Evangelho de João (1) Introdução (I)
No fim do Evangelho de João temos um epílogo,
delimitado por uma inclusão (20,30-21,25), que descreve a vida da igreja, após
a ascensão de Jesus, constituído por três quadros: a pesca milagrosa, a
refeição à beira do lago e a vocação de Pedro ao testemunho. Por esses quadros,
entendemos que a atividade dos Apóstolos depende da presença de Jesus, que se
preocupa em reunir ao redor da refeição eucarística aqueles que dele devem
haurir entendimento e forças para o trabalho apostólico e o testemunho. Pelo
epílogo conclui-se que Jesus é o Senhor da igreja.
É desse Senhor
que o Evangelho de João quer falar, proclamando, a partir do prólogo, sua divindade
e messianidade. Ao longo do Evangelho, o Unigênito Deus revela a sua Glória,
enquanto atua, na sua pessoa, a figura
do Filho do Homem, do qual profetizam Ezequiel e Daniel. Dessa forma se torna
claro o sentido das palavras que abrem o epílogo: 30 “Jesus fez,
diante dos discípulos, muitos outros sinais ainda, que não se acham escritos
neste livro. 31Estes, porém, foram escritos para crerdes que Jesus é
o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais a vida em seu nome”
(20,30s).
A reflexão sapiencial da Igreja
apostólica quer dar continuidade a tudo o que o Deus de Israel foi revelando
através dos historiadores, dos profetas e dos sábios. Ao reconhecer em Jesus o
realizador da profecia, se tornou o Israel novo, possuidor da riqueza da
revelação em toda a sua plenitude. Se grande era a graça das verdades contidas
na Profecia, imensa ela se tornava pela fé em Jesus, Filho de Deus,
“abertamente manifestado com poder, pela sua ressurreição, em espírito de santidade” (Rm
1,4). Com o seu evangelho, João quer nutrir a fé dos fiéis. O seu tema é:
“Jesus é a Palavra que assumiu a condição humana para colocar a sua tenda entre
nós” (Jo 1,14). É, portanto o Filho do Homem que, tornando-se Templo da Divindade, pela
Água que jorra do seu lado direito, em virtude da sua imolação, na condição de
Cordeiro imolado, dá a vida aos que a ele dão a sua adesão.
A condição divina de Jesus,
proclamada no prólogo, volta a ser afirmada quando o Cristo Jesus se proclama
Senhor do Sábado, que trabalha com o Pai que sempre trabalha (5,17). Aliás, diz
Jesus, ele somente faz o que vê o Pai fazer (v.19). Mais ainda, ele tem o poder
de dar a vida, da mesma forma que o Pai (v.21). A condição divina de Jesus é
proclamada mais uma vez quando Jesus se declara o “Eu sou”, Aquele que existe
antes que Abraão fosse (8,58). Verdade que fica ainda mais explícita quando
Jesus declara que Ele e o Pai são Um, ele estando no Pai e o Pai nele
(10,30.38); verdade repetida a Felipe no discurso de despedida: “Quem me viu,
viu o Pai. Não crês que estou no Pai e o Pai em mim?” (14,9-10).
A Pessoa divina do Filho vai se
manifestando enquanto Jesus atua em si a figura profética do Filho do Homem que
atribui a si desde o início da sua atividade messiânica. A Natanael que se
admira porque Jesus lhe disse que o viu debaixo da figueira, Jesus responde que
um dia o contemplará como o Filho do Homem servido pelos anjos (1,51). É,
portanto, esta figura que define a Pessoa humano-divina de Jesus, com todos os
significados que encontramos em Ezequiel: Jesus é a Glória de Deus (Ez 1), que
constrói para si um Templo do qual sairá, pela sua imolação, a água do Espírito
que renovará a face da terra (Ez 47).
O intuito catequético do Evangelho,
a condição divina de Jesus e a figura profética do Filho do Homem, que Jesus
atribui a si de modo especial e de forma insistente, são chaves de leitura às
quais poderíamos acrescentar a Morte de Cristo já presente no anúncio profético
de João Batista: “Eis o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo” (1,29).
Dela Jesus fala desde o início, quando realiza o primeiro dos seus sinais em
Caná da Galiléia, apresentando-a como celebração da Aliança eterna de Iahweh
com o seu povo (Os 2,18-22). A Morte de Cristo, necessariamente unida à figura
do Filho do Homem, é o fio condutor de toda a narrativa evangélica. A ela tende
toda a atividade de Jesus (4,34): por ela, chegará à Glória que lhe é própria
desde antes a criação associando os seus na sua sorte (Jo 17).
Perguntas para uma reflexão:
1ª) Com que
intuito João escreve o seu Evangelho?
2ª) Quais são
as chaves de leitura do Evangelho de João?
3ª) Qual é fio
condutor da narrativa do Evangelista?
Evangelho de João (2)
Introdução (II)
Jesus transmite a sua mensagem em
diferentes níveis, dependendo a quem se dirige: aos discípulos ou ao povo ou
aos escribas. Aliás, é com os escribas que pode efetivamente provar que ele é o
Messias. Quanto ao povo e aos discípulos somente indica a sua prerrogativa
mediante os sinais que podem levá-los a crer nele. O diálogo com os mestres da
Lei começa com o colóquio com Nicodemos. Jesus sabe que está falando a um dos
mestres em Israel e, por isso, cita a Lei de Moisés, querendo levar o escriba à
compreensão da nova realidade que ele está trazendo e que as figuras do AT
preanunciavam: “Como Moisés levantou a serpente no deserto, assim deve ser
levantado o Filho do Homem” (3,14). Aliás, notamos que Jesus está explicando o
sentido da serpente levantada com a figura da Glória de Iahweh da qual fala
Ezequiel, quando atribui a si o título messiânico de “Filho do Homem”.
Certamente Nicodemos deve ter intuído o sentido pleno desse título no momento
em que, reunido com o sumo sacerdote e os outros membros do sinédrio, ouviu
Jesus proclamar que ele era o Filho do Homem que eles veriam chegar sobre as
nuvens dos céus com todo poder e glória (Mt 26,64). Não é por acaso que o
encontramos no sepultamento de Jesus, junto com Maria e João, “trazendo cerca
de cem libras de uma mistura de mirra e aloés” (Jo 19,39; Mt 2,11). A realidade
nova é o nascimento da nova criatura que Jesus pode provocar naqueles que dão a
sua adesão de fé a ele [a figura de Nicodemos que compra os perfumes e os óleos
para embalsamar o corpo de Jesus, representa muito bem o discípulo que
reconhece em Jesus o Messias e o espera vê-lo de volta glorioso (Sl 45, 7-9)].
Os escribas devem, portanto, a partir dos sinais, se deixar atrair pelo
Pai,dispostos a abandonar a tradição humana e a reconhecer que as Escrituras
falam de Jesus, para que cheguem a ter a vida que tanto procuram na Lei.
Jesus volta a explorar as
Escrituras, da forma que a explorou no seu diálogo com Nicodemos, quando é
contestado pelos escribas porque curou o paralítico no dia de sábado (seu 3º
sinal). Ele é o Senhor do sábado. Ele sempre trabalha, da forma que o Pai faz.
Ele é aquele que faz somente o que vê o Pai fazer. Em união com o Pai, Ele tem
o poder de dar a vida e de julgar de forma que todos “honrem o Filho como
honram o Pai” (Jo 5,23). “Vós perscrutais as Escrituras para ter nelas a vida...
