Carta aos Romanos

Carta aos Romanos (1) Introdução

A Carta aos Romanos quer ser, para Paulo, uma antecipação de uma visita que tanto deseja realizar e pela qual, até, eleva a Deus a sua prece para que se concretize. Paulo está convencido que, em virtude da sua vocação para ser apóstolo dos gentios, embora os fiéis de Roma já conheçam o Evangelho, a Palavra da Verdade que “em todo o mundo está produzindo frutos e crescendo” (Cl 1,6), a sua pregação não deixará de “comunicar algum dom espiritual” (1,11). Sabe que a “sua palavra e a sua pregação são uma demonstração de Espírito e poder” (1Cor 2,4; 1Tss 1,5: “porque o nosso Evangelho vos foi pregado não somente com palavras, mas com grande eficácia no Espírito Santo e com toda convicção”), em virtude do carisma recebido.

Pelo seu epílogo, resulta que a Carta aos Romanos tem seu motivo ocasional na perspectiva de uma viagem, bastante próxima, de Paulo, para Roma, a caminho da Espanha, que só a poderão impedir “os infiéis da Judéia” (15,31). Neste caso, a Carta seria uma apresentação que Paulo faz de si mesmo, justificada pela condição de apóstolo que tem a obrigação de apresentar todos os homens irrepreensíveis diante de Deus (15,16; Cl 1,28). Pela exposição que nela Paulo faz do Evangelho de Deus, ela se torna uma oportunidade de se unir à admoestação recíproca, da qual os fiéis de Roma são capazes por causa do seu conhecimento (15,14), na condição de apóstolo dos gentios, qualificado por tudo aquilo que Cristo Jesus realizou por seu meio (v.18): na força do Espírito de Deus (v.19; Cl 1,29.11), por palavras e ações, sinais e prodígios, de Jerusalém até a Ilíria “eu levei a termo o anúncio do Evangelho de Cristo” (v.19).

Pela Carta aos Romanos, temos o esquema do evangelho de Paulo. O conteúdo do Evangelho de Deus é o Filho, que age na Igreja na condição de Senhor. Ressuscitado dos mortos, opera a nossa santificação pelo seu Espírito. Ele é o Mistério “envolvido em silêncio desde os séculos eternos” (16,25; Cl 1,26) que, por disposição do Deus eterno, foi manifestado pelos escritos proféticos e, agora “dado a conhecer a todos os gentios para levá-los à obediência da fé” (1,5;16,26): Cristo, “riqueza da glória e esperança da Glória” (Cl 1,27).

Duas profundas convicções estão presentes em Paulo no momento em que escreve a sua Carta aos Romanos: 1ª) a da grandeza do Plano de Deus. Um Plano que se apresenta à sua mente em todo o seu fulgor, seja em contraste com a condição de morte da qual o homem é resgatado em virtude da redenção, como no esplendor da graça que Jesus comunica pelo Batismo, na condição de verdadeiro Adão, em virtude da sua Morte e ressurreição. 2ª) A da Misericórdia de Deus em favor de toda a humanidade qual se manifesta, na história, pela recusa do Israel segundo a carne em anunciar que Jesus é o Cristo, quando os judeus poderiam usufruir da graça da redenção muito mais que os pagãos. A grande tristeza que Paulo sente provoca uma exposição cheia de comoção.

Em relação a ambos os pontos doutrinais notamos todo o seu esforço de reflexão que resulta numa exposição doutrinal clara, não obstante a profundidade dos conceitos que apresenta.

Perguntas para uma reflexão:

1ª) Por que Paulo escreve a uma comunidade já constituída?
2ª) Qual é a ocasião que o motiva a escrever?
3ª) Quais são as convicções que acompanham a sua exposição?

Prólogo (1,1-17)

1,1-7 Saudação
Paráfrase. Paulo se considera, na Igreja, um entre os servos de Jesus Cristo, não somente porque foi conduzido à obediência da fé, à semelhança de todos os outros fiéis, ele, pelo próprio Jesus que perseguia, os outros, pela pregação do evangelho para a conversão, mas porque, também, considera a tarefa do apostolado um serviço que ele deve exercer em prol da Igreja, para a sua salvação. Ele foi segregado para o apostolado para anunciar o Evangelho de Deus, isto é o Mistério de Deus, preanunciado pelos profetas nas Sagradas Escrituras, o Filho, da estirpe de Davi, segundo a carne, manifestado abertamente Filho de Deus com poder, pela ressurreição dos mortos, para santificar os fiéis no Espírito, na condição de Senhor da Igreja, Jesus Cristo, o Senhor nosso. Foi por ele que lhe foi concedida a graça e a função de apóstolo, para que seja anunciada a fé no seu Nome a todos os povos, entre os quais estão os fiéis da igreja de Roma, que devem se considerar vocacionados de Jesus Cristo, isto é, aqueles que de antemão Deus Pai conheceu e que predestinou a serem conformes à imagem do seu Filho, a fim de ser ele o primogênito entre muitos irmãos (8,29). Paulo deseja para eles a graça e a paz por parte de Deus, nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo.
Comentário. Estamos diante de uma saudação meticulosamente estudada em cada palavra. Ela consegue apresentar, em síntese, a condição de Paulo em relação aos fiéis da igreja de Roma e o conteúdo do Evangelho que ele quer a eles anunciar para que, por ele, cresçam na santidade. O Cristo de Deus é o Mistério que o Apóstolo quer anunciar, do qual falam as Escrituras, e que a ressurreição revelou de condição divina, Princípio de santificação dos seus fiéis, no Espírito, na condição de Cabeça da Igreja e de Mediador.

1,8-17 Esclarecimentos.
Paulo tem consciência da sua vocação a ponto de considerar sua a obrigação de cultivar a fé da comunidade de Roma, sobretudo porque foi chamado por Deus para ser apóstolo dos gentios. Por isso chega a pedir a Deus, nas suas orações, a graça de poder ir até Roma para experimentar o conforto espiritual, que pode dar e receber, pela fé que tem em comum com os fiéis daquela comunidade, através da recíproca exortação que a reflexão sobre a Palavra da Verdade oferece.
Na condição de Apóstolo, Paulo nos ensina que o “Evangelho de Deus”, “Palavra da Verdade” e “Anúncio do Mistério que é Cristo, riqueza da Glória”, nos conforta, porque promove a “justiça da fé para a fé” (v.17) pelo “dom espiritual” (v.11) que dele podemos colher quando sobre ele refletimos. Ele é “força de Deus para a salvação de todo aquele que crê, em primeiro lugar do judeu” (v.16). A ação do Evangelho é a ação de Cristo Jesus o qual, tendo-se tornado o Senhor da Igreja, possuidor do Espírito de santificação, nos faz passar de glória em glória (2Cor 3,18: “E nós todos que refletimos como num espelho a glória do Senhor, somos transfigurados nessa mesma imagem cada vez mais resplandecente, pela ação do Senhor, que é Espírito”). Trata-se de uma ação que tem o seu princípio na Morte de Cruz redentora, da qual Paulo não se envergonha porque é reveladora, “para aqueles que são chamados, tanto judeus como gregos, do Poder de Deus e da Sabedoria de Deus” (1Cor 1,24).
Notamos que Paulo, embora se dirija aos gentios, logo de início lembra os judeus “dos quais descende o Cristo, segundo a carne” (9,5). A lembrança das prerrogativas do judeu que abraça a fé, lhe servirá para ilustrar aos fiéis de Roma a preciosidade da “graça”. Na verdade, Paulo não quer polemizar, quer, simplesmente, afirmar que, agora, caiu o muro da separação e que todos, “tanto judeus como gregos”, são chamados a ser edificados sobre o único fundamento que é Cristo, seja os que foram chamados num primeiro momento como os que são chamados em virtude da pregação apostólica.

Perguntas para uma reflexão:
1ª) Qual é, em resumo, o conteúdo do Evangelho de Deus?
2ª) Qual é a graça que ele produz quando sobre ele meditamos?
3ª) Por que Paulo lembra o judeu de forma específica quando fala da Salvação?

Reflexão
            O Paulo que deseja Graça e Paz por parte de Deus Pai nosso e do Senhor Jesus Cristo, mostra que tem presente: 1º) a condição de Deus, de quem procede toda a graça, no amor, porque é a Bondade que age na Misericórdia. Que nós possamos corresponder guardando a “unidade do Espírito pelo vínculo da Paz” (Ef 4,3ss). 2º) A condição de Jesus o Cristo, constituído Senhor da Igreja. É o Filho que o Pai ama, a Descendência na qual pensou desde a culpa do homem e que prometeu. É Senhor na condição de Filho abertamente manifestada pela ressurreição dos mortos, que do Pai recebeu todo poder. É o Adão verdadeiro tornado de alma vivente Espírito vivificante (1Cor 15,45). 3º) A sua condição de apóstolo na qual foi constituído. Por ele, a Palavra age com eficácia e leva à obediência da fé e, em seguida, produz frutos espirituais.
            Pela saudação podemos definir a motivação última que leva Paulo a escrever a sua carta. É a convicção da sua função e o imperativo da sua consciência diante da importância do Desígnio de Deus e da importância do Mistério, que é Cristo, pelo qual se atua. A sua iniciativa é, depois, justificada pelo fato que o Evangelho não está restrito à função de anúncio da salvação para a conversão. A sua função inclui, também, aquela de confortar e exortar para produzir frutos, até levar à perfeição de vida os fiéis (Cl 1,28).

Carta aos Romanos (3) Tema: O Apóstolo

No prólogo, o primeiro título que Paulo atribui a si é aquele de “servo”. É para indicar que o caminho da sua santificação é aquele que o Senhor indicou com a sua imolação, obedecendo em tudo à vontade do Pai. Trata-se do caminho para a glorificação que o próprio Criador ditou para a sua criatura e que o homem Cristo Jesus percorreu como nosso Guia. Mas, logo em seguida, Paulo dá a si mesmo o título de “apóstolo”. A sua santificação acontecerá segundo o específico serviço de “enviado para o anúncio do Evangelho de Deus”. Não é portanto por vaidade que atribui a si mesmo esse título e sim, porque segregado para essa função, por vontade de Deus. A sua vocação foi a ele manifestada por Jesus, no caminho de Damasco, enquanto este se apresentava como Senhor daquela Igreja que ele perseguia. Por isso, ele, agora, trabalha para levar todos os homens à obediência da fé para o louvor do nome de Jesus.

A pregação do Evangelho revela a Sabedoria e o Poder de Deus naquele que em si realizou a Lei e os Profetas e que, agora, opera a santificação em todos aqueles que crêem, mediante o Espírito de Deus. Paulo sabe que tudo isso se realiza além da capacidade de suas forças. Isso, contudo, não o desanima, aliás o conforta, porque a sua confiança está em Deus. Sabe que ele é chamado a cooperar, porque o próprio Senhor o quis como seu instrumento. Ele procede então com pureza de coração. Não permite que a falsidade, a vaidade e a ambição de lucro ofusquem o seu ministério (1Tss 2,2-5). Vive a sua santificação sabendo que Deus o marcou com o seu selo em Cristo Jesus e que o Espírito se tornou o penhor da sua glorificação (2Cor 1,21s). Como que carregado em triunfo por Cristo, pelo poder da sua Cruz, enquanto é constante no seu seguimento, se torna o bom odor de Cristo (2,14). Ele é ministro de uma nova Aliança no Espírito que supera, em glória, a aliança que foi estabelecida por uma Letra escrita numas pedras. Trata-se, agora de uma Aliança inscrita nos corações daqueles que deram a sua adesão de fé nos que crêem em Cristo. Por essa fé naquele que a Lei e os Profetas testemunharam e que se tornou, de alma vivente, Espírito vivificante, em virtude da sua ressurreição, passamos de glória em glória (3,18). Paulo, na condição de membro da Igreja, como “servo de Jesus Cristo”, considera o seu apostolado o “seu sacrifício espiritual” (Rm12,1) pelo qual serve a Deus, com todo o seu espírito, pelo anúncio do Evangelho do seu Filho” (1,9).

Na sua condição, o Apóstolo fala com a autoridade do testemunho com o qual o Espírito Santo o selou, de forma que o seu Evangelho resulta irretocável. Pelo entendimento que lhe é concedido do Mistério que é Cristo, Cabeça da Igreja, ao Apóstolo é comunicada uma compreensão peculiar (Ef 3,3.5), pela qual não só o seu anúncio é causa de conversão (1Tss 1,5), como, também, condição renovada de nutrir os fiéis das Igrejas (Rm1,11).

Em Rm 16,7, Andrônico e Júnias são chamados “apóstolos notáveis”. Barnabé, segundo At 13,2-3, é escolhido e enviado como apóstolo, juntamente com Paulo. O apostolado é uma função na igreja à qual todos são chamados, que, contudo, contempla a uns de forma peculiar (Ef 4,11). A condição de Paulo, como Apóstolo, brota do testemunho de At 9. Nesse caso é importante e fundamental o testemunho do próprio Paulo que se proclama Apóstolo em condições de anunciar o seu Evangelho (Rm 2,16;16,25). O fundamento do apostolado dos “doze” é a escolha de Cristo entre os que estiveram com ele desde o início e foram testemunhas da Ressurreição. O fundamento do apostolado de Paulo é Cristo ressuscitado, na condição de Senhor da Igreja. Disto, a sua consciência dá testemunho (Rm 15,16.19).

O apostolado é uma grande graça que Jesus faz à sua Igreja, porque é por ele que o Evangelho de Deus é anunciado com toda a potência possível do seu Espírito merecido pela a sua Morte, através da Palavra da Verdade, e comunica a graça em virtude da sua Humanidade glorificada, tornada Espírito vivificante (1Cor 15,45; 2Cor 3,7-11). O Evangelho é “força de Deus” que nutre a justiça de Deus nos fiéis, da qual já foi o princípio, pela conversão.

