(15) Divisão
(16) Exegese                                                                                                                                                                                  



         (1) Introdução                                

A Carta aos Hebreus é uma avalanche de motivações que um espírito perfeito apresenta aos “companheiros da vocação celeste” (3,1) que precisam ser sustentados na fé, num momento de desânimo. Os quadros teológicos são grandiosos. As citações das Escrituras são oportunas. A noção da fé é abrangente. Somos colocados diante de uma realidade que Deus oferece e garante, a ponto de vermos quão preferível ela é em comparação ao que o mesmo Deus exige, segundo o que Paulo nos diz: “Os sofrimentos do tempo presente não têm comparação com a glória que há de revelar-se em nós” (Rm 8,18). A argumentação sobre a fé em Hb 11 chega a nos transmitir a sensação de quão valiosa ela é, embora exija que perseveremos até o fim, à semelhança de Abraão, Moisés e dos mártires que “recusaram o resgate para chegar a uma ressurreição melhor” (11,35).
A Carta aos Hebreus, segundo a expressão final: "Irmãos, eu vos peço que suporteis esta palavra de exortação” (13,22), é um escrito que, lido na assembleia dominical, visa ser uma tentativa de ajudar uma comunidade, que está para ser tomada pelo desânimo (12,3), a perseverar na fé, porque, a partir da deserção das assembleias dominicais, decaiu no ardor da caridade e, por isso, tornou-se lenta à compreensão (5,11), necessitada de perseverança, perto de ser rejeitada (6,8). O Autor não quer que seus membros percam a sua "segurança", pelo contrário, quer que, renovado o ardor da sua fé, "levem até o fim o pleno desenvolvimento da esperança" (6,12; 10,35s); resistam até o sangue na luta contra o pecado, porque é somente pela perseverança que alcançarão a herança da salvação (10,36; 1,14). A parte exortativa da Carta é considerável, enquanto, continuamente, se entrelaça com a exposição doutrinal sobre "Jesus que sofreu a cruz, desprezando a vergonha, e se assentou à direita do trono de Deus" (12,2). Quem escreve é um pastor que revela possuir o carisma de um doutor, que conhece Timóteo (13,23), que quer contribuir para a santificação dos seus "santos irmãos e companheiros da vocação celestial" (3,1), mediante uma reflexão sobre nosso Senhor Jesus (13,20), que chegou à glória pelo sofrimento e que, agora, é nosso Mediador da graça da qual necessitamos para perseverar no testemunho. Trata-se de um escriba judeu-cristão que se dirige a judeu-cristãos, filhos de Abraão (2,16), que acreditaram em Jesus Cristo. É um discípulo de Jesus Cristo que, pela perseverança, chegou à estatura adulta da fé, capaz de "degustar a doutrina da justiça" (5,13) e de discernir entre o bem e o mal, "convicto de possuir uma consciência boa, com a vontade de se comportar bem em toda ocasião" (13,18). Considera, portanto, o Reino inabalável que Deus nos concedeu pelo Filho glorificado (12,25) "uma fortuna melhor e mais durável' (10,34) que qualquer riqueza terrena. Por isso, assim admoesta "os seus santos irmãos e companheiros da vocação celestial" (3,1): "É de perseverança que tendes necessidade" (10,36). Os que tudo deixaram (5,18) importa que observem cuidadosamente os ensinamentos para não transviar: "Desejamos somente que cada um de vós demonstre o mesmo ardor em levar até o fim o pleno desenvolvimento da esperança" (6,11).

Para manter o fervor da caridade (6,11), manter "o senso moral exercitado para discernir o bem e o mal" (5,14) e degustar a doutrina da justiça (5,13), o autor da carta propõe a reflexão sobre o Filho eternamente perfeito (7,28b), o Sumo Sacerdote que entrou no céu como precursor (6,20), nosso Senhor Jesus, que "o Deus da Paz fez subir dentre os mortos, que se tornou, pelo sangue de uma Aliança eterna, o Grande Pastor das ovelhas" (13,20). Deus o levou à perfeição por meio do sofrimento (2,10). Se queremos participar da Glória de Nosso Senhor Jesus devemos passar pelo mesmo sofrimento, para sentarmos com ele à direita da Majestade. Além do mais, sua morte foi sofrida por ele para a nossa redenção. Portanto, tendo sido iluminados, tendo degustado o Espírito da Palavra, tendo participado dos sofrimentos dos santos, aceitado o despojamento dos bens, sabendo de possuir bens maiores, "não negligenciemos tamanha salvação" (2,3).
Temos no céu, "em relação a Deus, um sumo sacerdote misericordioso e fiel para expiar os pecados do povo. Pois, tendo ele mesmo sofrido pela tentação, é capaz de socorrer os que são tentados" (2,18). Em segundo lugar, estamos no tempo definitivo; realizou-se a figura; "guardemos bem a graça do Reino inabalável que Deus nos anuncia pelo Filho glorificado" (12,28). Na sua argumentação, o autor utiliza uma contínua comparação entre a antiga aliança e a nova aliança. A superioridade desta última é motivo de grande segurança para os que creem.  Nos nossos dias que são os últimos, os prodígios que Israel viu, na verdade figuras didáticas, se realizaram. Fomos contemplados por uma Aliança no sangue de Jesus Cristo, conhecemos o verdadeiro Monte do Santo, caminhamos para a verdadeira pátria "que está para vir" (13,14). Nós é que estamos ouvindo aquilo que foi transmitido a Israel em figura, porque Deus nos falou no Filho. Podemos distinguir (5,14) entre a vaidade da criação e o que é inabalável: a graça do Reino. Recebemos a graça da Salvação (2,3) e o mistério do Reino (12,28). Sirvamos a Deus, observemos os ensinamentos do Senhor e dos Apóstolos "para não nos transviarmos". Aceitemos as provações pelas quais Deus nos comunica a santidade (12,10); elas produzem frutos de paz e justiça (v.11). De fato, a vida cristã se desenvolve por etapas: conversão, batismo, Espírito, dons, caridade, perseverança na tribulação, esperança. A Igreja, à qual o autor da carta se dirige, viveu a iluminação, os dons, mas é "de perseverança que tem necessidade", condição para agradar a Deus em tudo, sem esmorecer. A maneira para se animar é a assembleia dominical pela qual a Palavra habita em nós plenamente (Cl 3,16). Lá há quem, repleto de sabedoria, como Estevão, ensina e admoesta. A ação de graças é promovida (ibid.). Pelo Senhor Jesus, alcançamos toda graça (Jo 14,13;15,16).
O Autor utiliza uma argumentação que sensibiliza os filhos de Abraão. Jesus é o Filho (Sl 2,7), o Rei que, pela sua imolação, desposa a Igreja (Sl 45). Nessa condição, é, também, nosso Sumo Sacerdote porque, Aquele que recebeu o nome de Senhor, Deus, por um juramento, chamou ao sacerdócio, como fez com Aarão (Sl 110,1.4). 
Aquele que é superior aos sacerdotes da terra, porque realiza em si a figura de Melquisedec e, por um juramento de Deus, é estabelecido Sumo Sacerdote para sempre, é de condição divina: "Resplendor de sua Glória e Expressão do seu Ser, sustenta o universo com o poder de sua palavra" (1,3). É nessa condição que realiza, com a sua Morte, a purificação dos pecados, abole a primeira tenda, entrando, uma vez por todas, no Santuário que está no céu, passando pelo véu da sua humanidade, e se torna Mediador de uma definitiva aliança. Embora sendo homem, senta à direita da Majestade, porque é Filho.


 A nossa herança é a Cidade celeste, da qual participaremos se formos perfeitos como os justos. Será Deus que nos julgará. Temos que proceder com temor e tremor porque ele é um “fogo abrasador (12,29). 
        
 Enquanto apela para a superioridade de Cristo em relação às figuras do   Antigo Testamento e faz disso o tema da sua exortação, o autor da carta lembra que estamos nos tempos últimos (9,26b-28; 10,25.37-38; 12,27), de forma que devemos viver na expectativa da vinda do Senhor. Não vale a pena desertar agora depois de ter sofrido tanto. A perseverança nos levará a participar da herança com Jesus, enquanto a deserção nos tornará merecedores do fogo da ira de Deus.
 Enquanto aduz o exemplo da história dos hebreus, convida a escutar a voz de Deus, para que não sejamos excluídos do repouso prometido, à semelhança dos que endureceram o seu coração no deserto e, por isso, foram excluídos da terra prometida.
  Se diante da Voz de Deus que falou no Monte Sinai, quando a terra estremeceu, e mostrou, pelo seu servo Moisés, a sua Lei, por não a ter observado, os hebreus receberam o castigo, agora que Deus fala do céu pelo Filho, o "Apóstolo" que anunciou, por primeiro, a salvação (2,3), devemos temer um castigo maior, reservado para o fim dos tempos, quando Deus fará estremecer os céus, se não observarmos "cuidadosamente os ensinamentos que ouvimos para que não nos transviemos" (2,1). Devemos prestar ouvidos à Palavra de Deus, que o Senhor começou a anunciar e que os Apóstolos também anunciaram, confiando no poder daquele que foi constituído Filho do Homem, sentado à direita da Majestade de Deus, por si, de condição divina, mas que, também, glorificou a sua Humanidade pela obediência até a imolação. Ele tornou-se um sumo sacerdote capaz de compadecer-se com os que são agora tentados, superior a Moisés e a todo sumo sacerdote, porque foi chamado por Deus para um sacerdócio eficaz e eterno. Também, entrou no Templo que está no céu sem ter que oferecer sacrifícios para si próprio, mas com o seu próprio sangue, tendo realizado, uma vez por todas, a Redenção. Temos, no céu, um sacerdote santo e imaculado.
  É na assembleia dominical, como também lembrará Ap 1,10, que ouvimos "quem nos fala do alto dos céus" pelo Filho, através da Profecia (Ap 1,3), enquanto celebramos o Memorial da sua Morte. É por ele que vivemos na vigilância, nutrindo a fé, mantendo o fervor inicial, adquirindo uma virtude comprovada, chegando a uma esperança que não será confundida, enquanto aguardamos a vinda d´Aquele que vem (Hb 10,37s) e recebemos a graça de um auxílio oportuno daquele que sabe compadecer-se dos que são tentados, tendo ele,  por primeiro, experimentado a tentação.
A exortação quer fundamentar a sua força de convicção no valor da Palavra de Deus à qual teremos que prestar contas [Prestai atenção à Palavra (12,25). A Palavra é uma espada cortante de dois gumes que penetra até... Se a Palavra revelada por anjos...]. O termo palavra, em hebraico não indica somente o que Deus diz, como, também, o que Deus realiza. Como Deus se revelou outrora por tudo aquilo que anunciou e realizou, “no Filho” Jesus Cristo, nos anunciou o Reino inabalável, a Salvação e nos constituiu herdeiros, com Cristo, do mundo futuro. Por isso, é necessário perseverar até o fim na nossa fé em Cristo para receber a "herança das promessas" (6,12).
  Não podemos endurecer os corações. Os que endureceram os seus corações, não querendo ouvir a voz de Deus, não obstante tivessem visto as suas obras que a comprovavam, foram excluídos do repouso prometido. Isso acontecerá para nós, também, se menosprezarmos a salvação anunciada pelo Senhor e fielmente transmitida pelos Apóstolos, "acompanhando Deus suas palavras com sinais..." (2,4).

  A argumentação da Carta irá utilizar, constantemente, a comparação entre dois momentos proféticos bem distintos: o tempo em que Deus falou pelos seus servos, os profetas, e o tempo escatológico em que Deus fala pelo Filho. Falou Deus aos pais nos profetas... Falou-nos no Filho (1,1s); a palavra promulgada por anjos.. tão grande salvação anunciada pelo Senhor (2,2s); Jesus é fiel a quem o constituiu, como também o foi Moisés em toda a sua casa (3,2); sacerdócio levítico... outro sacerdócio segundo a ordem de Melquisedec (7,11); Jesus se tornou a garantia de uma aliança melhor (7,22); a Lei estabeleceu sumos sacerdotes sujeitos à fraqueza, a palavra do juramento, posterior à Lei, estabeleceu um Filho eternamente perfeito (7,28). Cristo possui um ministério superior. Pois ele é o mediador de uma aliança bem melhor (8,6).
    O Autor não deixa de sublinhar que a palavra que o Deus único quer nos transmitir pelo Filho diz respeito ao tempo do fim. Isto significa que, pela fé, já estamos de posse do que é definitivo: o Reino inabalável que em breve há de se manifestar e do qual participaremos se perseverarmos, na fé, até o fim. É a palavra de quem nos fala "do alto dos céus" (12,25), que faz desaparecer "tudo o que participa da instabilidade do mundo criado, a fim de que subsista o que é inabalável" (12,27s).

           (2) Conceitos bem precisos


A Carta aos hebreus, para ser entendida, deve ser abordada tendo presente conceitos bem precisos.

 1º) O sacerdócio de Jesus
            “Se Jesus estivesse na terra não seria nem mesmo sacerdote” (Hb 8,3).
O termo “sacerdote”, para o autor da carta, deve ser, por si, reservado aos “que oferecem dádivas, de acordo com a Lei” (v. 4). Contudo, uma vez que lemos: “Iahweh jurou e jamais desmentirá: ‘Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedec’”, por atribuição e de forma analógica, todavia, por sublimação, pode-se falar de um sacerdócio do homem Cristo Jesus. A sua natureza é ilustrada por Hb 2,5-18. Em Jesus, a característica sacerdotal tem seu fundamento na imolação que o glorifica e, ao mesmo tempo, salva os seus irmãos.
Isto nos permite estabelecer uma relação clara entre o sacerdócio dos fiéis e o sacerdócio conferido pelo sacramento da ordem. Pelo caráter, todo e cada fiel é configurado, pelo Espírito, a Cristo sacerdote. Enquanto a configuração a Cristo, recebida no Batismo, torna o fiel capaz de tornar a sua vida “um sacrifício espiritual agradável a Deus” (Rm 12,1), a configuração recebida pelo sacramento da Ordem torna o fiel capaz de consagrar para que na celebração da Eucaristia se realize o Memorial da Morte do Senhor. A santificação dos fiéis e do sacerdote ocorre dentro das suas específicas funções.

2º) Estrutura literária da carta
            Todo e qualquer leitor da Carta aos Hebreus pode notar a sua forma literária. Trata-se de uma exposição que ilustra de forma enfática os conceitos que o autor apresenta. Por causa disso devemos descobrir quais são os conceitos fundamentais que norteiam a própria exposição. Isto nos permitirá definir, de forma clara, os blocos que a compõem e, em seguida, entender de que forma se sucedem, enquanto o autor expõe a sua exortação.
            O primeiro conceito fundamental, na mente do autor, é a figura de Jesus Sumo-sacerdote (8,1). O autor a desenvolve gradativamente, a partir da apresentação da condição divina de Jesus, fundamento da natureza do seu sacerdócio, apresentando-o na condição do adão que, único, chegou à perfeição pelo sofrimento. O segundo conceito fundamental é a fé que o fiel deve cultivar (11,1). As considerações sobre Jesus, gradativamente apresentadas são as suas motivações. Os dois conceitos se entrelaçam ao longo de toda a carta até aparecer a figura de Jesus em toda a sua irresistível grandeza (12,2), motivação conclusiva para o fiel viver o testemunho da sua fé, disposto a desprezar a vida, convencido de possuir, desde já, bens melhores.
            A motivação da carta é, portanto, exortar “companheiros da vocação celestial” à perseverança. As provações, quais suscitadas pelos judeus da diáspora que se recusam reconhecer em Jesus o Cristo e ameaçam de excomunhão da sinagoga todos os que a ele dão a sua adesão de fé, não podem levá-los ao desânimo a ponto de apostatar.
            A reflexão sobre Jesus, o Herdeiro, Resplendor da Glória de Deus e Imagem do seu Ser, que entrou nos céus com o seu sangue, na condição de nosso Sumo Sacerdote, realizada a purificação dos pecados, é o conteúdo da motivação que o autor da carta quer propor com as suas simples palavras de exortação. Ela será ouvida pelos fiéis reunidos em assembleia “no dia do Senhor”, juntamente com a exortação e as admoestações dos seus dirigentes (13,17), quando proclamada pelo leitor, para que seja guardada nos corações.
            A carta é uma exortação motivada por uma condição de desânimo. Os fiéis aos quais o autor se dirige precisam de perseverança. São cristãos que poderiam se tornar desertores, não obstante já tenham dado testemunho de heroísmo, a ponto de aceitar a perda dos seus bens, preferindo os bens melhores que conquistaram abraçando a fé. Porão tudo a perder caso não perseverem.
            O desânimo tem suas raízes na ausência às assembleias dominicais, nas quais os fieis nutrem sua fé pela Palavra, o que lhes dá condições de cultivar a virtude pela observância dos mandamentos, praticar as boas obras, viver o amor fraterno, a partir do apoio que dão aos irmãos pela exortação e admoestação. Tudo isso possibilita cultivar a constância que leva a uma esperança inquebrantável diante das tribulações, consideradas, então, como condições de viver em si a paixão de Cristo (cf. Rm 5,3-5).

  3º) O autor é um pastor de almas, discípulo de Paulo, responsável, à semelhança de Timóteo, de uma circunscrição de igrejas. Ele tem consciência de ser um homem de fé que persevera na esperança, em vista da conquista da herança eterna. Está em condições de ditar aos “santos irmãos, companheiros da vocação celeste” (3,1), o que devem fazer para lançarem fora o fardo do desânimo e, dessa forma, não se tornarem vítimas do pecado que os envolve (12,1). Pela perseverança, é possível chegar a “degustar a doutrina da justiça” (5,13) e, dessa forma, se alimentar com o alimento sólido dos perfeitos.
            À semelhança do que Paulo fez quando escreveu aos romanos, no intuito de colher algum fruto entre eles, ele compartilha a sua reflexão, para, com eles, se edificar na fé (cf. Rm 16,15; 1,11s).
Em primeiro lugar, convida a contemplar Jesus na condição de Filho, que realiza em si o que o Deus de Israel anunciou pelos profetas. Chegou a plenitude dos tempos. Deus nos fala em Jesus, o Herdeiro, aquele que estabeleceu o Reino na condição de Palavra criadora, Resplendor da Glória, Imagem do Ser, que sustenta todas as coisas, Aquele que, realizada a purificação dos pecados, sentou-se à direita da Majestade, acima das ordens celestiais, em virtude do Nome que recebeu, que excede o delas.
            A análise dos salmos 2; 45; 102; 110 o ajuda a apresentar a condição gloriosa de Jesus (Hb 1).

Em 2,1-4, temos uma primeira inserção de exortação moral, fundamentada nos dois quadros grandiosos da apresentação inicial: o Filho que nos fala, chegada a plenitude dos tempos; Jesus glorificado acima dos anjos, constituído senhor de tudo. Temos a obrigação moral de não negligenciar “tão grande salvação” (v.3). Se Deus puniu as transgressões da Lei da antiga aliança, qual não será o nosso castigo diante de uma Lei que nosso Senhor nos transmitiu, tendo-a recebido de Deus e que os Apóstolos nos anunciaram, com sinais e prodígios, sob a moção do Espírito?
2,5-3,6   O Filho que, “realizada a purificação dos pecados, se sentou nas alturas à direita da Majestade” é o nosso Sumo-sacerdote, misericordioso e fiel que Deus constituiu acima da sua casa, “que somos nós se mantivermos a confiança e o motivo altaneiro da esperança” (3,6). Ele é o homem, criado um pouco inferior aos anjos, que vemos “coroado de glória e honra”, porque “provou a morte em favor de todos os homens”. Deus o levou à perfeição pelo sofrimento, Ele, que Deus destinou para ser o Autor da nossa salvação, “é capaz de socorrer os que são tentados”, “tendo ele mesmo sofrido pela provação” (2,18).

3,7-4,13 Segunda inserção de exortação moral  Se Deus nos falou no Filho,    devemos escutar a voz de Deus.
Devemos aprender por aquilo que aconteceu aos israelitas quando não escutaram a voz de Deus no deserto. Por terem transgredido a Lei, não obstante tivessem visto as obras de Deus, na sua ira, este os excluiu do repouso prometido. Para não sofrermos a mesma sorte, devemos manter "firme até o fim a nossa confiança inicial em Jesus (3,14), "o Apóstolo e Sumo- sacerdote da nossa profissão de fé" (v.1). Seremos julgados pela Palavra de Deus, aquela que o Espírito anunciou pelos profetas, por Jesus Cristo e pelos Apóstolos, "por meio de sinais, de prodígios e de vários milagres, e pelos dons do Espírito Santo, distribuídos segundo a sua vontade" (2,4). A relação com o Apocalipse é clara, porque a Palavra "mais penetrante do que qualquer espada de dois gumes que... julga as disposições e as intenções do coração" é aquela que sai da boca do Filho do Homem, Senhor da Igreja, Sumo Sacerdote e Rei-Pastor das ovelhas.
4,14-16 Primeira síntese da “palavra de exortação: “Permaneçamos firmes na profissão de fé”, porque temos “Sumo-sacerdote eminente, que atravessou os céus: Jesus o Filho de Deus”. Ele é capaz de se compadecer das nossas fraquezas.
 O autor é um pastor de almas que se acha no dever de socorrer uma comunidade que foi fundada por outros evangelizadores, dos quais devem imitar a fé (13,7) e que já tem seus dirigentes. Trata-se de alguém da condição de Timóteo e Tito, que Paulo constituiu bispos sobre as comunidades fundadas. Considera-se à altura de aconselhar como quem "está convicto de possuir uma consciência boa, com a vontade de se comportar bem em toda ocasião" (13,18). É um escriba da classe sacerdotal que aceitou "com alegria a espoliação dos seus bens" (10,34). Quer exortar à perseverança na fé, aceitando carregar a humilhação, saindo fora do acampamento, para ir ao encontro de Jesus crucificado que, por primeiro, desprezou a vergonha à qual o expunha a rejeição do Sinédrio, porque foi assim que alcançou sentar-se à direita do Pai. Não devemos nos apegar à Cidade terrena, que não é permanente. De fato, procuramos a cidade do Céu.
            Pelos dados do autor, entendemos qual é o motivo da carta: o desânimo, que ele quer combater nos fiéis da comunidade à qual se dirige. São as perseguições dos judeus que proscrevem da Sinagoga todos os que se professam cristãos. Eles estão apegados à cidade terrena, aos Sumos sacerdotes, ao templo, às tradições humanas. Os cristãos procuram uma cidade que está para vir (13,14). Os que servem a Tenda não podem se alimentar do altar dos cristãos, porque Jesus "para santificar o povo por seu próprio sangue, sofreu do lado de fora da porta" (13,12), lugar onde são queimadas as carnes dos sacrifícios.

Por isso, o autor da carta exorta os fiéis de cada comunidade a imitar o testemunho dos seus dirigentes que coroaram a sua vida dando testemunho da sua fé até o fim (13,7), resistindo até o sangue no combate contra o pecado (12,4).
            “Falou Deus aos Pais pelos profetas” (1,1). Desde o início, esta frase nos indica que estamos diante de um hebreu que escreve a hebreus.
“Nestes dias que são os últimos, que são os nossos, falou-nos pelo Filho” (1,2). O Autor e os destinatários são hebreus que reconheceram em Jesus o Messias, o Filho de Deus, realizador da Profecia. Sabem que estamos no Tempo do Fim, pouco faltando para a manifestação do Reino inabalável, pelo qual, os que devem herdar a salvação, reinarão com o Herdeiro do mundo futuro.

(3) Os blocos da carta

Conforme o que já pontuamos na Introdução, podemos agora definir os blocos da carta: Enquanto o primeiro bloco trata da primeira apresentação do Filho que Deus constituiu acima da sua casa, os outros blocos, enquanto aprofundarão a compreensão da condição sacerdotal de Jesus, motivarão sempre mais os fiéis a viver perseverando na sua fé.
  Temos que observar, todavia, que, além da figura do Filho de Deus, nosso Sumo Sacerdote, há uma convicção ainda mais profunda que leva o autor a exortar os “companheiros da vocação celestial": a veneração ao Deus de Israel. Uma longa tradição de manifestações proféticas o torna presente à fé de cada descendente de Abraão (Rm 16,25-27). Não é possível esquecer tudo o que o seu Desígnio, que a reflexão sapiencial esteve paulatinamente descobrindo, sugere da sua Santidade, Sabedoria e Poder que se manifestam na Misericórdia (4,16).

Primeiro bloco: Hb 1-4
O primeiro bloco da carta é a primeira apresentação do Filho que Deus constituiu acima da sua casa: “Temos um Sumo-sacerdote eminente, que atravessou os céus: Jesus, o Filho de Deus. Permaneçamos, por isso, firmes na profissão de fé” (Hb 4, 14-15).


 Segundo bloco (5,1-10,19)
5,1-10 Ilustração da capacidade de Jesus de se compadecer através da comparação com o sumo sacerdote da religião judaica Feita exceção do pecado, Jesus, à semelhança do sumo sacerdote, ofereceu o seu sacrifício para si e para o povo. O seu sacerdócio tem como fundamento a vocação do próprio Deus, segundo o Sl 110.
5,11-6,20 Reflexão pertinente do autor da carta para explicar de que forma a sua exortação, fundamentada sobre os conceitos doutrinais que dizem respeito ao sacerdócio de Cristo, pode nos motivar à perseverança em vista da conquista da herança. Uma vez que fomos iluminados, demos testemunho, sofremos escárnios, aceitamos perder os nossos bens “guardemos o mesmo ardor em levar até o fim o pleno desenvolvimento da esperança”. Isto evitará que nos tornemos “lentos à compreensão”. Isto nos permitirá “degustar a doutrina da justiça” (5,13) e sermos “imitadores daqueles que pela fé e pela perseverança, recebem a herança das promessas” (6,12). A nossa esperança será como uma âncora lançada no céu onde está o nosso mediador, que lá nos precedeu [é pela esperança que alcançamos a posse daquilo que ainda não vemos (6,12; 11,1; cf. Rm 5,5)].
A vida cristã ainda não é completa depois de termos sido iluminados, de termos degustado o dom celeste, de termos recebido o Espírito Santo, de termos experimentado a beleza da Palavra de Deus e as forças do mundo que há de vir. É preciso perseverar na fé para sempre termos em nós o ardor inicial e “levarmos até o fim o pleno desenvolvimento da esperança”. Nessas condições, nunca seremos tomados pelo desânimo porque não seremos lentos na compreensão. Em condições de “degustar a doutrina da justiça” (Hb 5,13), possuidores de um senso moral exercitado, “faremos tudo sem murmuração e reclamação (Fl 2,14). Ao coroar a caridade com uma esperança incapaz de esmorecer, teremos lançado, “além do véu”, uma âncora de salvação, “onde Jesus entrou por nós, como precursor, feito sumo sacerdote para a eternidade, segundo a ordem de Melquisedec” (6,20). Estamos diante de uma palavra gancho que confirma a técnica literária segundo a qual o autor conduz a sua exposição. Ele quer motivar a sua exortação desenvolvendo a figura de Jesus, o Filho, no qual Deus nos fala na plenitude dos tempos, apresentando-o na condição de Sumo-sacerdote. A apresentação é gradativa para poder explorar todos os seus aspectos, importantes para reconfortar os desanimados.