Mas elas falam de mim” (v. 39). Em Jo 5 estão plenamente unidos os dois níveis
da catequese: a dos sinais e a da interpretação das Escrituras. Os escribas e
fariseus estariam em condição de dar a sua adesão de fé a Jesus com muito mais
fundamentos, não fossem os desvios do seu espírito que procura a “sua própria
glória”. Neles não está o amor de Deus. Pecam até contra a evidência da
verdade. Exasperados diante da sua impotência, porque não conseguem enfrentar a
sabedoria de Jesus, especialmente por saberem que Ele não estudou as Escrituras
(7,15), o insultam e se deixam levar pela vontade de matá-lo (8,40).
O ensinamento de Jesus explora as
Escrituras mais uma vez quando explica aos que o procuram
porque se saciaram sem, contudo, ter entendido o sinal. Mais uma vez cita a
figura de Moisés que deu o maná aos israelitas no deserto. Aquele não era o
verdadeiro pão do céu. O verdadeiro Pão do céu é aquele que o Filho do Homem
lhes dará: “a sua carne oferecida em sacrifício para a vida do mundo” (Jo 6,51).
O debate, que sempre tem como
fundamento a Lei com os seus ensinamentos, torna-se sempre mais profundo em Jo
7, quando Jesus mostra aos seus interlocutores o quanto estão longe de Deus
porque não seguem o modelo do seu ancestral, Abraão. Neles há uma vontade
homicida que os torna filhos do diabo. Em Jo 8, Jesus defende a sua condição
divina e a prova através de uma argumentação que culmina com uma afirmação categórica:
“Antes que Abraão fosse, Eu sou” (Jo 8,58).
A série de debates que João relata
prova, no mínimo, que os discípulos chegaram à convicção que Jesus proclamou,
diante dos escribas, citando a Lei, que ele era de condição divina e realizava
em si a figura do Messias. Prova, também, que certamente, diante da
argumentação incontestável de Jesus, os escribas tiveram que admitir, embora
não o reconhecessem, que Jesus tinha a eles provado ser de condição divina. Foi
esta a verdade que não puderam afastar da sua mente e que, utilizada como
pretexto, os levou à condenação de Jesus como blasfemo. Até diante de Pôncio
Pilatos alegaram essa proclamação que Jesus fez de si, a ponto de Pilatos
mandar pô-la, por escrito, na ponta do patíbulo da cruz: “Jesus de Nazaré, rei
dos judeus” (Jo 19,19; Sl 95,7).
A vitória de Jesus acontecerá no dia
de Pentecostes quando Pedro declarará, diante dos que levaram Jesus à morte,
que mataram o Santo, o Autor da Vida. Então, movidos pela graça do Espírito,
uns escribas pedirão o batismo, definitivamente convertidos à causa do Messias,
Filho de Deus.
Perguntas para uma reflexão:
1ª)
De que forma as Escrituras são fundamento para melhor chegar à compreensão de
Cristo, mistério de Deus?
2ª)
Por que os fariseus e os escribas se recusam em reconhecer que Jesus é de
condição divina?
3ª)
Quando foi, afinal, que escribas e fariseus deram a sua adesão de fé ao Cristo
de Deus?
Evangelho de João (3) Unidade
temática (I)
O Senhor da Igreja, que João quer
apresentar como o Cristo e Filho de Deus, é a salvação que se manifesta no dia
do Senhor (2,1; Os 6,2). É anunciada, em primeiro lugar, por João Batista, o
precursor, que aponta para Jesus como Cordeiro que tira o pecado do mundo: o
Cordeiro pascal, figura do Servo de Iahweh, que carrega sobre si as nossas
culpas (Is 53). É também relevada por Jesus, nas Bodas de Caná. Em ambos os
casos, ela é trazida por Aquele que vem com o Espírito. No entanto, quando Jesus
se apresenta a Natanael, caracteriza a figura utilizada por João Batista com o
título de Filho do Homem. Dessa forma, Jesus é a Glória de Iahweh que, pela sua
ressurreição edificará o Novo Templo, do qual sairá a Água que gera a vida. A
exposição de João acompanha as Escrituras que apresentam Iahweh que, da sarça
ardente revela o seu nome (Ex 3,14). Com Oséias falam dele como o “Esposo” que
volta a amar a sua Esposa com quem celebra Núpcias eternas (Os 2,21-22). Com
Ezequiel, falam da Glória de Iahweh que julga a cidade e constrói para si um
Templo novo, do qual sai a Água da vida.
A esse respeito, notamos que as
Escrituras são o fundamento de toda a argumentação de Jesus, que a Igreja faz
sua. O indicam, desde o início, as palavras de André a Pedro e de Filipe a
Natanael: “Encontramos o Messias” (1,41), “Encontramos aquele de quem
escreveram Moisés, na Lei,e os profetas” (v.45). A argumentação de Jesus, a
partir do seu diálogo com Nicodemos, será toda sobre as Escrituras. As Bodas de
Caná e a purificação do Templo (Jo 2), dela já anunciam o tema: o Filho do
Homem dará à sua Igreja o Espírito que sairá do Templo do seu Corpo
reedificado.
Podemos dizer, portanto, que Jo 1-2
são a apresentação do conteúdo do Evangelho de São João , à luz de Gn 3, da
profecia de Oséias e de Ezequiel: Iahweh volta a desposar o seu povo; do novo
templo sairá a água viva, merecida pelo Filho do Homem (Ez 47,1-2).
O diálogo com Nicodemos (Jo 3),
fundamentado no que diz Moisés no Livro da Lei, pela narrativa da serpente
levantada no deserto para curar quem olhasse para ela, é a primeira aula
catequética sobre o Filho do Homem, entregue à morte por Deus Pai, que se torna
condição de salvação ou de condenação. Os depoimentos de João Batista,
incluídos em Jo 3, ligam a figura do Filho do Homem a Iahweh que desposa o seu
povo.
O diálogo com a Samaritana (Jo 4)
reapresenta a salvação que Jesus traz, pelo dom do Espírito, destinada ao mundo
inteiro. Do Messias, todos os homens receberão o Espírito.
Em Jo 5, a partir da cura do
paralítico no dia de sábado, Jesus apresenta os fundamentos de sua
reivindicação de ser “igual a Deus”. 1º) Dele testemunhou João Batista. 2º) Os
sinais que ele opera indicam que ele vem de Deus. 3º) As Escrituras falam dele.
Moisés condenará aqueles que, embora reivindicando a sua paternidade, não
tiverem reconhecido Aquele de quem ele falou.
Jo 6 quer mostrar os verdadeiros
seguidores do Filho do Homem. São os que reconhecem em Jesus a verdadeira
vítima pascal e dela se nutrem porque é o “verdadeiro pão descido do céu”. O
maná, dele, era somente figura. Por ele conhecerão a ressurreição no “Dia da
salvação”.
Em Jo 7, sempre tendo o templo como
pano de fundo, símbolo do Templo novo em que ele se tornará quando, imolado,
dele jorrará a Água viva, Jesus debate com os escribas e fariseus sobre a sua
condição messiânica, exortando-os a serem fiéis descendentes de Abraão. João,
através do diálogo com os escribas e fariseus, quer mostrar a esmagadora
superioridade de Jesus, e, conseqüentemente dos seus seguidores, na
interpretação das Escrituras.