Perguntas para uma reflexão:

1ª) Quais são as prerrogativas do Apóstolo?
2ª) Em que sentido dizemos que o fiel, também, é chamado ao apostolado?
3ª) De que forma age a Palavra anunciada?

Carta aos Romanos (4)
Tema: O Evangelho

O Evangelho é o instrumental que a Carta aos Romanos propõe para nos edificarmos na fé. Basta observar a insistência com a qual é lembrado ao longo do Prólogo: 1o) Paulo “foi separado para o Evangelho de Deus” (1,1); 2o) “A Deus sirvo, no meu espírito, no Evangelho do seu Filho” (v.9); 3o) “Estou pronto para evangelizar” (v.15); 4o) “Não me envergonho do Evangelho, ele é força de Deus para a salvação” (v.16). Até quando fala dos escritos proféticos nas Escrituras santas diz: “que o Filho foi pré-evangelizado pelos profetas de Deus” (v.2). Para Paulo, a sua importância não se limita em ser a Boa Nova que anuncia a salvação, abrange a condição de Palavra da Verdade que produz, continuadamente, novos frutos quanto mais abundantemente ela habita em nós (Cl 3,16). Ela diz respeito a Cristo, o Mistério de Deus, isto é, a revelação única que somente o Filho poderia nos dar do Pai, mediante a sua pessoa. Paulo sintetiza e ilustra a sua grandiosidade com as palavras iniciais da sua apresentação: “... diz respeito ao Filho previamente evangelizado pelos profetas e que foi abertamente manifestado Filho de Deus com poder pela sua ressurreição”. Dessa forma, proclama Paulo, ele pode ser conhecido por nós pelas Escrituras, nelas anunciado na condição de Messias e Descendência de Davi, enquanto, pela sua ressurreição, é por nós conhecido na sua condição divina. O anuncio querigmático que encontramos na saudação é oportunamente desenvolvido por Paulo, conforme o exigem os temas que ele vai tratando, ao longo da sua carta. Dessa forma, em Rm 3, 21-26, nos explica a ação fundamental da manifestação do Filho de Deus em relação à salvação que alcançamos pela fé: ele é o Cristo que se manifestou na pessoa de Jesus, que nos remiu pelo derramamento do seu sangue. Em Rm 5,6-11, relaciona a redenção ao Plano do Pai que, na sua misericórdia, entregou o seu Filho à Morte, e declara todo o amor de Jesus por nós ao cumprir o desígnio do Pai. É na base deste conteúdo grandioso e solene que Paulo proclama o Evangelho de Deus, a Palavra da Verdade, “força de Deus para a salvação” (v.16) que, também “revela a justiça de Deus da fé para a fé” (v.17). De fato, nele se revela o Poder de Deus e a Sabedoria de Deus, enquanto anuncia a salvação que a Morte de Cristo realizou e o Senhor ressuscitado continuamente manifesta pelo seu Espírito santificador que faz passar os seus fiéis de glória em glória (2Cor 3,18).

É sobre esta Palavra da Verdade que Paulo quer refletir, juntamente com os fiéis da igreja de Roma, caso surja a oportunidade de estar com eles. A sua carta é uma antecipação desta atividade espiritual, que ele se prontifica a realizar, com um empenho singular de reflexão para poder oferecer, de antemão, algum fruto espiritual que possa consolar (gr.: sunparacaletenai) os que, em Cristo Jesus, ama de todo coração, na condição de apóstolo dos gentios. Ele tem consciência que , à semelhança dos outros apóstolos e profetas, é capaz de uma compreensão única do Mistério. Por causa disso, entendemos que o seu ensinamento nutre todo e cada fiel que dele se aproveita, através da leitura do seu escrito. Mais tarde, na sua Carta aos Colossenses, tornará ainda mais evidente a sua convicção acerca do Evangelho de Deus ao ilustrar mais detalhadamente o conteúdo do Mistério de Deus que é Cristo (Cl 1,25-27). Ele é a riqueza da Glória que nos é sempre mais comunicada pelo Senhor da Igreja, em quem estão todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento (2,3). Por esta ação, a justiça que nos mereceu pela sua Morte de Cruz, se revela da fé para a fé. Isto é, conseguimos viver a justificação pela fé naquele que é, também, a esperança da Glória. Nesse processo de santificação, Cristo Jesus ter-nos-á levado a uma condição de esperança que não será confundida pela certeza que estará em nós, em virtude do Espírito Santo, de termo-nos tornado herdeiros da vida eterna.

Perguntas para uma reflexão:

1ª) Em que sentido toda Bíblia é o Evangelho de Deus?
2ª) Por que o Evangelho é “força de Deus para a salvação daquele que crê” (Rm 1,16)?
3ª) O que significa que o “justo vive de fé” (Rm 1,17)?

Carta aos Romanos (5)
Tema: A fé

Fé é o termo pelo qual Paulo designa a vida divina que é suscitada, no ouvinte, pela pregação do Evangelho de Deus. Seu início é a adesão a Jesus, reconhecido como o Cristo, cuja Morte de Cruz é causa de redenção em virtude do derramamento do seu Sangue. Por ela nos é obtida a remissão dos pecados pela adoção filial no Amado (Ef 1,6). Essa vida é sujeita a um desenvolvimento, que Cristo Jesus opera na condição de “Filho de Deus, abertamente manifestado com poder pela sua ressurreição dos mortos”, constituído, pelo mesmo Deus Pai, Cabeça da Igreja. De sua parte, o fiel é chamado a corresponder à moção do Espírito do Senhor. A respeito disso, Paulo, desde a sua primeira carta aos Tessalonicenses, relaciona a vida de caridade à vida de fé. Na carta aos Colossenses, explicita de que forma a caridade promove a vida de fé: mediante os dons do Espírito que desenvolvem exatamente enquanto nós os promovemos correspondendo à ação do Espírito do Senhor Jesus Cristo. É por esse testemunho da nossa sã consciência que vivemos a nossa vida em Cristo. Ela desenvolve em nós, enquanto repetimos o caminho da obediência e da imolação que Ele, o Adão verdadeiro, nos ensinou, como Modelo e Guia.

A fé é nutrida e fortalecida pela Palavra da Verdade, o Evangelho de Deus. Aquela que já foi “força de salvação” no momento da conversão, “para aqueles que crêem” (Rm 1,16), em seguida, é alimento que nutre para a vida eterna. É ela que promove a justificação estabelecida, inicialmente, como dom gratuito de Deus. Aquele que “de alma vivente se tornou Espírito vivificante” (1Cor 15,45), pelas suas palavras “que dão o Espírito sem medida” (Jo 3,34), nos faz passar de Glória em Glória.

Paulo, na condição de ministro dessa glória, porque ministro de uma “nova Aliança no Espírito” (2Cor 3,6), entende promover a fé nos fiéis, exatamente porque separado para o Evangelho de Deus. O considera como um dever da sua função. Por isso, até reza para que isto se realize em relação aos fiéis de Roma, que precisam ter a sua fé fortalecida porque continuamente ameaçada por desvios doutrinais sugeridos por falsos doutores, e por tribulações que os adversários da fé causam e que poderiam levar ao desânimo. Pela reflexão sobre a Palavra da Verdade, Paulo quer, portanto, propiciar para os fiéis de Roma um dom espiritual pelo qual sejam fortalecidos. As dolorosas experiências das quais fala no início da Segunda Carta aos Coríntios, e que quase o levaram à beira da morte, lhe ensinaram quão valiosa é a consolação que, nesse caso, vem de Deus. Paulo quer encontrá-la no Evangelho, para si e para os fiéis de Roma (Rm 1,12).

Essas considerações nos permitem definir o intuito da Carta aos Romanos: oferecer aos fiéis de Roma um dom espiritual, do qual Paulo é capaz, em virtude da sua condição de Apóstolo, através da condição peculiar do dom da ciência nele, para que, consolados na fé que eles têm em comum com ele, sejam fortalecidos contra tudo o que ameaça a mesma (gr.:sumparacletenai; termo que lembra o Paráclito, o Consolador, o Espírito da Verdade). Rm 5 ensinará que tudo se resume em trilhar o caminho da tribulação com perseverança, para que, adquirida a virtude da constância, nos abramos a uma esperança que não será confundida. Trata-se de um caminho que Deus, na sua misericórdia nos ensina e que Jesus Cristo nos mostra, no seu amor. Dele compreendemos a grandeza ao considerar a imensidão da graça que Deus nos concedeu em Nosso Senhor Jesus Cristo, a dignidade em que o Batismo nos constituiu e a libertação da escravidão do pecado pelo Espírito, princípio da nossa ressurreição, da nossa condição de filhos de Deus e de herdeiros da vida eterna.

Perguntas para uma reflexão:

1ª) O que é a fé?
2ª) O que é que a promove?
3ª) De quais perigos nos precave o cultivo da fé?

Carta aos Romanos (6)
“Todos estão debaixo do pecado” (1,18-3,20)

1º) A condição do homem diante de Deus (1,18-32)

É evidente que sobre os homens está para se manifestar a ira de Deus porque vivem na impiedade e “estão repletos de toda sorte de injustiça” (v.29). Não sabem chegar a Deus pela contemplação da criação que dele revela o poder e a divindade.
Dessa forma, lhe prestariam culto de adoração e a sua ação de graças. Afastando-se sempre mais dele, se perdem em vãos arrazoados, fruto de um coração insensato envolto em trevas.
Trocam a Glória de Deus pela glória das criaturas e tornam deuses, para si, homens, aves, quadrúpedes e répteis. Tomados pela impureza, seus corações, que se tornaram insensatos, desonram seus corpos. Poderiam enaltecer-se servindo a Deus Criador, porque seria então que viveriam na verdade. Sinais das trevas em que os homens vivem mergulhados são as paixões aviltantes, sua sexualidade equivocada que os levam a sofrer, também, como consequência, os desvios do lesbianismo e da homossexualidade. Em lugar do conhecimento de Deus, neles se instala toda injustiça. Longe de Deus, o homem se torna perverso, ávido, cheio de malícia, invejoso, assassino, fraudulento, caluniador, inimigo de Deus, insolente e arrogante.
Desafiando o próprio Deus, que sabe que está ofendendo, chega até a aplaudir os que fazem essas coisas.

2º) Ninguém está em condição de se justificar diante de Deus (2,1-16).

Ninguém pode pensar de não estar praticando o pecado, achando que são os outros os culpados que Deus condenará. Por isso, ninguém deve resistir à graça de Deus, que se revela misericordioso, a ponto de se obstinar no pecado e viver impenitente. Isto acarreta a ira de Deus no dia do julgamento. Os que visam à glória, à honra, e à incorruptibilidade herdarão a vida; os egoístas, os rebeldes à verdade e os submissos à injustiça conhecerão a ira e a indignação de Deus, que julga a todos de forma imparcial.

3º) A condição peculiar do judeu (2,17-3,4)

Os que não conhecem a Lei serão julgados pela lei de Deus inscrita na sua consciência, enquanto os judeus serão julgados pela Lei de Moisés. Se, portanto, estes não praticam a Lei serão condenados por Deus com a agravante de que, por causa das suas transgressões, “o nome de Deus está sendo blasfemado entre os gentios” (2,24). Não adianta a circuncisão se o judeu não pratica a Lei; o incircunciso que observa a lei de Deus agrada a Deus muito mais do que o circunciso judeu que não observa a Lei de Moisés. Por causa disso, alguém poderia pensar que não há vantagem em ser judeu. Mas não é assim. O judeu tem o privilégio de conhecer os oráculos de Deus. A infidelidade de uns entre eles não anula a fidelidade de Deus, simplesmente a prova.

4º) Objeção sofística (3,5-8)

Se a injustiça realça a justiça divina, por que a ira divina?

Não podemos pensar que a infidelidade não é culpada pelo fato que provoca a misericórdia de Deus. Nunca o mal pode ser justificado. Dizer que podemos mentir e pecar para provocar a Bondade misericordiosa de Deus é querer sofismar. Não esqueçamos que Deus julgará o mundo e condenará os que praticam o mal.

5º) Síntese final (3,9-20).

Todos, judeus e gregos, estão debaixo do pecado. Esta é a condição em que se encontram os homens, da qual não conseguem sair: os pagãos porque não sabem chegar a Deus pela criação; os judeus porque não têm força de cumprir a Lei, por ela somente multiplicando suas culpas.

Perguntas para uma reflexão:

1ª) Em que condições de pecado vive o homem longe de Deus?
2ª) De que forma devemos corresponder à iniciativa de Deus que quer a nossa salvação?
3ª) Quais são as condições vantajosas que fazem do judeu um homem privilegiado para a salvação?