7,1-28 Os fundamentos do sacerdócio de Jesus que a revelação oferece O Sl 110 que, na abertura da carta já serviu, juntamente com o Sl 2 para ilustrar a condição gloriosa de Jesus, “constituído abertamente Filho de Deus com poder, em Espírito de santidade, pela sua ressurreição dos mortos” (Rm 1,4), lembrado em 5,5 para provar que Jesus é sacerdote porque foi chamado a esta função por Deus, agora é citado para que, interpretado à luz de Gn 14,17-20, nos dê a possibilidade de detectar todas as prerrogativas do sacerdócio de Cristo Jesus. É um sacerdócio régio, capaz de estabelecer a justiça e “guardar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz” (Ef 4,3) de forma eficaz e numa condição de perpetuidade. Uma vez que vemos Aarão oferecer o dízimo a Melquisedec, compreendemos que o sacerdócio de Cristo lhe é superior. Melquisedec, sem genealogia e sem fim, é figura do sacerdócio eterno de Cristo, superior a um sacerdócio participado por geração carnal. É um sacerdócio eficaz, enquanto o sacerdócio segundo a Lei não leva nada à perfeição. Jesus, com a sua imolação se tornou garantia de uma aliança melhor e, também, de uma esperança melhor. (Essa característica aqui é somente lembrada. Já foi comentada em 2,10-18 e será ilustrada em 8-10).

8,1-10,18 Os fundamentos doutrinais da eficácia do sacerdócio de Cristo  Jesus quando entrou nos céus, entrou no verdadeiro santuário; entrou com o seu sangue e se tornou o nosso intercessor. Com o seu sacrifício sancionou uma aliança melhor, fundada em melhores promessas. Por ele se realiza a profecia de Jr 31,31-34. “Sacerdote dos bens vindouros, oferecido o sacrifício, entrou, uma vez por todas no Santuário do Céu. Tornamos-nos capazes de prestar culto ao Deus vivo (9,14). Os que agiam no santuário da terra eram simples figuras, não levariam à perfeição aqueles que se aproximam de Deus (10,1). Cristo Jesus substituiu-se às vítimas. Deus se agrada com a sua obediência até a morte. O seu sacrifício nos santifica uma vez por todas. Com um único sacrifício leva à perfeição, e para sempre, os que ele santifica. O seu não é um sacerdócio segundo a Lei que estabelece que sejam sacerdotes os que são da tribo de Levi e ofereçam o que a Lei prescreve, num santuário que é figura do Santuário no céu, onde se realiza “um culto que é cópia e sombra das realidades celestes” (8,5). É um sacerdócio que estabelece melhores promessas, em relação à Aliança sinaítica. Realiza-se uma Aliança inquebrantável, com a finalidade de estabelecer, em virtude do sacrifício perfeito oferecido uma vez por todas, a Lei de Deus no coração dos homens, que se tornarão capazes de conhecer a Deus. O perdão das culpas será o início da ação misericordiosa de Deus.


10,19 Compromissos dos fiéis diante de tão grande salvação: Promover a fé. Viver a purificação dos pecados. Exortar-nos. Realizar boas obras. Frequentar as assembleias.


            Terceiro bloco  


11 A fé ilustrada por figuras Definição da fé. Uma condição de confiança em Deus que leva a cumprir com a sua vontade na certeza de que ele é fiel às suas promessas. Por isso, é posse do que se espera, fundamento do que ainda não se manifestou. Essa fé foi vivida pelos antigos que a testemunharam com os seus gestos, com os quais Deus se agradou. Enquanto nos faz compreender que tudo tem origem na palavra criadora de Deus, constatamos que o seu princípio não está nas coisas criadas. A partir da criação entendida pela fé, é fácil ver na figura de Abel a nobreza dos sentimentos que tornam o seu sacrifício melhor que o de Caim. Essa é a fé que justifica.Ela fala até depois dele estar morto. A figura de Henoc sugere o mesmo ensinamento. Deus dá testemunho que se agrada com a sua vida e por isso o arrebata. Noé é uma figura que ilustra ainda mais o conceito de fé. Ouvida a palavra de Deus, constrói a arca diante da indiferença do mundo. A fé o justifica e o sinal é a sua salvação. Abraão é a idealização do homem de fé. Obedece diante da promessa da cidade “cujo arquiteto e construtor é o próprio Deus”, que considera fiel. A nossa confiança é no Deus que suscitou de um homem marcado pela morte uma multidão... (v.12).

(4) O esquema mental do autor
Ao escrever a sua carta, o autor visava exortar e admoestar para edificar. Os Atos dos Apóstolos e as cartas apostólicas nos indicam que as comunidades se reuniam “no dia do Senhor” e que, enquanto celebravam o Memorial da sua Morte, se edificavam a partir da escuta da palavra que o leitor proclamava, através da exortação e admoestação que a mesma Palavra sugeria.
            O autor da carta aos Hebreus, nisso se assemelha a Paulo, quando escreve aos romanos, e a João que escreve o Apocalipse. A sua contribuição é uma reflexão sobre a condição sacerdotal de Jesus, o Sumo-sacerdote que entrou no céu com o seu Sangue e intercede por nós, na condição de Sumo-sacerdote misericordioso e fiel, o Filho que Deus constituiu acima da sua casa, “que somos nós se mantivermos a confiança e o motivo altaneiro da nossa esperança” (3,6). O autor espera com isso colher algum fruto, na condição de pastor de almas. Ele está confiante porque tem consciência de servir a Deus na fidelidade. As suas palavras saem de um espírito que chegou à perfeição, que se nutre de um alimento sólido, que é capaz de discernir entre o bem e o mal. Trata-se de uma condição que todos os fiéis que já foram iluminados, que conheceram a força do Espírito, degustaram os bens celestiais, poderiam alcançar, jogando fora o fardo do desânimo que os oprime e que os torna presas do pecado que os envolve, promovendo a fé pela Palavra, que deve habitar neles abundantemente, juntando à fé a virtude, pela purificação dos pecados, vivendo o amor fraterno, suportando-se mutuamente, praticando as boas obras, até coroar a sua caridade com uma esperança que não estremecerá diante de nenhuma provação.
            O sacerdócio de Cristo é o tema principal dentro de uma exortação que, de forma mais ampla, visa lembrar que temos uma responsabilidade grave diante de Deus que fala, ainda mais que chegou a plenitude dos tempos e que Deus nos fala, não mais nos profetas, mas no Filho, realizando tudo aquilo que os profetas pré-evangelizaram “aos nossos pais”. Não podemos negligenciar “tão grande salvação”, anunciada pelo Senhor, a nós transmitida por aqueles que a testemunharam, assistidos pelo Espírito Santo, e acompanhada por muitos sinais e prodígios. Recebemos um Reino inabalável. Perseveremos na fé, coroando-a com a esperança, aguardando, na vigilância, o Dia do Senhor.
O autor abre, então, a sua carta com o quadro glorioso do Desígnio de Deus que se realiza em Jesus (Lc 1,68-79), o Herdeiro (Mt 21). As suas prerrogativas divinas, Princípio da criação, Resplendor da Glória, Imagem do Ser; o sentido do seu sacrifício sobre a Cruz e a subsequente glorificação, são realidades conhecidas e celebradas por todas as comunidades cristãs (Cl 1,12-20), juntamente com a sua exaltação (Fl 2,6-11).
Ilustra, então, a condição gloriosa de Jesus, apelando ao sentido messiânico dos Sl 2; 45; 72; 110. Ele é superior aos anjos. Aquilo que foi profeticamente anunciado se realizou pela sua morte em favor de todos os homens. “Levado à perfeição pelo sofrimento, o vemos coroado de honra e glória” (2,9). Esse é o processo que leva o autor a ver em Jesus, tornado “em tudo semelhante aos irmãos, o Sumo-sacerdote misericordioso e fiel, capaz de expiar os pecados do povo e de socorrer os que são tentados” (2,17-18), uma vez que foi tentado por primeiro.


Quando o autor retoma o tema no fim de Hb 4, em Hb 5 desenvolve o aspecto misericordioso de Jesus. Temos então ilustrada, pelas palavras do autor, a figura de Nosso Senhor. A ilustração procede por etapas, até aqui marcadas da seguinte forma:
Jesus deve ser o nosso modelo de fé (Hb 12). 1º) É o nosso Sumo- Sacerdote, na condição de Filho (Hb 1) e de Adão que chegou a perfeição, permitindo-nos reinar com Ele (Hb 2): “Convinha, por isso, que em tudo se tornasse semelhante aos irmãos, para ser, em relação a Deus, Sumo-sacerdote misericordioso e fiel, para expiar assim os pecados do povo.18Pois, tendo ele mesmo sofrido pela provação, é capaz de socorrer os que são provados” (2,17-18). 2º) É o nosso Sumo-sacerdote na condição de quem Deus enviou para nos falar (Hb 3) e... (Hb 4): “Temos, portanto, sumo sacerdote eminente, que atravessou os céus: Jesus, o Filho de Deus. Permaneçamos, por isso, firmes na profissão de fé. Com efeito, não temos sumo sacerdote incapaz de se compadecer das nossas fraquezas, pois ele mesmo foi provado em tudo como nós, com exceção do pecado. Aproximemo-nos, então, com segurança do trono da graça para conseguirmos misericórdia e alcançaremos graça, como ajuda oportuna” (Hb 4,14-16). 3º) É nosso Sumo-sacerdote porque: “entrou por nós, como precursor, penetrando além do véu, feito Sumo-sacerdote para o éon, segundo a ordem de Melquisedec” (6,19-20).

            Hb 7 ilustra o sacerdócio de Cristo à luz da figura de Melquisedec. A superioridade do sacerdócio de Cristo nos faz entender porque o sacerdócio da Lei está fadado a desaparecer. É o inferior diante do superior, é o ineficaz quanto a levar à perfeição, enquanto o sacerdócio de Cristo é eficaz; depende da geração carnal, enquanto o de Cristo é eterno.
            Em relação ao próprio santuário, enquanto a tenda que Moisés construiu era figura do que lhe foi mostrado, o Santuário em que Cristo opera é a Tenda no céu. A sua Aliança oferece graças melhores daquela estabelecida com a aspersão do sangue dos bois e carneiros. É dada a remissão dos pecados. A Lei é impressa nos corações. Os homens podem chegar ao conhecimento de Deus.
            A condição imperfeita do sacerdócio da Lei fica clara diante da primeira tenda, onde são continuamente oferecidos sacrifícios sem eficácia. Cristo entrou no Santuário do céu passando pelo véu do seu corpo, com o seu sangue e, diante de Deus, intercede por nós. Ele é a vítima na qual o Pai se agrada e que Jesus oferece ao entrar no mundo. Substitui as vítimas prescritas pela Lei.
            Por Ele, que nos mostrou o caminho da “alegria”, chegando a possuir a Glória da Majestade (12,2) pela graça que Deus lhe concedeu de provar “a morte em favor dos homens" (2,9), Deus nos revela a grande salvação que se realizou nos “últimos tempos”. Temos que prestar ouvido Àquele que nos fala. Não permitamos que os nossos corações fiquem endurecidos pela murmuração que o desânimo poderia sugerir. Seríamos presa do pecado, perdendo qualquer condição de herdar a “herança das promessas” que somente é alcançada pelos homens de fé que perseveram no testemunho (6,12). O processo ascético é aquele de cultivar a fé, viver a purificação dos pecados, viver o amor fraterno, nos estimulando à caridade e às boas obras (10,22-25; cf. 13,21). Frequentemos as assembleias. Estejamos atentos ao “dia que se aproxima” (ibid.).

(5) Conteúdo temático
            O autor dessa carta escreve para ir encontro de fiéis desanimados por causa de contínuas perseguições. Na condição de quem tem consciência que chegou a agradar a Deus em tudo (13,18) e que, portanto, é capaz de “degustar a doutrina da justiça” (5,13), quer participar a sua reflexão pessoal às igrejas (13,22), para que sejam confortados. Dessa forma, enquanto conseguem perseverar nas tribulações, serão capazes de se nutrir de um alimento sólido que os levará a se libertar do fardo pesado do desânimo e a escapar de cair no pecado da apostasia que os envolve (12,1). Já foram iluminados, já sofreram tribulações, já socorreram os prisioneiros e os despojados dos seus bens, aceitaram o despojamento dos bens sabendo que tinham chegado a possuir bens melhores, o “reino inabalável” (6,10) . É para seguir Jesus que diante da alegria que lhe era oferecida, desprezou a humilhação e entregou a sua vida (12,2).
            A forma válida para conseguir tudo isso é a escuta de Deus que nos fala (12,25). Se o tivessem escutado os hebreus, no deserto, teriam entrado no repouso prometido. Se o escutarmos, agora, enquanto nos fala no Filho, continuaremos a ser a casa de Deus. Quando a sua voz abalar terra e céu, nós permaneceremos porque teremos guardado a “confiança e o motivo altaneiro da esperança” (3,6). Permaneceremos com aquilo que é inabalável.
            Edifiquemo-nos considerando a importância do Filho, de condição divina, o adão que foi criado um pouco inferior aos anjos e que, agora, vemos “coroado de honra e glória” por ter chegado à perfeição pelo sofrimento. Realizou a nossa redenção, num supremo gesto de amor.
            Jesus é o nosso Sumo Sacerdote que entrou no Templo do céu com o seu sangue e que, agora, sabe compadecer-se conosco por ter sido tentado por primeiro. É o sacerdote de que precisávamos: santo, puro e imaculado. O sacerdote da Antiga Aliança que oferece o sacrifício de expiação por si e pelos outros é sua figura. “Nos dias de sua vida mortal, ofereceu a Deus clamores e lágrimas para ser poupado da morte, e foi atendido por causa da sua submissão” (5,7).
            Não outorgou a si mesmo  essa condição. Deus o chamou como chamou Aarão, dizendo-lhe: “Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedec” (Sl110). A sua condição sacerdotal se manifesta quando entra no mundo (Sl 40). Substitui os sacrifícios de animais com a sua imolação, aceita pelo Pai. É estabelecida uma Nova Aliança, que proporciona bens maiores: o perdão das culpas e a condição de santificação pela observância dos mandamentos de Cristo Jesus. A Lei não podia levar à perfeição a santificação porque o sacerdócio que instituiu não era eficaz e nem o era o sangue das vítimas. Cristo, na condição de sacerdote “santo, puro e imaculado”, se ofereceu uma vez por todas e entrou no Templo do céu com o seu Sangue. O seu sacerdócio supera o de Aarão e o sacerdócio levítico, porque é eficaz. Nele as figuras se tornam realidade. A nossa vítima, agora, é aquela simbolizada pelas carnes queimadas fora da cidade (13,11-12), as da vítima cujo sangue servia para a aspersão. É Cristo que aceitou a vergonha . É ele que devemos seguir. Não podemos deixar endurecer o nosso coração para evitar de sermos excluídos do repouso prometido.
            Temos muitas testemunhas que inspiram a nossa fé. Elas foram perseverantes, embora não tenham chegado a ver realizadas as promessas. Nós temos a visão de Cristo autor e realizador da fé. Sejamos, portanto, perseverantes e testemunhemos até a efusão do sangue.
            É Deus que nos educa enquanto experimentamos as tribulações. Estamos vivendo a Aliança definitiva que nos introduzirá na Cidade celeste, para vivermos a Liturgia dos anjos que adoram o Deus dos espíritos, enquanto nós o celebraremos pelo culto a Cristo mediador da Nova Aliança. Vivamos a purificação dos pecados até alcançarmos o amor fraterno, cultivando a nossa fé pela Liturgia dominical, a castidade, o espírito de pobreza, para nos enriquecermos com os valores eternos.

(6) A lógica da exposição
            Jesus, “princípio e realizador da nossa fé” (12,2), é a figura que o autor quer apresentar, ele que, diante da glória que lhe era proposta, desprezou a vergonha. É o mais eloquente discurso que Deus poderia fazer aos homens, porque ele é o Filho, o herdeiro, cuja ressurreição revelou ser a Palavra criadora, o Resplendor da Glória e a Imagem do Ser de Deus, Aquele que governa o universo. “Realizada a purificação dos pecados, está sentado à direita da Majestade, tão superior aos anjos quanto o nome que herdou excede o deles” (1,3).
O Sl 2 nos revela a sua condição de Filho, gerado desde a eternidade. O Sl 45 proclama a sua condição eterna. O Sl 102 no-lo mostra senhor do universo criado. O Sl 110 o declara Sacerdote para sempre segundo a ordem de Melquisedec.
            Como negligenciar tão grande salvação que Nosso Senhor Jesus começou a nos anunciar e que os Apóstolos proclamaram no poder do Espírito Santo?
            Jesus é o Filho porque nele se realiza a profecia sobre o homem. Criado um pouco inferior aos anjos, pelo sofrimento chega à perfeição. A sua imolação torna-se princípio da nossa libertação da escravidão do Maligno. É dessa forma que, tendo-se em tudo tornado igual a nós, exceto o pecado, por ter chegado à perfeição pelo sofrimento, por ter-nos purificado dos nossos pecados, se tornou o nosso sumo sacerdote que sabe compadecer-se com aqueles que sofrem a tentação, por ter ele sofrido a tentação por primeiro.
            Não podemos endurecer o nosso coração, como fizeram os nossos ancestrais que saíram do Egito, porque não alcançaremos a pátria prometida.
            O nosso Sumo Sacerdote é santo puro e imaculado.
            À semelhança do sumo sacerdote que tem necessidade de orar para si, enquanto intercede pelo povo, Jesus, nos dias da sua vida mortal, ofereceu clamores e súplicas para ser poupado da morte e foi atendido por causa da sua piedade.
            Torna-se necessária a perseverança no testemunho para chegar a “degustar a doutrina da justiça” (5,13) e não cairmos na apostasia.
            O sacerdócio de Cristo é superior ao sacerdócio de Aarão, porque é segundo a ordem de Melquisedec. É eficaz porque nos alcança a remissão dos pecados.
            Temos, portanto, no céu, um Sumo Sacerdote que lá entrou e intercede por nós.
            Os sacerdotes oferecem muitas vezes os mesmos sacrifícios. Mas eles somente alcançam a purificação legal.
            Cristo entrou no santuário do céu com o seu sangue, uma vez por todas e intercede por nós.
            Sejamos, portanto, homens de fé que alcançam, pela fidelidade e perseverança, a posse dos bens futuros, uma vez que têm em si o argumento das coisas que ainda não veem. Temos exemplo disso nos Patriarcas, em Abraão, em Moisés, nos Juízes, nos mártires.
            Olhos fixos em Jesus, demos testemunho da nossa fé até a efusão do sangue, caso se torne necessário. Aspiremos à Cidade celeste, à Liturgia celeste, à comunhão com o Deus dos espíritos, à vida em Cristo.
            A nossa comunhão não é mais com as vítimas do sacrifício do altar. A nossa vítima está fora da cidade. É da carne de Jesus que lá foi morto que nos nutrimos (13,12).

            (7) A forma da exposição
            O Autor utiliza uma constante comparação entre a figura e a sua atuação na pessoa de Jesus, fundamentado em tudo aquilo que Deus revelou. Aos pais foi promulgada uma Lei por mãos de anjos. Com eles, Deus selou uma Aliança pelo sangue de sacrifícios de animais que Moisés mandou imolar. Constituiu Moisés como responsável do seu povo. Chamou Aarão par ser sacerdote. Estabeleceu um culto no templo. A nós, Deus falou diretamente pelo Filho que selou a definitiva aliança no seu sangue e se tornou o Senhor da Igreja. Deus, por um juramento, o constituiu Sumo Sacerdote segundo a ordem de Melquisedec, que entrou no Santuário do céu uma vez por todas com o seu sangue. Todas essas verdades só são compreendidas por quem tem uma fé adulta. Por isso é necessário, após a conversão, o batismo, a crisma e a participação da Eucaristia não abandonar as assembleias dominicais para lá ouvir a Palavra de Deus. É necessário se livrar de todo fardo e do pecado que nos envolve, deixando de sermos faltosos, amargos, impuros, adúlteros e apegados aos bens materiais; cultivando a fé, segundo os dons do Espírito; perseverando nas tribulações até possuir uma esperança que não será confundida. A quem pratica tudo isso é dado  degustar a justiça de Deus e ser capaz de discernir entre o bem e o mal.
            Jesus é de condição divina. Pela sua ressurreição foi constituído Filho de Deus com poder. É o Adão verdadeiro levado à perfeição pelo sofrimento, que sabe socorrer os que são tentados. É o nosso Sumo Sacerdote, misericordioso e fiel, constituído por Deus por um juramento, e que entrou, uma vez por todas, no Santuário do céu.
            Não podemos negligenciar tão grande salvação. Somos chamados a sermos co-herdeiros com Cristo “se sofrermos com ele para sermos glorificados com ele” (Rm 8,17). Olhos fixos em Jesus, autor e realizador da fé, que desdenhou a vergonha, saiamos da Cidade terrena, carregando a sua humilhação. A nossa herança são as carnes do Altar fora do acampamento; o prêmio, o dos que chegaram à perfeição, será a Jerusalém celeste situada no Alto Monte da Santidade de Deus.

(8)  Argumentação
            O tema central contido na exortação a perseverar no ardor inicial é assim anunciado: “temos tal sacerdote que se assentou à direita do trono da Majestade nos céus. Ele é ministro do Santuário” (8,1s). No prólogo se apresenta dessa forma: “A Sabedoria criadora que se fez carne, depois de ter realizado a purificação dos pecados, sentou-se nas alturas, à direita da Majestade” (1,2s). No fim da carta lemos: “O Deus da paz, que fez subir dentre os mortos aquele que se tornou, pelo sangue de uma aliança eterna, o grande Pastor das ovelhas, nosso Senhor Jesus, vos torne aptos a todo bem” (13,20s). Encontramos o tema, também, quando o autor exorta a assumir Cristo como Caminho vivo para entrar no Santuário (10,20), Jesus que sofreu a Cruz e se assentou à direita da Majestade de Deus (12,2).
            O Autor afirma que Deus nos fala por ele, de forma definitiva, depois de ter falado muitas vezes aos pais pelos profetas. Falou, outrora, chamando, propondo alianças, avançando promessas. Com Jesus, o profeta de Nazaré, tudo volta a repetir-se de forma definitiva porque: “Completou-se o tempo, o Reino de Deus está perto de se manifestar, convertei-vos e crede no Evangelho” (Mc 1,14); com Jesus, Deus estabeleceu um reino inabalável que nós somos chamados a herdar.
            A salvação que “começou a ser anunciada pelo Senhor e nos foi fielmente transmitida por aqueles que a escutaram”, nos é anunciada do céu, nestes tempos que são os últimos, enquanto contemplamos o filho sentado à direita da Majestade, na condição de nosso Sumo Sacerdote, capaz de nos purificar dos nossos pecados com o seu sangue, com o qual entrou, uma vez por todas, no Santuário que está no céu. Para que saibamos responder com fé e perseverança até herdarmos com Cristo o Reino inabalável, devemos “prestar atenção para não deixar de ouvir aquele que fala”, particularmente nas celebrações dominicais quando participamos do altar da Cruz de Jesus, onde está a verdadeira vítima, o autor e realizador da fé. Somente então saberemos carregar a sua humilhação e sair da Cidade terrena, convencidos de que procuramos a Cidade que está no céu. Aquele que pode nos confortar é aquele que por primeiro foi tentado. Ele é até o Caminho vivo porque também ele chegou à perfeição pelo sofrimento. Por ele podemos chegar à perfeição, condição única para sermos herdeiros das promessas (12, 23; 6,12). A figura do Filho eternamente perfeito que se tornou o nosso Sumo Sacerdote, capaz de interceder por nós nas suas relações com Deus, além de apresentar a sua perfeição como modelo e a sua função mediadora, é altamente motivadora para nos determinarmos a correr ao combate que nos é proposto e para nos livrar de todo fardo e do pecado que nos envolve. Chegamos a degustar a doutrina da justiça e a experimentar em nós o testemunho do Espírito como aconteceu aos homens de fé. Neles está o conhecimento das coisas que não se veem, porque as possuem por uma esperança que não pode ser confundida e que argumenta neles o que ainda há de manifestar-se.
            O Sacerdócio de Cristo deve ser contemplado a partir da Cruz, o altar da carne da vítima sacrificada, queimada fora do acampamento. Pelo seu sacrifício, Cristo alcançou a purificação dos pecados dos seus irmãos e entrou no Santuário do céu como precursor. Glorificado pela ressurreição, foi abertamente manifestado Filho de Deus com poder, porque Deus o fez sentar à sua direita. O seu Sangue é mais eloquente que o de Abel.