A partir do episódio da adultera,
(Jo 8), Jesus pede aos judeus que acreditem nele. A letra da Lei mata. Tem que
ser cumprida segundo o Espírito. Se não acreditarem que ele é o “Eu sou”,
morrerão nos seus pecados.
A cegueira dos chefes do povo e dos
fariseus permanece (Jo 9). Não reconhecem o sinal, não querem reconhecer em
Jesus o Filho do Homem (9,35-41). Jesus, então, pronuncia a sua sentença: “Para
um discernimento é que vim a este mundo: para que os que não vêem, vejam, e os
que vêem, tornem-se cegos” (Jo 9,39).
Perguntas para uma reflexão:
1ª)
Por que, ao revelar a sua Glória, Jesus manifesta que chegou o Dia da salvação?
2ª)
Quais são as figuras do Antigo Testamento que ilustram o título de “Filho do
Homem” que Jesus, a princípio, atribui a si?
3ª)
Em quais capítulos de João vemos Jesus citar e atribuir a si o título de “Filho
do Homem”?
Evangelho de João (4)
Unidade temática (II)
Esgotadas todas as argumentações com
os judeus, Jesus prossegue na formação de um povo novo. Ele já tinha tomado
essa iniciativa quando, num lugar deserto, além do mar de Tiberíades, qual novo
Moisés tinha celebrado a sua Páscoa, para que, através do “verdadeiro pão
descido do céu”, os que dessem sua
adesão a ele, alcançassem as condições de vida eterna.
O novo povo terá nele a Porta do
céu, o Filho do Homem, Glória de Iahweh, o Pastor de Israel, “Um com o Pai” (Jo
10,30), com o poder de “dar a vida e de retomá-la”.
A ressurreição de Lázaro quer
ilustrar as condições de vida eterna oferecidas aos os que crêem que Jesus é o
Cristo, o Filho de Deus (11,25-27).
Chegada a “Hora”, o Rei-Pastor
estabelece o Reino do Pai pela sua imolação. É o Filho do Homem que já anunciou
o aspecto nupcial da sua Morte, nas Bodas de Caná, e que, agora, dela revela
ser a condição da sua glorificação (Jo 12).
Jo 13-17 é o resumo da exposição
doutrinal acerca de Jesus e da sua missão no mundo, dirigida por Jesus aos seus
discípulos. Jesus se antecipa à páscoa hebraica e deixa aos seus o sinal da sua
Páscoa. O Filho do Homem, que o Pai consagrou e enviou ao mundo, pelo pão
partido, quer que participemos da sua imolação. O serviço é a forma da sua
realização, imitando Jesus, Mestre e Senhor. Assim todos saberão que somos seus
discípulos.
Com a sua Morte, (Jo 14), os
discípulos de Jesus estarão em condição de se tornar morada do Pai. Nele,
glorificado, encontrarão o Caminho, porque “um com o Pai” é a revelação do
Verdadeiro e Princípio da vida. Aliás, tendo chegado ao Pai, enviará o
Espírito. Vivo, estará sempre com eles e, com o Pai estabelecerá a sua morada
em todos os que observarem os seus mandamentos. Então, os seus discípulos,
guiados pelo Espírito, entrarão em plena comunicação com o Verdadeiro.
Jo 15 É dever produzir muitos
frutos. Isto acontecerá se viverem no amor, imitando-o no amor que ele
manifestou ter com eles dando a sua vida.
Jo 16 Devem estar preparados porque
serão odiados pelo mundo da mesma forma que ele foi odiado. Fiquem certos de
que o Espírito será o seu defensor testemunhando contra o mundo o seu pecado, a
sua injustiça e o merecimento da justa condenação. Alcançarão as condições de
podê-lo seguir para estar com ele.
Jo 17 é a oração de Jesus inspirada
por tudo aquilo que acabou de ensinar na Ceia da sua despedida. Pede a sua
glorificação e que, pela sua imolação, os seus o glorifiquem. Que os seus
discípulos sejam preservados do Maligno. Que todos os que nele crerem vivam em
tudo os seus mandamentos para que sejam um, como ele o é com o Pai. Dessa forma
convencerão o mundo a crer naquele que Deus enviou. Tornando-se desse modo merecedores da vida eterna, estejam
para sempre com ele e contemplem nele a Glória de Deus Pai.
Para isto Jesus dispõe-se a viver a
sua imolação para que os seus discípulos conheçam ainda mais o Nome: “a fim de
que o amor com que me amaste esteja neles e eu neles”.
Animado por esse último sentimento
expresso na sua oração, Jesus caminha para a sua Paixão. É o “Eu sou” que a
vive, o Filho do Homem, a Glória de Iahweh, que o mundo voltará a ver com todo
poder e majestade. Dá testemunho do Verdadeiro. Quem é de Deus o escuta. Não o
escutaram os que adotaram o Diabo como pai.
Vítima da sanha homicida dos chefes do
povo e dos fariseus, Jesus é entregue à morte. A coroa de espinhos e o manto de
púrpura indicam a sua glorificação e o reino que está merecendo em favor dos
homens. È o Filho de Deus que caminha para o seu triunfo.
A presença da Mãe debaixo da cruz e as
palavras que Jesus a ela dirige, sinalizam o sentido da morte de Cristo. O
rei-esposo vive as suas núpcias para que os discípulos recebam o Espírito e
vivam a alegria do perfeito amor (17,26).
O lado aberto pela lança mostra como
Jesus é o Novo Templo. É o “Eu sou”, a Glória de Iahweh, o Filho do Homem que,
elevado da terra, doa a Água viva do Espírito, que sai do lado direito do altar
do Templo. Jesus é o Cordeiro pascal que será memorial para sempre da Glória de
Iahweh que se revelou com braço forte e mão estendida. Os perfumes da sua
sepultura, mirra e aloés, indicam que ele é o rei que defende a justiça e a
verdade (Sl 45).
Perguntas para uma reflexão:
1ª)
Qual é o ensinamento do discurso de Jesus depois do Lava-pés?
2ª)
De que forma a Morte de Jesus é a realização da sua glorificação?
3ª)
De que maneira a Morte de Jesus na Cruz se relaciona às Bodas de Cana?
Evangelho
de João (5) Jo 1
1,1-18
Jesus é a Palavra que se fez carne
A última definição de Jesus por parte da
Igreja apostólica que, pela ressurreição, chegou a reconhecer nele o Filho, é
que ele é a Palavra que está em Deus, sempre voltada para Deus. Para descrever
essa condição divina do Senhor da Igreja, o evangelista João apela à narrativa
da criação, na qual se fala da Palavra
criadora. Jesus é essa Palavra que, em virtude da sua encarnação, é agora
conhecida por nós como Pessoa divina. Desde sempre está com o Pai e faz somente
aquilo que vê o Pai fazer (5,19). Dela temos uma descrição extremamente
ilustrativa em Pv 8, 22-31: Ela estava com Deus desde antes que os mares e os
montes existissem e, no momento da criação, ela agiu como mestre de obras, em
quem Deus se compraz. É a Sabedoria divina que Sb 7,25-26 chama de Espírito único,
resplendor da Glória do Onipotente, Imagem de sua bondade.