Carta aos Romanos (7)
A condição do judeu

Desde o início da sua Carta, Paulo tem presente a condição peculiar dos judeus. Lembra especificamente que o Evangelho, “força de Deus para a salvação”, diz respeito a Jesus Cristo, o Filho de Deus, “nascido da estirpe de Davi, segundo a carne”, “preanunciado pelos profetas nas Sagradas Escrituras”. Por essa prerrogativa, à qual acrescentará mais outras, o judeu, segundo o próprio Deus que o chamou para ser o seu povo de escolha, é o primeiro a poder usufruir da salvação. Ele compreende as Escrituras; pertence ao povo de escolha, a pleno título, pela circuncisão; de Deus contempla a Glória; dele recebeu a Lei. Por tudo isso leva vantagem sobre o pagão, em relação ao Evangelho, a partir do momento em que ele dá a sua adesão de fé a Jesus, reconhecendo-o como o Cristo de Deus. A Lei o leva a conhecer, de forma revelada, qual é a vontade de Deus. Por ela possui a “ciência e a verdade” (2,20). Em virtude da circuncisão, se fosse fiel à Lei de Deus, segundo o espírito dela, antes mesmo de abraçar a fé, chegaria a comunicar com Jesus Cristo de forma singular, podendo compreender de forma abrangente o Mistério de Deus. A Lei seria para ele o verdadeiro pedagogo para Cristo Jesus. A esperança que a Lei nutre em relação a Cristo já o justificaria, como aconteceu ao velho Simeão, no templo, ao receber em seus braços o Salvador, preparando-o para a santificação profunda que o Espírito atuaria nele em virtude da Redenção. Ele deve chegar a compreender que não há salvação no simples cumprimento das obrigações da Lei, a partir da circuncisão. É em Cristo que as figuras têm o seu cumprimento (2Cor 3,14). Deve reconhecer que a Lei, por si, não lhe comunica a força da qual precisa para cumprir com os preceitos de Deus. Essa força está em Cristo Jesus, em virtude da Redenção que ele realizou com a efusão do seu sangue. Pelo seu Espírito vivificador é que podemos realizar boas obras.
Pelo chamado à conversão (2,4), Deus quer realizar em nós aquilo de que somente ele é capaz: vivificar o que estava morto.
Para isto, o homem não tem força, porque corrompido pelo pecado. O judeu, à semelhança dos que se convertem, deveria se deixar atrair pelo seu Deus que se revela em Jesus Cristo.
Então, abandonando o seu vão orgulho, ao reconhecer-se pecador, por cometer as mesmas culpas que aponta nos outros na condição de conhecedor da Lei, experimentaria a bondade, a benignidade, a longanimidade e o amor do seu Deus, qual se revelou ao longo da sua história: o Deus que justifica, diante da fé de Abraão, que a ele, pela fé, deu glória. Pela fé dele, Deus pôde realizar a promessa do herdeiro, continuar a linhagem da descendência e dar-lhe a terra.

Ao esclarecer a condição do judeu diante da pregação do Evangelho, Paulo consegue mostrar como todos, indistintamente, judeus e gregos, precisam da salvação e, em relação ao judeu, como ela não é alcançada pelas obras da Lei, e sim, pelas obras da fé. A Lei, de fato, somente conseguiu mostrar o caminho da realização do homem. É somente através daquele que ela anuncia que esse caminho pode ser percorrido, mais exatamente, pela Glória divina que Cristo Jesus comunica, merecida pela sua imolação em favor dos seus irmãos. Numa forma drástica Paulo define a situação que a Lei criou: “somente multiplicou as culpas”. Com uma frase, talvez de impacto ainda maior, em relação ao Espírito que Cristo nos mereceu com o seu sacrifício expiatório, Paulo diz: “Aquele que não conheceu o pecado, Deus o tornou pecado para nós para que nos tornássemos justiça de Deus” (2Cor 5,21): o que corresponde às palavras que encontramos em Rm 3,25: Deus o tornou vítima de expiação pelos nossos pecados.

Perguntas para uma reflexão:
1ª) Por quais prerrogativas o judeu está em condições melhores para usufruir da santificação do Evangelho?
2ª) Por que as obras da Lei não alcançam a salvação para o judeu?
3ª) De que forma, então, alcançamos a salvação?

Carta aos Romanos (8)
A justiça de Deus opera pela fé em Jesus Cristo (3,21-26)

Rm 3,21-26 é a antítese de Rm 1,18, e quer provar que com Jesus Cristo se realizou a promessa feita à Humanidade (Gn 3,15), ditada “pelo amor do coração do nosso Deus” (Lc 1,78): “O Sol nascente nos veio visitar”, numa verdadeira epifania (gr.: pefanérotai, 3,21). Esse evangelho profeticamente anunciado (gr.: proepengeílato, 1,2) é a síntese da Escritura sagrada, enquanto resume em si a história da Descendência que Deus, desde o início, pensou para a salvação da humanidade.
Após o desenvolvimento do 1º Ponto da Carta, da secção que diz respeito ao tema “Todos pecaram e precisam da Glória de Deus” (3,23), Paulo anuncia o núcleo central do Evangelho de Deus: manifestou-se, na plenitude dos tempos, a justiça de Deus, pelo Filho, pensado desde sempre como a Vítima da expiação. Quem nele crê tem a vida eterna. Desde o início da história da humanidade Deus manifestou o seu amor para com os homens.
De fato, depois de tê-los criado à sua imagem e semelhança e ter ditado o caminho da sua realização pela obediência nutrida pela contemplação da criação, que promove a louvação ao poderoso Criador, não abandonou o homem à sua degeneração, pelo contrário o socorreu com a promessa de um Redentor que já agia na história enquanto era contemplado por Ele, desde então, como o Cordeiro imolado. Era o tempo da não imputação ao longo do qual os homens multiplicaram suas culpas, sobretudo Israel que, escolhido para dar continuidade à Descendência, foi objeto da atenção de Deus mediante uma Aliança. Os hebreus, na sua fragilidade humana, não souberam viver à altura da Lei. Todos pecaram. Contudo, isso foi permitido por Deus para que ficasse ainda mais evidente a gratuidade da Salvação.

Deus que, na sua ira, não tolera o pecado (1,18), não deixou, contudo, de amar profundamente a criatura. Em virtude da promessa (1,1), enviou o Filho para a Redenção. Pela sua imolação, mereceu o Espírito que vivificaria o que estava morto por causa do pecado, seja para o judeu, como para todos.

Os hebreus receberam a justificação por graça, tanto quanto os pagãos, não porque tivessem cumprido com as obras da Lei. A todos os que creem no Filho, o Pai dá o poder de se tornarem filhos de Deus.

Cristo Jesus foi destinado para ser um sacrifício expiatório, que purifica pelo derramamento do sangue. Os pecados de todos os homens são perdoados porque a justiça é comunicada. Isto dá-se pela fé em Jesus Cristo (2, 22.28.30). Esse anúncio que os Apóstolos, enviados por Cristo, proclamam, tem o seu fundamento na ressurreição do Senhor, da qual eles foram constituídos testemunhas. Fundamentado nessa certeza que sela a messianidade de Jesus, Paulo, juntamente com os outros Apóstolos, segundo o testemunho da sua consciência, no Espírito Santo (9,1; 1Jo 1,1s), conclama judeus e gregos à obediência da fé.

Perguntas para uma reflexão:
1ª) Qual é o feliz anúncio que Deus faz aos homens por si merecedores dos castigos divinos?
2ª) Por que os judeus, não obstante a Lei multiplicaram as culpas?
3ª) Sobre quais certezas os Apóstolos fundamentam o seu anúncio da salvação pela fé em Jesus Cristo?

Carta aos Romanos (9)
A justificação pela fé é testemunhada pela Lei (3,27-4,25)

A doutrina que Paulo proclamou de autoridade apostólica em 3,21-26, fundamentado numa primeira argumentação: “testemunhada pela Lei e os Profetas” (v.21), é reafirmada, em seguida, na base do testemunho de Abraão: quando ainda incircunciso, deu glória a Deus pela fé que mostrou nas palavras dele. A esse respeito a Escritura diz que a fé foi levada em conta de justiça, por parte de Deus. Isso acontece, também, a nós quando cremos em Deus que ressuscitou Jesus Cristo, quando acolhemos o anúncio dos apóstolos que nos falam em nome de Deus. Então, os frutos da Morte e Ressurreição do Senhor redundam em justificação e purificação nossa.

O judeu não é justificado pelas obras da Lei. Se assim fosse, a justificação somente seria possível para quem é judeu. Quando afirmamos que somos justificados pela fé, então entendemos que é justificado o circunciso e o incircunciso. Eis como se realiza o que a Lei ensina. Estas são as obras que devemos cumprir para nos salvar.

A figura de Abrão ilustra a salvação pela fé, à qual todos são chamados. Abraão deu glória a Deus não por algo que realizou e que Deus, então, recompensou. Foi-lhe atribuído a justiça a fé que teve em Deus. Não criou um crédito por algo que tivesse feito. Foi agraciado porque acreditou naquele que justifica o ímpio gratuitamente (4,6-8). Essa graça não está restrita aos circuncisos. De fato, Abraão agradou a Deus pela fé na sua palavra quando ainda era um incircunciso. Foi depois que a circuncisão se tornou o sinal da graça recebida. É desta graça que o judeu deve se orgulhar, com o compromisso de viver a Lei, enquanto revela a vontade de Deus. Devemos, contudo, considerar ligados filialmente a Abraão todos os incircuncisos que creem em Deus da mesma forma que a ele estão ligados os seus descendentes. Contudo, a estes lhes valerá a circuncisão se, ao Deus de Abraão, derem a sua adesão de fé, ao crer que ressuscitou Jesus o Cristo, o Filho, que fez sentar à sua direita nos céus, da Descendência de Davi, segundo a carne.

A promessa que Deus fez de que o descendente de Abraão seria o herdeiro do mundo não foi condicionada à observância da Lei e sim, à justiça alcançada pela fé (4,13). De fato, se fica estabelecido que são herdeiros os que são da Lei, tudo o que é esperado segundo a promessa de Deus pela fé nele, nunca será alcançado. A Lei só produz a ira (3,20), porque provoca a prevaricação, por causa da fragilidade humana.

Portanto, é pela fé que somos justificados, não pelas obras da Lei, para que, em virtude do dom, seja segura a promessa para toda a descendência; não somente para aquele que é da Lei, como, também, para aquele que, como Abraão, acredita (3,30).

Abraão é o pai de todos nós diante de Deus (4,16b), pai de muitas nações. Acrditou contra toda esperança, para ser pai de uma descendência numerosa como as estrelas do céu.
Permaneceu firme na fé, também quando tinha cem anos, confiando que Deus, no seu poder , realizaria o que prometia. Por isto, diz a Escritura, a fé lhe foi levada em conta de justiça.

Como Abraão alcançou a graça prometida, pela fé, assim nós alcançamos a graça da justificação dando a nossa adesão de fé a Deus que ressuscitou dos mortos Jesus, que foi entregue por causa dos nossos pecados e que ressuscitou para a nossa justificação.

Perguntas para uma reflexão:
1ª) Qual é o primeiro argumento que Paulo apresenta ao judeu para provar que a justificação não se dá pelo cumprimento das obras de Lei?
2ª) De que forma Abraão nos prova que a justificação é alcançada pela fé e não pelas obras da Lei?
3ª) Por que o judeu nunca poderá alcançar a justificação pelas obras da Lei?

Carta aos Romanos (10) “Tenhamos paz com Deus” (Rm 5)

Depois de ter argumentado sobre a fé como único meio para a justificação (1,18-4,25), Paulo exorta os fiéis de Roma a ter paz com Deus, isto é, “a guardar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz” (Ef 4,3), através da ação do Senhor da Igreja, que é capaz de realizar em nós a plenitude  da graça, para que cheguemos a cooperar na edificação da Igreja, seu Corpo, e alcançar a vida eterna. Por Ele obtivemos a reconciliação. Pela presença da Glória de Deus em nós, portanto, esperamos a manifestação da mesma. Procuremos, então, nos diz o Apóstolo, passar de uma condição de glória, que é a presença em nós do Espírito que nos foi doado, merecido pela justificação, para uma condição ainda mais perfeita, qual fundamentada numa esperança que não poderá ser confundida, nos associando a Cristo na sua Paixão para que em nós desponte a Vida no Espírito com todos os seus frutos: “amor, alegria e paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, autodomínio” (Gl 5,22s). É sobre este tema que Paulo começa a dissertar, nos lembrando, mais uma vez, a graça que Deus nos concedeu pela imolação de Cristo. Ela é fruto do seu amor que se manifestou na Morte de Cristo em favor de nós pecadores. Portanto, uma vez que fomos justificados pelo Sangue de Cristo, podemos alcançar com maior segurança a nossa salvação porque estamos na condição de reconciliados  e de quem vive a vida por Ele merecida, enquanto a promovemos associando-nos aos seus sofrimentos.

Após ter-nos dado a motivação fundamental, para nos explicar a importância da graça que recebemos mediante a justificação, Paulo recorre ao paralelismo, por contraste, entre Cristo Jesus e o Adão de Gn 3, “que é o tipo daquele que devia vir” (5,14). Por causa da desobediência de Adão, o pecado entrou no mundo e, com o pecado a morte. Consequentemente, todos conheceram a morte e nela pecaram. De forma semelhante, aconteceu o mesmo quanto à graça. Merecida pela obediência do homem Cristo Jesus, ela foi estendida a todos os homens, para que reinassem na vida.

Por essa página da carta aos romanos, podemos notar o vigor do pensamento de Paulo. Ele não se limita a anunciar uma verdade.
A eviscera para nela descobrir todos os valores. Podemos também definir a forma segundo a qual procede o seu raciocínio.
Cada argumentação está ligada àquela que a precede por uma palavra gancho, que se encontra na última sentença da argumentação anterior. Em terceiro lugar, Paulo insiste sobre o tema  principal até esgotar todos os seus aspectos. O que, de fato, dificulta a nossa compreensão é a forma técnica com que Paulo utiliza os termos. As traduções nos desencaminham porque utilizam as variantes que os sinônimos oferecem. Com isso, nos escapa o sentido doutrinal preciso que Paulo, de fato, quer nos apresentar, enquanto devaneamos em interpretações às quais nos induzem os sinônimos utilizados pelo tradutor.