(9)  Resumo
            Temos, no céu, um Sumo sacerdote, Jesus que, realizada a redenção, entrou, uma vez por todas, no Santuário, com o seu Sangue. Ele é o Adão verdadeiro, levado à perfeição pelo sofrimento, capaz de consolar os que sofrem. É o Filho, o herdeiro, criador de tudo, Resplendor da Glória e Imagem do seu ser.
            O mesmo Deus que já falou aos pais, nos profetas, nos últimos tempos, que são os nossos, nos falou nele.
            Não negligenciemos tão grande salvação que o Senhor nos anunciou por primeiro e que os Apóstolos nos transmitiram, acompanhados por sinais, prodígios e milagres, que o Espírito Santo por eles operava.
            Devemos prestar atenção Àquele que nos fala. Os que, no deserto não deram ouvidos à voz de Deus, não obstante as obras que realizou, morreram sem ter visto a terra prometida. Nós seremos consumidos por Deus, que é um fogo abrasador, se não escutarmos Aquele que nos fala do céu, que vai fazer desaparecer o que não é eterno, enquanto fará subsistir o Reino inabalável do Filho. Ele constituiu “nosso Senhor Jesus o grande Pastor das ovelhas, capaz de nos tornar aptos a todo bem (13,20s).
Iluminados, batizados, crismados, nutridos pela Palavra, procuremos degustar a justiça e ser capazes de discernir entre o bem e o mal. Se decairmos, estamos arriscados a crucificar novamente a Jesus Cristo, nos tornando merecedores da maldição. Quem já deu prova de caridade e desprendimento procure segurar a recompensa que Deus, na sua justiça, quer dar. Mas precisa perseverar na fé para ser herdeiro da promessa. Isto é possível quando fixamos os nossos olhos em Jesus que suportou a cruz para entrar na glória. Nos anima o testemunho de uma nuvem de santos que nos envolve.
            Para entrar na Cidade, a nova Jerusalém, devemos nos tornar homens de fé que chegam à perfeição pela constância, até se abrir à esperança inabalável, a ponto de viver em contínua ação de graças por saber que estamos entre o número dos eleitos. Para isso, torna-se necessário, em primeiro lugar, frequentar as assembleias dominicais, ao longo das quais, a Palavra nos nutre abundantemente, chegando a fazer-nos degustar a doutrina da justiça, o alimento sólido dos que vivem a fé na esperança das promessas que o Deus fiel nos faz.
            Quando esmorecemos diante do Dia do Senhor que tarda a chegar, nos tornamos lentos na compreensão, não sabemos mais discernir entre o bem e o mal, a ponto de nos esquecermos que até chegamos a renunciar com alegria a tudo o que possuíamos, certos de ter chegado a possuir bens melhores. Esmorecendo, voltamos a  desejar o que é mal para nós, arriscados a calcar sob os pés o Filho de Deus e a profanar o Espírito da graça.
            Lembremos dos homens de fé que perseveraram no testemunho, na esperança de entrar na cidade de Deus. Envolvidos pelo seu testemunho, não titubeemos em seguir Jesus que assumiu a Cruz. Vivamos a purificação dos pecados, animados pelo exemplo dos que resistiram até o sangue.
            Deus nos castiga da forma que um pai castiga o filho para educá-lo. O faz na condição de quem educa à santidade, como Pai dos espíritos chamados à perfeição.
Lutemos contra o pecado evitando sermos faltosos, amargos, impuros, adúlteros e gananciosos, uma vez que nos aproximamos do Monte Sião, da Cidade Jerusalém, de miríades de anjos, dos justos cujos nomes estão inscritos no céu, de Jesus Mediador de uma Nova aliança. Tenhamos consciência da nova realidade e abracemos o Reino inabalável que Deus nos oferece nestes últimos tempos, pelo Filho, nosso Senhor Jesus Cristo que o Pai ressuscitou e fez sentar-se à sua direita.

(10) Chave de leitura
            Pela própria declaração final do Autor da Carta aos Hebreus, estamos diante de uma exortação dirigida a uma comunidade cristã para que persevere no “primeiro ardor”. O argumento que o autor utiliza é a figura de Jesus, o Senhor da Igreja, que está sentado à direita da Majestade e que entrou no céu como Sumo-sacerdote, na condição de nosso precursor. Porque Filho, que Deus glorificou, ele nos tornou herdeiros consigo do mundo futuro, embora tenhamos que “sofrer com ele para sermos glorificados com ele”. Contemplemos este “Filho eternamente perfeito” que “sentou-se à direita da Majestade, feito superior aos anjos quanto o Nome que herdou excede o deles. Nosso Senhor Jesus, de condição divina, porque é a Sabedoria criadora, é o Filho que o Pai glorificou, o Rei-Sacerdote que Deus consagrou com um juramento, a quem submeteu todos os reis da terra. Ele sabe socorrer os que são tentados porque foi tentado por primeiro. Deus o levou à perfeição pelo sofrimento. Constituído em nosso favor nas relações com Deus, sabe compadecer-se das nossas fraquezas porque nos dias de sua vida mortal, entre clamores e lágrimas pediu a Deus que fosse poupado da morte, e foi atendido por causa da sua piedade (5,5) (Quando tivermos que resistir até o derramamento do sangue na luta contra o pecado, lembremo-nos de que Deus ressuscitou dos mortos o Grande Pastor das almas, nosso Senhor Jesus -13,20). Foi constituído nosso Sumo sacerdote quando Deus o ressuscitou dos mortos: “Tu és meu Filho, eu Hoje te gerei” (Sl 2,7). Por um juramento o tornou “sacerdote segundo a ordem de Melquesedec” (Sl 110,4), Aquele que fez sentar à sua direita (ibid.). O seu sacerdócio é superior ao do sumo sacerdote que a cada ano se purifica pelos ritos de purificação na tenda e pelo sangue de carneiros, para depois entrar no santuário para purificar o que está no santo dos santos. Jesus, não tendo necessidade de nenhuma purificação, aboliu a tenda e, após ter realizado o sacrifício para a remissão dos pecados, uma vez por todas, entrou no Santuário do Céu, com o seu sangue. Lá está como nosso Mediador e, continuamente, nos purifica dos nossos pecados.
            Mantenhamos o ardor da caridade lutando até o sangue contra o pecado. Consideremos as provações como castigos que o Pai dos espíritos nos envia para nos comunicar a sua santidade que, em nós, se manifesta em frutos de paz e de justiça. Seja nosso modelo a nuvem de testemunhas que nos envolvem.
            Para evitar que nos tornemos lentos na compreensão, escutemos a Palavra nas assembleias dominicais. Com os olhos fixos em Jesus que abraçou a Cruz, sigamo-lo, carregando a sua humilhação, saindo fora do acampamento, onde está o altar com as carnes da verdadeira vítima. Dessa forma, o nosso coração não endurecerá, evitaremos decair e abandonar tudo, com o risco de sermos amaldiçoados; nossa fé não esmorecerá e herdaremos a salvação. A dignidade de Nosso Senhor Jesus Cristo e a grandeza da recompensa que nos foi prometida devem ser a nossa motivação para não esmorecer. 


            “Assim, meus santos irmãos e companheiros da vocação celeste, considerai atentamente Jesus, o apóstolo e sumo sacerdote da nossa profissão de fé” (3,1).Os irmãos e companheiros são os “filhos de Abraão” pelos quais o Filho veio. Estamos diante de uma perspectiva judaica. A “vocação celeste” é descrita em Hb 13,14 “estamos à procura da cidade que está para vir”: “Vós vos aproximastes do monte Sião e da Cidade do Deus vivo, a Jerusalém celeste e de milhões de anjos reunidos em festa, e da assembléia dos primogênitos cujos nomes estão inscritos nos céus, e de Deus, o Juiz de todos, e dos espíritos dos justos que chegaram à perfeição, e de Jesus, mediador de nova aliança, e do sangue da aspersão mais eloqüente que o de Abel” (12,22-24). “Jesus, o “apóstolo” é o Filho que depois de ter realizado a purificação dos pecados, sentou-se nas alturas, à direita da Majestade” (1,3), e que, na condição de Senhor, começou a nos anunciar “tão grande salvação” (2,3).
Jesus, o “Sumo sacerdote”, é o mesmo Filho que tendo expiado os nossos pecados “tendo ele mesmo sofrido pela provação, é capaz de socorrer os que são provados” (2,18). No desânimo, tentados em desistir, “saiamos ao encontro de Jesus, fora do acampamento, carregando a sua humilhação” (13,13), “olhos fixos naquele que é o autor e realizador da fé, Jesus, que, em vez da alegria que lhe foi proposta, sofreu a cruz, desprezando a vergonha, e se sentou à direita do trono de Deus” (12,2).
            O autor está preocupado com uma comunidade que está para se entregar, tomada pelo desânimo. Por isso se aproxima dela mediante uma carta para confortar os seus irmãos na fé (13,22). Acha que uma comunidade de judeu-cristãos poderia se animar diante da figura de Jesus que, realizada a redenção, entrou no céu com o seu Sangue, na condição de Sumo Sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedec (6,19). Aquele que realiza a figura da Antiga Aliança é o Cristo de Deus, que realiza em si a condição de Filho que o Pai gerou, “Luz da Luz, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro”. Ele é, também, o herdeiro por quem podemos participar do poder que a ele o Pai entregou, a partir do poder pelo qual venceu o Maligno, até chegar a sentar com ele no trono do Pai. É um caminho que necessita de constância, virtude pela qual entendemos que os sofrimentos por causa da nossa fé são uma condição de participar da Paixão de Cristo e experimentar, como ele, a alegria do Espírito.
            Para isso, é necessário que nos alimentemos com a doutrina da justiça, que adquirimos somente pela reflexão dominical. Esse foi o conselho que Paulo deu aos Romanos e que João dará no início do Apocalipse: “Bem-aventurado aquele que lê, os que ouvem e guardam no seu coração a palavra da Profecia” (1,3). Por ela o Espírito dá testemunho de Jesus” (Ap 19,10).
            A palavra de exortação do autor tem como tema de maior importância o Filho que do Pai recebeu todo poder (é evidente que o foi por ter abraçado a Cruz, desprezando a vergonha, enquanto visava a “alegria” do Espírito). Por tudo aquilo que nos ensinou e os Apóstolos nos transmitiram, pela fé que a pregação no Espírito suscitou em nós, nos tornamos herdeiros do Reino inabalável, que será nosso se perseverarmos no testemunho.
            Não endureçamos os nossos corações para não sermos excluídos do repouso prometido. Não se trata da terra que Josué conquistou, mas da nossa participação no repouso de Deus.
            No Dia do Senhor, reunida em assembléia, uma comunidade composta eminentemente de judeu-cristãos, ouve a proclamação da carta de um cooperador de Timóteo, que está na Itália, mas que deseja, quanto antes voltar até eles. À semelhança daquilo que fez Paulo quando escreveu a sua carta aos Romanos, enquanto esperava poder se encontrar com eles, o autor da carta aos Hebreus declara que as suas são palavras de exortação, no intuito de se edificar com os membros da comunidade. Ele o faz, contudo, com a consciência de estar vivendo a sua fé, segundo todas as suas exigências. Isto possibilita que, em espírito de discernimento, possa sugerir o caminho do bem, enquanto está em condições de “degustar a doutrina da justiça”, condição que fica perdida para aqueles que se deixam levar pelo desânimo. Preocupado com a situação de desânimo em que se encontra a comunidade à qual escreve, movido pela responsabilidade de quem foi chamado a dar continuidade ao trabalho dos Apóstolos, sabe, à semelhança de Paulo,que, todavia, pode colher algum fruto com a sua reflexão.
            Convida os seus companheiros a se porem diante do Deus de Israel, o Deus que falou aos patriarcas. Estes nele creram e ele se revelou um Deus fiel e,  em Jesus Cristo, se revelou um Deus da Paz, ressuscitando-o e constituindo-o Pastor das almas, glorificando-o e fazendo-o sentar à sua direita; ele, que é o herdeiro, com quem, portanto, seremos co-herdeiros de um Reino inabalável. A sua condição é divina, porque é o Criador de tudo, Resplendor da Glória e Imagem do Ser de Deus.
            Pelas Escrituras é possível ilustrar a sua condição messiânico-divina: é a realização da figura do Rei, o filho de Deus, que tudo cria e que permanece eternamente. É o Rei-Pastor, aquele que o Pai fez sentar-se à sua direita e a quem declarou, por um juramento, Sumo sacerdote para sempre, realizando nele a figura do Sumo sacerdote, que supera em tudo, porque ele o é segundo a condição do rei Melquisedec.
            Contra os perigos do desânimo, que poderia levar à apostasia, temos que reagir fortalecendo a nossa fé pelo alimento sólido que a “doutrina da justiça” pode nos oferecer. Quando fomos iluminados, nos determinamos a viver a purificação dos pecados, a viver na esperança do Dia do Senhor. Agora, diante das perseguições, devemos perseverar no testemunho, para a salvação das nossas almas.
            Isto deve ser feito considerando Jesus, na condição de Filho: o homem que vemos coroado de honra e glória. Deus lhe concedeu a graça de oferecer a sua vida em sacrifício, o que redundou em glória para ele e em libertação do Maligno para nós. Nele temos o Filho, Sumo Sacerdote que pode nos consolar na tentação, tendo-a ele sofrido, por primeiro.
            Devem nos inspirar os homens de fé dos quais falam as Escrituras. Sobretudo, deve nos inspirar Jesus que optou pela ignomínia da cruz.
            Lembremos que Deus castiga aqueles que ama.
            Corajosamente, saiamos da Tenda, porque Aquele que entrou no Santuário do céu é aquele para o qual a carne do sacrifício dos animais, cujo sangue serviu para a aspersão, aponta como verdadeira vítima. É de um novo altar de que devemos participar. Não aspiramos mais por uma cidade terrena. Procuramos o Santuário da Cidade celeste, onde está Cristo, Mediador da Nova Aliança com o verdadeiro sangue da aspersão, “mais eloquente que o de Abel” (12,24).

Momentos em que é lembrado o tema mais importante da carta:
            “Depois de ter realizado a purificação dos pecados, sentou-se nas alturas à direita da Majestade” (1,3b). Trata-se do Filho, o Herdeiro, a Palavra criadora, Resplendor de sua Glória, Imagem do seu Ser, Providência. O termo messiânico “Filho” é ilustrado pelo Sl 2; 97; 45; 102; 110. É o Herdeiro de um Reino inabalável. Cl 1,15 ilustra a sua condição de Criador. Sb 7,22 fala dos títulos de Resplendor, Imagem da Substância de Deus, a ele atribuídos.
            “Convinha, por isso, que em tudo se tornasse semelhante aos irmãos, para ser, em relação a Deus, sumo sacerdote misericordioso e fiel, para expiar assim os pecados do povo” (2,17). Nele se realiza a condição ideal do filho de homem (Sl 8), sublimada pelo sofrimento. Por ele, os homens são libertados do Maligno e da Morte.
            “Temos, portanto, sumo sacerdote eminente, que atravessou os céus: Jesus, o Filho de Deus” (4,14). Excede em dignidade o sumo sacerdote, porque é capaz de se compadecer. Por ele podemos conseguir a graça de que precisamos no tempo oportuno. (v.16).
            “Todo sumo sacerdote, tirado do meio dos homens é constituído em favor dos homens em suas relações com Deus. Sua função é oferecer dons e sacrifícios pelos pecados. É capaz de ter compreensão por aqueles que ignoram e erram, porque ele mesmo está cercado de fraqueza. Pelo que deve oferecer sacrifícios tanto pelos pecados do povo quanto pelos seus próprios” (5, 1-3). O sumo sacerdote da Antiga Aliança é figura de Jesus, sacerdote eminente.
            “Cristo recebeu a glória de tornar-se sumo sacerdote daquele que lhe disse: “Tu és meu Filho, hoje te gerei”, conforme diz em outra passagem: “Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque”. É Filho em virtude da sua submissão, no sofrimento. Levado à perfeição se tornou princípio de salvação eterna, na condição de Sumo Sacerdote (5,5-10).
           
Hb 7 ilustra a natureza do sacerdócio de Cristo.
            É superior ao sacerdócio de Aarão porque, como diz o Sl 2 é “segundo a ordem de Melquisedec”. A este, Abraão pagou o tributo. Com a vinda do sacerdócio de Cristo, o de Aarão acaba superado. O de Cristo é um sacerdócio eterno e eficaz. Pela sua morte, Jesus entra no santuário do céu uma vez por todas. A aspersão do seu sangue purifica dos pecados. Por isso é princípio de uma esperança melhor. Trata-se de uma Aliança superior à de Moisés no Monte Sinai. “A palavra do juramento, posterior à Lei, estabeleceu o Filho, tornado perfeito para sempre”.
            “Temos tal sacerdote” (8,1): 1º) é o Rei-messias, o Filho, a quem Deus, por juramento, chamou ao sacerdócio, segundo a ordem do rei Melquisedec; 2º) seu sacerdócio é para sempre;3º) o glorifica; 4º) é eficaz. Investido com todo poder divino, é ministro do Santuário do céu, onde intercede por nós.
            Em Jesus se realiza a figura da tenda com os seus sacerdotes que, segundo a Lei, oferecem o que é prescrito. É superior a Moisés que estabeleceu uma aliança com a aspersão do sangue dos animais. A aspersão, agora, dá-se com o seu Sangue. O efeito é de frutos melhores, como profetizou Jeremias :Deus inscreve agora nos corações as suas leis. Nos fiéis há um princípio de conhecimento, fruto da misericórdia divina.

(11) Intuito da Carta
O Autor quer animar companheiros da vocação celestial para que perseverem. Devem resistir até o sangue, na luta contra o pecado. A sua fé deve ser como a das inúmeras testemunhas da História de Israel. Considerem as provações um castigo corretivo de Deus que quer comunicar-lhes a santidade, tornando-os capazes de frutos de paz e de justiça. Portanto, para se despojarem de todo fardo e do apego ao pecado, evitem ser faltosos, serem amargos, impuros. Pratiquem a hospitalidade, assistam os prisioneiros, vivam uma vida matrimonial casta, evitem a idolatria do ouro. Isto os fará voltar ao ardor inicial, de forma que não serão tomados pelo desânimo diante das perseguições da Sinagoga. Para isto, é necessário frequentar pontualmente as assembleias, para se animar pela escuta da Palavra, interpretada em espírito de sabedoria e revelação, e celebrada com salmos, hinos e cânticos espirituais. Será possível entender, então, a grandeza do chamado, qual é a riqueza da glória reservada aos santos, o poder que Deus manifestou em Jesus Cristo ao ressuscitá-lo dos mortos e ao fazê-lo sentar à sua direita nos mais alto dos céus e ao torná-lo Senhor da Igreja, enchendo tudo com a sua Plenitude.

                   O autor escreve para que os fiéis não caiam no desânimo, cansados de tantas tribulações (escárnios, prisões, confisco de bens). Considerem os bens melhores nos quais acreditaram e procurem conquistá-los pela perseverança (10,32-39). Para isso, o autor propõe a contemplação do Desígnio que Deus realizou em Cristo. As considerações morais estão entrelaçadas com as reflexões teológicas que as motivam.
                   Jesus é o homem que Deus, segundo determinação de sua vontade, quis levar à perfeição pelo sofrimento. Quis, também, que, pela efusão do seu sangue, fôssemos libertados da escravidão do Maligno e da morte eterna.
                   O Sumo Sacerdote da Antiga Aliança é a sua figura. De fato, Jesus é um membro da estirpe humana e oferece o sacrifício pelos pecados. Ofereceu-se, sem pecado, para alcançar a sua glorificação e a liberdade definitiva da morte, superada toda tentação.
                   O seu sacerdócio é superior ao de Aarão. Podemos argumentar essa afirmação pela figura de Melquisedec. Enquanto Abrão oferece o dízimo de tudo, revela que a Lei é inferior àquele que, por um juramento, foi constituído Sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedec. Enquanto Deus determina um novo sacerdócio segundo uma nova Lei, devemos dizer que o sacerdócio de Aarão era provisório.
                   De fato, Jesus é superior ao Sumo Sacerdote porque não precisa oferecer sacrifícios para se purificar e porque o seu sacerdócio dura eternamente.
                   Ele é o Sumo Sacerdote de que precisávamos, santo, inocente, imaculado, separado dos pecadores. Ofereceu-se uma vez por todas, “o Filho, tornado perfeito para sempre” (7,28).
            O Autor quis escrever uma exortação no intuito de levar os fiéis a uma fé perfeita, pela perseverança: “Pelo que importa observemos tanto mais cuidadosamente os ensinamentos que ouvimos para que não nos transviemos” (2,1). Os ensinamentos que o Senhor nos anunciou por primeiro dizem respeito “à purificação dos pecados” (1Jo 1; 2Pd 1.5-10; 1Jo 3). Sem esse exercício poderíamos nos tornar lentos na compreensão, coisa que não acontece aos que unem à fé a perseverança, tornando-se , dessa forma, herdeiros da promessa. Isso acontece para aqueles que não abandonam as assembléias dominicais, ao longo das quais os fiéis se alimentam de um alimento sólido, porque não deixam de “degustar a doutrina da justiça” (5,13), que os torna possuidores de um “senso moral exercitado para discernir o bem e o mal” (v.14). Os que, vencidos pelo desânimo, não juntam à fé, à virtude, e ao autodomínio a perseverança, e à perseverança a piedade, estão arriscados a voltar ao pecado, voltando a dominar neles a iniquidade e, com isso, a não mais ver e conhecer a Deus (1Jo 3). Para evitar esse perigo devemos continuamente motivar a nossa confiança em Deus que é fiel, até tornar a nossa esperança inabalável. Temos que pensar, também, que os nossos ancestrais, no deserto, eram prontamente punidos quando transgrediam a Palavra promulgada por anjos. Qual não será a nossa punição se “negligenciarmos tão grande salvação que começou a ser anunciada pelo Senhor e que nos foi transmitida pelos Apóstolos”? Os nossos ancestrais, ao longo da sua peregrinação nos deserto, deixaram endurecer o seu coração, enquanto eram provados, para o seu bem (12,5-11). Murmuraram e se rebelaram, a ponto de provocar a ira do Senhor que jurou que não entrariam na terra prometida. Foram excluídos não obstante fossem membros do mesmo povo que Deus libertara. Nós, também, seremos excluídos se mostrarmos a mesma indocilidade, não obstante sejamos companheiros de Jesus Cristo, se não formos perseverantes na fé.
            A fé é nutrida pela palavra de Deus. Temos que continuamente prestar ouvido à voz dele (Cl 3,16; Ap 1,3.10) que nos fala, do céu, pelo Filho. Aos nossos pais falou um discurso terreno, constituído somente de figuras.
            No Apocalipse, o Filho fala diretamente e mostra a sua condição gloriosa para que os fiéis vivam à altura do primeiro amor ou se convertam, condição para serem reconhecidos por Ele diante do Pai. Em Hb o discurso de Deus é Jesus Cristo com a sua obra, sintetizada na figura do Sumo Sacerdote que, realizada a purificação dos pecados, sentou-se à direita da Grandeza, feito tão superior aos anjos quanto o nome que herdou excede o deles. Vemos que o discurso dos dois autores é similar e que tem o mesmo intuito, qual é aquele de exortar para levar à perfeição a fé de tal forma que ninguém renegue o nome de Cristo e, surpreendido pelo Dia do Senhor, como por um ladrão, seja excluído do Reino.
            Para o Autor de Hebreus, Jesus Cristo é Aquele que para Paulo era o Mistério de Deus, isto é a Revelação pela qual Deus fala aos homens. De início, o chama com o mesmo título que encontramos em Cl 1,13: “o Filho”.  Ao comentar a sua condição divina, ambos apresentam dele as mesmas características: Imagem de Deus e Criador. Em relação à sua ação messiânica enumeram as mesmas obras: estabelece o Reino, opera a redenção. A originalidade de Hebreus é de ver a Pessoa divino-messiânica de Jesus na condição de sacerdote. Toma a figura do sumo sacerdote que exercia as suas funções no templo para definir a função sacerdotal de Jesus, enquanto é Pessoa divina que, pela Encarnação, assume a natureza humana. Pela comparação, apresenta a superioridade do sacerdócio de Jesus que ilustra com a figura do rei Melquisedec.
            A visão de Hebreus contribui para compreender mais profundamente a ligação dos homens com Deus, por Jesus Cristo. Aquele que, pela Encarnação, acaba sendo chamado de Filho e, segundo esse título é comentado na sua relação com Deus Pai, na Vida Trinitária, na condição de Filho do Homem é a Pessoa divina do Homem Cristo Jesus que se ofereceu em resgate de todos nós, de forma eficaz. Tendo entrado no Santuário do Templo que está no céu, com o seu Sangue, realizada a redenção pelo sacrifício da sua vida, uma vez por todas, intercede por nós. A sua intercessão consiste na sua ação como Princípio e Realizador da nossa salvação. Isto, porque foi levado à perfeição pelo sofrimento e pela sua Morte destruiu o dominador da morte, libertando-nos da morte eterna. Isto, porque, também, se tornou o Caminho, vivo e novo que percorremos na caridade, nos renovando na piedade (10,20-24).