Quando a Palavra assume a condição
de Enviado do Pai e se apresenta com a humanidade de um “filho de homem”, só
pode ser a Luz divina que enquanto resplandece, é Vida para os homens. Chegou o
Dia do Senhor, dia de Luz, que Israel sempre esperou como Dia da salvação.
Essa realidade tão inesperada, por
vontade divina, tem uma testemunha na pessoa de João Batista, reconhecido entre
os judeus como profeta. A Palavra, realmente, se fez carne. Ela esteve no nosso
meio como manifestação da Divindade que habita no Templo que criou para si.
Nela se revela o Invisível. Jesus é o resplendor da Glória, o Deus que se
revelou a Israel pela sua história, com “braço forte e mão estendida”, pelos
seus feitos grandiosos. O fez pelas obras que o Pai quis que ele realizasse: os
exorcismos, os milagres, a doutrina e a morte de cruz selada pela ressurreição.
Por ele, Deus comunica aos homens a
sua vida plena. A Torah não podia comunicá-la, era simplesmente o pedagogo para
Cristo. Pelo Unigênito Deus é dado ao homem entrar em plena comunhão de vida
com Deus.
1,19-34
O testemunho da Profecia
Para o evangelista é determinante o
testemunho de João Batista que, enquanto nega ser ele o Messias, aponta para
Jesus que declara ser o Servo de Iahweh,
o Cordeiro que carregará sobre si as culpas dos homens. Dele anuncia a condição
eterna: “Aquele que vem depois de mim existia antes de mim”. Ele é aquele que
vem com o Espírito que vivifica. É o Cristo, o Filho de Deus.
1,35-51
Jesus e os Apóstolos
João, André, Pedro, Felipe e
Natanael que o reconhecem como Messias, recebem de Jesus a revelação que ele é
“a casa de Deus e a porta do céu”. Jesus cita de maneira explícita a visão de
Jacó, em Betel, (Gn 28,12), enquanto nele se realiza a figura profética do
Filho do Homem, do qual falam Ezequiel e Daniel.
Por meio de Jo 1, o Senhor
ressuscitado que assiste a Igreja é apresentado na sua condição divina e
messiânica. Ele é o Unigênito Deus que, pela sua encarnação nos comunica a
“graça e a verdade”. Grande foi a graça que Israel recebeu quando Deus lhe deu
a Lei. Todavia é por Jesus, o Cristo, testemunhado pela Lei e os Profetas, que
o Espírito renova a face da terra e os homens entram em plena comunhão de vida
com o Verdadeiro. Aos que o acolhem dá a condição de poder se tornarem estirpe
de Deus.
Perguntas para uma reflexão:
1ª)
Quais são os termos pelos quais João define a condição divina de Jesus?
2ª)
Qual é a importância de João Batista?
3ª)
Qual é o título messiânico pelo qual Jesus se apresenta?
Evangelho de João (6) Jo
2
2,1-11
O Senhor da Igreja é o Esposo
A narrativa alegórica das Bodas de
Caná visa ilustrar, de Jesus, a sua condição de Esposo. O gesto de oferecer a
Água, capaz de comunicar a alegria do Espírito, simbolizada pela sua
transformação em vinho, porque participa a vida da graça que leva à plena
comunhão com Deus, antecipa a “sua hora”. É fácil estabelecer um paralelismo
entre essa narrativa e o quadro da Morte de Cristo na Cruz. Em ambos os casos
está presente a mãe que assume a figura da Mulher, segundo as palavras que Deus
pronuncia em Gn 3,15: “Ódio porei entre ti e a Mulher”. O sinal que João nos
narra deve ser considerado a primeira das interpretações da Morte do Senhor, a
Descendência que esmagará a cabeça da serpente.
Quando o Filho do Homem é “elevado
da terra”, segundo as Bodas de Caná, na sua glorificação deve ser visto na
condição de Deus que volta a desposar o seu povo. Nele se realiza a profecia de
Oséias (Os 2,21-22 ). O dom que o Esposo apresenta à Esposa é o Espírito que
não tinha sido ainda concedido, não obstante todos os ritos de purificação que
a Lei de Moisés prescrevia. O autor da Carta aos Hebreus se estende sobre esse
ponto quando afirma que o sangue dos animais não podia cancelar os pecados (Hb
9,8-10).
O Lava-pés é uma segunda alegoria da
Morte de Cristo, que ilustra de que maneira Jesus nos alcançou a purificação e qual
deve ser o caminho da nossa santificação.
Dessa forma resulta que a Morte de
Cristo na Cruz é realmente a “Hora” da sua glorificação. Pela sua obediência
até a morte, o Adão Novo chega ao termo da sua santificação, realiza o Plano de
Deus e efunde o Espírito sobre toda carne.
2,13-22
O Senhor é o Templo
No momento em que Jesus pronuncia o
seu desafio diante do protesto dos anciãos do templo, nos anuncia que ele
reerguerá o que eles tentarão fazer desaparecer. Dessa forma, Jesus anuncia a
sua vitória na condição de Filho do Homem, título messiânico com o qual se
apresentara a Natanael, ao mesmo tempo que aludia às palavras que Jacó
pronunciara depois da visão da escada que partia da terra e chegava ao céu,
pela qual os anjos subiam e desciam para servir o Filho do Homem: “Esse lugar é
verdadeiramente a casa de Deus e a porta do céu”!
Pelos dois episódios de Jo 2 sabemos
exatamente que o evangelista nos falará de Jesus Cristo, a Palavra que se fez
carne, o Filho de Deus Pai, o Unigênito Deus que se manifestou em toda a sua
Glória, através da figura da Glória de Iahweh, da qual fala o profeta Ezequiel.
Ela se apresenta na condição de um electro, no meio do fogo que está numa nuvem
tempestuosa, “como um filho de homem que é fogo dos quadris para baixo e fogo
dos quadris para cima” (Ez 1,27s). Aliás, essa será a figura com a qual, na
condição de Messias, interpelado pelas autoridades religiosas, anunciará a sua
condição divina que o levará a voltar sobre as nuvens do céu para julgar a
cidade terrena (Mt 26,64).
Dessa forma devemos ligar o
evangelho de João ao Apocalipse e pensar em Jesus como o Cordeiro que tira o
pecado do mundo (1,29) e o Filho do Homem, o Templo do qual a Glória de Iahweh,
o “Eu sou”, faz jorrar a Água da vida (Ez 47,1).
Perguntas para uma reflexão:
1ª)
Nas Bodas de Caná quais são os elementos que as relacionam à Morte de Jesus na
Cruz?
2ª)
O que é que simboliza o dom do Espírito nas Bodas de Caná e na Morte de Jesus
na Cruz?
3ª)
Qual livro do NT complementa o que o Evangelho de João sugere de Jesus como
Filho do Homem e Cordeiro imolado?
Evangelho de João (7) O
povo ao qual Jesus pregava
De
Jo 2 falta comentar o v. 12 que é o apêndice do quadro das Bodas de Caná e os
vv. 23-25. Eles nos falam dos ouvintes de Jesus: “a sua mãe, seus irmãos e seus
discípulos” (v.12), e “muitos que, vendo os sinais, creram no seu nome” (2,23).
Segue-se, porém, uma importante observação do evangelista: “Mas Jesus não tinha
confiança neles, porque os conhecia a todos” (v.24).