É com Rm 5 que Paulo entra, de forma definitiva, na reflexão sobre o Evangelho, a Palavra da Verdade que deve habitar em nós abundantemente (Cl 3,16), a fim de colher o fruto de um dom espiritual pelo qual a sua e a fé dos fiéis de Roma seja fortalecida (Rm 1,12). Quando fala das tribulações que devem ser suportadas na constância, parece de estarmos escutando aquele que acabou de escrever a 2 Cor, no fim do ano 57, na qual, por extenso, explica a beleza da vida cristã que, pelos sofrimentos, se abre à esperança da vida eterna (2Cor 4-5). A reflexão de Rm 5 é o começo de um pensamento teológico que se estenderá até o fim de Rm 8 e que apresenta a vida cristã em toda a sua dignidade e beleza, no intuito de nos motivarmos a vivê-la com toda convicção.

            Perguntas para uma reflexão:
1ª) Qual é o sentido de “Justificados pela fé, tenhamos paz com Deus” (Rm 5,1)?
2ª) De que forma podemos desenvolver a vida divina recebida pela nossa fé em Cristo?3ª) Em que sentido o Adão pecador é figura de Cristo?

Carta aos romanos (11)
Gloriemo-nos na esperança (5,1-11)

A reflexão de Paulo sobre o Evangelho, “a Palavra de Deus que produz frutos no mundo inteiro” (Cl 1,6), o levou a explicar exaustivamente a gratuidade da justificação pela fé que temos em Jesus Cristo, que “foi entregue pelas nossas faltas e ressuscitado para a nossa justificação” (4,25). À semelhança de Abraão que acreditou, podemos, dessa forma, “dar glória a Deus” (4,20). Todavia, por Jesus Cristo que, ressuscitado, foi constituído, por Deus, Senhor da Igreja, podemos dar a Deus uma glória ainda maior, pela perseverança nas tribulações. Por estas, nos associamos à Vida que Cristo Jesus experimentou na sua Paixão. Isto nos abre a uma esperança que não será confundida porque, então, o Espírito Santo, que nos foi dado, infunde nos nossos corações a caridade na sua plenitude.
Daremos, então, glória a Deus, com alegria, numa contínua ação de graças por nos ter associado aos herdeiros da sua herança (Cl 1,11s).

A dúplice glorificação que pode partir de cada fiel é motivada pela manifestação da Bondade de Deus que, na sua misericórdia, quando ainda éramos pecadores, entregou o seu Filho que, no seu amor, nos justificou no seu sangue. Esse Filho, na condição de Senhor da Igreja, quer promover a vida daqueles que se tornaram seus amigos (Jo 15,15) e quer levar consigo onde ele agora está.

Segundo a explicação acima exposta assim deveríamos ler Rm 5,1-5: “1Justificados, portanto, pela fé, tenhamos paz com Deus, pela ação de nosso Senhor Jesus Cristo, 2por quem obtivemos acesso, pela fé, a esta graça em que fomos situados, e, também, nos gloriamos na esperança da Glória de Deus. 3Não só, como também, nos gloriamos nas tribulações, cientes que a tribulação produz a paciência, 4a paciência a virtude comprovada, a virtude comprovada a esperança. 5A esperança não se confunde porque o amor de Deus terá sido efundido em nossos corações pelo Espírito Santo, que nos foi dado”.

Para Paulo, tudo é graça, porque fruto de uma iniciativa unilateral de Deus que, desde sempre, “por livre desígnio de sua vontade, quis nos tornar seus filhos adotivos, em Jesus Cristo” (Ef 1,5). Todavia, o fiel, para que o Plano de Deus se realize, deve desenvolver os dons do Espírito. Trata-se de um processo que Paulo descreve, em detalhes, em Cl 1,3-12. Dele, também, temos uma ilustração valiosa em 2Pd 1,3-10. Essa é a segunda maneira pela qual damos glória a Deus e que nos permite passar de uma primeira condição de fé a uma condição de fé mais perfeita (1,17). Ao nos abrir à esperança, estaremos merecendo a vida eterna, porque o Espírito Santo, então plenamente comunicado, nos terá associado à vida do Deus trino. Quando esta se manifestar, então, será a terceira condição pela qual daremos glória a Deus para sempre (Ef 1,12).

Rm 5,6-11, enquanto apresenta a Redenção como manifestação suprema do amor de Deus e de Jesus Cristo, é o fundamento da argumentação de Paulo. Se, justificados por Deus que nos amou ao entregar o seu Filho, somos salvos da ira, quanto mais alcançaremos a salvação pela vida que tivermos feito despontar em nós, ao nos associarmos aos sofrimentos de Cristo. Seremos, então, salvos, não somente porque reconciliados, como também na condição dos que se gloriaram porque associados à vida de Cristo na sua Paixão.

        Perguntas para uma reflexão:
1ª) Qual é o processo que leva à perfeição a vida da graça (cfr. 5,3-5)?
2ª) Por que a perfeição da vida da graça nos dá maiores garantias de salvação?
3ª) De que mais se gloria o verdadeiro cristão?

Carta aos Romanos (12)
Cristo, o Adão verdadeiro (5,12-21)
O Evangelho preanunciado, isto é, a Lei e os Profetas, já ilustrava a Pessoa de Cristo através da figura de Adão. As narrativas sapienciais de Gn 1-3 permitem definir as seguintes prerrogativas de Cristo: ele é o homem criado à imagem e semelhança de Deus, chamado para viver a plena dependência e obediência ao seu Criador e ser o mediador da louvação que parte da criação e se eleva a Deus. Essas prerrogativas não se desenvolveram nos membros da estirpe humana, que se revelou rebelde. Cristo, em virtude da sua condição divina, pelo contrário, cresceu em “idade, sabedoria e graça” (Lc 2,52). Foi o verdadeiro Adão, que justifica, que nos constitui, individualmente, na condição de realeza, pelo Espírito, possibilitando o domínio sobre os instintos e a conseqüente mediação de louvação nossa entre o mundo e o seu Criador.
Cristo, enfim, nos dá a vida divina, sempre pelo seu Espírito, que é penhor de imortalidade, ressurreição na carne, filiação divina, herança eterna. Pela comparação vemos quanto Cristo Jesus enriquece o homem ao se tornar um de nós. É esse enriquecimento que ilustra o que falta a ser completado por Deus na obra da criação do homem.

Contudo, isso acontece num contexto de pecado. A narrativa sapiencial de Gn 3 surgiu exatamente para explicar esse mistério.
O sábio começou a constatar a infidelidade de Israel ao seu Deus porque, não obstante os grandes prodígios operados em seu favor por parte do Criador, que voltava a revelar-se ao homem através da sua relação com Abraão, o povo de escolha, ainda preferiu a idolatria, enveredando, dessa forma, o caminho do pecado. Viu, então, o sábio do AT, que o homem, exatamente como fez Israel, se rebela contra o seu Criador porque quer se constituir num deus. Essa ambição desmedida, o primeiro dos sete vícios capitais, é fruto de uma omissão, qual a da não procura de Deus pela contemplação das obras da criação, pelas quais o homem descobriria os atributos de Deus, o seu Poder e a sua Glória.

Todo homem está exposto a esse fracasso. De fato o vive. A história da geração de Caim (Gn 4) o ilustra nos seus desdobramentos. Cristo Jesus dele redime o homem, seja aquele que o precedeu como aquele que o segue, mediante a comunicação do Espírito que, após ter a este suscitado como criatura animada, agora, se comunicando de forma mais plena, nele se torna princípio de imortalidade gloriosa. Enquanto redime a humanidade da sua condição de culpa, que é real nos adultos, enquanto é potencial no recém-nascido, dizemos que tira o pecado original. Enquanto comunica a vida divina, nos constitui na condição definitiva contemplada pelo Plano da criação do Pai.
A transmissão direta de uma culpa que os ancestrais da humanidade teriam cometido é uma ilação. Nos equivocamos diante de uma narrativa sapiencial que quer simplesmente ilustrar o comportamento de todo e cada homem. Disso resulta que somente a Divindade, assumindo a condição humana pode ser o Princípio da sua regeneração e a força da atuação dos ideais que o Criador tem sobre a criatura.

Perguntas para uma reflexão:
1ª) Quais são as prerrogativas do Verdadeiro Adão?
2ª) De que maneira o sábio do AT deduziu a condição de pecado que se encontra em todo e cada homem?
3ª) Por que somente Jesus transmite a graça da filiação divina?

Carta aos Romanos (13) A incompatibilidade da graça com o pecado (I)

A) Enxertados em Jesus Cristo, somos novas criaturas em virtude do Batismo (6, 1-11).

Para Paulo, o Mistério que o Evangelho anuncia, é “Cristo em nós, riqueza da Glória” (Cl 1,27) que, ao mesmo tempo, se distingue de nós e a nós se associa. Se distingue pela sua eminente condição divina, se associa pela plena comunicação do seu Espírito, de forma que, os fiéis mantêm a sua individualidade, enquanto, ao mesmo tempo, em tudo dependem de Cristo Jesus.
Ele é o Filho, consubstancial ao Pai, abertamente manifestado com poder, pela Ressurreição dos mortos, na condição de Descendente da estirpe de Davi (1,3s): “Lembra-te de Jesus Cristo da descendência de Davi, ressuscitado dos mortos” (2Tm 2,8). Segundo a carne, padeceu e derramou seu sangue como vítima de expiação. Nos justifica porque é de condição divina.
Tudo ele atua como Primogênito da estirpe dos filhos de Deus, com os quais tem em comum a natureza humana. Por esta, estabelece uma solidariedade conosco de tal forma que tudo o que é dele é nosso também. Contudo, tudo depende de um processo: se sofrermos com ele para, também, sermos glorificados com Ele (Rm 8,17).

Os homens, pela fé, recebem o seu Espírito, a seiva da Videira que faz dos ramos um só Corpo. Os fiéis são então edificados sobre a Pedra viva, como pedras vivas, num só Templo (Ef 2,20-22). A condição de nova criatura depende, portanto, de Cristo.
Pelo seu Espírito somos convertidos, regenerados, santificados.

Com Rm 6, Paulo inicia a exposição da vida cristã que ele já chamou de Santidade, Justiça, Glória, que, nos lembrou, deve ser atuada pelas boas obras, a partir da conversão e regeneração pelo Batismo, para que seja promovida em nós a glória, a honra e a incorruptibilidade (2,7), porque o fundamento dela é a própria efusão de sangue que Cristo realizou como vítima de expiação. É uma vida de fé e de caridade, que deve ser promovida nas tribulações, enquanto nos abrimos, pelos frutos do Espírito, a uma esperança que não será confundida (5,1-5). Cristo Jesus no-la comunicou na condição de Cabeça da Humanidade, numa abundância única do Espírito que implicou, além da remissão dos pecados, a própria comunicação do mesmo, que, em nós, se torna princípio de ressurreição na carne, condição de filiação divina, enquanto nos torna herdeiros da vida eterna (8,11-17).
Trata-se de um processo de sepultamento com Cristo na sua Morte. Aquele que se fez, para nós, Caminho, na condição de Princípio da nossa vivificação, em virtude da sua condição divina, não só nos arrasta na esteira da sua glorificação, como, também, se torna Modelo da nossa santificação. Impossível, portanto, cogitar de ainda continuar a ter qualquer parte com o pecado. Nós morremos completamente a ele. Na verdade, estamos ainda muito expostos ao pecado porque ainda estamos vivendo a conquista da nossa salvação. Mas Paulo nos lembra o nosso compromisso para que o renovemos exatamente através da Palavra, particularmente celebrada pelo Memorial da Morte do Senhor. Por ele, enquanto misticamente nos associamos ao mistério da sua imolação e somos fortalecidos pelo Espírito para o testemunho, através das Escrituras, renovamos a nossa motivação.

A vida cristã é, portanto, um sério engajamento na fé, na caridade, até nos abrimos a uma esperança motivada pela expectativa de podermos estar com Cristo, porque sabemos que somente assim escaparemos da ira divina. Se o fiel, depois de ter vivido a fé e a caridade, se acovardar no testemunho, não receberá a coroa da vida. Aquele que, depois de ter conhecido o Evangelho de Cristo e tê-lo abraçado nos seus compromissos, volta a crucificar a Cristo com o pecado, será excluído da vida eterna (Hb 6,4-6). A nossa salvação deve ser seriamente merecida. Nada como a reflexão intensa sobre tudo o que a produziu, o valor que tem em si e as exigências da mesma, para nos manter vigilantes. A apatia, o laxismo, o deboche e até a arrogância contra Deus poderiam, facilmente, voltar a tomar conta do nosso espírito. Rapidamente nos tornaríamos materialistas e perderíamos a sensibilidade pelos valores do espírito.

Perguntas para uma reflexão:
1a) Qual é a nossa relação com Cristo Jesus em virtude do Batismo?
2a) Qual é o dinamismo da vida cristã?
3a) Em que sentido Jesus é para nós Modelo e Princípio?

Carta aos Romanos (14)
A incompatibilidade da graça com o pecado (Rm 6) (II)

B) (6, 12-23) O nosso sacrifício espiritual

1º) Nossos membros devem se tornar instrumentos de virtude (6,12-14).

6,12s. Na base de tudo aquilo que acabou de expor (6,1-11), Paulo exorta a perseverar na conquista da salvação revestidos de fé e caridade, alegres na tribulação para desenvolver a vida do Senhor ressuscitado. O cristão está morto para o pecado e vivo para Deus (v.11). Na força do Espírito, do qual nos nutrimos todas as vezes que recorremos ao Evangelho de Deus, pelo qual contemplamos Cristo Caminho e Verdade que nos traz Vida, podemos viver a nossa condição de realeza, mantendo a nossa relação harmoniosa com a criação, da qual somos intérpretes na sua louvação ao Criador. Isto evita que voltemos a ser escravos das concupiscências, servos do pecado, instrumentos de iniqüidade. Porque redivivos entre os mortos, os nossos membros podem ser instrumentos de virtude.