12)       Destinatários

            Os que já receberam o dom do Espírito e, por ele “experimentaram a beleza da Palavra de Deus” (6,5), devem avançar para uma perfeição adulta, para degustar a doutrina da justiça (5,13; cf. 1Jo 3). Quem decai se torna uma terra que produz “espinhos e abrolhos” (6,8), perto da maldição. Devemos ser imitadores daqueles que pela fé e pela perseverança, recebem a herança da promessa, demonstrando o mesmo ardor em levar até o fim o pleno desenvolvimento da esperança, evitando ser lentos à compreensão. Deixamos tudo para conseguir a esperança proposta. Nela devemos nos agarrar, fundamentados sobre o juramento de Deus.  
Pelo grande número de informações que o autor da Carta nos oferece, podemos dizer que os destinatários são cristãos de origem judaica: como o Autor da Carta, são também descendentes dos que ouviram a Voz de Deus pelos profetas; sabem distinguir entre o tempo da espera e o tempo da realização, os "últimos dias"; estão familiarizados com as Escrituras; são capazes de captar a superioridade de Jesus em relação aos profetas, porque Jesus é o Filho, enquanto os profetas são servos; capazes de ver como a Aliança antiga anunciada por anjos, é inferior à nova Aliança estabelecida por Jesus, pela sua Morte de Cruz. Basta dizer que os que servem à Tenda, não podem participar do nosso altar, porque nós comemos das carnes da vítima que saiu do acampamento, daquele que, desprezando a vergonha de ser rejeitado pelo Sinédrio e ser crucificado, conquistou a glorificação à direita da Majestade. Não devemos ter apego à Cidade terrena, com seus ritos legais, que Jesus Cristo, na condição de verdadeiro Sumo Sacerdote que entrou no Céu com o seu Sangue, tornou caducos. Jesus entrou no céu passando pelo véu da sua humanidade. Por ter chegado à perfeição pelo sofrimento, Deus o fez ressurgir dos mortos e sentar à sua Direita. Jesus é o Filho eternamente perfeito (Sl 2,7) constituído nosso Sumo Sacerdote por um juramento (Sl 110,4).
            Os destinatários dessa Carta são, principalmente, comunidades constituídas por judeus que se converteram. Poderíamos até especificar que entre eles há membros da tribo de Levi e da família sacerdotal de Aarão. Gente que tudo perdeu, ao perder a função de servidores do templo, único sustento para a tribo que não tinha herdado nenhuma terra ao longo da conquista. A esses santos, companheiros da vocação celestial, o Autor, que também é sacerdote, explica que, agora, têm um Sumo Sacerdote que entrou no céu, o Filho, o Herdeiro, com quem herdarão o Reino inabalável. Por ele, o Deus de Israel que já falara aos pais, nos profetas, agora lhes fala, contemplado na sua condição suprema de quem, Unigênito Deus, está sentado à direita da Grandeza da Glória, superior aos anjos, que se tornaram meros servidores seus, aguardando que tudo seja posto debaixo de seus pés.

13)        Conteúdo das palavras de exortação
                       
                        Na Carta aos Hebreus, distinguimos entre o conteúdo das palavras de exortação e a argumentação acerca da natureza do sacerdócio de Cristo. A ideia central da exortação é incutir nos interlocutores que Deus, nos últimos tempos que são os nossos, está nos falando pelo Filho, isto é, por Jesus, que se apresentou como servo, profeta do Deus de Israel, mas que, a sua ressurreição revelou o Filho do Homem que o Pai fez sentar à sua direita no trono da majestade. Por estarmos vivendo o Tempo do Fim, aquilo que foi anunciado em figuras, por Cristo e em Cristo se realizou. O fundamento da sua superioridade é a sua Condição Divina: Criador, Sabedoria resplendor da Glória, Expressão do Ser. Na condição de Filho do Homem glorificado é o Herdeiro com o qual, pela fé e pela perseverança, nos tornaremos coerdeiros do mundo futuro. Jesus chegou a essa condição por ter sido levado à perfeição pelo sofrimento (nele se realizou o verdadeiro Adão). Pelo seu sangue derramado realizou a purificação dos pecados, estabelecendo uma Aliança definitiva. No momento da sua ressurreição e entronização, foi chamado, por um juramento, ao sacerdócio, como Aarão. Tendo entrado no céu com seu próprio sangue, depois de ter oferecido o único sacrifício no qual o Pai se agrada, intercede por nós no céu. Ele sabe, também, compadecer-se daqueles que são tentados.
            Não podemos negligenciar tão grande salvação anunciada pelo Filho do Homem, seja antes de se manifestar na condição de Senhor, seja depois, quando foi fielmente transmitida por aqueles que a escutaram, acompanhando Deus a sua pregação com prodígios, milagres e dons do Espírito. No deserto os nossos pais receberam o castigo por não ter ouvido a Voz de Deus. Nós não entraremos no repouso de Deus se não cuidarmos ouvir Aquele que nos fala.
            De fato, escutamos a Palavra quando nos convertemos, somos batizados, crismados e participamos das assembléias dominicais, degustando então da Palavra. Mas é preciso perseverar até nos desfazermos de todo fardo e do pecado que nos envolve: faltas, amargura, impureza, adultério, idolatria do ouro. Se for necessário, devemos dar testemunho até o sangue na luta contra o pecado. Já visitamos prisioneiros e fomos aprisionados por causa da fé, aceitamos perder os nossos bens sabendo que, desde já estamos de posse de bens maiores. Não percamos a segurança diante da grande recompensa que nos foi prometida. Anima-nos a figura de Jesus Crucificado que desprezou a vergonha. Ele nos propiciou as suas carnes imoladas que somente os que saem da Cidade terrena podem comer, embora isto implique a humilhação da Cruz. Jesus é o nosso caminho vivo (10,20).
            Anima-nos uma nuvem de testemunhas ao nosso redor. Eles nos mostram que é somente pela perseverança que chegaremos a uma esperança inabalável das realidades futuras. Quando o procuramos, então, Deus infunde em nós o seu testemunho, como fez com Abel, Enoc, Noé, Abraão, Moisés que viram de longe o dia do Senhor e se alegraram. Nós, pelo contrário, nos aproximamos do Monte de Sião, a Cidade santa, a Nova Jerusalém, das miríades de anjos, do coro dos justos, de Jesus, o Justo Juiz, o Mediador de uma Nova Aliança que glorifica os seus mártires (cf. 2Tm 4,8).

(14)  O combate contra o pecado

            O combate contra o pecado é o exercício que a catequese apostólica propõe para que a vida possa sempre mais se desenvolver. Depois de iluminados, os fiéis, além de viverem a caridade, devem desenvolver no espírito de entendimento para que possam conhecer, em espírito de discernimento, qual é a vontade de Deus. O cumprimento da vontade de Deus deve ser marcado pela constância, até abrir-se a uma esperança que não será confundida. Isto os tornará aptos para toda boa obra que realizarão no Poder da Glória, vivendo a vida da Paixão de Cristo, quando surgirem as tribulações, na mansidão e na longanimidade, o que lhes permitirá oferecer a Deus o seu sacrifício de louvor.
            A carta é dirigida a “santos irmãos e companheiros da vocação celestial” (3,1), à procura da “cidade que está por vir” (13,14), no Dia que se aproxima (10,25): o que revela o pensamento que ditou a carta. Quer exortar a “saborear a doutrina da justiça” (5,13), como homens de fé que, “pela perseverança, recebem a herança das promessas” (6,12). Abraão e a sua descendência, pela fé, mereceram ver a cidade que Deus prometera e que eles saudaram de longe (11,10.16). Israel celebrou a sua aliança com Deus, no Monte Sinai, mas pediu a Moisés que fosse o intermediário das palavras de Deus. Nós somos os que “se aproximaram do Monte Sião, onde está a Cidade do grande Deus, a Jerusalém celestial, o Santuário onde é celebrada a liturgia por milhões de anjos, estão os primogênitos marcados na fronte com o sinal de Deus, porque lá está o Juiz de todos e dos espíritos dos justos que chegaram à perfeição; onde está Jesus, o Mediador da Nova Aliança, no seu sangue que fala mais alto que o de Abel” (12,22-24). Se grande foi a graça que “os nossos pais receberam”, por terem ouvido a voz de Deus quando lhes falava pelos profetas, muito maior é a nossa, porque Deus nos falou pelo Filho. O autor da carta admoesta recordando o castigo que irá atingir os que, à semelhança de Israel no deserto, não perseveram na escuta da voz de Deus. Tomados pelo desânimo, abandonam a assembleia dominical, tão necessária para ser nutridos pela Palavra de Deus (Cl 3,16), tornando-se, dessa forma, “lentos à compreensão (5,11), a ponto de voltar ao pecado, abandonando a ‘purificação dos pecados’ (2Pd 1,5-10), “profanando o sangue da aliança no qual foram santificados, e ultrajando o Espírito da graça” (10,29). Serão consumidos, como abrolhos e espinhos (6,8), pelo fogo abrasador de Deus (12,29). Por isso, o autor da carta exorta a contemplar a dignidade de “nosso Senhor”, o Filho, o herdeiro. Segundo a sua condição divina, é o Criador de tudo, o Resplendor da Glória e a sua Expressão. Tendo assumido a nossa condição humana, levado à perfeição pelo sofrimento, realizada a purificação dos pecados, está, agora, sentado à direita da Majestade. Deus tudo submeteu aos seus pés. Até os anjos o servem. No Santuário do Céu, é o nosso Sumo Sacerdote que sabe compadecer-se por ter ele sofrido por primeiro e mediar a graça de que precisamos no tempo oportuno.
            Por esta análise inicial, podemos chegar à constatação que os capítulos um e dois da Carta aos Hebreus são a apresentação do tema que a Carta desenvolverá.

Para o autor, a vida cristã é uma dura e longa provação. Há o risco de sucumbir. Por isso, é necessário avançar em todas as etapas da justificação e depois de termos sido nutridos, como criancinhas, com o leite espiritual, torna-se-nos necessário “degustar a doutrina da justiça”, para sempre estarmos convencidos que vale a pena seguir a Cristo que carrega a cruz até merecermos entrar na cidade celeste.
            Cristo, então, se torna a figura central da reflexão do autor, na condição daquele que viveu a graça do sofrimento que o levou à honra e à glória, daquele que realizou a purificação dos pecados como Pessoa de condição divina, daquele que entrou no Santuário do céu com o seu sangue, daquele que é capaz de consolar os que são tentados. Ele é o nosso Sumo Sacerdote, superior a Aarão, que realizou a Nova Aliança, nos merecendo a renovação das nossas mentes, a ponto de desejarmos viver segundo a vontade de Deus (10,16).

(15) Divisão

1,1-2ª O Deus que falou nos profetas, nos falou no Filho
1,2b-14 O Filho está acima dos anjos
2,1-4 Exortação

2,5-3,6 Jesus, coroado de honra e glória, nosso Sumo-sacerdote, preposto à casa de Deus
3,7-4,13 Exortação

4,14-5,10 Jesus, Filho de Deus, capaz de nos socorrer nas nossas fraquezas, foi constituído por Deus Sumo-sacerdote pelas palavras: “Tu és sacerdote eternamente segundo a ordem de Melquisedec”.
5,11-6,20 Exortação. Consegue se aprofundar nessas verdades aquele que persevera no testemunho. Alcança a herança das promessas aquele que une à fé a perseverança, fundamentado na promessa selada pelo testemunho por parte de Deus.
7 O sacerdócio levítico e o sacerdócio de Jesus
            O sacerdócio é outorgado a Jesus segundo as palavras do Sl 110,4. A figura se encontra em Gn 14,18ss. O Rei de justiça e de paz, possuidor de vida eterna é revelado pela sua figura, um sacerdote superior a Araão. A sua vinda abole o sacerdócio antigo. Isto é comprovado pela condição de eternidade que possui, em relação a sacerdotes de origem carnal que se sucedem no tempo. A Lei e o sacerdócio são abolidos porque não levam à perfeição, nem purificam dos pecados
8 Jesus é o sacerdote constituído por um juramento, tornado perfeito para sempre. O seu sacrifício nos purificou duma vez dos pecados.
9,1-14Tal é o sacerdote que se assentou à direita do trono da Majestade nos céus, na Tenda verdadeira
Os rituais na primeira tenda e os sacrifícios repetidos para entrar na segunda tenda, “tudo eram ritos humanos, sem eficácia para aperfeiçoar a consciência” (vv. 9-10). “Cristo que, pelo Espírito eterno, se ofereceu a si mesmo a Deus como vítima sem mancha, há de purificar a nossa consciência das obras mortas para que prestemos culto ao Deus vivo” (v.14).
9,15-28 Aplicação moral.
10 Eficácia do sacrifício de Jesus, Filho de Deus: “Leva à perfeição, e para sempre, os que ele santifica” (v.14).
10,19-39 Exortação
11 A fé

(16)   Exegese

 Hb 1-4
Estamos diante de uma exortação (13,22) de um pastor de almas que experimentou em si a grandeza da vocação cristã (13,18) e deseja que todos a vivam. Ele nota que falta perseverança na vida dos fiéis (10,36), o que não lhes permite avançar na compreensão da grandeza dos mistérios da sua fé (6,11) e firmar sua esperança, para se tornarem, dessa forma, herdeiros das promessas, juntamente com aqueles que perseveraram na fé. Estes, iluminados e santificados pelo Espírito, conheceram a beleza da Palavra de Deus, a força das realidades futuras, praticaram as boas obras, deram testemunho de Cristo e, pela perseverança, adquiriram a constância e se abriram à esperança, fruto do Espírito. Lançaram, dessa forma, uma âncora que penetrou além do véu de forma que esperam no Cristo, Sumo-sacerdote para a eternidade (6,19s).

Reflexão                                                                                         
A exposição do autor visa apresentar Jesus na condição de Sumo-sacerdote que entrou no céu com o seu Sangue e intercede por nós, para animar os fiéis a perseverarem no testemunho, até o derramamento do seu sangue. Não obstante as graças recebidas e as tribulações suportadas, torna-se necessário que neles desponte a virtude da constância, para que perseverem até alcançarem a esperança.  
            Hb 1-2 visa apresentar Jesus em toda a sua dignidade divina e na condição de perfeição que alcançou pelo sofrimento. O nosso Sumo-sacerdote é Jesus, o Filho, de condição divina porque é o Resplendor da Glória de Deus e Imagem do seu Ser. Segundo a condição humana assumida, pela sua imolação nos libertou da escravidão do diabo, destruindo o Mal. Tendo entrado, na eternidade (éon), no mundo futuro, além de interceder por nós, é capaz de compadecer-se e vir em socorro “dos que são provados” (2,18).

            Ele é o Filho, isto é o “Unigênito Deus” (Jo 1,18) que se manifestou pela Encarnação, a Pessoa divina pela qual Deus falou aos homens, de forma definitiva. Outrora, este já tinha falado pelos profetas. O Filho é o herdeiro. Criador do mundo, que sustenta o universo com o poder de sua palavra, é o Resplendor da Glória de Deus e a expressão do seu ser. Este é o realizador da nossa redenção, chamando-nos à purificação dos nossos pecados, da qual somos capazes em virtude da sua condição gloriosa (1Jo 2; 2Pe 1,5-10): um processo enobrecedor!
            O Filho é Aquele que é de condição divina e que, pela Encarnação, se tornou a Revelação do Pai. Autor da nossa salvação, pela mesma obra da nossa redenção foi levado à perfeição pelos sofrimentos. Ele é aquele que o Pai constitui Dia, ressuscitando-o dos mortos (Sl 2,7), o Rei-Deus que cinge a espada em defesa da justiça e da verdade (Sl 45), Aquele que Deus faz sentar-se à sua direita (Sl 110,1). É o homem, “por um pouco, feito menor que os anjos”, agora, coroado de honra e glória, por causa dos sofrimentos e da morte. Nos céus, é o nosso sumo sacerdote capaz de expiar os pecados do povo e de socorrer os que são tentados. É Sumo-sacerdote porque o Pai o consagrou quando lhe disse “Tu és meu Filho, eu hoje te gerei” (Sl 2,7), “Tu és sacerdote para sempre segundo a ordem de Melquisedec” (Sl 110,4): Aquele que foi salvo da morte por causa da sua submissão, que pela obediência no sofrimento foi levado à perfeição e que “se tornou para todos os que lhe obedecem princípio de salvação eterna”.
            Jesus é superior a Moisés, porque foi constituído administrador da casa de Deus na condição de Filho, enquanto Moisés o foi na condição de servo. É superior ao sumo sacerdote porque dura eternamente. O seu sacerdócio é segundo a ordem de Melquisedec. O seu sacrifício foi oferecido uma vez por todas e expia os pecados dos homens. Jesus, entrou, uma vez por todas, no Santuário que está no céu e intercede por nós.
            Fomos chamados a uma vocação celestial, merecedora de consideração, sobretudo porque, em Jesus, temos o Apóstolo e Sumo-sacerdote da nossa profissão de fé. Não podemos deixar endurecer o nosso coração pela sedução do pecado e nos afastar do Deus vivo pela incredulidade. Sabemos o que aconteceu a Israel no deserto, por causa da sua indocilidade (Sl 95). Teremos que prestar conta à Palavra de Cristo “espada de dois gumes” (4,12; Ap 1,16).

Hb 1-2 A importância da escatologia

1-2.     Para poder entender o peso da argumentação do Autor da Carta aos Hebreus, que visa animar os fiéis da comunidade à qual se dirige, para que continuem no ardor inicial, devemos advertir, primeiramente, a importância que ele, juntamente com os que fielmente nos transmitiram a salvação anunciada por Jesus, o Senhor da Igreja, deu ao Tempo do Fim (escatologia). Trata-se de uma imagem que visa sublinhar que não haverá outra condição de salvação melhor e maior daquela que Deus nos ofereceu em Cristo Jesus. Dessa forma, devido à maneira superior que nos foi oferecida, temos que observar que temos uma responsabilidade ainda maior em relação àqueles que lidaram com a Lei, transmitidas por anjos. Se eles foram punidos por causa das suas transgressões, quanto maior será a nossa punição em relação à Palavra que Deus nos dirigiu em Jesus Cristo diante da qual desanimamos. De Jesus, devemos considerar os atributos, primeiro dos quais, no nosso caso, em que estamos lidando com a nossa salvação eterna, o autor lembra o “herdeiro”. Isto significa que, antes, não havia condição de herdar o reino dos céus, enquanto, agora, recebemos o anúncio da salvação daquele que é “princípio e realizador da fé”. Jesus inaugurou esse tempo a partir do momento em que anunciou: “Completou-se o tempo, o Reino dos céus está próximo de se revelar. A conversão é uma questão de vida ou de morte. Deem a sua adesão de fé à Boa Nova que vos prego” (Mc 1,14). Comentou o Reino com seu discurso escatológico e O proclamou realizado com a sua Ressurreição. Falta somente sua manifestação gloriosa, que devem esperar vigilantes todos aqueles que dele querem usufruir. São Paulo reafirma o discurso de Jesus a partir da sua primeira Carta aos Tessalonicenses. Nessa linha estão as Cartas de Pedro e o Apocalipse. Trata-se de um tempo breve. Ao longo da sua duração, devemos ser perseverantes no testemunho para não perdermos a “coroa da vida” (Ap 2,10). O Reino que já foi conquistado e do qual participam os santos, ainda não se tornou manifesto porque é preciso que se complete o número dos mártires. Essa explicação está em Ap 6, e é uma interpretação da condição histórica da Igreja. De fato, o Reino dos céus já está realizado. Os santos reinam com Cristo, enquanto os maus são impedidos de entrar no céu. Tornaram-se presa do “fogo devorador de Deus” (Hb 12,).
            A nós que estamos vivendo os últimos tempos e que, por isso, estamos em condições de ver de que forma se realizam as promessas, porque, por Jesus nos tornamos herdeiros do Reino inabalável, da nossa salvação, sendo que somos chamados a ser coerdeiros com ele, se sofrermos com ele para sermos glorificados com ele; mais do que os nossos pais, temos a obrigação de prestar ouvido Àquele que nos fala pelo Filho. Deus nos fala por Aquele que é o Criador, a Sabedoria, Resplendor da sua glória e Expressão da sua substância; que é o nosso Redentor, e que é o nosso Sumo Sacerdote no Santuário do céu.
            A exortação do autor da carta visa, portanto, em primeiro lugar, nos alertar sobre “Deus que nos fala”, sobretudo porque, agora, se trata, não de profeta, e sim, de filho herdeiro, que nós, Igreja, reconhecemos: “Palavra criadora, Resplendor, Imagem, Providência”. Recebeu o reconhecimento de Deus, por ter realizado a nossa redenção. No céu, é o nosso eminente Sumo Sacerdote, que Deus constituiu acima da sua casa. Ele é capaz de interceder por nós, tendo sofrido a provação, por primeiro.
            Jesus, no momento da sua ressurreição, foi constituído Princípio de toda a criação: “Tu és meu Filho, a ti constituo Luz” (Sl 2,7). Torna-se o Rei ungido por Deus, em virtude da sua imolação (Sl 45,7-8); o Filho do Homem ao qual todos os reis estão submetidos (Sl 110,1). Este é o Nome acima de todo nome que Jesus recebe, de forma que, diante dele, todo joelho se dobra. Até os anjos de Deus o adoram porque ele é o Criador (Cl 1,16) (1,1-2,1). Nós somos chamados a formar essa Jerusalém celeste, para nos unirmos a milhões e miríades de anjos que prestam o seu culto de adoração àquele que está sentado no Trono . É o Filho, a Glória de Iahweh, que Deus Pai chamou para sentar à sua direita. Quando tudo lhe for submetido, então, entregará o Reino ao Pai (trata-se de uma figura em vista da  hierarquia que deve ser mantida presente).
            Os nossos pais foram punidos por causa das suas transgressões cometidas contra a Palavra promulgada por anjos. Qual não será o nosso castigo se negligenciarmos “tão grande salvação anunciada por nosso Senhor e fielmente transmitida por aqueles que a testemunharam, enquanto era acompanhada por sinais, prodígios, milagres e dons do Espírito” (2,2-4)?
            Nossa vocação é a de reinarmos no mundo futuro porque Jesus, “em favor de todos os homens”, foi levado à perfeição pelo sofrimento e agora “está coroado de honra e de glória”. Embora de condição divina, tornou-se um de nós ao assumir a natureza humana de forma que, ao celebrarmos a sua glorificação, já celebramos a nossa também. Pela sua morte, nos libertou do Maligno. Coroado de honra e de glória, aquele que sofreu para entrar na glória e nos santificar, o Autor da nossa salvação, entrou agora no Santuário do céu “para expiar os pecados do povo”, na condição de Sumo Sacerdote, capaz de socorrer os que são tentados. (2,5-18)

1,1-2a.O Deus que, outrora, muitas vezes e de muitos modos falou aos pais nos profetas, nos últimos dias, que são os nossos, nos falou num Filho. Podemos parafrasear dizendo: “O Senhor Deus de Israel que falara aos nossos pais pelos profetas, desde os tempos mais antigos, na sua misericórdia, chegada a plenitude dos tempos, nos falou pelo Filho”. O autor da carta não podia abrir o seu escrito de uma forma mais grandiosa e encorajadora. O cântico de Zacarias (Lc 1,68-79) é a sua digna interpretação: “Bendito seja o Senhor Deus de Israel que a seu povo visitou e libertou. Fez surgir um poderoso salvador, lembrado da promessa feita aos nossos pais, pelos profetas”. Chegou a plenitude dos tempos e nós somos os privilegiados que podem usufruir da visita do Deus de Israel, para chegar a possuir a herança “com aqueles que não obtiveram a realização da promessa” (12,39). O Filho é Jesus, que Deus Pai constituiu herdeiro. Essa primeira qualificação é apresentada pelo autor que está se dirigindo a fiéis que precisavam ser animados para que, pela constância, cultivassem a esperança que os tornasse capazes da herança. A sua condição de herdeiro encontra a sua confirmação nos títulos divinos, com os quais a Igreja celebra o seu Senhor e que se seguem imediatamente: “Resplendor da Glória do Pai, Imagem do Ser” (Cl 1,15-20), por quem foram feitos os séculos, que sustenta com o poder da sua palavra.

Deus que fala e que devemos escutar é a motivação fundamental que o Autor da Carta aos Hebreus apresenta para permanecermos firmes na fé. O Deus que fala é o Deus que, fiel a si mesmo, realiza o que anuncia. Pela contemplação das suas obras, os homens deveriam ser levados a observar os seus mandamentos, a partir do momento em que, pela sua criação, fica manifesto que a sua Palavra é criadora. Acontece que o homem desobedece porque não procura Deus na criação. Os hebreus desobedeceram porque esqueceram as obras que Deus tinha realizado em vista da sua libertação. Nós não podemos deixar de observar os seus ensinamentos porque estamos diante dos feitos realizados pelo Filho:
“Prestai atenção para não deixar de ouvir aquele que vos fala! Porque se não escaparam do castigo quando recusaram ouvir aquele que os advertia sobre a terra, com maior razão ainda não escaparemos nós, se nos afastarmos de quem nos fala do alto dos céus. Ele cuja voz um dia abalou a terra, agora proclama: “ainda uma vez abalarei não apenas a terra, mas também o céu. As palavras ‘ainda uma vez’ anunciam o desaparecimento de tudo o que participa da instabilidade do mundo criado, a fim de que subsista o que é inabalável. Visto que recebemos um reino inabalável, guardemos bem esta graça. Por ela sirvamos a Deus de modo que lhe seja agradável, com submissão e temor. Pois o nosso Deus é um fogo abrasador!” (12,25-29).

 Por si, esta citação contempla Deus na sua condição de juiz do mundo. Reflete, contudo, o poder que exerce quando fala pelo Filho. Com Jesus tornou-se manifesto o primeiro momento de uma escatologia. É um momento precioso porque Deus, no seu poder misericordioso, visa oferecer ao homem não somente todas as condições de salvação, como, também, as condições da sua divinização, uma vez que o destina a ser coerdeiro com Jesus Cristo, na condição de "filhos adotivos" (Ef 1,5). Esses bens não podem andar perdidos por causa de uma desistência provocada pelo desânimo, por causa de perseguições. É pela perseverança que os alcançamos, uma vez que demonstramos considerá-los bens maiores daqueles aos quais abdicamos, quando abraçamos a fé.
1,2b...que estabeleceu herdeiro de tudo Estamos diante de uma especificação sugerida pelo Sl 2,8: “Pede-me; dar-te-ei por herança todas as nações; tu possuirás os confins do mundo”. O Filho, em quem Deus fala a nós que vivemos a plenitude dos tempos (Gl 4,4), enquanto esperamos confiantes a manifestação do “Reino inabalável”, é Jesus, o Herdeiro. Nosso Senhor Jesus (13,20), especificará o autor, é o Filho eternamente perfeito (6,28). Levado à perfeição pelo sofrimento que redundou em salvação nossa (2,10; 5,9), é o Filho, estabelecido com poder por sua ressurreição dos mortos: “A promessa feita a nossos pais, Deus a realizou plenamente para nós, seus filhos, ressuscitando Jesus, como também está escrito nos Salmos: “Tu és o meu filho, eu hoje te gerei” (At 13, 32s),sentado "nas alturas à direita da Majestade" (13,20). Aliás, ele mesmo, por ser de condição divina, porque Sabedoria, Princípio da criação de Deus, Resplendor da sua Glória, Expressão do seu ser, "depois de ter realizado a purificação dos pecados, sentou-se nas alturas à direita da Majestade..." (Fl 2,6-11). Para entender toda a grandeza do Autor da salvação (2,10), coroado de honra e glória (2,9), após ter sido levado à perfeição pelo sofrimento, basta ler Ap 1-5. É o Senhor da Igreja que João contempla Rei-Sacerdote, de condição divina, vitorioso sobre a morte, que está sentado no trono de safira, acima da abobada celeste e que, com o Pai, recebe dos anjos e de toda a corte celeste, a mesma adoração. É a ele que o Pai entrega todo o poder de julgar, porque ele é o Filho.
            Se Hb 1,1-2a, tem seu digno comentário em Lc 1,68-75, o prólogo, a partir do primeiro título atribuído ao Filho, encontra o seu comentário em Cl 1,12-16: “O Pai nos fez capazes de participar da herança dos santos na luz. Ele nos arrancou do poder das trevas e nos transportou para o Reino do seu Filho amado, no qual temos a redenção, a remissão dos pecados. Ele é a imagem do Deus invisível, o Primogênito de toda criatura, porque nele foram criadas todas as coisas...”