Conhecemos da mãe de Jesus o
entendimento, pelas palavras que a ele dirige quando o reencontra nas Bodas de
Caná: “Eles estão sem vinho”. São palavras que revelam uma compreensão única
que ela tem do seu filho, ainda mais manifesta por aquilo que diz aos
serventes; “Fazei tudo o que ele vos disser”. É a mulher de fé que “tudo guarda
no seu coração e o medita”, o que lhe permite crescer sempre mais na graça. Não
acontece a mesma coisa com os irmãos e os discípulos. Sabemos do desânimo pelo
qual muitos deles foram tomados, quando Jesus os chamou para um desafio crucial:
“Esta palavra é dura, quem pode escutá-la”? (6,60). Diante do mesmo discurso de
Jesus, Judas toma a determinação da traição ao seu
mestre.
O próprio Jesus declarará aos Apóstolos que
não poderão segui-lo para onde ele está indo e que Pedro o renegará antes que o
galo cante, apesar da declaração do
evangelista quando é realizado o primeiro dos sinais por Jesus: os discípulos, ao verem a sua Glória, creram
nele. Assim também, os que chegam a crer no seu Nome, ao ver os sinais que
fazia, não merecem a confiança de Jesus que conhece os passos que a fé deve dar
para se tornar inabalável. Na própria Mãe de Jesus existia uma contínua
necessidade de superação diante da ação profética do seu Filho, embora dele
conhecesse a condição divina desde a Anunciação do Anjo. Nesses termos se
expressa Lucas, diante da pergunta que José e Maria fazem a Jesus quando o
reencontram no templo. Uma resposta cheia de mistério: “Por que me procuráveis?
Não sabíeis que devo estar na casa de meu Pai?” Eles, porém, não compreenderam
a palavra que ele lhes dissera” (Lc 2,49s). Podemos imaginar a dificuldade dos
Apóstolos e do povo. Todos imbuídos por um falso messianismo de cunho político,
esperavam que Jesus restabeleceria o Reino de Israel com uma ação militar.
Pedro até pega a espada e acaba cortando com um golpe, a orelha de Malco.
Jesus não nega que os que acolhem as
suas palavras já estejam no caminho da salvação. Trata-se, contudo de um começo.É
preciso deixar que o Pai os atraia. Tornar-se-á necessário que aceitem a
realidade da imolação do Filho do Homem, que abracem a condição de servos, à
semelhança do Filho do Homem que veio não para ser servido, mas para servir e
dar a sua vida em resgate de muitos. Os discípulos terão que abandonar o
pensamento do homem terreno para abraçar os mandamentos daquele que vem do alto
e que tem palavras que possuem o Espírito sem medida. Quando chegarem a
comungar da sua carne dada para a vida do mundo, então viverão por ele, porque
terão encontrado o alimento que o Filho do homem quis dar, segundo o Espírito
com o qual o Pai o marcou. Segue a Jesus e encontra o caminho da sua realização
aquele que faz da sua vida “um sacrifício espiritual agradável ao Senhor...”,
discernindo “o que é bom, agradável e perfeito” (Rm 12,1-2).
Perguntas para uma reflexão:
1ª)
Qual é o entendimento que Maria, a mãe de Jesus, tem das palavras dele?
2ª)
Por que os discípulos ainda não podem entender plenamente a Jesus?
3ª)
Quando se realiza o pleno seguimento de Jesus?
Evangelho de João (8) Jo 3
Jesus
perscruta as Escrituras
O
diálogo de Jesus com Nicodemos é o início de um extenso ensinamento que nos
leva a entender em toda a sua originalidade e grandiosidade o Desígnio de Deus
que “de antemão, por livre determinação de sua vontade estabeleceu que o homem
se tornasse seu filho adotivo em Jesus Cristo” (Ef 1, 5). Desde a sua abertura
Jesus anuncia que tudo será obra do Espírito. Será como uma nova criação. O
homem nem imagina de que forma dar-se-á. Ele a pensa segundo a sua experiência
do nascimento, como toda criatura vem à vida. Jesus diz que tudo depende do
Filho do Homem, elevado da terra. A Lei e os Profetas já o anunciaram. No Êxodo
temos o episódio da serpente de bronze que Moisés levantou para que todos os
que para ela olhassem fossem curados. Jeremias fala de Deus que borrifaria o
seu povo com o seu Espírito para que fosse purificado.
A
grandiosidade do Plano de Deus é anunciada por Jesus com palavras solenes:
“Deus amou tanto o mundo que enviou o seu Filho Unigênito”.
O seu
reconhecimento por parte da criatura é condição de vida eterna. A importância
da pessoa de Jesus está no fato que ele é Pessoa divina: a Palavra que, desde
sempre está com Deus, pela qual tudo foi criado, que é Luz-Vida; que assumiu a
condição humana para estar entre nós e nos revelar a sua “Glória, na condição
de Unigênito Deus e nos comunicar graça sobre graça. Ao recordar Moisés como
sua figura, dizemos que ele nos deu a Lei, enquanto “a graça e a verdade nos
vieram por Jesus Cristo”.
A fé
nele provoca a ação de Deus que nos faz nascer pelo Espírito como quem nasce de
Deus.
A
“kénosis”, a condição de servo, a imolação de cruz, a nossa filiação adotiva, a
comunicação do Espírito são os elementos que ilustram o amor daquele que é a
Bondade. Fiel a si mesmo, Deus esquece os pecados, os crimes, a condição de
injustiça em que se encontra o homem, aceitando a sua expiação pelo sacrifício
que Jesus oferece. Pelo seu amor ao Filho, doa o Espírito, princípio seguro de
realização e de participação ao Reino. A grandiosidade do gesto é comprovada
pela dignidade daquele que é entregue: o Filho, cuja natureza é a Divindade
participada com o Pai e o Espírito. Para habitar entre os homens, ele faz sua
tenda a humanidade assumida pela encarnação.
A
glorificação da humanidade assumida é realizada pela Pessoa divina do Filho que
a conduz, na obediência e no serviço, até a entrega total pela morte de cruz.
Os vv.
22-30 lembram, através do testemunho de João Batista, a condição messiânica de
Jesus e a sua prerrogativa de ser o Esposo. O descontentamento dos discípulos
de João Batista diante da atitude de Jesus provoca a reflexão do evangelista
que volta a insistir sobre a mentalidade nova que devemos assumir em relação a
Jesus. É preciso reconhecer que ele fala segundo o pensamento de Deus. As suas
palavras são Espírito e Vida. O Pai a ele entregou todo Poder, nele vive a
Natureza divina. Dessa forma, quem crê no Filho, aquele que o Pai consagrou e
enviou ao mundo, tem a vida eterna. Quem não crê está condenado e a ira de Deus
permanece sobre ele.
Perguntas
para reflexão:
1ª) Qual
é a originalidade e grandiosidade do Desígnio que Deus realiza em Jesus Cristo?
2ª) Qual
é a condição para termos parte na graça que o “Unigênito Deus” traz?
3ª)
Quais são as prerrogativas que devemos reconhecer em Jesus para podermos
usufruir da sua graça?