6,14 Estamos sob o regime da graça. Está abolido o regime da Lei, que só multiplicava as culpas, porque agora, na força do Espírito podemos observar a Lei que Cristo levou à perfeição, dela nos mostrando, com o seu exemplo, toda a grandiosidade. A Lei é útil ao pecador (1Tm 1,9) para saber quais são os pecados que deve evitar e as obrigações com Deus a cumprir. Contudo, é só pelo Espírito que cumprimos a Lei, enquanto é por ele que vivemos a vida de Cristo.

2º) Não podemos mais ser escravos do pecado (6,15-23)
6,16 O cristão, pela sua fé em Cristo, se submeteu ao regime da virtude para a vida. Quem se submete aos vícios pratica o pecado e caminha para a morte.

6,17-18 Aquele que se converteu e se regenerou, abraçou a doutrina que medita dia e noite. Um exercício necessário que nos desvencilha da vaidade. O fiel vive como um liberto do pecado enquanto abraça a escravidão da virtude.

6,19-21 A experiência humana mostra à qual grau de baixeza moral podemos chegar quando, afastados de Deus, nos entregamos ao pecado. Os vícios nos enredam e nós vivemos escravos da iniqüidade. O seu termo é a morte porque a criatura humana em nada vive as condições da sua realização: o espírito não se nutre de Deus pela louvação suscitada pela contemplação do Poder e Glória divina, que colocam o homem na perfeita relação de dependência de criatura do Criador, de forma que vive a obediência que lhe permite uma condição de realeza, tornado-o assim mediador da louvação que sobe da criação ao Criador; a alma não encontra a verdade porque a atividade do seu corpo reage desordenadamente aos estímulos da vaidade.

6,22 Pela conversão, que é dom do Espírito de Cristo, recebemos a regeneração e a santificação, que devemos implementar, porque o termo último é a vida eterna. Enquanto sujeitos ao pecado éramos escravos agindo para a nossa morte, agora servimos à virtude. É o caminho correto. Procuramos os valores do Espírito, renovados por Cristo Cabeça, Primogênito da estirpe dos filhos de Deus, segundo a fé, a caridade e a esperança.

6,23 A vida eterna é o dom gratuito supremo dado ao homem por Deus pelo seu plano de divinização. O salário do pecado é a morte.

6,23 Tudo foi concedido por “um só homem, Jesus Cristo” (5,15).

6,23 “...Senhor nosso”. A condição de Jesus, o Cristo, é de ser o Cabeça da Igreja, abertamente constituído Senhor no momento da sua Ressurreição. Aqui temos esboçado o conceito de Igreja: um povo convocado sob o Cristo do Senhor, que usufrui das mesmas prerrogativas dele: “se a Cristo, também a nós”: “se sofrermos com Ele, para sermos glorificados com ele” (8,17).

Reflexão - O ponto de partida é a solidariedade efetiva que existe entre Cristo Jesus e nós, seus irmãos em virtude da Encarnação e da sua condição divina. Tendo o Pai criado nele, por ele e com ele o Adão verdadeiro, do qual o primeiro é figura (5,14), e tendo-o levado à perfeição na obediência e pelo sofrimento (Hb 2,10s), pelo Espírito são comunicadas à criatura as condições que levam à plenitude a obra da criação: a imortalidade gloriosa e a filiação divina. Nesse quadro, Jesus é a Videira, o Cabeça, a Pedra angular. Videira que comunica a seiva do Espírito; Cabeça que , pelo Espírito, atua o “desenvolvimento desejado por Deus” (Cl 2,19) e nos transforma de glória em glória (2Cor 3,17s); Pedra angular sobre a qual o edifício, bem edificado, se torna Templo de Deus. Cristo é a Plenitude da Divindade (Cl 2,9) que nos enche da Plenitude de Deus (Ef 3,19).
Essa vida divina, desde já, é vivida por nós na fé. São Gregório Nazianzeno diz que possuímos a vida eterna enquanto vivemos os seus valores, na expectativa da sua manifestação gloriosa.
Carta aos Romanos (15)
Livres deste corpo de morte (Rm 7)

Para Paulo, o homem sobre o qual a graça da justificação entende agir em virtude da fé em Jesus Cristo, é aquele que não pratica o que quer, enquanto faz o que detesta (v. 5). Embora a Lei seja santa e santo, justo e bom seja o preceito (v. 12), a letra da Lei não tem em si a força de resgatar o homem do pecado. Sob o regime da Lei o judeu era mantido cativo pela força do pecado, multiplicando as culpas porque, sendo carnal, não conseguia cumprir a Lei espiritual. De fato, o homem, a partir da sua rebeldia ao Criador, vê agigantar-se em si o mal que o escraviza, a ponto de constatar que é o pecado, que habita nele, o autor do mal que pratica. Agora, pelo corpo de Cristo, que morreu uma vez por todas, libertando-nos do pecado, cessou o regime da Lei, isto é a condição precária em que o homem se encontrava. Pertencemos àquele que ressuscitou dentre os mortos, a fim de produzirmos frutos para Deus. É como se tivéssemos morrido ao tempo em que a Lei era o nosso pedagogo para Cristo, ficando nós livres de pertencer ao Senhor, em virtude do seu Espírito, por ele merecido e a nós comunicado.
A condição de consciência distingue o homem de todos os outros seres animados. É uma centelha inserida numa massa de instintividade (Sb 9,15s). O desenvolvimento instintivo, conduzido segundo as regras da natureza, constituir-se-ia num ato de domínio sobre a criação e de louvor ao Criador, dele reconhecendo a soberania. Contudo, o homem fracassa porque não cultiva a contemplação que o levaria à correta relação com o Criador. Os instintos então se tornam irresistíveis. O homem faz o mal que não quer e não faz o bem que quer. A Lei não é suficiente para reter o homem dos vícios. Deus então intervém e ao homem que fracassa nas suas leis de crescimento, em Jesus, o verdadeiro Adão, mostra o Caminho. Por Aquele que é a Vida, vem em socorro do homem com o dom do Espírito, divinizando-o, de forma que o homem tem todas as condições e as mais altas motivações para se realizar: a situação de degeneração em que cai quando se omite na implementação das leis do seu crescimento; Cristo Caminho, Verdade e Vida, que aponta para a forma real de crescimento; Cristo Princípio do Espírito que o salva, o regenera e intercede.

O fiel é chamado a um vasto trabalho de santificação mediante o cultivo da graça que recebe de Deus que, na sua bondade misericordiosa, o chama à conversão (2,4). A Redenção não substitui o plano original de chamar o homem à participação da vida divina mediante o serviço pela obediência. Só o torna possível diante da extrema fragilidade da criatura, enquanto o Espírito é dado. Mas é só como primícias que ele é dado, de forma que o homem deve cultivar a fé em vista de uma caridade plena. É o programa da santificação ao qual todo e cada fiel é chamado (2Pd 1,5-10 ). A justificação pela fé converte e regenera. Depois disto, o fiel deve cultivar o que por um dom gratuito lhe é concedido: a configuração a Cristo, resistindo às tentações pela prática da virtude. O anima a consciência da grandiosidade do dom, da força que está nele, o Espírito, e a sabedoria do Plano de Deus que o Evangelho prometido, atuado e anunciado lhe revelam. O anima também a consciência que agora ele tem da condição de miséria moral em que ele voltaria a cair se deixasse de atuar as boas obras iniciadas pela conversão e regeneração no Batismo, mediante a procura da glória, da honra e da incorruptibilidade (2,7). O anima, enfim, o entendimento que ele tem da sua responsabilidade, diante da recusa dos judeus ao anúncio do Evangelho. Se algo grave acontece ao pagão que o recusa e algo pior acontece ao judeu, algo terrível vai acontecer ao fiel, caso profane, pela sua displicência, o dom da graça recebida pela justificação em Cristo. “Gratuitamente justificado pela misericordiosa Bondade, em virtude da redenção realizada por Cristo Jesus,...vítima de expiação no seu sangue” (3,24s), deve se deixar transfigurar por Cristo Senhor de glória em glória (2Cor 3,17s).

A condição definitiva contempla o homem espiritual em plena comunhão com o seu Criador. A corporeidade participará numa condição transfigurada como, analogicamente, acontece à semente que, plantada, quando morre, se transforma numa plantinha. O homem deve portanto se importar com os valores do espírito, continuamente lutando contra a absolutização dos valores da lei de vaidade. O instrumento da valorização do espírito é o Memorial da morte do Senhor, com tudo o que a Escritura ensina acerca do homem que acaba tendo a sua expressão máxima em Jesus, o Verdadeiro, que se fez Caminho para que tenhamos a Vida.

Perguntas para uma reflexão:
1ª) De que o homem é capaz, terminado o regime da Lei, em virtude da graça que Cristo mereceu com a sua Morte?
2ª) Quais são as motivações que o levam a viver a vida da graça?
3ª) De que forma São Pedro descreve as etapas da santificação em 1Pd 1,5-10?

Carta aos Romanos (16)
O dom do Espírito (I)

A vida no Espírito (8,1-17)

Em Jesus Cristo, Deus Pai cumpre com a sua promessa (Gn 3,15): justifica aqueles que conheceu e predestinou para serem conformes à imagem do seu Filho. Embora chamados a viver a sua vocação criatural, os homens fracassaram. No seu amor, Deus Pai não os abandonou. No Filho, tornado instrumento de redenção pelo seu sangue, os justificou. Ao homem glorificado é dada a condição de vida que Jesus Cristo mereceu, contudo como primícias (8,2). Volta o quadro inicial da criação. Nele está o homem com a responsabilidade de se desenvolver na obediência, mediante a superação das tentações e a perseverança nas tribulações. O anima agora o Espírito de Cristo, Cabeça de um povo que nele tem o princípio da regeneração até quando recai no pecado ( 1Jo 2,1).

Mas o homem tem que entender que não tem mais nada a ver com o pecado. A sua vida é o Espírito para a conquista dos valores do Espírito. Os atrativos da carne, satisfeitos de forma desregrada, levam à morte. Para prevenir a sua manifestação é necessário viver a vida do Espírito em toda a sua intensidade, à semelhança de Cristo Jesus que caminhou até a morte. Temos que nos tornar “uma coisa só com ele por uma morte semelhante à sua” (6,5). “Se morremos com ele, temos fé de que também viveremos com ele” (6,8): “pois sofremos com ele para também com ele sermos glorificados” (8,17).

Em princípio, “portanto, não existe mais condenação para aqueles que estão em Cristo Jesus” (8,1) porque, pela fé na sua morte redentora, são justificados e o Espírito é o princípio de força suficiente para resistir à virulência da carne (7,13) e crescer até a estatura adulta de Cristo” (Ef 4,13). “O Espírito socorre a nossa fraqueza,... o próprio Espírito intercede por nós” (8,26).

A dinâmica do nosso crescimento consiste em apelar continuamente ao Espírito de Cristo Jesus merecido pela morte de Cruz, que nós celebramos, na fé, como causa da nossa justificação. Estamos em condições de cumprir a Lei santa e espiritual (7,12.14), observando os seus preceitos (8,4. Contudo, para que o Espírito de Deus habite em nós, devemos realmente pertencer a Cristo. Isso implica a exclusão de todo a qualquer apego ao pecado (8,12. Cf. 1Jo 3,7-10; Ap 2,4-6). Uma vez recebida a presença do Espírito pela conversão que a Palavra anunciada pela Igreja provocou, o fiel que, na fé, recebe o Espírito daquele que por ele morreu e ressuscitou, deve cultivar a fé e a caridade até chegar a viver a efusão plena do Espírito na esperança, que brota de uma virtude comprovada: uma esperança que não será confundida. A fé é cultivada através da vivência dos dons do Espírito até produzir os frutos do Espírito. É somente nessas condições que Cristo está em nós pelo seu Espírito que nos vivifica de justiça em justiça.

Essa forma de vida será, enfim, selada pela ressurreição na carne. E, porque tornados filhos de Deus, seremos herdeiros, com Cristo, da vida eterna.

Todas essas realidades vividas por nós afastam qualquer temor de julgamento de condenação porque estamos correspondendo plenamente ao Plano do Pai e à imolação do Filho para a nossa salvação: estamos vivendo plenamente a vida no Espírito.

A descoberta desses valores nos sintoniza de forma inseparável com o Plano de Deus, pelo qual se revela todo o seu amor, a grandeza da vocação do homem e o esplendor da sua vida que nos foi participada pelo Filho constituído em poder pela sua ressurreição e que doa o Espírito de santidade aos membros do seu Corpo que é a Igreja.

Perguntas para uma reflexão:
1ª) Por que “não existe mais condenação para aqueles que estão em Cristo Jesus”? (8,1)
2ª) De que maneira desenvolvemos a nossa vida em Cristo?
3ª) Quais os benefícios dos que vivem em Cristo Jesus?

Carta aos Romanos (17)
O dom do Espírito (II)

A cosmologia revelada (8,18-27)

Deus reserva a sua Glória à criatura humana que vive a sua imolação. Vale a pena vivê-la, diante da vantagem que é oferecida. A própria criação “anseia pela revelação dos filhos de Deus” (v.19). A glorificação do homem a arrasta para a mesma condição. Sujeita à lei da vaidade, destinada à corrupção, dela é resgatada pelo homem que, libertado da corrupção e da morte em virtude do Espírito, na liberdade do mesmo Espírito chega à Glória como filho. Do Espírito nós temos as primícias. Como criaturas por Ele renovadas aspiramos à redenção do nosso corpo, porque é somente por ela que alcançamos a nossa glorificação. Para isso, deve ser aplicado o esquema exposto em Rm 5: superar a tentação, viver a tribulação na virtude comprovada, até coroar a vida de fé com uma esperança que não será confundida, porque o Espírito terá feito desabrochar os seus frutos: amor, alegria, paz, etc (Gl 5,22).