Antes de continuar na leitura da carta, diante daquilo que dela já sabemos, isto é, que se trata de uma exortação, que se constitui somente de umas palavras postas em comum para edificação recíproca, à semelhança de Paulo quando escreveu aos Romanos, é bom ficarmos atentos à natureza da sua textura literária. A perspectiva grandiosa apresentada por 1,1-2a é redigida com extrema precisão quanto à colocação dos termos. Um leitor despreparado não repara que, enquanto, segundo a redação original na língua grega, diante de “Deus” temos o artigo determinativo, diante de “filho” não temos artigo. Pelas nuances captamos: 1º) o autor quer apresentar o Deus de Israel, tão familiar aos seus interlocutores, 2º) para que observem a eminência do gesto quando fala em Jesus, 3º) porque este é o Herdeiro, a Palavra criadora, o Resplendor da Glória, a Imagem do Ser, a Providência, constituído Senhor (1,2b-4).
O autor dessa carta é um homem de fé que chegou a uma vida de plena comunhão com Deus, aberto a uma esperança que não será confundida e que vive numa contínua ação de graças por ter sido contado entre o número dos santos. Quer escrever palavras de exortação a fiéis que estão para ser tomados pelo desânimo, quando poderiam, pela perseverança, chegar a se abrir a uma esperança que não pode ser confundida porque o Espírito Santo seria derramado nos seus corações. Entenderiam que a tribulação os associa à vida que se manifestou em Cristo, na sua Paixão; que esta vida seria princípio de vida nos irmãos e os tornaria merecedores de uma glorificação com Cristo; que, enfim, eles estariam trilhando o caminho novo que Cristo traçou, condição do pleno desenvolvimento do adão justificado. Não podem desprezar “tão grande salvação que o Senhor nos anunciou por primeiro e que os Apóstolos nos transmitiram” (2,3). Não deixem de escutar aquele que nos fala: Deus, que outrora falou aos nossos pais nos profetas, mas que nos últimos tempos nos falou no Filho. Estamos diante daquele que já abalou a terra e que agora está para abalar os céus. Não haverá mais outra advertência. Escutemos a voz de Deus para que entremos no “repouso prometido”. Os que seguiram a Moisés, preposto por Deus sobre toda a sua casa, não entraram no repouso, por causa da sua murmuração. Evitemos que nos aconteça o mesmo, agora , que herdamos um “reino inabalável” por Jesus Cristo, o Filho que, realizada a redenção, sentou-se à direita da Majestade.
            Dessa forma, as situações e os temas vão se apresentando: 1o) A fé dos fiéis, ameaçada pelo desânimo por causa da continuada luta contra o pecado e consequentes tribulações; 2o) A História de Israel figura da História do Novo Israel; 3o) A dignidade de Jesus Cristo, o Filho, que se tornou nosso Sumo-sacerdote, mediador de uma nova aliança.
            A carta quer tratar, principalmente, do sacerdócio de Cristo, que considera um alimento sólido para animar os fiéis antes que decaiam do fervor inicial, para que perseverem, uma vez que chegaram a considerar riqueza maior do que os bens materiais a fé que abraçaram, que testemunharam, que promoveram pela caridade aos irmãos e pela qual optaram não obstante o confisco dos seus bens.

1,3 Aquele que sendo o Resplendor da Glória, e a Imagem da sua substância, que sustenta todas as coisas com a palavra do seu Poder.... Como Pessoa divina, o Filho é o “Resplendor da Glória de Deus e Imagem do seu Ser”.
            Os judeu-cristãos, acostumados a contemplar o Plano de Deus na sua atuação, sabiam que o Deus de seus pais vinha se manifestando, ao longo dos tempos, pelos profetas, e que o que tinha sido anunciado realizara-se pelo Filho, o herdeiro, em virtude da redenção que realizara da sua humanidade que acabou glorificada e se tornara Princípio da nossa redenção da escravidão do Maligno.Jesus é o herdeiro porque viveu em tudo a obediência ao Pai. A sua Morte de cruz levou a humanidade assumida à participação da Glória da Vida Trinitária. Uma vez, todavia, que a Morte de Cruz foi um sacrifício de expiação do Servo, na condição de Resplendor da Glória do Pai, Imagem do seu ser, nós, nele, nos tornamos filhos adotivos, por graça, pela fé. Coerdeiros, teremos parte no reino inabalável com Jesus se perseverarmos na tribulação, a partir da celebração da Morte redentora, nas liturgias dominicais. Os que imitarem Jesus na imolação, pelo serviço aos irmãos, efetuado por uma imolação em favor deles, mostrando de amá-los como Jesus os amou, “terão parte com ele no reino” (Jo 13,9).
            A Carta aos hebreus é, portanto, uma exortação a viver a perseverança na tribulação, pelo seguimento de Jesus, que aceitou a humilhação da cruz, para participar, com ele da Glória, depois de um breve sofrimento. Anima-nos a constatação de que estamos nos últimos tempos, com as máximas manifestações: o Filho, sentado à direita do trono de Deus, na condição de Sumo e Eterno Sacerdote que entrou no Céu, com o seu sangue e intercede por nós. No seu sangue podemos continuamente nos purificar, até herdar, com ele o reino inabalável. Na verdade, a saudação final (13,20), poderia estar no início, apresentando o tema principal (8,1) da Carta. Teríamos, então, uma visão semelhante à do início do Apocalipse: o Senhor da Igreja que nos lavou com o seu sangue, que é contemplado e celebrado, na assembleia dominical, como “autor e realizador da fé” (12,2).

1,3 tendo realizado a purificação dos pecados, sentou-se à direita da Majestade, nas alturas.
            Temos aqui anunciada a reflexão que o autor da carta quer compartilhar, confiante que saberá motivar os seus irmãos e companheiros da vocação celeste (3,1). Devemos notar que ela é a explicação das palavras iniciais: “Deus falou-nos pelo Filho”. O Filho é Jesus que, “embora de condição divina”, ao entrar no mundo, “assumiu a condição de servo”. Pela sua obediência até a morte de Cruz, “levado à perfeição pelo seu sofrimento”, pelo qual, também, nos purificou dos nossos pecados, “Deus o exaltou”. Ele é o nosso Sumo-sacerdote que entrou no céu com o seu sangue e intercede por nós.
O que pode motivar os leitores da sua carta, para o autor é: 1º) o Filho, de condição divina; 2º) que realiza, pelo sacrifício de si mesmo, a redenção; 3º) atuando em si o Desígnio do Pai de nos tornarmos “seus filhos adotivos em Jesus Cristo”, o herdeiro.

1,4. Tornado, dessa forma, melhor que os anjos quanto superior, em relação a eles, é o nome que herdou. Começa a apresentação das peculiaridades de Jesus, o Filho de Deus, nosso Sumo-sacerdote, que atravessou os céus. Jesus, feito, por um pouco inferior aos anjos, “tendo realizado a purificação dos pecados” (1,3), recebe um Nome que está acima de todo nome. Diante dele, todo mundo proclama que ele é o Senhor (Fl 2,6-11).
1,5a. Quando e a qual dos anjos disse: “Tu és meu Filho, eu hoje te gerei”? Através de pós-figurações, interpretadas à luz da ressurreição, o autor ilustra a condição de Jesus, o homem feito um pouco inferior aos anjos que vemos coroado de honra e glória “por causa dos sofrimentos da morte” que o levaram à perfeição (2,10). São as palavras do Sl 2,7, que Deus Pai dirige ao Filho no momento da ressurreição (At 13,33). O homem feito por um pouco inferior aos anjos, levado à perfeição pelo sofrimento, senta à direita de Deus, na condição de Filho. Dentro da perspectiva da angelologia, Jesus se torna senhor das ordens angelicais que governam o universo, Tronos, Dominações, Principados e Potestades. Tudo foi colocado sob os seus pés (Cl 2,15).
1,5b. E novamente: “Eu serei para ele um pai e ele será para mim um filho” (2Sm 7,14)           Em Jesus se realiza a figura do rei, considerado filho de Deus.
1,6. E quando, novamente, introduz o primogênito no mundo, diz: “Adorem-no todos os anjos de Deus”. Palavras do Sl 97,7 que somente se realizam com Cristo.

2ª feira 1ª Semana TC Ano ímpar
            Reflexão (Hb 1,1-6)
            Gl 4,4 declara que o Filho, que, como anuncia o próprio Jesus, “o Pai consagrou e enviou ao mundo” (Jo 10,36), “nascido sob a Lei... para que recebêssemos a adoção filial”, é ele mesmo. Sua condição é divina: “Resplendor da Glória de Deus, Imagem do seu Ser” (Sb 7,26). Entra no mundo futuro como Sumo-sacerdote, com o seu sangue e intercede por nós. Todos os anjos o adoram. Os capítulos 4 e 5 do Apocalipse ilustram esta condição celestial do Senhor da Igreja
            Este é o começo da nossa reflexão sobre “Jesus que se revela”, sobre Aquele que a voz do Pai apresentou no momento do seu batismo no Rio Jordão: “Este é o meu Filho, o amado”. É aquele que a Profecia nos anunciou: o Emanuel, o Menino, o Rebento, o Servo de Iahweh (Is 7,14; 9,5-6;11,1-3; Is 42; 53); a Descendência, Noé (Gn 3,15; 6,8). Ele, a “A Palavra que se fez carne”, a Luz que é Vida, o Unigênito Deus.

1,7. A respeito dos anjos, porém, ele declara: “Torna em vendavais os seus anjos e em chamas de fogo os seus ministros”.
            Tudo o que Deus envia é seu anjo, com a função de cumprir uma missão para a qual é enviado. O anjo não é uma categoria de seres criados e sim, de enviados (v.14), cuja função angelical termina com o fim da sua missão.
1,8s. Mas ao Filho diz: “O teu trono, ó Deus, pelos séculos dos séculos, cetro de justiça é o cetro do teu reino. 9Amaste a justiça e odiaste a iniquidade. Por isso, ó Deus, te ungiu o teu Deus com óleo da alegria, preferindo-te aos teus companheiros”.
            Jesus reina com Deus. O seu cetro procura a justiça. Deus o ungiu com o óleo da alegria, preferindo-o aos seus companheiros (Sl 45,7-8).
1,10-12. E: “Tu, no princípio, ó Senhor, fundamentaste a terra e, obras das tuas mãos são os céus. Eles perecerão, mas tu permanecerás e todos como uma vestimenta envelhecerão. E como uma roupa os mudarás, e serão mudados: mas tu permaneces o mesmo, e os teus anos não terminarão”.
            Palavras do Sl 102, 26ss que se realizam em Jesus, a Palavra criadora, de condição eterna.
1,13. A qual dos anjos já disse: “Senta-te à minha direita até que ponha os teus inimigos como escabelo dos teus pés?”
            Sl 110,1 que retrata a realeza messiânico-divina de Cristo.
1,14. Não são todos espíritos servidores, enviados para servir em favor daqueles que são destinados à salvação?
            Os espíritos estão a serviço de Deus. São enviados para socorrer os homens. Os vemos nessa função quando Marcos os apresenta servindo Jesus, no deserto.
            Os espíritos estão a serviço de Deus. São enviados para socorrer os homens. Os vemos nessa função quando Marcos os apresenta servindo Jesus, no deserto, e quando Jesus declara que o Pai poderia enviar em seu socorro “legiões de anjos”. A repetida utilização do termo acabou constituindo uma categoria de seres criados por Deus. As suas diversas ordens receberam até nomes adotados da angelologia assírio-babilonense ( tronos, dominações, principados, potestades, querubins e serafins). Nada impede que Deus possa tê-los criado, como, também, nada proíbe que sejam considerados segundo a terminologia da linguagem figurativa que contempla Deus reunido com a sua corte celeste, sentado no seu trono, assistido pelos seus ministros, prontos para executarem as suas ordens.
2,1. Pelo que importa observemos tanto mais cuidadosamente os ensinamentos que ouvimos para que não nos transviemos.
            Depois de ter apresentado o tema da Redenção, que irá tratar na Carta, em toda a sua importância, o Autor lembra a responsabilidade que temos diante de Deus que nos fala pelos seus fatos, no Filho, realizador da Profecia. No fim voltará a lembrá-la dizendo: “Prestai atenção para não deixar de ouvir Aquele que vos fala!” (12,25). Pela sua palavra que penetra como uma espada de dois gumes, seremos julgados.
2,2-3a.Pois, se a palavra promulgada por anjos entrou em vigor, e qualquer transgressão ou desobediência recebeu justa retribuição,3 como escaparemos nós, se negligenciarmos tão grande salvação?
            O conceito é repetido no fim da Carta (12,25b) e tem o seu comentário em 12,18-25.
A superioridade da Nova Aliança sobre a antiga está no fato que herdamos um reino inabalável (v.27) por meio de Jesus, mediador, e do sangue da aspersão mais eloquente que o de Abel (v.24).
2,3b. Esta Nova Aliança começou a ser anunciada pelo Senhor. Depois, foi-nos fielmente transmitida pelos que a ouviram.
            Deus nos fala pelo Filho que enviou (Lc 4; 2Pd 3,2) e pelos Apóstolos (1Jo 1,3).
2,4. Testemunhando Deus juntamente com eles, por meio de sinais, de prodígios e de vários milagres, e pelos dons do Espírito Santo, distribuídos segundo a sua vontade. At 1,8s.

2,5-18. Jesus, como Homem, embora chamado a herdar o mundo futuro, esteve por um pouco inferior aos anjos porque devia chegar à perfeição pelo sofrimento e à glória pela sua morte redentora.
                        3ª feira 1ª Semana TC Ano ímpar
            Reflexão (Hb 2,5-12)
            Desde a abertura, o autor da carta está ilustrando a dignidade daquele que quer apresentar na condição de Sumo-sacerdote que entrou no céu com o seu sangue e intercede por nós. Jesus, em primeiro lugar, é o Filho Herdeiro, de condição divina: Resplendor da Glória de Deus, Imagem do seu Ser. A sua condição de Filho que entrou no mundo futuro (Gr: oikoumene) pode ser ilustrada pelos Sl 2; 45; 97; 102; 110). Isto, por si, já bastaria para darmos importância “à grande salvação” que realizou. Ele, contudo, deve ser considerado, segundo a condição humana assumida, como a Cabeça dos seus irmãos, porque levou a termo o Plano de Deus. Alcançou a perfeição pelo sofrimento. Dessa forma, também, “provou a morte em favor de todos os homens” (2,9).

 Agora, estando acima de tudo e de todos os anjos, é o nosso Sumo- sacerdote que Deus constituiu sobre a sua casa, "capaz de socorrer os que são tentados" (2,18).
            Com o fim do segundo capítulo fica clara qual será a teologia que o Autor exporá para motivar os interlocutores à perseverança na fé. Os que são tentados devem contemplar a pessoa de nosso Senhor Jesus que aceitou a provação para entrar na glória e confiar nele, porque, nas suas relações com Deus, se tornou Sumo Sacerdote, capaz de socorrer os que são tentados. Os sofrimentos da morte que o levaram à perfeição redundaram em justificação para nós, porque ele quis se tornar nosso irmão. Agora que entrou nos céus e está sentado à direita da Majestade, nos chama a sermos coerdeiros.
4ª feira 1ª Semana TC Ano ímpar
            Reflexão (Hb 2,14-18)
            Com a especificação última relativa ao Filho que “realizada a purificação dos pecados sentou-se à direita da Majestade, que o declara nosso Sumo Sacerdote, estamos diante do tema da Carta. “Levado à perfeição por meio de sofrimentos” (2,10), enquanto apresenta o seu sangue que expia os nossos pecados (v.17: Cf 1Jo 2,2), misericordioso e fiel, “é capaz de socorrer os que são provados” (v.18).
            O tema começou a ser apresentado desde 1,1-4: o Filho, constituído herdeiro, realizada a purificação dos pecados, sentou-se à direita da Majestade. Aqui começa a ser explicitado: pelo sofrimento foi levado à perfeição e, por vocação do Pai, se tornou Sumo Sacerdote, capaz de expiar os nossos pecados.
            Em 1,1-2 distinguimos quatro elementos: 1º - Deus que fala; 2º -aos pais pelos profetas; 3º -a nós pelo Filho: 4º -a condição final da fala que se dá pelo Filho. Ao Autor, mais que sublinhar os dois momentos, interessa advertir que estamos diante de Deus que fala: "Prestai atenção para não deixar de ouvir aquele que vos fala!" (12,25). Como Deus castigou aqueles que, no deserto, endureceram o seu coração e não ouviram a sua voz (3,7-4,12), nos castigará se não ouvirmos o Filho (12,25-29) que, por primeiro, nos anunciou a salvação que, em seguida, os Apóstolos nos transmitiram fielmente(2,1-4), "testemunhando Deus juntamente com eles, por meio de sinais, de prodígios e de vários milagres, e pelos dons do Espírito Santo" (v.4). A condição final sugere uma responsabilidade maior. Caso abdiquemos à posse da herança dos santos a que fomos chamados seremos consumidos pelo fogo devorador de Deus, quando a sua voz, ao sacudir terra e céus, deixará subsistir somente “aquilo que é inabalável” (12,27).
 A importância da Palavra
           "Prestai atenção para não deixar de ouvir Aquele que vos fala" (Hb 12,25). Prestar atenção à Palavra é a mesma recomendação de Cl 3,16: "A Palavra habite em vós plenamente". Ela é o instrumental da ascética cristã em todas as fases da evolução da fé que teve o seu início pela iluminação, através da pregação apostólica: “Lembrai-vos dos vossos dirigentes que vos anunciaram a Palavra de Deus" (13,7). Depois de ter sido iluminados pelo Espírito, é nela que devemos encontrar as motivações para resistir até o sangue no combate contra o pecado, “degustando a doutrina da justiça” (5,13). O justo vive pela fé e pela fé conserva a sua alma (10,38s). "Se esmorecer, nele não encontro mais nenhuma satisfação" (ibid.).
            Israel deixou de ouvir a Voz de Deus. Por isso foi excluído do repouso prometido. Por ter deixado de considerar as obras de Deus, escutou a voz do Maligno. No deserto, se queixou contra Deus. Ao longo da sua história, se voltou para deuses estranhos. Nós devemos frequentar as assembleias e nos admoestar com sabedoria, enquanto refletimos sobre as obras que o mesmo Deus, que outrora falou aos nossos pais pelos profetas, realizou, de forma única e insuperável, pelo Filho. Aliás, aquelas eram figuras da Salvação que Jesus Cristo, "abertamente manifestado Filho de Deus com poder, pela ressurreição, em Espírito de santidade" (Rm 1,4), realizou, e da Aliança que estabeleceu com o seu Sangue, constituído Sumo-sacerdote segundo a ordem de Melquisedec.
            A Voz que abalou a terra quando da Aliança sinaítica, pelo Filho voltou a abalar terra e céu. Estamos no tempo do Fim. Jesus, constituído Filho, após ter realizado a purificação dos pecados, que nos tornou reis e sacerdotes para Deus e que, tendo-se ele tornado precursor nosso nos Céus e Sumo Sacerdote, nos abriu as portas do Santuário, em condição de socorrer os que são tentados, é a graça do Reino inabalável que Deus nos concedeu. Não podemos "negligenciar tão grande salvação" (2,3).
A eficácia da ação de Jesus depende da sua condição divina
Em virtude da sua condição divina, pela sua imolação, Jesus alcançou, primeiramente para si, a igualdade com Deus, segundo a expressão de Cl 2,9: “Nele habita  corporalmente a plenitude da divindade”. Levado à perfeição pelo sofrimento está coroado de honra e glória (Hb 2,9). Em segundo lugar, alcançou, para nós, a purificação dos pecados, em virtude do seu Sangue, mais precioso do que o sangue dos bois que Moisés mandou imolar para selar a aliança do Sinai (Cl 1,14).
            O seu triunfo no-lo revela tão superior aos anjos quanto o nome que herdou excede o deles. Os anjos são vendavais e fogo. Jesus é aquele a quem Deus diz: “Tu és meu Filho, eu hoje te gerei” (Sl 2,7). Os anjos são espíritos servidores dos que devem herdar a salvação. Por eles foi dada a Lei, mas é pelo Senhor Jesus que nos foi anunciada a Salvação que os que a ouviram no-la transmitiram fielmente, Deus tudo acompanhando  com sinais e prodígios e as manifestações do Espírito.
            Jesus é Filho porque chamado por Deus para sentar no seu trono, ele que é o Criador que, na condição de Rei, desposou a humanidade. Os seus inimigos serão a ele subjugados (Sl 110,1).
            Foi somente por um pouco de tempo que foi encontrado inferior aos anjos. Uma vez levado à perfeição pelo sofrimento, ele é o nosso irmão que entrou no céu como precursor.
            A exposição do autor está toda fundamentada num constante paralelismo das figuras da Antiga Aliança com as figuras da Nova Aliança. Inicia-se com Moisés, chamado a administrar a Casa de Deus. Ele é figura de Jesus que cuida de nós, sua Casa. Moisés exerceu a sua função na condição de servo, enquanto Jesus a exerce na condição de Filho.
            Diante do fato de que Deus nos fala pelo Filho, temos maior obrigação, do que os nossos pais, de ouvir a sua voz, para não sermos excluídos do seu repouso.
            Jesus, de natureza divina, que estabeleceu a Nova Aliança pelo derramamento do seu Sangue, e que, agora, está sentado no Trono da Majestade divina na condição de Filho do Homem glorificado, é o nosso Sumo-sacerdote, estabelecido diante de Deus em nosso favor, que sabe compadecer-se porque escolhido entre os homens, que sabe socorrer os que são tentados. É um Sacerdote santo e imaculado.
            Para degustar esta doutrina da justiça, é preciso crescer na fé, porque aquele que decai se torna lento no entendimento. Para crescer na fé temos que ser perseverantes enquanto Deus nos prova. Pela constância podemos chegar a possuir uma esperança que penetra além do véu, onde Cristo Jesus entrou como precursor.
            O homem de fé é capaz de ver em Jesus o verdadeiro Sumo-sacerdote constituído, por um juramento, segundo a ordem de Melquisedec, superior, portanto, ao próprio Aarão que, em Abraão, pagou o tributo ao Rei de Salém. Jesus é o Filho eternamente perfeito, que entrou nos céu, está sentado à direita da Majestade e intercede por nós. Aboliu a primeira tenda, porque não precisou de purificação para entrar no Santo dos Santos no céu, onde entrou com o seu próprio Sangue.
            Diante de figura tão gloriosa, corramos para o combate que nos é proposto. Despojemo-nos de todo fardo e do pecado que nos envolve. Olhos fixos em Jesus, autor e realizador da fé, que desdenhou a vergonha e aceitou a cruz que os pecadores lhe infligiram, professemos nossa fé nele. Inspirem-nos os santos, a partir de Abel, que perseveraram contra toda esperança. Dessa forma, tiveram em si o bom testemunho que Deus nele infundiu e que os tornou capazes de conhecer o Princípio da criação e o que espera os que servem a Deus sem esmorecer.

A importância da perseverança para o Autor
            O Autor tem consciência da grandeza do dom que recebemos em virtude da nossa fé em Jesus Cristo. Chama-o "Reino inabalável" (12,28), "uma fortuna melhor e mais durável pela qual vale a pena sofrer injúriase tribulações, ser solidários daqueles que tais coisas sofrem e do sofrimento dos prisioneiros' (10,33s).
Não podemos "negligenciar tão grande salvação" (2,3), pelo contrário, "importa  observemos cuidadosamente os ensinamentos que ouvimos para que não nos transviemos" (2,1). Fomos iluminados: recebemos o Espírito Santo, experimentamos a beleza da Palavra de Deus (6,4s), nos aproximamos do Monte Sião e da Cidade do Deus vivo, da Igreja dos primogênitos, de Deus, o Juiz de todos, de Jesus, mediador de uma Nova aliança e do sangue da aspersão mais eloquente que o de Abel (12,22-24).
            Alcançam a "herança das promessas" (6,12) somente aqueles que vivem o fervor da caridade, demonstrando "o mesmo ardor em levar até o fim o pleno desenvolvimento da esperança" (6,11). Eles não desanimam na tribulação, pelo contrário, confiam em Deus que se comprometeu com juramento. A imensa recompensa que nos espera, superior a qualquer bem terreno, merece toda a nossa perseverança. Essa graça pode ser alcançada de Cristo Jesus, que vive glorioso no céu, porque ele a mereceu por nós superando a provação que o tornou capaz de socorrer os que são tentados. Ele pode no-la merecer porque Deus o constituiu sacerdote como Aarão, "em favor dos homens em suas relações com Deus" (5,1), numa condição até superior a dele porque o seu sacerdócio é segundo a ordem de Melquisedec.
            Devemos temer pela nossa salvação se desanimarmos diante da provação, porque estaremos perto da maldição. De fato, se foram castigados os que não escutaram a Palavra promulgada por anjos, como escaparemos nós, se negligenciarmos tão grande salvação anunciada pelo Senhor? Ele estabeleceu uma nova aliança por ter entrado no céu com o seu Sangue. Nosso Senhor é o Rei-Pastor, o Filho do Homem, o Herdeiro do mundo futuro do qual seremos coerdeiros se dermos testemunho da Palavra. Pela Palavra da Lei seremos julgados quando da vinda de Jesus Cristo.
A grandeza da ação de Deus
            Deus operou a salvação em favor de Israel. Maior salvação ele operou em nosso favor pelo Filho. A Israel deu o seu servo Moisés, deu os sacerdotes e o sumo sacerdote para perpetuarem os frutos da aliança do Sinai. Mas o sumo sacerdote que, a cada ano, oferece um sacrifício de expiação precisa oferecê-lo para si também e renová-lo. Jesus não precisou oferecer sacrifício algum para si. Entrou no Templo do céu com o seu sangue, tendo realizado a Redenção uma vez por todas. As duas alianças, uma superior à outra, são formas pelas quais Deus se revelou aos homens.