O
Evangelho de João (9) Jo 4
“A salvação vem dos judeus”
Jesus chega ao poço de Jacó, que está na Samaria, vindo da Judéia. Quando os habitantes de Sicar dizem à samaritana que reconhecem em Jesus o Salvador do mundo (v.42), entendemos que João através da sua narrativa quer nos ensinar que é a partir de Jerusalém que deve irradiar-se a salvação. Contudo, exatamente porque terá que se estender a todos os povos, a topografia não terá mais nenhuma significação: “Os verdadeiros adoradores adorarão a Deus em Espírito e Verdade”. Este ou aquele monte sobre os quais estão situados os templos, cessarão de ser importantes. Tornar-se-á importante viver os valores do Reino. Dessedentados pelo Espírito e nutridos pela Verdade, os membros desse reino guardarão a sua liberdade praticando a purificação dos seus pecados e observando os mandamentos de Cristo.
A primeira coisa a ser feita pelos samaritanos é abandonar a idolatria para se tornarem, como os judeus, adoradores do Deus único e verdadeiro: o Deus que se revelou a Israel, não o bezerro de ouro que está nos templos da Samaria. Moisés, ao descer do Monte onde tinha-se encontrado com Deus, mandou destruí-lo. Mandou até que os hebreus confessassem o seu pecado engolindo-o, tendo-o pulverizado e misturado com água. A idolatria renega a Aliança que Deus estabeleceu com Israel. Quem se prostitui pela idolatria, querendo confiar em deuses falsos, deixa de ser adorador do único Deus que se revelou a Israel “com braço forte e mão estendida”.
A samaritana reconhece nas palavras que Jesus a ela dirige um sinal de Deus. Logo assume uma atitude reverente diante daquele que, embora seja a primeira vez que o vê, revela ser ele um profeta. Não se rebela, da forma que fez o sacerdote de Betel com o profeta Amós, tornando-se dessa maneira merecedor da ira de Deus. Embora a repreensão de Jesus seja grave, a aceita juntamente com os seus conterrâneos. Com eles chega até a reconhecer nele o Salvador do mundo. Não era assim que estavam se comportando os anciãos do templo, depois da sua ação profética pela qual mostrava que a casa do seu Pai precisava ser purificada de toda imundice, exatamente porque era ali que morava o Deus de Israel.
A água do poço já não interessa mais àquela que se abeberou à Fonte da Água que jorra para a vida eterna. Dessedentada com Água viva que Jesus ofereceu, entendendo que estava prestando culto a ídolos, reconhecendo os seus crimes, chega a compreender qual era a verdadeira maneira para prestar culto ao Deus de Israel, único e verdadeiro, a conhecer o Messias no profeta que estava falando com ela. Estava com a alegria da vida nova que ansiosamente queria compartilhar pelo anúncio aos seus concidadãos.
Jesus, também, compenetrado com a sua ação salvadora que tinha acabado de realizar, não está interessado com o alimento que os Apóstolos acabam de trazer, tendo, para isso, ido até a cidade para comprá-lo. Nele está a ânsia de poder realizar a vontade do Pai, porque esse é o seu verdadeiro alimento, cujo valor, por sua vez, os Apóstolos descobrirão ao experimentar a alegria da ceifa de tudo aquilo que Jesus terá semeado.
Desde já podemos constatar que, para Jesus, a sua Morte de Cruz era o termo último que, enquanto realizaria o Desígnio do Pai, nele realizaria a glorificação e a condição de levar o Espírito a todos os homens.
Perguntas para reflexão:
1ª) Qual é a Água que o Cristo quer oferecer?
2ª) Quem são os adoradores em Espírito e Verdade?
3ª) Qual é o alimento com o qual Jesus deseja se nutrir?
2ª) Quem são os adoradores em Espírito e Verdade?
3ª) Qual é o alimento com o qual Jesus deseja se nutrir?
Evangelho de João (10) Jo 5
“...
todos honrem o Filho como honram o Pai” (5,23)
É o momento em que Jesus fala abertamente da sua
divindade que os seus interlocutores são convidados a aceitar na base da prova
irrefutável da sua messianidade. A prova incontestável se fundamenta nas obras
do Pai que ele realiza e que vão se apresentando em Jo 6 (o verdadeiro Pão,
aquele que desce do céu), Jo 7 (o templo do qual jorra a Água da Vida), Jo 8 (o
Eu sou), Jo 10 (o Pastor Bom, Um com o Pai, que dá a vida pelas suas ovelhas), Jo
11 (a Ressurreição e a Vida), na sua Paixão, momento em que se revela nele a
Glória do Pai (Jo12), e, enfim, na sua Ressurreição.
O anúncio começa com um sinal, a cura do paralítico na piscina de Betesda. É
sábado, e é exatamente nesse dia que Jesus se proclama “o Senhor do sábado”, a
quem todos devem honrar como honram o Pai. Nessa condição “ele faz somente o
que vê o Pai fazer”. O Pai o ama e “lhe mostra tudo o que ele faz”. A ele, o
Pai deu o poder de ressuscitar e de dar a vida aos mortos.
Todos os que crêem nele e no Pai que o enviou têm a vida e não são julgados.
João Batista é testemunha da sua origem divina. Uma vez que acreditaram nele,
ele é uma condição valiosa para acatar a sua pregação.
São
sobretudo as Escrituras que falam dele, as que os próprios escribas e fariseus
perscrutam. A Igreja, no tempo de João Evangelista, não duvida entrar no campo
das Escrituras que os escribas tanto confiavam, para provar a condição messiânica
de Jesus. São os escribas que não querem se aproximar de Jesus para ter a vida,
“porque neles não está o amor de Deus”, procuram somente a própria glória.
Portanto, Moisés os acusará diante de Deus, por não terem acatado a evidência
da verdade.
A luz que Jo 5 oferece para a interpretação dos capítulos seguintes, nos
permite uma visão unitária do Evangelho de João. Em Jesus se realizam as
Escrituras e é a Igreja que oferece a interpretação, a mais profunda, das
figuras messiânicas. Os escribas se surpreenderiam diante de tamanha
originalidade, chegassem eles à conversão, como chegou Paulo de Tarso. Diante
da pregação de Pedro, três mil fariseus se converteram, no dia de Pentecostes,
e viram em Jesus o Santo, o Justo que não podia conhecer a corrupção, o Autor
da vida que, por inveja, os sumos sacerdotes e os anciãos do povo levaram à
morte. Essa compreensão de Jesus é a passagem necessária para entender como, em
primeiro lugar, para João Evangelista, ele é, antes de tudo, de condição divina.
É essa condição que é afirmada, desde o prólogo do seu evangelho e, nesse
capítulo, é abertamente proclamada por Jesus.
Para João, Jesus é a Pessoa divina do Unigênito Deus, a Palavra voltada para o
Pai que, ao assumir a nossa condição humana, dele manifestou a Glória. Dele, em
virtude da sua imolação de Cruz, jorra a Água da vida, que sai do lado direito
do Templo, a partir do lado direito do altar (Ez 47,1). Portanto, Jesus é o
Filho do Homem, a quem o Pai deu o poder de julgar. É segundo esse título que
João fala de Jesus, o Cristo, o Filho de Deus. No homem Jesus se manifesta a
Glória de Iahweh que, na visão de Ez 1, vem para julgar a Cidade pecadora e se
apresenta como “um filho de homem” apesar de ter todas
as características da divindade (Ez 1,26-28). A sua manifestação última
acontecerá na sua segunda vinda. Aquele que os sumos sacerdotes e os anciãos do
templo levaram à morte é o homem Cristo Jesus que voltará sobre as nuvens, com
todo poder e glória.
Quem nele crê, tem a vida eterna.
Perguntas para reflexão:
1ª) Em que termos Jesus descreve a natureza divina
do Senhor do sábado?