Pelo que o Evangelho de Paulo apresenta, resulta que o homem, livre da escravidão dos vícios, pode cultivar as virtudes do seu espírito, na força do Espírito. Isto significa acompanhar Cristo modelo de obediência e imolação com a certeza de chegar “à gloriosa liberdade dos filhos de Deus” (8,21). Isto já é vida eterna, santificação, embora, ainda exija o esforço de dominar os impulsos da carne. Contudo, “os sofrimentos do tempo presente não tem proporção alguma com a glória que há de revelar-se em nós” (v. 18). Participaremos da vida trinitária, à semelhança da Humanidade de Jesus glorificado, do qual nos tornamos imagem, segundo o Plano do Pai (v.28s). Entendemos, agora, porque era preciso que “o Cristo sofresse para entrar na glória” (Lc 24,26).
A Glória é, por nós, alcançada somente quando vivemos a perfeita condição criatural, que implica a obediência e a imolação. Cristo mereceu para nós essa condição. Dela nos revestimos pelo Batismo, chamados a preservá-la e cultivá-la pela Eucaristia, que nos torna sempre mais capazes do testemunho nas tribulações.

Em união com Cristo temos a função de mediar a louvação que parte da criação e sobe até Deus. Com a sua Ressurreição, Cristo já, em princípio, resgatou o cosmo da lei de vaidade.
Agora, esse processo se atua através do homem que, resgatado na sua imagem, deve proceder de glória em glória. Nós “possuímos as primícias do Espírito” (v.23). O melhor do que poderia ser dado à criação foi dado a nós. Mas o nosso corpo está ainda sujeito à lei da vaidade, arriscado a cair no pecado se não lutamos para a nossa salvação com “a couraça da fé e caridade” e “o capacete da esperança” (1Tss 5,8). O nosso anseio para a Glória poderia transformar-se em anseios pelos efêmeros valores do homem carnal, esquecidos da tarefa de conseguir a redenção do nosso corpo e a filiação divina de forma definitiva. Por isso o fiel deve “completar na sua carne o que falta à Paixão de Cristo” (Cl 1,24), porque é pelo sofrimento da luta que aumenta a esperança. Caso surjam tribulações, elas são a condição ideal para tornar nossa esperança quase que uma certeza, porque é na virtude comprovada, obtida pela paciência nas tribulações, que o Espírito é “largamente difundido em nossos corações” (5,3-5).

Rm 8, 26-27 descreve a ação do Espírito no processo de crescimento da criatura até à glorificação. Doado como primícias, o Espírito supre a fraqueza da carne, a partir da mediação que ele atua junto ao Pai, pedindo aquilo de que precisamos, porque nós nem sabemos o que pedir. A sua súplica são gemidos inenarráveis, algo sublime, próprio da natureza da divindade. O Pai entende, na sua infinita percepção das mentes, o sentido dos pedidos do Espírito. Há uma identidade de intenções entre o Pai e o Espírito. O Espírito pede segundo o Desígnio do Pai que “por livre decisão de sua vontade nos predestinou a sermos seus filhos adotivos no Amado” (Ef 1,5s).

A resposta de Deus é plena. Mas o fiel deve ser encontrado no amor, porque somente os que respondem aos desígnios de Deus são os beneficiados.

Perguntas para uma reflexão:
1ª) De que maneira o cosmo é associado ao destino de glória do homem?
2ª) Quais são os passos que o homem deve realizar para responder à ação do Espírito?
3ª) Qual é a importância da virtude teologal da esperança que é alcançada somente pela perseverança nas tribulações?

Carta aos Romanos (18)
O dom do Espírito (III)


O fruto espiritual (8,28-39)

Rm 8,31-39 é um hino de louvor que Paulo proclama como conclusão da sua reflexão, embora ainda parcial (1,16-8,39), sobre o Evangelho de Deus. Em socorro do homem, por si merecedor da ira, veio Deus com toda a sua bondade. Na sua misericórdia entregou o seu Filho para que os homens fossem justificados, por graça, em virtude da redenção realizada no seu sangue. Esse mesmo Filho, na condição de Senhor da Igreja, constituído Filho de Deus com poder pela sua ressurreição dos mortos, após ter-nos justificado com a sua Morte, promove em nós a santificação pelo seu Espírito de santidade, nos fazendo passar de glória em glória. Os que possuem o Espírito de Cristo têm em si o penhor da sua ressurreição, são herdeiros da vida eterna na condição de filhos e esperam a glorificação juntamente com a criação. Tudo pode ser sintetizado nos seguintes termos: “Aquele que de antemão nos conheceu, nos predestinou a sermos conformes à imagem do seu Filho, a fim de ser ele o primogênito entre muitos irmãos. Os que predestinou, também os chamou; e os que chamou, também os justificou, e os que justificou, também os glorificou” (8,29-30).

Realmente, “Deus coopera em tudo para o bem daqueles que o amam” (v.28). Paulo colhe, nesse momento, o seu fruto espiritual (1,13), que oferece aos fiéis de Roma como dom espiritual (1,11): sente-se ainda mais determinado “a ser posto à morte o dia todo” (v.36) porque, na morte, vê florescer a Vida, enquanto associado à Paixão de Cristo. Nada, portanto, o “poderá separar do amor de Deus manifestado em Cristo Jesus, nosso Senhor” (v.39).

Ao chegar a este ponto da sua reflexão sobre o Evangelho de Deus, Paulo sintetiza o seu pensamento enquanto contempla o Plano de Deus que se realizou e no qual somos inseridos na condição de eleitos, se realmente correspondemos ao chamado de Deus. Aquilo que Paulo aqui sintetiza, anunciando simples pontos de uma temática que desenvolveu até esse momento da sua Carta, será, por ele, celebrado no seu cântico espiritual a Deus Pai, na abertura da Carta aos Efésios. Nesse cântico temos a explicitação da comoção de Paulo, que conseguiu entender a grandiosidade do Desígnio de Deus, porque, “por livre determinação de sua vontade fomos feitos sua herança, a fim de servirmos para o louvor de sua glória, nós que teremos vivido esperando em Cristo” (Ef 1,11-12).

Aquele que chegou a experimentar a plena efusão do Espírito e, dessa forma, se abriu à esperança da Glória que receberá como herança, já não pode ser separado do amor de Cristo. Já terá sido provado que a tribulação, a angústia e a perseguição foram o caminho que o associaram à Paixão de Cristo. A morte pela espada só poderá coroar a alegria no Espírito que ele, então, experimentou. Não existe ser criado que possa prevalecer e fazê-lo deixar de amar a Deus que manifestou o seu amor em Cristo Jesus, nosso Senhor.

É evidente a conotação autobiográfica desse hino.
Conseqüentemente, vemos, claramente, como Paulo pode ser, para nós, perfeito modelo de vida cristã.

Em Cristo Jesus nosso Senhor, se manifestou a Bondade e o Amor de Deus. Na sua misericórdia, nos regenerou pelo poder do Espírito Santo que “ricamente derramou sobre nós, por meio de Jesus Cristo, nosso salvador”. Justificados pela sua graça, nos tornamos herdeiros da esperança da vida eterna (Tt 3, 4-7).

Perguntas para uma reflexão:
1ª) Quais são as etapas do Plano de Deus em favor do homem?
2ª) Qual é o fruto espiritual que Paulo colhe com a sua reflexão sobre o Evangelho de Deus?
3ª) Quais são as graças que uma vida cristã bem vivida nos alcança?

Carta aos Romanos (19)
O abismo da “riqueza, da sabedoria e da ciência de Deus” (11,33)
Rm 9

Paulo, depois de ter falado da “justificação pela fé” (1,18-4,25) e do caminho a ser percorrido para levar a justiça, alcançada pela fé, à sua perfeição (Rm 5-8), a partir de Rm 9 até o fim de Rm 11, trata da condição de Israel no Plano de Deus. O primeiro ponto diz respeito à maneira segundo a qual Deus, “por livre determinação da sua vontade”, realiza o seu Plano, qual é aquele de nos tornar “seus filhos adotivos no Amado” (Ef 1,5).

De início, não pode deixar de manifestar a dor do seu coração ao ver que os judeus, que são seus irmãos segundo a carne, se recusam, como um todo, em dar a sua adesão de fé, resistindo, dessa forma, a Deus que chama os homens à salvação, na sua misericórdia. Eles estariam na condição de usufruir de maneira toda peculiar, como está de fato acontecendo a ele, da graça do evangelho, uma vez que, em virtude da vocação de Abraão, pela circuncisão que os agrega de forma plena ao Israel de Deus, estão de posse do conhecimento do Deus, que manifestou a sua Glória e revelou o seu Poder com os seus grandiosos feitos ao longo de toda a sua história. Com ele, os seus ancestrais até concluíram alianças,dele receberam a Lei, a ele estão prestando o culto verdadeiro, dele esperam a realização das promessas, feitas a Abraão seu pai e a toda a sua descendência. Como, então, não conseguiram ver em Jesus o Cristo ao qual Deus deu a primazia (gr.: o ôn epi pantôn)? Algo que, em Paulo, provoca a mais alta admiração e a exaltação da riqueza da Glória de Deus, nele manifestada.

Será que Deus falhou no seu Plano? Não, porque ele o realiza mediante aqueles que escolhe. Para dar continuidade à Descendência que desde o princípio determinou suscitar em vista da recuperação do homem das garras do Maligno, foi ele que suscitou Isaac, como, também a Jacó, preferindo-o a Esaú.
Ninguém está em condições de questionar a forma de proceder de Deus, seria como se o barro questionasse o oleiro acerca do destino que lhe dá. De fato, vemos que,em última análise, foi pela escolha que Deus alcançou a salvação de todos, judeus e gregos, revelando, dessa forma, “a riqueza da sua glória” para todos aqueles com os quais determinara usar de misericórdia. Voltou a chamar de seu povo a Israel que acabara de renegar por causa da sua idolatria. O fez , como diz Isaias, reservando para si um resto deles, embora, por si, todos merecessem ser destruídos como Sodoma e Gomorra. Quanto aos gentios, numa iniciativa amorosa, “por livre determinação da sua vontade”, deixou-se encontrar, embora não o procurassem e tornou-se visível aos que não perguntam por ele (10,20).

O erro dos judeus é aquele de procurar a justiça, esquecidos que ela só pode ser alcançada pela fé. Ninguém é justificado pelas obras da Lei. Somos justificados no Cristo de Deus, que é o termo da Lei. Ao recusar-se em dar a sua adesão de fé Àquele que se revelou abertamente ser o Filho de Deus, ao qual o Pai entregou todo poder e que nos mereceu o Espírito com a sua Morte, os judeus não alcançam a justificação. Dessa forma, Jesus, o Cristo, torna-se para eles pedra de tropeço.

Perguntas para uma reflexão:
1ª) Quais são as prerrogativas pelas quais os judeus estão em condições de usufruir de forma privilegiada do Evangelho de Deus?
2ª) Qual é o critério que Deus escolheu para realizar o seu Plano de salvação em favor dos homens?
3ª) Por que Cristo Jesus se tornou para os judeus uma pedra de tropeço?
Carta aos Romanos (20)
A culpa dos judeus (Rm 10)


Diante do fracasso dos judeus, Paulo reza pela salvação deles.
Cometeram o seguinte pecado: foram zelosos nas coisas de Deus, mas não segundo a devida compreensão da Lei. De fato, guiados por um zelo não esclarecido, ignorando a justiça que Deus oferece e procurando estabelecer a própria, não quiseram se submeter à justiça de Deus.

Nos vv. 2-4 Paulo sintetiza tudo o que disse dos judeus em Rm 2-4: em relação a Deus (termo repetido 3 vezes) bom, paciente e longânime, os judeus são cegos, obstinados e rebeldes (2,4).
Alcança a justiça aquele que crê em Cristo (3,22), porque ele é o termo da Lei. De fato, quando é que se realiza o que Moisés diz a respeito da vida pela prática da justiça? É quando se realiza a justiça pela fé. É quando, ao ouvir o anúncio dos apóstolos, daqueles que falam de autoridade e cuja palavra é eficaz em promover a fé, o ouvinte confessa com a sua boca que Jesus é o Senhor, Aquele que Deus o ressuscitou dos mortos, movido pela fé que está no seu coração. Trata-se de uma condição que é oferecida a todos, judeus e gregos.

A partir de 10,17, Paulo detalha os motivos da culpa dos judeus.
1º) Embora o evangelho de Cristo tivesse sido anunciado no mundo inteiro, os judeus não lhe deram ouvido; 2º) não chegaram a compreendê-lo, por própria culpa. De fato, estão enciumados diante da conversão dos gentios.