A revelação de Deus pelo Filho 
            O Filho é Aquele que ao entrar no mundo se ofereceu em sacrifício ao Pai. Segundo a humanidade por ele assumida, Deus quis levar à perfeição o Autor da salvação (2,10), para que ressuscitado, elevado ao céu, Aquele que se tornou, pelo sangue de uma aliança eterna, o grande Pastor das ovelhas, nosso Senhor Jesus (13,20), se tornasse, em relação a Deus, um sumo sacerdote misericordioso e fiel, capaz de expiar os pecados do povo. Pois tendo ele mesmo sofrido pela tentação, é capaz de socorrer os que são tentados (2,17s).

As figuras que ilustram o sacerdócio de Cristo
            O sacerdócio de Cristo é segundo a ordem de Melquisedec (Sl 110,4). Levi, em Abraão, pagou o dízimo a Melquisedec. Enquanto Cristo realiza em si a figura de Melquisedec, é superior a Aarão, que, também, é figura de Cristo enquanto foi chamado para o sacerdócio. Jesus realiza a figura de Melquisedec quando entra no céu e ouve a voz do Pai: "Tu és sacerdote para sempre..." (Sl 110,4). A superioridade do sacerdócio de Cristo resulta, também, do fato que ele é sacerdote do verdadeiro Santuário, aquele que está no céu, onde ele entrou com o seu sangue, uma vez por todas, tendo atravessado o véu da sua humanidade. A sua mediação é eficaz, enquanto a ação do sumo sacerdote, aqui na terra é ineficaz. Os sacerdotes que, na terra, "oferecem dádivas de acordo com a Lei" (8,4), são figura da realidade celeste. A sua inferioridade tem origem na aliança temporária estabelecida no Sinai, em vista de uma aliança definitiva. Seu culto e seu templo são destinados a desaparecer uma vez que se realizou a Nova Aliança. O sinal da sua precariedade é o serviço cultual na primeira parte da tenda: ritos humanos "sem eficácia" para aperfeiçoar a consciência de quem presta culto. Jesus Cristo ofereceu o seu corpo (10,5-7). Com isso substituiu os ritos ineficazes com o sacrifício da sua vida: "atravessou uma tenda maior e mais perfeita, que não é de mãos humanas'' (9,11). Passando pelo véu da sua humanidade, entrou no santuário do céu, com o seu sangue, e se tornou Mediador de uma redenção eterna. Estamos numa Nova Aliança. As transgressões são perdoadas e a herança eterna prometida é concedida. "Temos um tal Sacerdote que se assentou à direita do trono da Majestade nos céus". É de natureza divina (1,3). É o adão, "em tudo semelhante aos irmãos" (2,17), “levado à perfeição pelo sofrimento” (2,10). "Fiel em toda a sua casa" (3,6). É o Sumo-sacerdote capaz de socorrer os que são tentados, tendo sofrido, por primeiro, a tentação. É o Filho que o Pai consagrou sacerdote (Sl 2,7; 110,1.4). Superior a Aarão (7,10). Ministro do Santuário que está no céu. Mediador da Nova Aliança. Entrou no Santuário do céu, com seu sangue, obtendo uma redenção eterna (9,12). "Cristo, por um Espírito eterno, se ofereceu a si mesmo a Deus, como vítima sem mancha, purifica a nossa consciência das obras mortas" (9,14; cf. 1Jo 2,2) para que prestemos a Deus um culto vivo (Rm 12,1). O sacrifício de Cristo marca o tempo do fim porque, agora, os pecados são perdoados, o homem é resgatado da morte e, em Cristo, recebe a herança eterna (9,15).
            A vida cristã
            A vida cristã, que tem o seu início na conversão, no batismo, na crisma e é continuamente alimentada pela Palavra, deve sempre se manter no ardor inicial para poder se tornar adulta, e nos tornar capazes de nos comportarmos bem em qualquer ocasião. Por isso é necessário perseverar quando Deus nos castiga como um Pai para nos comunicar a sua santidade, para que possamos produzir frutos de paz e de justiça. Somente quem cultiva a fé, e persevera nas tribulações até adquirir a virtude da constância, pode chegar a uma esperança que não será confundida, porque o Espírito Santo será derramado no seu coração. Estará nele o bom testemunho que Deus concede àqueles que o procuram. A nossa fé terá em si a compreensão do que nos espera, como aconteceu a todos os que deram testemunho da palavra e chegaram a conhecer o Criador.

A escatologia
            Estamos no tempo do fim (1,2; 9,26; 10,25; 12,27). É preciso viver na vigilância, participando das assembleias, em contínua celebração da Palavra (10,24; Cl 3,16), "à medida que vemos o Dia se aproximar" (10,25). "Um pouco, muito pouco tempo, e aquele que vem, lá estará. Ele não tarda" (10,37). Quando da vinda do Senhor, seremos julgados pela Palavra. "Pois, se a palavra promulgada por anjos entrou em vigor, e qualquer transgressão ou desobediência recebeu justa retribuição, como escaparemos nós, se negligenciarmos tão grande salvação?" (2,1-3).

A fé
            O Autor da Carta considera a fé a condição de vida que o fiel deve cultivar até a sua plenitude. A fé é adesão incondicional a Deus que se revela. Começa pelo reconhecimento dos seus atributos pela criação. Entendemos o que é fé quando olhamos para Noé, para Abraão que abandona a terra, que oferece o filho, para Moisés que resiste ao faraó "como se visse o Invisível". [U1] Enquanto os que creram não viram a realização das promessas, nós que cremos em Cristo Jesus vemo-las realizadas. Mas ele chegou à Glória pelo sofrimento. Para evitar o desânimo, é bom considerar o que ele sofreu por parte dos pecadores (12,3).

A Palavra
            Nas assembléias, a reflexão sobre as Escrituras se torna necessária para renovar o espírito. É possível contemplar a Palavra que é aquilo que Deus anuncia pelos profetas e pelo Filho e que se realiza. O testemunho da Palavra será o nosso juiz. Por ela valorizamos o nosso destino de vocacionados à Cidade celeste, de companheiros dos santos, em virtude da nova Aliança que Cristo Jesus estabeleceu. É por isso que a Carta termina com uma exortação "Prestai ouvidos àquele que vos fala!", que explica porque a mesma começa dizendo "Muitas vezes e de muitos modos falou Deus". As obras de Deus são a sua palavra, isto é, o que ele anuncia e realiza, desde a criação. São elas que devem nutrir a nossa fé da mesma forma que nutriram a fé de muitos homens santos.

A motivação
            Jesus que "sofreu a cruz, desprezando a vergonha, assentou-se à direita do trono de Deus" (12,2). O sofrimento leva à perfeição (2,10). Por ele Deus nos educa (12,7). Conforta-nos termos um Sumo-sacerdote que "levado à perfeição pelo sofrimento, se tornou para todos os que lhe obedecem princípio de salvação eterna" (4,9), porque, tendo entrado no Templo do Céu com seu próprio sangue, é capaz de expiar os pecados e, "tendo ele mesmo sofrido pela tentação, é capaz de socorrer os que são tentados" (2,18).

Caminho a seguir
            Não desertar as assembléias porque é nelas que é possível escutar a Palavra, celebrar a Morte do Senhor e receber o Espírito, confortar e ser confortado na fé, para viver na perseverança até alcançar uma esperança que não será confundida. Para viver a santificação, os que foram iluminados e receberam o Espírito devem continuamente meditar a palavra de Deus (12,25), ainda mais que, pelo Filho entronizado, ela nos anuncia as realidades definitivas (12,27) das quais somos chamados a ser herdeiros (vv. 22-24). Pela meditação chegamos à implementação dos ensinamentos, motivados pela grandeza da recompensa (10,35). Tudo o que Deus realizou nos julgará. Basta olhar para os pais que, apesar de terem visto as obras de Deus, não deram a ele sua adesão de fé. Evitemos cair no mesmo erro porque Deus está nos falando pelo Filho e vivemos uma Nova Aliança que nos garante a remissão dos pecados pelo sangue daquele que entrou no céu e é ministro do verdadeiro Santuário. Dele somos chamados a ser coerdeiros. A única coisa exigida é a de perseverar. "Sem esmorecer, continuemos a afirmar a nossa esperança, porque é fiel quem fez a promessa" (10,23; 6,17s).

O prólogo
O prólogo reflete a profunda convicção do Autor de que, com Jesus Cristo, estamos diante de Deus que nos fala nos tempos escatológicos. É nossa obrigação prestar atenção para não deixar de escutar Aquele que fala. É pela escuta atenta da Palavra, no dia do Senhor, dia em que celebramos a sua Morte e participamos da carne do seu sacrifício, que crescemos na fé, a ponto de saber resistir até a morte ao pecado.

Exortação (2,1-4)
            A salvação, anunciada aos antigos por anjos, negligenciada, mereceu o castigo. Anunciada pelo Senhor e transmitida pelos Apóstolos implica uma observância mais cuidadosa. Motivam-nos os sinais, os prodígios, os milagres, a manifestação do Espírito com os seus dons distribuídos entre os fiéis.
            A exposição teológica e a exortação a não nos tornarmos lentos na compreensão, com o perigo de nos transviarmos por não observar cuidadosamente os ensinamentos ouvidos (2,1), se entrelaçam ao longo de toda a Carta. É preciso viver sempre no fervor da caridade para levar a termo, na perseverança, a virtude da esperança, a partir do cultivo da fé e, assim, sermos herdeiros das promessas (6,12). Outra constante da exposição é o contínuo paralelismo entre a antiga e a nova aliança para que desta última resulte toda a superioridade.
            Se a negligência diante da palavra administrada pelos anjos mereceu o castigo, quão maior será o castigo se negligenciarmos a Palavra do Senhor e dos Apóstolos, ainda mais que ela vem acompanhada por sinais, prodígios, milagres e os carismas do Espírito. "Não endureçamos o nosso coração!". Vivamos o hoje da nossa existência para não sermos excluídos da terra prometida. Seremos associados à sorte do Herdeiro, caso vivamos a salvação. Para isso, é necessário meditarmos sobre a dignidade do Senhor da Igreja.
            Essa exortação inicial nos diz que estamos diante de uma Carta pastoral que se preocupa com o problema da defecção e que tenta motivar os fiéis a voltar ao fervor da caridade, para que não se transviem.
           

3,1-6 Nosso Senhor Jesus Cristo é o "Filho eternamente perfeito" (7,27b) pelo qual Deus nos fala dos altos céus. Ele é o Apóstolo e o Sumo Sacerdote da nossa profissão de fé. Realiza em si a figura de Moisés, superior a ele porque é o Filho, enquanto Moisés era servo. É superior ao sumo sacerdote, porque é sacerdote segundo a ordem de Melquisedec. Na condição de arquiteto da casa de Deus (Ex 39,43) está nos edificando no seu templo pelo Espírito. Mas nós seremos esse templo “se mantivermos a confiança e o motivo altaneiro da esperança” (3,6).
            Segunda exortação
3,7-18. A forma exortativa, que começou a se apresentar em 2,1-4, volta a aflorar. Logo entendemos que, pela palavra, é o Espírito Santo que fala (um claro paralelismo com Ap 2-3: "quem tem ouvido ouça o que o Espírito diz às Igrejas"). Entendemos, também, que, para o Autor, estamos nos últimos tempos, de forma que devemos aprender por aquilo que aconteceu aos israelitas quando não escutaram a voz de Deus no deserto. Por terem transgredido a Lei, não obstante tivessem visto as obras de Deus, na sua ira, este os excluiu do repouso prometido. Para não sofrermos a mesma sorte, devemos manter "firme até o fim a nossa confiança inicial em Jesus” (v.14), "o Apóstolo e Sumo-sacerdote da nossa profissão de fé" (v.1).
5ª feira 1ª Semana TC Ano ímpar
            Reflexão (Hb 3,7-14)
            Hb 3 é um apêndice que quer explicar qual deve ser a nossa relação com Jesus, considerado na sua condição de Sumo Sacerdote misericordioso e fiel. Em relação a misericordioso, o autor acha ter sido bastante elucidativo. É o termo fiel que sugere uma exortação. Diante do Filho, que Deus constituiu Senhor da Igreja com poder, ao ressuscitá-lo dos mortos (Ef 1,20), devemos corresponder com confiança (cf. Sl 31) e esperança. Caso nos entreguemos à murmuração e à rebeldia, pereceremos, sem alcançar a pátria prometida (Sl 95,14).

4,1-11 Continua aberta a possibilidade de “entrar no repouso prometido”. Temos que assumir todos os compromissos para podermos merecê-la. Não podemos nos comportar como as virgens insensatas que não levaram o óleo consigo (Mt 25,3). Vivamos a fé que abraçamos. A maneira de argumentar do autor não consegue nos motivar. Tinha a sua validade para os ouvintes do seu tempo que estavam em consonância com a sua forma de pensar, especifica de um rabino.

4,12-16 Seremos julgados pela Palavra de Deus, aquela que o Espírito anunciou pelos profetas e por Jesus Cristo, "por meio de sinais, de prodígios e de vários milagres, e pelos dons o Espírito Santo, distribuídos segundo a sua vontade" (2,4). A relação com o Apocalipse volta a apresentar-se porque a Palavra "mais penetrante do que qualquer espada de dois gumes que... julga as disposições e as intenções do coração" é aquela que sai da boca do Filho do Homem, Senhor da Igreja (Ap 1,16), Sumo Sacerdote e Rei-Pastor das ovelhas (13,20).
            Depois da apresentação grandiosa do Filho, depois de ter-nos o autor recordado que escutamos a mensagem de Jesus que os Apóstolos nos transmitiram com os sinais do Espírito, de ter-nos lembrado a glorificação que Jesus experimentou pelos sofrimentos da sua morte e os benefícios da libertação do diabo que ela acarretou em nosso favor e, enfim, de ter-nos lembrado que, dessa forma, temos um Sumo Sacerdote que intercede por nós nos céus e pode nos consolar por ter ele, por primeiro, experimentado a provação, ao lembrar-nos que “se mantivermos a confiança e o motivo altaneiro da esperança” (3,6), nos garante que continuaremos a ser a morada de Jesus com o Pai, no Espírito (cf. Jo 14,23). É a exortação que ocorre ao longo das assembleias dominicais, momento em que os fiéis se admoestam reciprocamente no intuito de se precaver do desânimo. Esmorece na sua confiança e se afasta do “Deus vivo”, enquanto o seu coração se torna mau, o fiel que abdica do querer “degustar a doutrina da justiça” (5,13).
4,14-16 O autor chega à conclusão da sua argumentação inicial. Os fiéis não devem ceder à tentação do desânimo (Ef 3,11-13). Animem-se diante da eminência do Sumo Sacerdote que entrou no céu: “Jesus, o Filho de Deus”. Têm que perseverar, a ele recorrendo, porque “é capaz de socorrer os que são tentados, tendo ele mesmo sofrido pela provação” (2,18). Aproximem-se do trono da graça para alcançar graça no tempo oportuno.
Sábado 1ª Semana TC Ano ímpar
            Reflexão (Hb 4,12-16)
            A “Palavra de Deus” tem as seguintes significações: 1º) É palavra profética (1,1), enquanto foi instrumento de revelação em relação às coisas que deviam acontecer (1Pd 1,10-11). 2º) É palavra de autoridade que deve ser executada quando o Filho nos transmite a mensagem recebida do Pai (2,3-4). 3º) Será instrumento do nosso julgamento final (4,12-14).
            A condição de Filho eternamente perfeito atua em Jesus enquanto se tornou, no céu, o nosso Sumo Sacerdote. Enquanto permanecermos firmes no testemunho, poderemos, sempre, por meio da sua mediação, alcançar do nosso Deus a “graça como ajuda oportuna”.
             Hb  1-4 desenvolve dois temas. Trata-se de uma primeira tentativa do autor da carta para motivar os seus leitores a não desanimar diante da provação, pelo contrário, a perseverar, a fim de merecer partilhar da herança dos santos.  Estamos diante de uma decisão definitiva, porque recebemos, por Cristo, um Reino, realidade inabalável. Devemos acatar a mensagem de Jesus que, os Apóstolos, por sua vez, nos transmitiram, acompanhada de sinais provocados pelo Espírito Santo. Quanto a sua dignidade, Jesus é o Filho, o herdeiro, Resplendor da Glória de Deus, imagem do seu Ser, o Criador de tudo. Foi glorificado por Deus, na sua humanidade assumida, a ponto de se tornar o nosso Sumo Sacerdote que entrou nos céus e pode interceder por nós, enquanto pode até compadecer-se conosco, por ter sofrido por primeiro. Admoestados por aquilo que aconteceu com Israel no deserto, que foi excluído da terra prometida porque desanimou e partiu para a murmuração, suscitando a ira de Deus, demos ouvido àquilo que este nos diz pelo Filho, por tudo aquilo que ele realizou e ensinou. Caso contrário, como uma espada que sai da sua boca, a sua palavra, mais penetrante que uma espada de dois gumes, nos transpassará, no dia do julgamento.


Explicação do sacerdócio de Cristo
Tema
4,14-15 Jesus é o nosso Sumo Sacerdote, superior aos outros sumos sacerdotes, porque é o Filho que atravessou os céus. A condição de Filho já foi explicada, como, também a condição de sumo sacerdote. Ambas foram alcançadas em virtude dos sofrimentos. Por essas duas prerrogativas ele é eminente e sabe "se compadecer das nossas fraquezas, pois ele mesmo foi provado em tudo como nós, com exceção do pecado".
4,16. É uma exortação dirigida aos que são tentados (2,18).

5,1 O autor começa a ilustração do sacerdócio de Cristo através da figura do sumo sacerdote do culto hebraico. 1º) É tirado do meio dos homens (2,14: “participou da mesma condição”). 2º) Sua função é oferecer dons e sacrifícios pelos pecados (2,17: “sacerdote misericordioso e fiel, par expiar os pecados do povo”);
5,2 3º) é capaz de compreensão  (2,18: “Pois tendo ele mesmo sofrido pela provação, é capaz de socorrer os que são provados”).
5,3 4º) ele mesmo está cercado de fraqueza (4,15: “Não temos um sumo sacerdote incapaz de se compadecer das nossas fraquezas, pois ele mesmo foi provado em tudo como nós, com exceção do pecado”).
5,4. Mas foi Cristo, de fato, chamado ao sacerdócio, como o foi Aarão?
5,5. Ele o foi, no momento da sua ressurreição que, não somente o exaltou, como, também, o tornou sacerdote, quando o Pai proclamou "Tu és meu Filho, eu hoje te gerei" (Sl 2,7), porque, ao mesmo Filho Deus diz, ao fazê-lo sentar à sua direita: "Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedec" (Sl 110,1.4). O fundamento da ilustração está no fato que são citados salmos messiânicos.
5,7-10. Pela sua submissão, que resgatou a rebeldia do adão, aprendeu a obediência. Tornado perfeito, conheceu a glorificação. Para a sua glorificação, ofereceu o seu sacrifício pela sua fraqueza, isto é para remir a sua humanidade da condição de morte, uma vez por todas. Dessa forma, ele não morre mais. Pelo seu sofrimento, "levado à perfeição", também, se tornou Sumo Sacerdote para a salvação eterna de todos os que lhe obedecem. Aquele que está sentado no trono da Majestade é Filho e Sumo Sacerdote também: "Jesus, o Filho de Deus" (4,14). A ilustração será retomada com Hb 7,1.
2ª feira 2ª Semana TC Ano ímpar
            Reflexão (Hb 5,1-10)
            O autor começa a análise daquele que estava apresentando desde o início para que fiquem claras as condições do sacerdócio de Jesus. É possível encontrar em Jesus as características do Sumo-sacerdote da Antiga Aliança: tirado do povo para oferecer sacrifícios em favor dos irmãos; compreensivo, porque ele mesmo cercado de fraqueza. Ninguém, contudo, outorga a si mesmo a condição sacerdotal, porque Aarão foi chamado por Deus.
            Jesus é sacerdote porque Filho que o Sl 110 declara sacerdote segundo a ordem de Melquisedec. De fato, o é na condição de verdadeiro adão, levado à perfeição pelos sofrimentos, que se ofereceu como vítima de expiação em favor dos seus irmãos. Quando Deus o glorifica com a ressurreição e a ascensão, então lhe outorga o título de Sumo-sacerdote com as funções que a figura da Escritura indica. A Divindade se aproxima tanto de nós que chega a se compadecer dos homens a partir da experiência que teve pela encarnação, através da sua imolação. Pela sua humanidade glorificada nos ensina o caminho da nossa glorificação, mediante o gesto do reconhecimento da nossa dependência da Divindade, e o caminho da nossa purificação pela celebração do seu sacrifício de expiação que nos leva à prática de toda boa obra.
            Os que lhe obedecem alcançam a salvação eterna.

5,11-6,20

5,11-14
            É retomada a linha exortativa, iniciada de forma admoestativa.

            A vida cristã. Para o Autor da Carta, o início da vida de cada cristão se dá com o anúncio do Senhor: "Completou-se o tempo, o Reino de Deus está perto, convertei-vos e crede no evangelho" (Mc 1,14; Hb 2,3). Os Apóstolos que estiveram com ele desde o início (1Jo,1,1; Hb 2,4), o transmitiram fielmente, “testemunhando Deus juntamente com eles, por meio de sinais, de prodígios e de vários milagres, e pelos dons do Espírito santo, distribuídos segundo a sua vontade" (Hb 2,4). A pregação provocou a conversão que levou ao Batismo, "iluminação, dom do Espírito" (6,4). A vida de fé foi, então, nutrida pela Palavra da profecia e pelas forças do mundo que há de vir (Hb 6,5; 12,22s; Ap 1,3.10-13). A perseverança que produz uma virtude comprovada (Rm 5,4) é a condição para chegarmos à posse da herança das promessas (Hb 6,12). Somente pela virtude comprovada é possível degustar a doutrina da justiça (5,13). É necessário, portanto, nutrir a fé com as obras da caridade, quais sejam: assistir os prisioneiros, aceitar a prisão, ser despojados dos bens (10,34). Mantido o "mesmo ardor em levar até o fim o pleno desenvolvimento da esperança" (6,11), a lançamos "para além do véu, onde Jesus entrou por nós, como precursor" (v.20). Então não seremos confundidos porque o Espírito Santo terá sido derramado nos nossos corações (Rm 5,5). Quando iluminados pelos seus dons de sabedoria e revelação, sabemos qual é a esperança que o seu chamado encerra (Ef 1,18; Hb 12,22s). Quem não cultiva a fé pelos dons do Espírito, quem não persevera na tribulação até possuir uma virtude comprovada, se torna "lento à compreensão" (6,12) e fica exposto ao desânimo.
6,19 A esperança, com efeito, é para nós qual âncora da alma, segura e firme, penetrando além do véu Quando nos abrimos a uma esperança incapaz de esmorecer, porque sustentada pela alegria que a constância nas tribulações provoca, temos em nós a garantia, a prova das realidades futuras. Nada nos poderá separar do amor de Cristo.
6,20 Onde Jesus entrou por nós, como precursor, feito sumo sacerdote para o éon, segundo a ordem de Melquisedec Volta a ser lembrado o tema da carta, apresentado no prólogo e já repetido em 4,14. É o pensamento que o autor quer participar para se edificar através da sua exortação quando for lida na assembleia dominical.
3ª feira 2ª Semana TC Ano ímpar
            Reflexão (Hb 6,10-20)
            Desde Hb 2,1-4 vemos o autor da Carta relacionar o seu pensamento teológico a conselhos que visam levar os fiéis a viver o seu compromisso moral. Diante da constatação de que Deus nos fala pelo Filho, não podemos negligenciar tão grande salvação (2,3). Olhando para o homem Jesus que nos mereceu a redenção pela sua imolação, abramo-nos à esperança de podermos ser confortados por este nosso Sumo Sacerdote que “tendo ele mesmo sofrido pela provação, é capaz de socorrer os que são provados” (2,18). Sabendo que somos a casa de Deus à qual o Filho foi preposto e que continuaremos a sê-la “se mantivermos a confiança e o motivo altaneiro da esperança” (3,6), não endureçamos o nosso coração, para podermos entrar no repouso prometido. Quando acaba de fazer uma apresentação comovente e grandiosa da Pessoa do Senhor que “nos dias da sua vida terrestre, apresentou pedidos e súplicas, com veemente clamor e lágrimas, àquele que o podia salvar da morte” (5,7), intensifica a sua exortação para que os fieis não percam a graça que podem haurir ao contemplar Jesus em toda a sua grandeza de Sumo Sacerdote, segundo a ordem de Melquisedec.  
            A vida cristã constitui-se de conversão, cultivo da fé, vivência da nossa configuração a Cristo Jesus, recebida do Espírito no nosso Batismo, senso moral exercitado para que possamos “degustar a doutrina da justiça” (5,13). O fracasso na vida moral poria em risco a própria salvação eterna. A estatura adulta, alcançada enquanto nos nutrimos com a doutrina da justiça, é aquela que permite viver no ardor inicial, condição indispensável para “levar até o fim o pleno desenvolvimento da esperança” (6,11). Estamos diante do mesmo pensamento de Paulo seja quando escreve a 2Cor como quando escreve Rm 5. A condição adulta é aquela que não nos deixa “lentos à compreensão”: alcançaremos a herança prometida somente pela perseverança.
            O juramento que Deus fez a Abraão que acabou sendo abençoado porque acreditou contra toda esperança e o juramento que constituiu Jesus na condição de Sumo Sacerdote segundo a ordem de Melquisedec, são o fundamento da nossa confiança. Na perseverança alcançaremos, com certeza, a herança prometida.
            O desânimo frustraria uma vida de fé, caso faltasse a perseverança na provação. O autor da Carta sugere, então, que encontremos alento em Jesus Cristo que Deus constituiu nosso Sumo-sacerdote Sacerdote[U1] .