2ª) Quais são os sinais pelos quais a Igreja
reconhece o Messias em Jesus?
3ª) Qual é o título que, no evangelho de João,
define a condição divino-messiânica de Jesus?
Evangelho de João (11)
Jo 6
“A minha carne é verdadeira comida,
o meu sangue é verdadeira bebida” (6,55)
A narrativa da multiplicação dos pães (6,1-15), está relacionada à de Mt 14, onde
encontramos a explicação do porquê Jesus atravessa o lago. A
ligação com Mateus explica a anotação de João referente a Jesus que está na
montanha onde senta com os seus discípulos. Ela significa que Jesus está para
ensinar segundo a autoridade que recebeu do Pai. Os discípulos, sentados aos
seus pés devem acatá-la, não julgá-la segundo critérios humanos. Infelizmente,
muitos dos seus discípulos abandonarão Jesus dizendo “esta doutrina é muito
dura quem pode suportá-la”, esquecidos dos sinais proféticos que garantiam a
sua origem do alto. A narrativa de Mt 14 liga claramente o sinal ao pão partido
e distribuído na Última Ceia. Dessa forma, a narrativa de João deve ser
entendida no mesmo sentido, principalmente porque o evangelista liga a
multiplicação dos pães à Páscoa.
O próprio Jesus quer que o povo olhe para o seu milagre como para um sinal,
para que entenda que ele quer dar, na verdade, um alimento que dure para a vida
eterna. Marcado pelo selo do Espírito ele quer nos transmitir tudo o que ouviu
do seu Pai para que o nosso espírito não tenha mais fome. Pelas palavras que
possuem o Espírito sem medida, nos saciaremos e nos dessedentaremos para sempre
porque nos tornaremos adoradores do Pai em Espírito e Verdade. A sua doutrina
quer apresentar o caminho da realização que cada adão, criado à imagem e
semelhança de Deus, deve perseguir, seguindo o Filho do homem que, na sua
humanidade, realiza o adão verdadeiro. Por isso os discípulos devem aceitar o
opróbrio da Cruz, que Moisés já apresentava como uma exaltação do Messias,
condição de salvação para todos os que olhassem para a serpente erguida na
haste.
A fé terá que ser manifestada pela
celebração sacrifical, mediante a participação da carne
da vítima imolada para a salvação do mundo. O memorial da sua morte é
sacrifício que realmente une o que come da sua carne e bebe do seu sangue ao
Verdadeiro que o faz viver.
A recusa de muitos discípulos em aceitar a doutrina de Jesus torna-se, para nós
evidente comprovação de que a Eucaristia é realmente o Corpo de Cristo. Dele
nos alimentamos enquanto nos torna dele participantes pela carne da vítima que
somos convidados a comer. Essa é a doutrina que os Apóstolos abraçaram. Pedro
considera o ensinamento de Jesus uma doutrina divina. A determinação, naquele
momento, de Judas Iscariotes de abandonar Jesus e de entregá-lo aos seus
adversários, nos revela a radicalização dos que, na fé no seu Mestre, se
determinaram em segui-lo.
Devemos dizer que os evangélicos, embora reconheçam a inspiração do Evangelho
de João, a partir do momento que não adotam a fé do Apóstolo, estão se privando
de algo que o próprio Cristo Jesus instituiu e que por quinze séculos a igreja
apostólica dos seus pais constantemente professou. Diante disso, não resulta
temerária a interpretação que exclui a presença real de Jesus na Eucaristia?
Corresponde às palavras dos discípulos que se afastaram. É fruto de um
raciocínio humano. Da mesma forma, a fé dos que abraçam o ensinamento de Cristo
corresponde às palavras de Pedro: “Só tu tens palavras de vida eterna”.
Não é possível pensar que Jesus realizou um sinal tão importante para que os
Apóstolos usufruíssem dele somente
naquele momento e que, a partir de então estivessem celebrando uma mera
recordação saudosista pela Fração do Pão. Jesus teria, então, instituído a
Eucaristia somente para que fosse usufruída
pelos Apóstolos na Última Ceia? Ou o teria feito em vista da Igreja da qual os
Apóstolos são os alicerces? A Eucaristia celebrada como simples recordação
pelos símbolos do pão e do vinho que recordariam o sinal da graça do Corpo dado
e do sangue derramado, seria totalmente desvirtuada, gesto inferior até às
figuras da mesma nas Escrituras.
Perguntas para reflexão:
1ª)
Qual é o alimento pelo qual o Filho do homem nos convida a trabalhar?
2ª)
De que forma participamos do sacrifício da Cruz?
3ª)
O que significa presença real sacramental de Jesus na Eucaristia?
Exegese Jo 6
Exegese Jo 6
Estamos
diante da catequese do Apóstolo São João à sua comunidade sobre o alimento pelo
qual Jesus, o Senhor da Igreja, põe os seus em comunhão de vida com ele, os nutre
(21,9) para que seu trabalho seja frutífero, se tornem capazes do testemunho e
vivam vigilantes na expectativa da sua vinda (21,6.15.22). João debate todos
os motivos da desconfiança que surgem naqueles que já deram a sua adesão de fé
a Jesus, que levam os judeus a não aceitar a doutrina de Cristo, que já levaram
muitos discípulos a abandoná-lo e o próprio Judas a traí-lo. O pano de fundo é
o Êxodo com as figuras da páscoa hebraica, do cordeiro imolado, do povo no
deserto que recebe o maná do céu. Seguindo essas evocações, João expõe a
doutrina de Jesus.
Esquema
da exposição
6,1-15 O quadro alegórico da multiplicação dos pães.
“Dai-lhes vós mesmos de comer”. O termo último
do alimento é o povo. Jesus se serve dos
Apóstolos para distribuir o alimento que ele cria e multiplica. Os mesmos
Apóstolos são encarregados de administrar o alimento que durará para sempre.
Pronuncia a ação de graças, reparte os pães e os distribui aos seus. É a ceia
pascal, aqui evocada pela anotação cronológica, própria de João: “Estava
próxima a páscoa dos judeus” e pelos gestos de Jesus relativos à Última Ceia, a
Páscoa que Jesus desejou ardentemente celebrar com os seus, dando ao rito
antigo que termina (Lc 22,17) um novo sentido (v.19-20). O memorial do “corpo
dado” e do “sangue derramado” é o novo memorial que substitui e supera o antigo
memorial da libertação e constituição de um povo novo.
6,16-21 A travessia revela a natureza do autor da
multiplicação dos pães: Aquele “a quem até os ventos e o mar obedecem”.
6,22-27 A catequese, a partir do alimento que perece
aponta para o alimento que dura para a vida eterna que Jesus, na sua condição
divina de “Eu sou”, explicitada pelo título divino-messiânico de “Filho do
Homem” (Ez 1, 26-28), que por sua vez ilustra o título que Jesus se atribui de
“Filho que o Pai enviou”, isto é, Aquele que, segundo a sua condição divina é
“Um com o Pai”, mas que, como “Palavra que se fez carne”, representa o próprio
Deus, na condição de enviado: “O Filho que o Pai consagrou e enviou ao mundo”
que os judeus querem lapidar porque, embora sendo homem, se declara igual a
Deus (Jo 10,33).