A culpa dos judeus deixa Paulo angustiado e inconformado a ponto de expressar por meio de uma hipérbole, o seu profundo desejo para que se convertam. “Desejo ser anátema...”. Diz estas palavras aquele que no fim de Rm 8 declarou que nada poderá separá-lo do amor de Cristo. Ao revelar que, se fosse possível, aceitaria até esta condição, nos mostra quanto ele apreciava o que os judeus estavam perdendo. Grande foi o privilégio que Deus concedeu aos judeus quando os tornou o seu povo de escolha através da vocação de Abraão. Como povo de escolha é a descendência dos patriarcas, está na condição de prestar o seu culto ao Deus verdadeiro que a eles manifestou a sua Glória, deu a Lei e enviou os profetas. As Escrituras, portanto, deveriam ser a condição para acolher Cristo Jesus porque o pré-anunciaram (1,2) e o testemunharam (3,22). Por que este enrijecimento do coração e da alma, não querendo entender que a Glória manifestada sobre o rosto de Moisés ao apresentar a Lei aos hebreus era transitória? É agora que ela se manifesta de forma permanente no rosto dos Apóstolos que anunciam o Cristo. Este é o Senhor! Pelo seu Espírito somos santificados e passamos sempre mais de uma condição de fé para outra melhor (2Cor 3,18).

Paulo tem consciência que a sua pregação e a dos outros Apóstolos é uma manifestação do Espírito. A sua palavra tem força capaz de converter os corações. Ela tem o seu ponto de partida no testemunho que está nos Apóstolos em virtude do carisma profético e da unção sapiencial que receberam do Espírito. Os judeus estão repetindo o pecado que já cometeram no tempo de Isaias que exclamava: “Senhor, quem acreditou em nossa pregação”?

Paulo detalha os aspectos da culpa dos judeus com uma seqüência de citações das Escrituras: 1ª) a pregação chegou até os confins da terra; 2ª) um povo sem a inteligência que Israel possui a acolheu; 3ª) os judeus, com isto, ficaram irados.

Pelas argumentações de Paulo em Rm 9-10, entendemos, agora, claramente porque fundamentou a exposição do seu evangelho sobre um contraditório com os judeus, que vemos presente ao longo de toda a sua carta. Por ele aflora e se torna visível às nossas mentes toda a riqueza da graça que Deus nos concedeu, toda a grandiosidade do Plano dele que se iniciou com a vocação de Abraão, para ser recapitulado em Jesus, o Cristo, realizador de todos os anseios dos que o esperaram e que doa o Espírito ao povo da sua conquista, como penhor da herança eterna (Ef 1, 11-14).

Nós, agora, temos o Evangelho, reflexão sapiencial da Igreja apostólica que, em Cristo, reconhecido Filho de Deus com poder, pela sua ressurreição, vê o realizador da Profecia. Por ele somos confortados na nossa fé enquanto colhemos algum fruto espiritual, no dia do Senhor, ao guardarmos no nosso coração a palavra proclamada (Ap 1,3), que nos permite aprofundar sempre mais a compreensão do Mistério de Deus, que Cristo Jesus recapitula (Ef 1,10).

Perguntas para uma reflexão:
1ª) Qual é, para Paulo, a culpa dos judeus?
2ª) Qual é a grandeza do povo hebreu que os tornaria os mais aptos a receber o Evangelho de Deus?
3ª) Por que Paulo insiste, ao longo da sua carta, em dialogar com os judeus?

Carta aos Romanos (21)
O desfecho final (Rm 11)


Os judeus estão sendo preteridos em vista da salvação dos outros povos. Isto não significa repúdio por parte de Deus que, desde os tempos de Elias se revela fiel no seu amor. Quando o profeta pensava que Israel tinha abandonado o seu Deus para prestar culto a Baal, Deus a ele revelava que tinha reservado “sete mil homens” para si. “No nosso tempo”, diz Paulo, “constituiu-se um resto segundo a eleição da graça”. Trata-se dos escolhidos. “Os demais ficaram endurecidos” (v. 9). A queda destes, contudo, não é definitiva, sempre em virtude da fidelidade de Deus à sua Aliança com Israel. A volta deles à vida redundará na maior glorificação de Deus. Aliás, Deus permite a conversão dos gentios para que os judeus fiquem enciumados, “E eu”, volta a dizer o Apóstolo dos gentios, “honro o meu ministério, na esperança de provocar ciúme dos da minha raça”.

A graça pode ser comparada à seiva de uma oliveira que cresce e faz despontar os seus ramos. Até ramos de oliveira silvestre podem ser nela enxertados para se beneficiar da seiva da oliveira santa. Mas estes devem ser bondosos com os ramos da oliveira santa que foram cortados por causa da sua incredulidade e procurar estar firmes na fé. Um dia, Deus voltará a enxertar os ramos naturais. “O endurecimento atingiu uma parte de Israel até que chegue a plenitude dos gentios, e assim, todo Israel será salvo” (vv. 25b-26).

Estamos diante de uma grandiosa manifestação da misericórdia de Deus, aquele que na sua bondade sempre age com amor. No momento presente usa de misericórdia com os gentios, graças à desobediência de Israel, o que mostra a condição de desobedientes de ambos, gentios e judeus. Em virtude da misericórdia que Deus usa com os gentios, de forma recíproca, será misericordioso com os judeus que no tempo presente se revelam rebeldes: “Deus encerrou todos na desobediência para a todos fazer misericórdia” (v. 32).

O caminho da escolha e o caminho da vocação de Israel acabaram de mostrar a ciência de um Deus sábio e rico em misericórdia. Os seus pensamentos transcendem os pensamentos dos homens quanto o céu está acima da terra. Ninguém pode se atrever a querer ser seu conselheiro. Ele possui tamanha abundância de tesouros que nós não podemos imaginar quanto o seu Plano é diversificado. Isto ocorreu para os judeus. Nós temos que nos precaver para não cairmos no mesmo erro.

A reflexão sapiencial dos historiadores descobriu que o reino de Israel dos tempos de Davi e Salomão tinha sido obra de El Shaddai, o Deus que com amor maternal tinha protegido os patriarcas, o Deus que depois tinha-se revelado, pelo seu braço forte e sua mão estendida, ser Iahweh. Com este nome Israel devia invocá-lo para sempre. A tradição, como não deixa de observar Jesus, esquecida do espírito da Lei, tinha estabelecido critérios humanos para observá-la, elencando 613 preceitos, e tinha estabelecido princípios terrenos de interpretação dos sinais da vinda do Reino de Deus, que os profetas anunciaram e que Deus realizaria após ter purificado Israel e Judá de todas as suas culpas. Pelos diálogos que Jesus tece com os escribas do seu tempo vemos quanto ele insiste para que abandonem a maneira que é própria dos que são cá da terra e assumam aquela ditada por ele que vem do alto. Nisto os judeus são tão renitentes que a sua obstinação patenteia quanto o homem está longe da ciência de Deus. Parece que caímos no mesmo erro. Temos decretado que a religião interessa enquanto responde aos nossos problemas e às nossas necessidades. A religião é importante enquanto apresenta valores novos que Deus oferece ao homem e são eles que devem ser levados em conta: a divindade de Jesus, a forma original com que realiza a sua vocação messiânica para estabelecer o Reino de Deus, a nossa redenção pela sua Morte de Cruz, a vida divina que o Espírito Santo suscita e promove pela ação dos sinais sensíveis que Jesus instituiu, as Escrituras que nos conduzem à compreensão aprofundada dos Mistérios de Deus, etc.

Enquanto estamos firmes na fé, poderemos usufruir da graça que, por causa da fé, recebemos. Aliás, esta condição que faz crescer em nós a justificação, será até capaz de sugerir os verdadeiros meios para solucionar os nossos problemas mais prementes.

Perguntas para uma reflexão:
1ª) De que forma se revela a fidelidade de Deus no seu Plano de Salvação?
2ª) A quais critérios devemos nos ater para realizar em nossa vida o Plano de Deus?
3ª) Por que é somente a vida de fé que oferece as soluções dos nossos problemas?

Temas Bíblicos - Carta aos Romanos (22)
O nosso culto espiritual (12,1-2)


Fundamentado na argumentação acima exposta, Paulo, após ter tratado da condição dos israelitas diante da proclamação da messianidade de Jesus (Rm 9-11), nos exorta a nos oferecer como “hóstia viva, santa e agradável a Deus” para realizar o nosso “culto espiritual” (v.1). Traça então a linha de ação (v.2): abandono da filosofia do mundo enquanto aplicamos o processo de transformação que encontramos sintetizado em Rm 5,1-5: a graça da vida divina que nos configura a Cristo ressuscitado deve desenvolver-se através da superação das provações; o que nos torna perseverantes e cria em nós uma virtude comprovada.
É esta vida do espírito que produz a esperança, manifestação da plena caridade efundida, então, em nós pelo Espírito Santo, que opera em nós desde o nosso Batismo.

Enquanto nos considera como seres humanos relacionados a este mundo, em virtude da nossa condição corporal, Paulo nos convida a oferecer “nossos corpos”. A palavra “mundo” é utilizada por Paulo para indicar as leis do homem carnal que já levaram à ruína a humanidade, que agora devem ser abandonadas por aqueles que deram a sua adesão de fé ao Filho que Deus, no seu amor, quis que se imolasse por nós. De fato, somente o homem espiritual está em condições de se relacionar com Deus (1Jo 2,15).

Aquele que, portanto, pelo Batismo recebeu a vida nova, deve começar a desenvolvê-la pela purificação dos pecados no sangue de Cristo (1Jo 1,7; 2Pd 1, 5-10), para alcançar a perseverança, depois a virtude comprovada e, enfim, a esperança (Rm 5,3-5).

Em Rm12,1-2 vemos claramente que a linguagem é litúrgica e está relacionada ao ato de uma imolação de uma vítima a Deus, num sacrifício de louvor.

12,1. A exortação de Paulo apela, em nome de Deus, para que atendamos, agora, aos seus pedidos.

A intensidade com que expressa os seus sentimentos é fruto das reflexões teológicas expostas ao longo dos capítulos anteriores.
O homem foi resgatado das suas culpas por Deus que, no seu amor, entregou o Filho o qual, pela sua Morte e Ressurreição, nos comunicou uma vida nova. É a vida do Espírito que nos torna filhos de Deus, herdeiros, com Cristo, da vida eterna. Diante de tanta misericórdia e de tanta graça, assim nos exorta Paulo, apresentemos a Deus a nossa vida tornando o nosso ser uma vítima sacrifical, que tem em si a vida de Cristo, qual nos é concedida pelo Senhor ressuscitado, em virtude da sua Morte.
Ela deve se caracterizar, também, porque foi separada para Deus, isto é, nada mais tem a ver com o mundo. Porque, então, vítima sacrifical e sem defeito, agrada a Deus. Ela deve ser o nosso “culto espiritual”.

12,2. Não podemos mais andar segundo a filosofia do mundo, que 1Jo 2,15-17 ilustra. O termo grego (süskematízeste) indica 'simpatizar com o esquema'. Devemos nos transformar pela renovação da mente (gr.: metamorfúste), por uma mudança radical.

O mundo, do qual Cristo nos libertou pela sua Morte, em virtude da comunicação da vida nova no seu Espírito, deve ser gradativamente vencido.

A queima da vítima sacrifical com a qual Deus se agrada acontece ao longo de toda a vida cristã. De fato, enquanto o Senhor ressuscitado já possui de forma gloriosa a vida divina, merecida para a sua humanidade, e chegou a merecê-la através da sua obediência e imolação, em nós, pelo Batismo, embora perfeita em si, é embrional. Devemos atuar um processo de purificação qual indicado por 1Jo 3,3. Isto pressupõe que, ainda, não chegamos ainda à estatura adulta de Cristo e que podemos até estar na condição de quem vive privado do Espírito, por ter voltado a viver segundo a carne, a ponto de estar precisando de uma nova reconciliação da qual fala 1Jo 2,1. O que não pode acontecer é o que diz Hb 6,4-8.

Perguntas para uma reflexão:
1ª) Quando a nossa vida se torna um culto espiritual?
2ª) Quais são as etapas para que chegue à sua condição perfeita?
3ª) Como fala Hb 6,4-8?

Carta aos Romanos (23)

12,3. Enquanto reconhecemos a nossa posição na comunidade devemos considerar a nossa atuação como um serviço, segundo a nossa específica vocação, pelo qual o compromisso pessoal na edificação da igreja encontra mais uma motivação (a da caridade, além de agradar a Deus na imolação). É natural a satisfação que sentimos ao constatarmos a nossa eficácia; mas não devemos nos estimar “mais do que convém”: 1o) porque estamos sempre muito aquém daquilo que a função exigiria e 2º) porque somente é válido nos alegrarmos enquanto reconhecemos os grandes benefícios que Deus, pelo nosso ministério, concede.

12,4. A primeira motivação para a nossa modéstia vem da constatação de que há muitas funções na Igreja e que nós estamos simplesmente exercendo uma delas. É muito mais inteligente constatarmos que somos um corpo e precisamos uns dos outros.

12,5. Nós somos de Cristo, membros uns dos outros. É mais válido apreciar a contribuição do outro do que me vangloriar pela minha atuação.

12,6. É dom gratuito a profecia. Não há por que se vangloriar.
Pelo contrário, é a minha condição de servir. Devo atuá-la com responsabilidade para contribuir para a edificação do corpo, sobretudo “comunicando-a em harmonia com a fé”.

12,7. Quem é chamado ao ministério deve atuá-lo como serviço, seja ele bispo, padre ou diácono. Quem tem o dom do ensino deve transmitir as verdades gostando de poder fazer isso, mas, sobretudo gostando de poder nutrir os fiéis, ao mesmo tempo em que, modestamente, reconhece que muito ainda lhe falta aprender. Quem tem o dom de exortar, enquanto lhe é dado o dom de interpretar a Palavra de Deus, não deve se sentir superior nem atuar despoticamente, sabendo quanto ele é pecador e que, o importante é exercer a caridade de motivar o irmão.