7,1-25. O sacerdócio de Cristo segundo a ordem de Melquisedec.
Introdução. Após ter falado do sacerdócio de Jesus na condição de Filho, o adão que foi coroado de honra e glória, que foi chamado a ser Sumo sacerdote como Aarão, e ter ilustrado as suas condições, comparando-as às do Sumo- sacerdote da Antiga Aliança, o Autor, agora, o ilustra através da figura de Melquisedec, rei de justiça e de paz, como o indicam o seu nome (hbr.: Rei de Justiça) e a cidade que governa (Salém). Dele não são lembrados os nomes do pai e da mãe, nem a genealogia, nem o tempo da sua existência. É figura de Jesus Rei Sacerdote que abençoa e permanece eternamente. É segundo o sacerdócio do Rei de Salém, sem genealogia, que o Sl 110,4 fala do sacerdócio do Messias, constituído abertamente Filho de Deus, no momento da sua ressurreição, segundo a interpretação profética que Paulo faz do Sl 2,7, em At 13,33. Em Abraão, até os descendentes de Levi pagaram o dízimo a Melquisedec. E, enquanto os sacerdotes pertencem à ordem sacerdotal em virtude de uma descendência, Cristo se torna sacerdote em virtude de um juramento: "O Senhor jurou e não se arrependerá" (Sl 110,4).
7,26-28. Jesus é o nosso Sumo-sacerdote, superior aos sacerdotes da terra, que precisam oferecer sacrifícios a cada dia. Ele o fez uma vez por todas para si e para nós. Mas, não mediante sacrifícios de animais, e, sim, "oferecendo-se a si mesmo" (v.27), o que redundou na sua perfeição e na nossa redenção. Jesus se tornou sacerdote, não por causa de uma descendência, e sim, por um juramento. É no "Filho eternamente perfeito" (v.28) que temos o nosso Sumo Sacerdote santo, inocente, imaculado, elevado no mais alto dos céus" (v.26).
            O sacerdócio de Jesus, além de ser lembrado como prerrogativa do Filho, em relação, portanto, à sua natureza humana que, por ele é glorificada, é lembrado em relação à redenção que realiza e celebra (2,17-18). A celebração é perpetuada entre os seus irmãos pelo Memorial que ele instituiu.
8-10. O tema central da Carta volta a ser citado para ser desenvolvido segundo mais outras prerrogativas que o sacerdócio de Cristo apresenta: ministro da verdadeira tenda (8), suprime o ‘santo’ e entra no Templo do céu com o seu sangue (9); é o Sacerdote da Nova Aliança (10).
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8,1 Tema Jesus é Mediador de uma Nova Aliança que oferece melhores promessas (8,6), porque ele é o Filho que “depois de ter realizado a purificação dos pecados” (1,3), “ se assentou a direita do trono da Majestade nos céus” .
8,2 Suas prerrogativas. Seu sacerdócio é segundo a ordem de Melquisedec. O juramento do Pai, no momento da sua ressurreição, no-lo revela exercido, agora, no céu (1-7). É ministro no verdadeiro santuário.
8,3-5 A Tenda e o sacerdócio levítico, com os seus sacrifícios e oferendas, eram figuras. O culto praticado no santuário da terra era cópia daquilo que era praticado no céu. Figura, portanto, profética do “Cordeiro imolado contemplado desde antes a criação do mundo” (1Pd 1,19-20)
8,6 O Filho, constituído sacerdote por juramento,estabelece uma Nova e Eterna Aliança, com melhores promessas.
            5a feira 2ª Semana TC Ano ímpar
            Reflexão (Hb 7,25-8,6)
                        O argumento, que o autor da carta aduz para exortar os fieis a se precaverem do desânimo diante de continuadas tribulações, é “Nosso Senhor Jesus” na sua condição gloriosa (13,20), merecida, contudo,pela imolação de Cruz (12,2).
            A condição peculiar de Jesus é ilustrada através de constantes comparações com a figura do sumo sacerdote na Antiga Aliança.
            Ao mesmo tempo, o autor da carta, enquanto oferece motivos de admiração pela pessoa de Jesus, apresenta exortações morais para que os fieis cheguem a viver a sua vida de fé na sua plenitude, única condição para usufruir da mediação que Jesus oferece em vista da nossa conquista da herança reservada aos santos. Devemos chegar a promover em nós a virtude da esperança porque ela é a âncora que podemos lançar além do véu e nos ganchar à mediação que Jesus oferece na condição de nosso Sumo Sacerdote (6,19-20).
            A primeira grande responsabilidade deriva do fato de que estamos no fim dos tempos, porque Deus, depois de ter falado muitas vezes e de muitos modos pelos profetas, nos últimos tempos nos falou pelo Filho. Esta condição de Jesus “que, em vez da alegria que lhe foi proposta, sofreu a cruz, desprezando a vergonha, e se assentou à direita do trono de Deus” (12,2) é ilustrada pelo Sl 2,7: “Tu és meu Filho, a ti eu constituo Dia”. Ele é o nosso Sumo-sacerdote segundo a ordem de Melquisedec (Sl 110,4).
            Eis a primeira exortação: “Não podemos negligenciar tão grande salvação” (2,3). A segunda exortação segue-se à apresentação de Jesus na condição de nosso modelo porque realizou em si os ideais do verdadeiro adão e mostrou qual é o caminho da perfeição que leva à gloria. Este é o nosso Sumo-sacerdote que revela ter em si os sentimentos do Deus misericordioso e que mostrou a fidelidade da qual a Bondade é capaz (2,17). Evitemos, portanto, a murmuração e o desânimo para não sermos excluídos da terra prometida
            Hb 5 intensifica a apresentação das características do nosso Sumo-sacerdote para que cresça a nossa confiança e vejamos nele o “motivo altaneiro da nossa esperança” (3,6). Foi tirado do meio dos homens, oferece o sacrifício pelos pecados, sabe compadecer-se porque circundado de fraqueza, intercede por si e pelos irmãos. Hb 5,5-10 descreve os sentimentos de Jesus, enquanto vivia a sua imolação aqui na terra.
            Hb 6  apresenta em todos os seus detalhes a vida dos fieis para que possam usufruir da mediação de Jesus. É “pela fé e pela perseverança que receberemos a herança das promessas” (6,12). Não basta a conversão, a graça do Batismo, a imposição das mãos, crermos na ressurreição dos mortos e no julgamento eterno (6,2; 9,27). Temos que crescer até “degustar a doutrina da justiça” (5,13). Sabendo, então, discernir entre o bem e o mal, seremos constantes se perseverarmos na tribulação.
            Hb 7 fortalece a nossa compreensão da grandeza de Jesus, enquanto mostra a  sua decisiva superioridade sobre o sacerdócio de Aarão e da tribo de Levi. Um sacerdócio recebido por juramento e eficaz.
            Hb 8 acrescenta mais outras prerrogativas. Jesus se tornou ministro da tenda armada pelo Senhor. Os sacerdotes da terra, enquanto oferecem suas dádivas, são cópias do culto que se realiza no céu. Basta lembrar que Moisés construiu a tenda de acordo com a “instituição divina recebida” (v.5) (Ex 25,40).

8,7-13 Jesus, mediador de uma Nova Aliança. Realiza-se a profecia de Jr 31,31-34.
Deus, na sua misericórdia, comprazido no Filho, o Amado, esquece todas as culpas praticadas sob a antiga Lei. Por Cristo é dado ao homem receber, pela graça da justificação, a adesão às palavras da pregação do Evangelho, segundo o Espírito. Pelo testemunho do mesmo Espírito, que está nele, tem certeza de possuir a verdade divina. Pelo processo de purificação e da observância dos mandamentos, em comunhão com os Apóstolos que lhe transmitiram a fé, pode chegar à condição de escolhido entre os chamados.
 O ministério de Cristo é superior, medeia uma aliança bem melhor, porque é dada uma Lei cujas prescrições, cumpridas, nos alcançam a santificação; nos fornecem bens melhores.
8,8 O profeta Jeremias a anunciou, enquanto denunciava o fracasso da Primeira Aliança.
8,10-12 Na sua misericórdia, Deus perdoará os pecados, inscreverá a sua lei nos corações dos fiéis, que “conhecerão o Senhor”. Deus amará tanto o mundo que entregará o seu Unigênito. Pela sua humanidade este será o Modelo e Princípio de santificação. O seu Espírito conduzirá o fiel à perfeição do conhecimento do Senhor.


            Hb 9 Jesus purifica “a nossa consciência das obras mortas para que prestemos culto ao Deus vivo” (v.14).

O autor da carta, não se cansa de encontrar motivos para mostrar a superioridade, quanto à condição de graça, que agora alcançamos em virtude do sacerdócio de Jesus. Começou a prová-la, deste ilustrando, inicialmente, a condição divina e a perfeição que alcançou pelo sofrimento (Hb 1-2). Aproximou  Jesus à figura do sumo sacerdote para mostrar como somente Jesus alcançou aquilo que os ritos que o sumo sacerdote pratica significam, mas não alcançam: “Jesus foi atendido por causa da sua submissão” (5,7)
A cada ano, o sumo sacerdote, antes de entrar no Santo dos Santos, "oferece sangue por suas falhas e pelas do povo" (9,7). Contudo, "tudo eram ritos humanos" (v.10) "sem eficácia para aperfeiçoar a consciência de quem presta o culto" (v.9). "Cristo, porém, veio como sumo sacerdote dos bens futuros...Ele entrou uma vez por todas no Santuário... com seu próprio sangue... para que prestemos culto ao Deus vivo" (v.11-14).
            Em relação a Moisés, é Mediador de uma nova aliança. Os que são chamados para ser a assembléia de Deus “recebem a herança eterna que foi prometida" (9,15).
            Hb 10 Por isso, Jesus é o Messias que quer realizar a vontade de Deus mediante o sacrifício da sua vida, em lugar dos holocaustos da Lei que não agradam a Deus. Pelo novo sacrifício substitui a Lei antiga com a Nova Lei, inscrita nos corações (Jr 31,31-34).
            "Pelo sangue de Jesus temos plena garantia de entrar no Santuário" (10,19). Celebrando o sacrifício de Cristo nas nossas assembleias, temos em Jesus "um caminho novo e vivo que ele mesmo inaugurou através do véu, quer dizer, através da sua humanidade”. A nossa celebração é presidida por um sacerdote eminente constituído sobre a casa da Deus. Nossa esperança volta a ser animada porque podemos nos estimular à caridade. Nossa vigilância será renovada "à medida que vemos o Dia se aproximar".
            Quem se omite em cultivar a fé e a perseverança, "calca aos pés o Filho de Deus, profana o sangue da Aliança, ultraja o Espírito da graça" (10,29). Deus não encontra nele mais nenhuma satisfação (v.38).

Reflexão
(Quando começamos a ler Hb 9, apresenta-se clara a ideia que o autor tinha do culto da A.A. Havia “um ritual para o culto e santuário terrestre”. “Naquele regime, apresentavam-se oferendas e sacrifícios sem eficácia para aperfeiçoar a consciência de quem presta o culto. Tudo eram ritos humanos referentes aos alimentos, às bebidas, às abluções diversas, impostos somente até o tempo da correção” (9, 9b-10).
            “Cristo, porém, veio como sumo sacerdote dos bens vindouros. Ele atravessou uma tenda maior e mais perfeita, que não é obra de mãos humanas” (9,11). Trata-se da sua humanidade (9,20). “Entrou, uma vez por todas, no Santuário... com o próprio sangue, obtendo redenção eterna” (9,12).
            “Eis porque ele é mediador de nova aliança. Sua morte aconteceu para o resgate das transgressões cometidas no regime da primeira aliança” (9,15). “Aqueles que são chamados recebem a herança eterna que foi prometida” (9,15).
Os descendentes de Abraão, isto é os que se tornam descendência do patriarca que acreditou e que Deus pode suscitar até das pedras, pela fé em Cristo, que nos justifica por graça, se tornam co-herdeiros. A justificação “aperfeiçoa a consciência de quem presta o culto” (9,9), “porque todos me conhecerão, do menor até o maior. Porque terei misericórdia das suas faltas e não me lembrarei mais dos seus pecados” (8,11b-12).
            À semelhança da Antiga Aliança, a Nova Aliança se fundamenta na Morte da vítima oferecida. É pelo seu Sangue que tudo é purificado e há a remissão dos pecados. Cristo entrou no Santuário do Céu uma vez por todas.
            Os que promovem a sua esperança dele receberão a salvação.

9,1 Na Antiga Aliança, o santuário e o ritual para o culto eram terrestres. Havia uma primeira tenda chamada Santo e, depois de um véu, uma segunda tenda chamada Santo dos Santos.
9,9 O fato de repetir sacrifícios na primeira tenda e de entrar a cada ano na segunda tenda, significa, como nos sugere o Espírito, que não se tratava de ritos definitivos.
9,10 Eram “ritos humanos referentes aos alimentos, às bebidas,às abluções” (Gl ).
9,11-14 Cristo, com o seu sacrifício, entrando, uma vez por todas no Santuário do céu, com o seu sangue, lá estando como mediador, é ministro dos bens vindouros.
9,15 Pela sua morte somos resgatados das transgressões que poderíamos cometer sob a Lei e postos em condição de herdar a herança prometida (aquela que, na fé, os nossos ancestrais viram de longe).
9,16-28 Moisés selou a Aliança com a proclamação da Lei e a aspersão do sangue. Cristo aspergiu com o seu sangue a realidade celeste e estabeleceu uma aliança eterna. Não repete mais o sacrifício. Realizou a purificação dos pecados, uma vez por todas, tendo alcançado a sua glorificação. Voltará para dar a salvação aos que o esperam.
9,24 Primeira prerrogativa do exercício sacerdotal de Jesus: intercede  “diante da face de Deus em nosso favor”.
9,25 Segunda prerrogativa: o faz uma vez por todas, a diferença do sacerdote da terra que entra a cada ano no Santo dos Santos.
9,26 Terceira prerrogativa: abole o pecado por meio do próprio sacrifício.
9,27 Quarta prerrogativa. Com a sua segunda vinda dará a “salvação àqueles que o esperam”
2ª feira 3ª Semana TC Ano ímpar
            Reflexão (Hb 9,15.24-28)
            O autor da carta, ao lembrar as narrativas didáticas do Êxodo acerca da tenda, onde se encontram reproduzidas as condições do templo de Salomão, consegue trasmitir a clara sensação de quão transitória era a condição dos ritos de tradição humana e de como, de fato, não conseguiam purificar as consciências dos homens. Chega até a sugerir um sinal do Espírito Santo na sala em frente ao Santo dos santos. Dá-se a realidade definitiva quando Jesus entra no Santo dos Santos, no Santuário do Céu, porque ocorre a purificação pelo seu sangue e as realidades futuras nos são oferecidas: “Disse o Senhor ao meu Senhor, senta-te à minha direita” (Sl110,1)... O Senhor jurou e não se arrependerá, ‘Tu és sacerdote eternamente segundo a ordem do rei Melquisedec’ (v.4).
            Estamos diante de ensinamentos, todos eles deduzidos como ensinamentos das Escrituras, interpretadas de forma muito pessoal, visando ilustrar a grandiosa realidade que Jesus o Cristo estabeleceu, na qual podemos colocar nossa confiança e pela qual podemos alimentar nossa altaneira esperança. Em Jesus, podemos ver o verdadeiro adão. A perfeição que ele alcançou pelo sofrimento e que lhe mereceu a glorificação nos anima na luta contra o pecado e no testemunho. A sua condição divina inspira a nossa confiança, porque ele é o Filho preposto sobre a casa de Deus que somos nós. Nele podemos reconhecer os traços do Sumo sacerdote que sabe compadecer-se e pode interceder por nós porque estabelecido na ordem sacerdotal por um juramento divino.

Hb 10 Com o seu sacrifício, Jesus estabelece o princípio da nossa glorificação (v.19)
       10,1-10 Superioridade do sacrifício de Cristo
10,1Na Lei temos as figuras dos bens futuros. Por isso, os sacrifícios provocam somente uma purificação legal. Não tiram os pecados. Não conseguem dar a partida a um processo de santificação naqueles que são chamados à perfeição.
10,2-3 Isto é comprovado pelo fato de que os sacrifícios eram continuamente repetidos. Exatamente por que ficava nos fiéis “uma consciência dos pecados”.
10,4 De fato, o sangue dos animais não pode eliminar os pecados.
10,5-10 É o Filho, Jesus, que diz ao Pai que veio, disposto a realizar o sacrifício de expiação, na submissão. Ab-rogado o regime da Lei, pela oferenda do seu corpo, Jesus, realiza, uma vez por todas, a redenção.

3ª feira 3ª Semana TC Ano ímpar
            Reflexão (Hb 10,1-10)
            É desde Hb 5 que o autor da carta ilustra o sacerdócio de Cristo, comparando-o ao sacerdócio da Antiga Aliança. A aproximação com a figura do sumo sacerdote, tirado do meio dos pecadores, que precisa oferecer sacrifícios também para si, consegue nos fazer entender quanto Jesus é misericordioso. Em Hb 7, ao ilustrar a superioridade do sacerdócio de Cristo evocando a figura de Melquisedec do Sl 110, nos faz ver quanto ele é eficaz na sua mediação em nosso favor. Em Hb 9, ao detalhar os elementos que estão na tenda, chega a nos dizer que tudo era figura, para enfim nos dizer, com o texto de hoje, que o rito da purificação dos pecados era vão, porque o sangue de bodes e carneiros não cancela os pecados.
            Com a citação do Sl 40, hoje, sintetiza tudo o que vem explicando desde o início: Jesus é o Filho. Em virtude da sua condição divina que realiza a purificação dos pecados. A sua imolação agrada a Deus porque Ele é o verdadeiro Adão que vive, no corpo que assume, o reconhecimento da dependência da criatura do seu Criador até a imolação.
            Este é o Modelo que deve nos inspirar para nos aliviarmos de “todo fardo (desânimo) e do pecado que nos envolve (tentação de apostatar)” (12,1) e viver na perseverança para chegar a possuir “um senso moral exercitado”. Então nos teremos transformado na casa do Filho, dela constituído por Deus ministro, porque estaremos mantendo “a confiança e o motivo altaneiro da esperança” (3,6).


         10, 11-18 Superioridade do sacerdócio de Cristo
10,11 Realizada a redenção, Jesus, entronizado, estabelece o princípio de santificação, pelo qual os fiéis podem chegar a ser perfeitos como é perfeito o Pai que está no céu.
10,15- O atesta o Espírito Santo: com a Nova Aliança, Deus inscreverá as suas leis nos corações dos fiéis, esquecido dos pecados e iniquidades de outrora.
10,18. Perdoado o pecado, “já não se faz mais a oferenda por ele”.
         10,19-25 O Caminho novo
10,19-20. Na humanidade de Cristo, que conheceu o caminho da glorificação, está o princípio da nossa santificação.
            10,19 Sendo assim, irmãos, temos a plena garantia para entrar no Santuário.
10,21. Nós somos o novo templo que Deus construiu. Cristo Jesus o preside, na condição de Filho, para levar à herança os que guardam de forma altaneira o motivo da sua esperança (3,).
10,22. A purificação dos pecados é aquilo que primeiramente devemos fazer.
            10,22...o coração purificado de toda má consciência.
10,23. Vivamos a perseverança nos sofrimentos, segundo a virtude da constância. Creiamos na fidelidade de quem fez a promessa.
            10,23... Afirmemos nossa esperança.
            10,24-25. Pelo cultivo da Palavra, exortemo-nos uns aos outros, quando celebrarmos a Liturgia dominical; animemo-nos (Cl 3,16) enquanto, na vigilância esperamos nos unir àquele por quem nos alegramos nos sofrimentos. Ele é capaz de nos socorrer, tendo sido tentado por primeiro. Ele nos consolará (Ap 3,8), conhecendo a nossa fraqueza.
            10,24... Estimulemo-nos às boas obras.
            10,25... Não deixemos as nossas assembléias.
            10,26... Aguardemos vigilantes o Dia do Senhor.

        10,26-31 O castigo para os que apostatam, tomados pelo desânimo
Se, por causa do desânimo, cairmos na apostasia, seremos devorados pelo fogo de Deus, por termos crucificado novamente a Cristo e “ultrajado o Espírito da graça”.
        10, 32-39 Motivos para levantar os ânimos
10, 32-39. Arenga. Lembrem quanto de sofrimentos já viveram. Perseverem até o fim, sem esmorecer. Sejamos homens de fé “para a conservação de nossa alma”. Pelo anúncio da Palavra, o Espírito os levou à conversão. Experimentamos, então, pelo Batismo, a Luz-Vida, através dos dons da fé, da esperança e da caridade. Chegamos ao ponto de nos tornarmos os eleitos, em virtude do testemunho, “debaixo de injúrias e tribulações” e da assistência que prestamos aos que estavam na prisão. Experimentamos, até, a alegria do Espírito Santo quando, espoliados dos nossos bens, estávamos “certos de possuir uma fortuna melhor e mais durável”. Por que perder a recompensa, cedendo ao esmorecimento? Se o justificado esmorecer, Deus não encontrará nele “mais nenhuma satisfação”. “Nós não somos desertores, para a perdição. Somos homens da fé, para a conservação da nossa alma”.
            10,32 Lembrai-vos, contudo,.. É como se o autor dissesse: “Esqueçam o que falei dos castigos que acometeriam que abandonasse a fé, desiludido com ela. Lembrem a consolação que experimentaram quando a abraçaram e de quanto foram capazes em suportar dolorosos combates, as injurias, as perseguições e com que caridade assististes os que estavam presos. Aceitastes até a espoliação dos seus bens, na convicção que a fortuna adquirida era bem melhor e mais durável.
10,35 Não percais, pois, a vossa segurança. “É de perseverança que tendes necessidade” (v.36), porque a vida de fé se realiza, não enquanto sentimos satisfação porque ela nos dá o retorno, segundo uma expectativa humana, mas enquanto cumprimos com a vontade de Deus. O homem vive segundo esse tipo de fé. Se ele esmorece, Deus não encontrará nele satisfação alguma.
                        Comentário. – Por esse trecho, chegamos a definir os destinatários da Carta. Notamos, também,que há um paralelismo com 1Ts. Há perseguições por parte dos judeus. Os tessalonicenses as suportam com ânimo. Os instruiu Paulo que aprendeu o valor da vida do Crucificado e que sabe que tal vida produz vida nos outros, é princípio de glorificação e condição de perfeita evolução no adão redimido. A comunidade de origem judaica não reage da mesma forma. É tomada pelo desânimo. Trata-se de uma comunidade de famílias da tribo de Levi que serviam no templo e que, agora sentem o peso da pobreza, das humilhações e das perseguições.


          Tema O sacerdócio de Jesus

            O autor da carta, por duas vezes, afirma categoricamente que Jesus não pode ser considerado sacerdote em relação à Lei hebraica. Somente os descendentes da família de Aarão e a tribo de Levi serviam no templo. Jesus era da tribo de Judá. A sua imolação é, sobretudo, expressão do culto que a criatura eleva ao Criador. Por ela, Jesus chega à perfeição, o que permite ao Criador torná-lo partícipe da sua Glória. Em virtude da sua condição divina, a participação na Glória é de tal forma plena que Paulo diz: “Nele habita corporalmente a plenitude da divindade” (Cl 2,9). Ascendido à Glória, Jesus é “estabelecido Filho de Deus com poder, em Espírito de santidade” (Rm 1,4). É o momento em que Deus Pai declara “Tu és meu Filho, eu hoje te gerei” (Sl 2,1), respondendo às suas súplicas feitas ao longo da sua vida na terra. A condição definitiva de Filho e Sacerdote tem seu fundamento naquilo que Jesus, ao entrar no mundo diz ao Pai: “Não foram do teu agrado os sacrifícios da Lei, eis-me aqui, -no rolo do livro está escrito a meu respeito- eu vim ó Deus, para fazer a tua vontade” (10,7). O Filho que teve sua origem por obra do Espírito Santo, que oferece a sua vida em sacrifício, vê sua condição divina e sacerdotal manifestada quando chega à perfeição pela graça que Deus lhe concedeu de “provar a morte em favor de todos os homens” (2,9). O autor da carta, todavia, lembra que Jesus foi chamado ao sacerdócio por Deus, à semelhança de Aarão, o que lhe permitiu assumir as mesmas funções do sumo sacerdote, em relação ao povo, porque assim reconhecido por Deus ao entrar no Céu, “realizada a purificação dos pecados” (1,_). Foi, então, que manifestou ser um sacerdote “misericordioso e compassivo”, capaz de se compadecer com aqueles que são tentados, porque ele o foi por primeiro.
            O sacerdócio que Jesus exerce no céu resulta ser superior ao sacerdócio que o mesmo Deus instituiu ao chamar Aarão para a função de oferecer sacrifícios e interceder pelo povo. É superior porque é “segundo a ordem de Melquisedec” e extingue, por isso, o sacerdócio da Antiga Aliança; porque é eficaz, uma vez que a purificação dos pecados acontece em virtude da aspersão do seu sangue, e eterno, porque ele é aquele que “levado à perfeição” vive eternamente (Hb 7). A profunda semelhança de Jesus com o sumo sacerdote quando oferece o sacrifício de expiação (5,3), torna a figura, uma valiosa explicação do sacerdócio de Cristo. Cercado ele mesmo de fraqueza, coisa que lhe permite compreender os irmãos quando erram por ignorância, oferece o sacrifício tanto para si quanto pelo povo. É aquilo que Jesus fez. Sabe, todavia, se compadecer dos pecadores muito mais do que o sumo sacerdote ao oferecer os sacrifícios, porque ofereceu a sua vida de forma eficaz, alcançando a redenção, ao mesmo tempo em que alcançava para si a perfeição. Quem exerce o seu sacerdócio na Tenda do céu é um Sumo-sacerdote “tornado perfeito”, que entrou no Santuário atravessando o véu de uma vez por todas. Também, quando rezava para si, não era em vista da remissão dos seus pecados. Embora cercado de fraqueza, ele não conheceu o pecado. Precisava rezar para subtrair, de forma definitiva, a natureza humana assumida da condição definitiva de poder ser tentada pelo diabo. Nisto foi atendido. Ele é, agora, no céu, o Sumo-sacerdote eminente, o Filho de Deus, que lá entrou pelo véu do seu corpo, com o seu Sangue e intercede por nós. “Oferecido uma vez por todas para tirar os pecados da multidão... aparecerá uma segunda vez, com exclusão do pecado, àqueles que o esperam, para lhes dar a salvação” (9,28).
            A condição sacerdotal de Jesus é o tema no qual o autor mais se estende para ilustrar a novidade dos últimos tempos. O Filho, pelo qual Deus nos fala e que se revelou de condição divina pela sua glorificação, que explicitou o sentido da sua Morte, pela ressurreição, encontra, na figura do sumo sacerdote, a mais valiosa ilustração. Essa condição pode ser, inicialmente, apresentada através do homem em que se tornou Jesus e que chegou à perfeição pela graça da sua Morte redentora. Nesse caso, eis que Jesus aparece como o Sumo sacerdote misericordioso e fiel, que sabe se compadecer daqueles que são tentados. Esse aspecto é desenvolvido ao considerar o caminho que a humanidade de Cristo percorreu para ser poupada da morte, enquanto realizava a purificação dos seus irmãos: perfeição da caridade em todos os aspectos; manifestação da Glória no Filho do Homem.
            Através das palavras do Sl 110, o autor viu que se podia explicar a superioridade do sacerdócio de Cristo, a sua condição eficaz e eterna (Hb 7).
            Hb 8 e 9 aponta para a superioridade do sacerdócio de Jesus ao lembrar que a tenda na terra era figura da Tenda no céu, na qual Cristo entrou como Sumo Sacerdote com o seu sangue, realizada a purificação dos pecados uma vez por todas.
            Hb 10 mostra Jesus no exercício do seu sacerdócio, que se revela superior ao sacerdócio da Lei, porque a oferta que faz de si agrada a Deus, em virtude da sua obediência (o que nos faz remontar ao sacrifício criatural e vê-lo como fundamento da ordem sacerdotal).
            Temos um eminente sacerdote que Deus constituiu acima da sua casa (10, ). “Esta casa somos nós se mantivermos a confiança e o motivo altaneiro da nossa esperança” (3,6). Reconhecemos que o fim de Hb 2 e o início de Hb 3 é a síntese do tema sobre o sacerdócio que a carta desenvolve e pelo qual o autor quer ilustrar a novidade do Filho que nos fala “nos últimos tempos que são os nossos” e a sua eminente condição: sentou-se acima dos céus à direita da Majestade, tão superior aos anjos quanto é o nome que herdou.
            A argumentação é o válido fundamento da exortação. Consegue até nos conscientizar sobre a grave obrigação moral de prestar atenção a Deus que nos fala.

Tema: O nosso sacerdócio
            Quando Jesus entra no mundo se apresenta diante de Deus na condição de quem vai se substituir às vítimas oferecidas pelos judeus sobre o altar do sacrifício no templo. A sua imolação agrada a Deus enquanto vive a sua obediência e o reconhecimento, na condição de verdadeiro adão, da sua dependência do Criador. Quando, portanto, entra no santo dos santos, no céu, tendo vivido o seu sacrifício pela morte cruenta na Cruz, porque consagrado pelo Pai por um juramento que o torna Sumo Sacerdote, asperge com o seu Sangue as realidades do céu. Pela sua intercessão eficaz, recebemos a justificação. O caráter com que o Espírito nos configura a Cristo, além de nos tornar participantes da sua realeza e do seu espírito profético, pelo qual estamos em condição de ouvir e acolher a Lei de Deus, nos configura a Cristo sacerdote. Em virtude do sacerdócio batismal, à semelhança do Novo Adão, pela obediência e reconhecimento da nossa dependência que nos leva à prática dos mandamentos de Deus, podemos oferecer “nossos corpos como vítima espiritual agradável a Deus” (Rm 12,1), perpetuando o nosso sacrifício enquanto, procuramos realizar tudo o “que é bom, agradável e perfeito” (ibid.).
            Aos que Jesus chama é dado, pela imposição das mãos do Presbitério, isto é, enquanto é constituído membro da hierarquia sacerdotal, que, em primeiro lugar, o leva a viver o compromisso do responso pela interpretação das Escrituras, consagrar ao longo da celebração da Eucaristia, após ter exercido a sua função mistagógica. A ordem sacerdotal o torna superior, em grau, quanto à configuração de cada fiel a Cristo sacerdote, porém, somente naquilo que é condição de poder consagrar. Sob este aspecto, o presbítero participa, da fato, do sacerdócio de Cristo. Ela é, todavia, participação de quem é constituído ‘ministro”. Sua característica precípua, portanto é aquela de ser um serviço de quem foi chamado para administrar, depois  devida preparação, o que Jesus instituiu.

            O fiel é correto quando reconhece no padre esta condição sacerdotal. Deve, contudo se preocupar, sobretudo, em viver o seu sacerdócio batismal para que a função ministerial do padre não ande frustrada. De fato, ambos, fiel e padre, devem lembrar que o que agrada a Deus é o respectivo sacrifício espiritual que se realiza quando cada qual vive a sua específica vocação dentro da Igreja.

Exegese 11-13

 A verdadeira fé

            Hb 11 se abre com uma definição da fé que tem o seu comentário nas figuras que serão posteriormente citadas. Estamos diante de uma forma de vida sugerida pela reflexão apostólica. O mundo não tem essa concepção (v.7). Preocupa-se com a conquista de bens que respondem às exigências da vida que conduzimos na terra: as cidades (Caim); as artes (Jubel), as indústrias (Tubalcaim), os prazeres (Noema), o poder (Lamec). A fé, pelo contrário, se preocupa com aquilo que Deus revela, que deve ser conquistado com o exercício das virtudes que o Espírito promove, a partir do culto àquele que se revela o Criador e da sua procura seja pelo culto como pelo serviço. Isto nos é ensinado pelas figuras de Abel e Enoc, no contexto das suas narrativas. Morrer injustiçado, por causa de atos que agradam a Deus, significa superar a morte por parte de quem mostrou de estar em comunhão com Deus. O sangue de Abel fala até o tempo presente. Nos garante que no homem de Deus há um testemunho que não se esvai com a morte física. O justo alcança a recompensa do Deus que procurou na terra. O mesmo nos é ensinado por Enoc do qual até se canta que foi arrebatado ao céu para não conhecer a morte. Ele é da descendência dos patriarcas que invocavam o nome de Iahweh. Com palavras de exaltação a sua fé é proclamada e a recompensa por parte de Deus, porque o procurou. Noé, é o justo que encontra graça diante dos olhos de Deus. Prova, até, ser digno da predileção de Deus, porque crê. Nele podemos apreciar quais benefícios traz a fé, uma vez que por ele a humanidade foi salva, e qual a efetiva recompensa que Deus concede ao homem de fé: a vida, para si e para a sua família. Quando pensamos que era figura de Cristo, podemos ainda mais avaliar os benefícios da fé. Jesus, na fé, acreditou que o Pai podia salvá-lo da morte. Superada a tentação, seu espírito se abriu a uma esperança que lhe dava, antecipadamente, a posse dos bens futuros e a certeza deles. O Espírito nele dava testemunho e a sua morte foi uma ação de graças até entrar na Glória.
            A fé, por uma vivência consagrada à procura de Deus para servi-lo, que chega à certeza de uma recompensa para quem o serve com fidelidade, é o valor que as Escrituras nos ensinam.
            Para explicar como devemos viver a fé e nela perseverar, o Autor nos diz que devemos procurar o Deus da história. Chegamos então a entender que "o mundo foi organizado pela Palavra de Deus... não tem sua origem em coisas manifestas" (v.3). Ela provoca "um bom testemunho" (v. 39), quando vivida na perseverança nas tribulações: "uma posse antecipada do que se espera, um meio de demonstrar as realidades que não se vêem" (v.1).

11,1 A intricada definição do que é a fé, que aqui encontramos, é explicitada pela apresentação da fé de homens santos. Abraão e Moisés são os tipos que mais esclarecem o seu conceito. Animados por uma confiança inabalável no Deus que lhes aparecera, superaram todas as provações. Com isso a sua adesão incondicional se tornou sempre mais inabalável. Paulo explica que, quando a justificação que ela vai promovendo, enquanto supera as provações, transborda em manifestações de amor a Deus, até ser coroada por uma esperança que nunca vacilará (Rm 5,5). Ter fé significa, portanto, possuir, na expectativa que seja revelada, a verdade, à qual damos uma adesão incondicional, por ser o argumento do que não se vê.
11,2 Os ancestrais dos hebreus revelaram sua fé no seu Deus, que neles se agradou, pelo testemunho que deram da mesma.
11,3 O primeiro testemunho da sua fé foi acerca do seu Deus, que professaram criador de tudo.
11,4 Abel, que é o tipo da descendência que Deus suscita, teve o seu sacrifício aceito a preferência do de Caim, a descendência rebelde. O sangue dele ainda a proclama.
11,5 Pela mesma fé, Henoc, teve o reconhecimento de Deus, que o exaltou. A fé que Deus concede é condição para agradar a Deus.
11,6 Ela, contudo, deve testemunhar, acerca do Deus de Israel, que ele é o Criador de tudo, e deve crescer mediante a sua procura. A fé é um aspecto da vida divina, alcançada pela adesão à Palavra anunciada. Diz respeito, mais diretamente às verdades que, procuradas, promovem a posse de Deus quando testemunhadas.
11,7 No caso de Noé, a fé foi confiante adesão àquele que se revela, até dele dar  testemunho. Sua justicação ficou assim promovida.
11,8 Abraão, Isaac e Jacó são os tipos que nos mostram o sentido da nossa esperança. Foram chamados para possuir a terra. A sua esperança, contudo era orientada a uma pátria que a terra simbolizava. Na sua fé a viram de longe. “É por isso que Deus não se envergonha de ser chamado o seu Deus. Pois, de fato, preparou-lhes uma cidade” (v.16).
11,17 O sacrifício de Isaac leva à perfeição a fé de Abraão. Sabe que o seu Deus, que já lhe deu uma descendência contra toda esperança, é capaz de lha dar de novo ressuscitada.
11,20 Foi segundo essa fé que viveram Isaac e Jacó.
11,23 Moisés repete na sua vida a atitude de Abraão. A sua fé já tem um precedente na fé dos pais que o escondem do faraó. É figura de Jesus. Prefere abraçar a tribulação do seu povo, “olhos fixos na recompensa”. Ele considerou a humilhação, à semelhança de Cristo, condição de uma riqueza melhor. A fé o tornou destemido “como se visse o Invisível”. Na fé, celebrou a páscoa, marcou as casas dos hebreus com o sangue, atravessou o Mar Vermelho.
11,30 A história de Israel é toda ela uma ilustração do que a fé pode. Por ela cremos no Criador e na recompensa que nos dará. Dela falam as muralhas de Jericó, Juízes, reis e profetas.
11,35 Outros, embora mortos, chegaram a uma ressurreição melhor. Os que sofreram hostilizados pelo mundo provaram que o mundo não eram digno deles.
11,39 Mereceram, pela perseverança, ter em si o testemunho da promessa, embora não vissem a sua realização.
11,40 Deus estabeleceu que lá chegassem conosco, tendo-nos destinado para algo melhor. É a abertura da exortação de Hb 12.


12,1-4
            O Autor da Carta, mais uma vez, exorta: “Considerai, pois...” (12,3). Os fiéis devem se motivar a perseverar no testemunho diante do modelo de fé dos que, pela perseverança, alcançaram a virtude da constância que, por sua vez, neles promoveu a esperança, a ponto de verem coroada a sua caridade pela alegria que os associou aos sentimentos de Jesus Cristo na sua Paixão (Rm 3-5). Motivação, também, é o próprio exemplo de Cristo que não titubeou em abraçar a Cruz, considerando vergonhoso acovardar-se. O que lhe mereceu sentar-se “à direita do trono de Deus” (12,3). Vitorioso é aquele que supera o desânimo e, consequentemente, supera a tentação da apostasia, tendo-se tornado imitador “daqueles que pela fé e pela perseverança recebem a herança da promessa” (6,12). Em Jesus encontramos aquele que pode compadecer-se porque sofreu por primeiro e, na condição de “autor e realizador da fé” (12,2), nos alcançará “misericórdia e graça no tempo oportuno” (4,16).
12,1... Tal nuvem de testemunhas ao nosso redor. A fé dos Patriarcas, dos Juízes, dos Profetas, dos mártires, dos confessores, projeta sobre nós a luz da Nuvem, que é o Espírito, que nos ajuda a entender “o autor e realizador da fé, Jesus”.
12,1... Rejeitando todo fardo O desânimo, deve ser superado, com o cumprimento dos mandamentos do Senhor, “que não são pesados porque nos permitem vencer o mundo (1Jo 5,3-4).
12,1... e o pecado que nos envolve A tentação da apostasia está sobre os que vivem desanimados, como o pecado estava sobre Caim (Gn 4,7).
12,1...corramos com perseverança para o certame É a figura do lutador que se lança no combate. A perseverança torna vitoriosos.    
12,2... Jesus deve ser o nosso modelo.
12,2... O autor e realizador da fé, diante da alegria que lhe foi proposta, sofreu a cruz, desprezando a vergonha, e se assentou à direita do trono de Deus. Essa frase é a síntese de Hb 2, relacionado a Hb 1: o homem Jesus é o Filho glorificado porque levado à perfeição pelo sofrimento.
12,3 Jesus suportou o ódio do mundo. A sua atitude deve nos levar a superar o desânimo que as perseguições provocam.
12,4 Aquele que persevera até o fim, esse será salvo.
            Comentário – Esse texto complementa Hb 10, 19-26. O desânimo, portanto, pode ser combatido: 1o) contemplando a figura gloriosa do Nosso Sumo-sacerdote  que entrou no céu com o seu Sangue. Deus quis “levar à perfeição o Autor da nossa salvação pelo sofrimento”; 2o) considerando o “reino inabalável que recebemos como herança” (12,28); 3o) tomando consciência da necessária implementação dos mandamentos de Cristo e da purificação; 4o) vigiando na expectativa do Dia do Senhor.
12,5-15. O sentido da provação.
            À purificação dos pecados (1Jo 1,7; 3,2-3) diz respeito a obrigação de “resistir até o sangue no combate contra o pecado” (Hb 12,4).
            No sofrimento temos que reconhecer a ação de Deus que educa, como um pai, porque ama. Age com sabedoria, para nos comunicar a sua santidade, porque ele é o Deus dos espíritos que criou. Frutos finais é a caridade coroada pela esperança. A paz e a justiça são os seus sinais.
            O Novo Adão é nosso modelo. O próprio autor e realizador da fé (12,2; 5,8) foi levado à perfeição pelo sofrimento (2,10): entre clamores e lágrimas, o Filho foi atendido, salvo da morte (5,7-8).
4ª feira 4ª Semana TC Ano par
Reflexão (Hb 12,5-15)
            Olhos fixos em Jesus e lembrados do exemplo de vida de muitas testemunhas, quais as lembradas em Hb 11, acatemos mais uma motivação contra o desânimo: a tribulação é permitida pelo “Pai dos espíritos a fim de vivermos” (12,9). De fato, chega à posse definitiva da herança aquele que comunica com a santidade de Deus (v.10), que, por si, é alcançada quando não amamos o mundo (1Jo 2,15). Precisamos cultivar a fé, promovendo em nós os dons do Espírito, a partir do entendimento, para que, pelo conselho, cheguemos, em espírito de fortaleza, a dar testemunho. Desabrocharão, então, em nós, os frutos do Espírito, a partir da alegria que só experimentam aqueles que, como Paulo, chegam a viver associados a Cristo na sua Paixão. O fiel, por este caminho, alcança a paz, oferecida aos Apóstolos no dia da Ressurreição, e a consequente condição de justiça.
            Se temos a condição de tudo realizar fora das tribulações graves de uma provação, apliquemo-nos na conquista da fé e da esperança, até desfrutarmos de uma caridade plena para que, quando chegar o momento do testemunho, não nos extraviemos (v.13).

12,18-24 Mais uma exortação. O Deus do qual nos aproximamos, não é mais aquele descrito pela teofania do Monte Sinai (vv. 18-21). É o Deus da Jerusalém celeste, cantado por milhões de anjos, aos quais vão associar-se os perfeitos, os que Deus escolheu para si: “os espíritos dos justos que chegaram à perfeição” (v.23), porque viveram a aliança que Jesus estabeleceu com a sua imolação. Descreve-a a metáfora da purificação pelo sangue que, na verdade, representa o que Jesus mereceu por nós, a purificação dos pecados (vv. 22-24).

           
Objetivo final da luta contra o pecado é a Paz e a Santificação.

12,25Prestai atenção para não deixar de ouvir aquele que vos fala! É a exortação que acompanhou a carta toda. A palavra de Deus continuamente meditada é altamente motivadora porque relembra as obras de Deus que manifestam o seu poder, o que é motivo da nossa confiança nele. Ela evitará que nos tornemos indóceis e pequemos pela nossa incredulidade (3,19). Israel foi castigado porque não prestou atenção. Com maior razão, o seremos nós, por recusarmos a “grande salvação” que Deus, pelo Filho (1,2), no Espírito (2,4), nos propõe.
12,26a Ele, cuja voz um dia abalou a terra. Aquele que nos fala, para a nossa salvação é Aquele que, pela sua voz poderosa, já abalou o Monte Sinai (vv. 18-21).
12,26b-27 Agora proclama: Ainda uma vez abalarei não apenas a terra, mas também o céu A terra e o céu serão abalados (linguagem escatológica). Tudo desaparecerá, subsistindo somente “o que é inabalável”, o Reino que somos chamados (9,15) a herdar com o Filho, “contanto que mantenhamos firme até o fim a nossa confiança inicial” (3,14). “Não negligenciemos tão grande salvação” (2,3). Do contrário, não escaparemos do fogo abrasador de Deus.
12,28b Com submissão e temor, sirvamos ao Pai dos espíritos (12,9), olhos fixos naquele que sofreu a cruz (v.2), sem nos deixar fatigar pelo desânimo (v.3).
12,29 Pois o nosso Deus é um fogo abrasador. O Deus que fez cair mortos os israelitas no deserto nos consumirá pelo fogo, se nos desviarmos, cedendo à tentação do pecado que nos envolve (v.1)



13,1 O autor especifica os compromissos do caminho ascético da nossa purificação que deve ser conduzida para que os fiéis mantenham o ardor inicial da caridade, pela posse de um “senso moral exercitado para discernir o bem e o mal” (5,14), levados, dessa forma, em espírito de discernimento “ao pleno conhecimento da vontade de Deus” (Cl 1,9). Para isso, cita o último elemento para chegar à caridade, segundo 2Pd 1,5-10: o amor fraternal.
13,2. O amor fraterno é vivido, de forma prática, pela prática da hospitalidade,
13,3 pela atenção aos prisioneiros, por causa da fé; eles são a nossa carne.
13,4 pela fidelidade no matrimônio, figura das Núpcias de Cristo crucificado com a sua Igreja. A desordem moral, pela fornicação e pelo adultério, desestrutura a relação de caridade com Deus.
13,5 A cupidez do ouro, que é uma idolatria, também, deforma a vida de caridade. Uma vez garantida a segurança material, temos que confiar no Senhor e nos preocupar com o Reino.
13,7 Os dirigentes que anunciaram a palavra, na condição dos que deram continuação àquilo que o Senhor iniciou (2,3), são merecedores de imitação, sobretudo se considerarmos “como terminou a vida deles”. São Paulo é um exemplo, com Barnabé, Epafra, Timóteo e Tito. Paulo era fabricante de tendas, mas sua verdadeira riqueza era a Palavra, o Mistério de Cristo.
13,8 O patrimônio que eles nos transmitiram é o Evangelho que deve permanecer inalterado. O Cristo de hoje deve ser aquele que os Apóstolos pregaram e que deve permanecer para sempre.
13,9 As doutrinas dos que pregam coisas estranhas à nossa fé, devem ser descartadas: “Todo o que avança e não permanece na doutrina de Cristo não possui a Deus” (2Jo 9). O nosso coração somente é fortificado pela Graça: “os alimentos nunca foram de proveito para aqueles que disso fazem uma questão de observância”.
6ª feira 4ª Semana Ano ímpar
            Reflexão (Hb 13 1-9)
            Temos que acrescentar ao texto da liturgia o v.9, que explica o v.8. Dessa forma notamos um paralelismo do Autor quanto ao conteúdo moral da sua exortação com Pedro, 1Jo cujos autores refletem a doutrina de Paulo (1Ts; Gl).
            A cupidez do ouro, que Paulo chama de idolatria, merece uma atenção particular, uma vez que desvia a atenção do fiel, quanto à sua preocupação com o Reino (Mt; Lc), o qual tem que ter a ambição de pregar (Ef 6,14-17).
            Em relação ao v. 8, ilustrado pelo v. 9, devemos lembrar o ensinamento de 1Jo 2,18-28; 4,1-6; 5,11-13.

13,10 A verdadeira vida de fé, na caridade. Nos nutrimos da Carne da vítima de um altar que difere do altar sobre o qual é oferecida a vítima da qual se alimentam os que servem à Tenda.
13,11 A vítima da qual nos nutrimos é aquela que oferece o sangue ao Sumo Sacerdote, cujas carnes são queimadas fora do acampamento.
13,12 Jesus realizou essa figura ao sofrer do lado de fora da porta. É a Vítima cujo Sangue santifica.
13,13 Os que reconhecem a verdadeira vítima, qual Lv 19,27 indica: “Jesus que sofreu a Cruz, desprezando a vergonha” (12,2) e o reconhecem como “Caminho novo e vivo” (10,20), “carregando a sua humilhação”...
13,14 ...estão a caminho da “Cidade permanente ... que está para vir”, porque temos, naquele que realizou as figuras dos sacrifícios das vítimas e do sumo sacerdote que a cada ano oferecia o sacrifício de expiação, nos proporcionando o Espírito da Graça, “a plena garantia de entrar no Santuário, pelo seu Sangue” (10,19).
13,15 Ele é o sacrifício de louvor com o qual Deus se agrada e pelo qual nos nutrimos de verdade.

            Sábado 4ª Semana TC Ano ímpar
            Reflexão (Hb 13, 10- )
             Reflexão A mediação de Cristo Sumo Sacerdote, Senhor da Igreja e o compromisso de fé do fiel, chamado a cultivar a confiança e a esperança para se tornar merecedor da herança eterna

            Para o autor da carta, Jesus era, na condição de Sumo Sacerdote, qual ilustrado através da comparação com o sumo sacerdote da religião judaica, uma motivação válida para reagir contra o desânimo no qual os fieis estavam para cair, cansados de tantos sofrimentos provocados por infindas tribulações. Vemos que, nisto, se esmera, apresentando-o, logo de início na sua mais alta dignidade. Ele é o Filho. Para isto cita as palavras do Sl 2, exclamando : “A qual dos anjos jamais disse: “Teu és meu Filho eu hoje te gerei”? Junto cita, também, o Sl 110: “Jurou o Senhor e não se arrependerá: “Tu és sacerdote para sempre segundo a ordem do rei Melquisedec. Senta-te à minha direita para que ponha teus inimigos debaixo dos teus pés”. Junto com estes dois salmos cita, também, mais outros para lembrar a condição divina de Jesus.
            Bastariam estas considerações para não negligenciarmos a grande salvação que ele nos oferece.
            O autor da carta, contudo, oferece a consideração acerca da perfeição à qual Jesus chegou pelo sofrimento, segundo a sua condição de verdadeiro adão.
            À luz da condição divina e da perfeição alcançada pelo sofrimento que nos mereceu a redenção, desde o fim de Hb 2, pode nos apresentar Jesus como o Sumo Sacerdote, misericordioso e fiel, que pode compadecer-se conosco por ter ele passado por primeiro pelos sofrimentos, necessários para chegarmos à glorificação. Quando chega a esta primeira conclusão, o autor da carta já pensa em Jesus como o realizador da figura, portanto, possuidor de um sacerdócio verdadeiro capaz de purificar com o sangue de uma vítima aceita por Deus em sacrifício. Apresenta-o, então, como o Filho colocado por Deus como ministro da sua casa, que “somos nós, se mantivermos a confiança e o motivo altaneiro da nossa esperança” (3,5). A superioridade de Jesus, em relação ao sumo sacerdote da lei Judaica, vai sendo, então ilustrada com a figura de Cristo que “na sua vida mortal, ofereceu clamores e lágrimas a Deus Pai, e foi atendido por causa da sua submissão (Hb 5). Em relação ao sacerdócio de Aarão, também, Jesus é superior, embora ele tinha chamado ao sacerdócio como ele (Hb 7). Tudo aquilo que se diz da tenda e dos objetos que nela devia estar, não passa de figuras (Hb 8), como, também, os sacrifícios de animais que não podiam purificar a ninguém com o seu sangue (Hb 9).
            É o Filho que ao entrar no mundo, realiza a redenção (Hb 10): passa, uma vez por todas, através do véu do seu corpo e entra no Santuário do Céu com o seu Sangue e intercede por nós.
            Jesus que desprezou a ignomínia para entrar na glória deve ser o nosso Modelo e inspiração. É ele que nos torna capazes de resistir até o derramamento do sangue.

            O motivo para ver desfraldar esta bandeira é a consciência que o autor da carta tem da seriedade do nosso compromisso com a fé que abraçamos. Quando meditamos o Sl 95, somos admoestados para não desanimarmos para evitar chegarmos atrasados para entrar no “repouso prometido”. Os fiéis têm que se engajar e ser fiéis na frequência às assembléias dominicais, para que, motivados pela Palavra, nutram a sua confiança e promovam a sua esperança até lançá-la, qual âncora além do véu, onde está Jesus na condição de Sumo Sacerdote que pode nos alcançar a graça da perseverança no tempo oportuno.






























                                                                                              







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