12,8. Quem reparte é justo que sinta a satisfação da sua generosidade. Errado é o ar de superioridade. Correta é a modéstia de reconhecer que tudo ele recebeu de Deus. O importante, é se preocupar com a edificação da Igreja mediante a sua obra de misericórdia (afinal é bem mais fácil daquela de ensinar!). Quem é chamado a presidir viva o seu serviço com solicitude. Quem pratica obras de misericórdia, não desanime nem resmungue se ninguém o reconhece e se não tem motivo algum para se vangloriar. Sinta-se privilegiado de poder experimentar a desprendida alegria espiritual.

12,9. A fé devidamente desenvolvida é a verdadeira caridade. É aquela que detesta o mal e se atém ao bem (“aquele que guarda os mandamentos para conhecer a Deus” (1Jo 2,3). O Apóstolo, então, continua dizendo: “Quem diz de conhecer e não guarda os mandamentos é mentiroso, a verdade não está nele” (v.4). Quem guarda a sua Palavra... caminha como ele caminhou (v.5.6).
Engana-se a si mesmo quem não pratica os mandamentos, porque a caridade não está nele; não está radicalizando com o mundo, por isso o Espírito não está nele.
12,10. A estima recíproca ajuda a ter sentimentos de modéstia (v.3). Os outros têm valores que eu não tenho.

12,11. O zelo: individualmente, é o fervor da caridade; eclesialmente é o serviço do Senhor.

12,12. A alegria é um fruto do Espírito (Gl 5,22), que brota de uma caridade não fingida, sobretudo quando somos perseverantes na tribulação (Rm 5,3).

12,12. A oração. É a louvação do Poder e Glória que se manifestam nas obras de Deus. Por ela cultivamos a transcendência do Criador, que é Vida Trinitária; reconhecemos a sabedoria com que atua nosso plano de divinização; constatamos a nossa condição de miséria por causa do pecado; a grandeza da nossa liberdade no Espírito. Alcançamos uma compreensão sempre mais profunda da grandeza da Pessoa de Cristo ilustrada pelas Escrituras; a graça dos sacramentos; a nossa vocação eterna. É preciso perseverar nela para nutrir o espírito pela contemplação e reflexão sobre as verdades, antes que o corpo, com suas tendências desregradas, leve vantagem. Precisamos continuamente lembrar a nós mesmos o Modelo que é Cristo Jesus: como Ele levou ao triunfo o seu corpo pela obediência e imolação, assim acontecerá a nós. Precisamos manter a convicção de que o nosso ser permeado pelo Espírito, em virtude da Redenção, pode viver a imortalidade em todos os seus atos enquanto lembramos que o que praticamos segundo a carne, de forma indevida, nos leva à perda do Espírito e à morte.

12,13. As obras de misericórdia. São a manifestação do amor de Deus que está em nós.

12,14. A perseguição é uma condição privilegiada para crescer na virtude da paciência até experimentar a alegria do Espírito.

12,15. Participar da sorte dos mártires, socorrendo-os nas privações das prisões (v.13) é plenitude de vida cristã.
12,16. Cristo veio para servir.

Perguntas para uma reflexão:
1ª) Quais são as funções que os fiéis podem exercer em prol da Igreja?
2ª) Qual é a importância da oração?
3ª) Qual é a condição que leva a vida cristã à sua plenitude?


Nossa relação com os outros (12,17-15,13)

12,17-21. Depois de ter tratado do compromisso moral que cada fiel tem com a Igreja, enquanto é chamado a edificá-la contribuindo segundo a sua específica vocação, Paulo sugere a forma pela qual o cristão deve se relacionar com o próximo. A virtude da caridade deve inspirar suas atitudes em todas as circunstâncias. Quem faz o mal a quem o ofendeu está simplesmente se prejudicando. Paradoxalmente, diz Paulo, deveríamos pagar o bem com o mal. É isto que devemos fazer, desejando que o inimigo saia do caminho do mal, para que não se perca eternamente. Esta é caridade fraterna verdadeira. O mal que ele praticou já tem um juiz, que, por sorte, é misericordioso, para ele e para nós. Quando perdoamos temos tudo a ganhar, porque Deus nos perdoa muito mais. Quem insiste em não perdoar terá que pagar a sua dívida imensa com Deus.

13,1-7. As autoridades civis devem ser reconhecidas porque são manifestação da vontade de Deus. Os impostos devem ser pagos, como, também, as outras taxas que servem para remunerar os que cuidam da sociedade.

13, 8-14. É nesse momento que Paulo apresenta a caridade como a atitude que deve inspirar o fiel em todas as circunstâncias (13,8-10); atitude que está relacionada a outro princípio geral da vida cristã, qual é aquele da vigilância (13,11-14). Pela caridade e pela vigilância, o fiel estará sempre agradando ao Senhor.

14,1-15,13. Em relação aos irmãos que partilham da mesma fé, Paulo alerta que, movidos pela caridade, devemos evitar o escândalo: “Não faças perecer por causa do teu alimento alguém pelo qual Cristo morreu!” (14,15). A caridade deve nos sensibilizar diante da fraqueza de fé de irmãos que, às vezes, consideram fundamental aquilo que, de forma evidente para nós, é simplesmente opcional, como, distinguir entre alimento e alimento ou considerar dias sagrados os que podem não sê-lo.

Edifica a Igreja aquele que vive a justificação, a plena unidade com Deus e torna a sua vida um sacrifício espiritual. Pela unidade do Espírito, a sua vida favorece a paz e coopera na edificação da Igreja, Templo de Deus no Espírito.

Cristo Jesus em vista da edificação da sua igreja, aceitou assumir atitudes que não visavam a sua satisfação. Como nos ensinam as Escrituras, à semelhança de Cristo, assumamos as atitudes que evitam o escândalo dos fiéis.

A plenitude da vida cristã se dá quando a nossa fé chega a experimentar a alegria e a paz que o Espírito quer realizar em cada fiel. Isso acontece quando, como já nos ensinava Paulo em Rm 5,3-5, seguindo a Cristo na sua Paixão, o cristão desenvolve uma caridade plena, constante na tribulação.

Perguntas para uma reflexão:
1ª) Por que devemos vencer o mal com o bem quando alguém nos ofende?
2ª) Por que devemos nos preocupar com a fé dos nossos irmãos?
3ª) Qual é a relação entre Rm 15,13 e Rm 5,3-5?

Carta aos Romanos (25)
Resumo da Carta


Pela análise do texto da Carta constatamos que Paulo aproveita o seu primeiro contato com a comunidade de Roma para expor, de forma sistemática, os conteúdos da sua catequese.

O 1º ponto da sua exposição é a condição do homem:uma condição pecadora por ele ter-se afastado de Deus para cair na idolatria. Conseqüência disso são os distúrbios morais e a perversão que tomam conta do seu ser, a ponto de se tornar objeto da ira de Deus. Corolário do 1º ponto é a descrição da condição do judeu. Não obstante o privilégio de ser conhecedor da Lei, ele é igualmente pecador porque não a observa.

A conclusão do 1º ponto é: “Todos pecaram e precisam da Glória de Deus”.

O 2º ponto trata da justificação pela fé diante do anúncio do Evangelho de Deus. É justificado aquele que crê em Jesus Cristo, o Filho que Deus, no seu amor, quis que fosse a vítima de expiação. No seu Sangue, somos purificados dos nossos pecados. Corolário do 2º ponto é a argumentação, pelas Escrituras, em particular pelo que aconteceu a Abraão, o ancestral dos judeus: os judeus são salvos pela fé em Jesus Cristo e não pelas obras da Lei. A conclusão do 2º ponto é que participamos da Glória de Deus quando cremos que ele nos justificou no seu Filho pela sua Morte e nos santificou pela sua ressurreição.

O 3º ponto trata da maneira pela qual os que foram justificados pela fé devem viver a sua santificação. Rm 5 apresenta o tema em forma de exortação (vv. 1-11) e ilustra a grandeza da graça recebida, enquanto compara aquilo que se deu com Jesus Cristo com aquilo que, por contraste, aconteceu com o primeiro adão. Rm 6 apresenta a maneira segundo a qual o fiel deve conduzir a sua vida, ilustrando a graça do Batismo. Rm 7 aponta para a graça que nos foi dada e que torna possível a nossa santificação. Corolário do 3º ponto é o comentário de Paulo sobre aquilo que o Espírito Santo, agora, opera naqueles que são de Cristo (Rm 8). O final de Rm 8 é um hino inspirado por tudo aquilo que Deus operou segundo o seu plano.

Rm 9-11 trata, à parte, o papel dos judeus na história da salvação, desenvolvendo os seguintes temas: 1º) de que forma Deus atua o seu Plano; 2º) a culpa dos judeus; 3º) o desfecho final. A escolha de Deus é pessoal e se justifica em vista da salvação de todos. Israel é culpado diante de Deus porque não atendeu à voz dos enviados de Deus; o que permite que o anúncio da salvação se estenda a todos os povos. No fim, para a maior glória de Deus, Israel, como um todo, se converterá.

Rm 12 é uma exortação a viver a santificação individual em vista de um serviço na igreja segundo a específica vocação de cada um.

Rm 13,1-15,13 trata da relação com os outros.

Rm 15,14-16,27 retoma a explicação daquilo que motivou Paulo a escrever a sua Carta, que se conclui com a saudação.

No Prólogo, portanto, já estão os temas que Paulo desenvolverá ao longo da sua Carta, expressos em forma solene, como numa profissão de fé do Apóstolo: Chamados à obediência da fé, os fiéis devem viver a sua santificação, confortando-se pela palavra do Evangelho. Então, no judeu e no grego se manifestará sempre mais a justificação pela ação de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Perguntas para uma reflexão:

1ª) De qual condição Deus resgata o homem pela fé em Jesus Cristo?
2ª) De que forma desenvolvemos a vida da graça que o Batismo nos comunica?
3ª) Qual é o papel do povo hebraico no Plano de Deus?

Carta aos Romanos (26)
Epílogo (15,14-16,27)
Esclarecimento final (15,14-33)
Pelo que Paulo escreve nesse trecho do epílogo da sua carta, entendemos que esta foi um ensaio daquilo que deve ter feito, de forma sistemática, quando, afinal, chegou em Roma, e que fazia sempre e com toda comunidade cristã. Entendemos, também, que o prólogo (1,1-17) é uma justificação acerca do seu autor, que agiu com ousadia em relação aos fiéis de Roma, que já estavam na perfeita condição de se admoestar, porque cheios de amor fraterno, e de se exortar, porque repletos de ciência, e que, portanto, podiam, por si mesmos, se nutrir da Palavra, fortalecendo-se reciprocamente, e juntos se defender do mal.

No epílogo, Paulo reapresenta os pontos do seu esclarecimento inicial para que fique entendido que agiu dentro da sua função de apóstolo, aquele que deve anunciar o Evangelho de Deus e, depois da conversão, nutrir os fiéis com palavras cheias da unção do Espírito, segundo o dom da profecia a ele conferido em virtude da sua vocação. Por causa dessa prerrogativa da sua pregação, que permite que o Evangelho se revele em todo o seu poder santificante, na condição de ministro de Cristo, com a obrigação de evangelizar os gentios, civilizados ou bárbaros, doutos ou sem instrução, a sua tarefa visa tornar os gentios um sacrifício espiritual agradável a Jesus Cristo, santo, pela ação do Espírito. Na base da experiência da sua pregação que se estendeu de Jerusalém até toda a Ilíria, por tudo aquilo que, ao longo da mesma, Cristo operou de sinais e prodígios, ele tem certeza que não falhou, pela carta que escreveu, na sua obra de evangelização entre os fiéis de Roma. Nas condições em que ele serve no ministério da pregação do Evangelho, a sua pregação é força de Deus para a salvação de todo fiel, segundo aquilo que ensinou quando falou do empenho que os justificados pela fé devem ter, para escapar da ira de Deus no dia do julgamento. Ela produz o processo gradativo de uma revelação da justiça enquanto a fé vai se tornando sempre mais adulta.

Pelo que deduzimos do epílogo, podemos afirmar que, na Carta aos Romanos, junto a uma exposição sistemática do evangelho temos uma reflexão que a acompanha e que produz frutos em virtude da graça da Verdade . As reflexões de Paulo têm a característica de serem de autoridade apostólica. Paulo tem consciência disso. Por isso lembra que a sua pregação, em virtude do seu carisma apostólico, acontece na força do Espírito Santo e se manifesta com toda ciência (2Cor 11,6). Temos uma amostra dessa força no próprio prólogo, momento em que sintetiza o seu evangelho, enquanto exorta os fiéis de Roma a perseguir a sua santificação. São palavras que confortam porque mostram toda a grandeza do poder de Deus que se manifestou em Jesus Cristo ao ressuscitá-lo dos mortos e ao constituí-lo Senhor da Igreja, com poder, tornado de alma vivente Espírito vivificante.

Isso explica porque Paulo estava pronto para uma ação evangelizadora entre os fiéis de Roma. Seria, mais uma vez, uma demonstração da eficácia com que a Palavra, por ele, agia. Ela é força para a salvação para todo e cada um que crê. Uma salvação que os fiéis devem procurar, potenciando a vida em Cristo, depois que chegaram à justificação pela conversão.

Perguntas para uma reflexão:

1ª) Pelo epílogo, o que entendemos do prólogo?
2ª) Qual é a prerrogativa de uma pregação apostólica?
3ª) O que visa, especificamente, a reflexão de Paulo, que a Carta aos Romanos nos apresenta?




Nossa relação com 
  








 




2 comentários:

  1. Caro Padre Fernando, meu eterno formador, o livro que devo escrever continua a aumentar em capítulos- "O Padre Capra tinha razão". Estou lendo seus comentários. São de extrema serventia para um padre de aldeia na Diocese de Marabá. Abraço filial- Pe. Sanzio Luiz Ferraz

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