6,28-35). A primeira das obras que os seus discípulos
devem realizar, diz Jesus é: “crer naquele que o Pai enviou”. Terão que crer a
partir da interpretação que ele dá da Escritura: o maná era figura do
verdadeiro pão que agora Deus está dando, que é ele, na condição de “Eu sou”. A
prova: o testemunho de João: “Aquele que vem depois de mim, existia antes de
mim”. Jesus explicitará a declaração de João, afirmando “Antes que Abraão
fosse, Eu sou” (8, 56).
A lógica
de Jesus leva muitos a acreditar nele,
que exclamam: “Senhor, dá-nos sempre desse pão”. Crer nele é ter a vida, sempre
alimentada pela Palavra que se fez carne, sempre dessedentada pela Água que
jorra para a vida eterna.
6,36-44 A desconfiança dos que não creem recebe uma
advertência. Por que recusam a argumentação que é válida, fundamentada no
testemunho de João, nos sinais e nas Escrituras que falam dele, comprovadamente
Messias, aduzindo argumentos de experiência meramente humana (v.42)? A sua
verdadeira origem deve ser diagnosticada pela interpretação dos sinais que vêm
de Deus! Eles devem ser o critério de interpretação da sua Pessoa.
Diante
dos sinais que Deus pedagogicamente foi oferecendo para levar os homens a dar a
sua adesão de fé, é preciso crer, insiste Jesus, para alcançar o que ele pode
dar. Quem nele crê, tem a vida eterna e conhecerá a ressurreição na carne. A
renitência em crer é resistência ao Pai que tenta atraí-los para entregá-los ao
Filho que tem a missão de lhes propiciar a vida eterna pela ressurreição da
carne.
Os
discípulos têm que aceitar o que ele diz: “Eu sou o pão descido do céu”.
Devem
deixar que o Pai os atraia, diante de tudo aquilo que de provas lhes forneceu.
6,45-47 Está, agora, se realizando a palavra da Escritura
que diz: “serão ensinados por Deus”. Esta é, em síntese, a doutrina: “Eu, na
condição de Verdadeiro que anuncia verdades eternas declaro: 1) Quem crê em mim
tem a vida eterna; 2) Eu sou o pão da vida. Vossos pais comeram o maná no
deserto e morreram; 3) Quem come deste pão viverá eternamente.
6,48-51 Assumindo por tema o “pão da vida”, Jesus
continua: 1) “Eu sou o pão vivo descido do céu; 2) Quem comer deste pão terá a
vida eterna; 3) e o pão que eu darei é a minha carne para a vida do mundo.
6,52-58 Assumindo, em seguida, o termo carne, Jesus
continua: “Se não comerdes a carne do Filho do Homem e não beberdes do seu
sangue não tereis a vida em vós, porque a minha carne é verdadeira comida e o
meu sangue verdadeira bebida” O ensinamento vem do Verdadeiro e se refere a um
alimento verdadeiro, entendido para todos os que crerem em Jesus.
Continua
Jesus: “Quem come a minha carne e bebe o meu sangue, tem a vida eterna”. Uma
vida que depende do sinal sacramental instituído. Tendo-se deixado atrair pelo
Pai, o discípulo alcança a condição de vida terna, condição de ressurreição,
quando celebra o Memorial da Morte do Senhor e vive segundo os seus
ensinamentos, porque é então que a Caridade divina estará nele.
.........
A
doutrina
Jesus é o
Filho que conhece a Deus (6,46: “Só aquele que vem de junto de Deus viu o Pai”;
3,11: ”Falamos do que sabemos e damos testemunho do que vimos ; 1,18: “Ninguém
jamais viu a Deus, o ‘Unigênito Deus’, que está no seio do Pai no-lo deu a
conhecer”.
Pelo seu
ensinamento, está em curso a realização da profecia de Jr 31,33s. Deus está
transmitindo o seu ensinamento pelo Filho (12,49-50: as palavras que vos digo
não são minhas,são do meu Pai que me enviou. O seu mandamento é preceito de
vida eterna). Aquele que entende, pelo testemunho de João, pelos sinais e pelo
que Jesus interpreta das Escrituras, que realmente Jesus vem de Deus (3,2:
Nicodemos) e a ele vá, está permitindo que nele se realize o Plano de Deus. Este
quer que os homens encontrem a salvação naquele que ele enviou. Por ele não se
perderão, pelo contrário, conhecerão a ressurreição final. Não são os critérios
humanos que levam a entender as verdades que Deus revela. Fundamentados nas
Escrituras, quando vem o Messias, será dado conhecer o que Deus quer revelar
por aquele que desde sempre conhece a Deus, que desceu do céu, que único vê o
Pai. É preciso seguir a lógica da fé e chegar a se enriquecer com as verdades
da revelação. A lógica humana não condiz com a interpretação de verdades, quais
o do nascimento da água e do Espírito, o do alimento que Deus quer dar ao nosso
espírito. A fé é o critério da compreensão de Jesus, enquanto nos comunica a graça que somente a Divindade nos pode dar
enquanto se manifesta e enquanto se imola segundo a humanidade assumida.
O quadro
do maná, comentado pelo salmo: “Deu-lhes a comer o pão do céu” (Sl ), serve a
Jesus, através do processo dialético da negação e da superação, para falar do
“verdadeiro Pão” que Deus quer dar aos homens: o Filho que deve ser levantado
da terra. É nele que os seus devem crer, reconhecendo-o “Poder de Deus e Sabedoria
de Deus”, uma vez que “Graça e Verdade nos vieram por Jesus Cristo” (1,17). A
imolação de Cruz do Filho do Homem é o termo último de um processo de revelação
que tem o seu começo nas palavras da Sabedoria que suscita a admiração (Lc 4,22).
Corroboradas pelos sinais da messianidade, elas sugerem o caminho árduo, entrar
pela porta estreita, a dedicação ao Reino confiando em Deus, por em prática os
seus ensinamentos e testemunhá-lo diante dos homens. Quem se alimenta dos seus
mandamentos e do Espírito que as suas palavras transmitem, atraído pelo Pai,
usufruirá, também, da graça da redenção que Jesus alcançou pela sua imolação e,
então, conhecerá a ressurreição na carne. Há etapas a serem cumpridas para
alcançar a salvação através de respostas a condições sempre mais exigentes que
a Palavra vai manifestando. A adesão à verdade da Morte redentora torna-se
condição de entrega da vida por causa de Cristo. A sua celebração se torna,
também, princípio de força para acatar e por em prática os outros mandamentos, porque
é capaz de corroborar a adesão que temos dado a Cristo Jesus enquanto se
manifestava na condição de Sabedoria.
Entendemos,
então, que o processo se inicia com a Palavra anunciada. Por ela há uma
primeira ação do Espírito que leva a uma adesão de fé e a implementação da
Verdade escutada. A adesão de fé se torna então o critério do enriquecimento pelas
verdades que Jesus oferece com a sua imolação. Murmura aquele que não tem em si
o amor de Deus, porque não se purificou acolhendo a Palavra.
A forma de
exposição
A obra a
ser realizada é a de “crer naquele que o Pai enviou”
O título
messiânico que Jesus sugere para que por ele alcancemos uma forma abrangente
capaz de interpretar a revelação que vem
de Deus é o do “Filho do Homem”. Isto porque podemos reconhecer em Jesus o “Eu
sou”, a “Palavra que se fez carne” que manifesta a Glória de Deus. Ela desce do
céu, vive entre os filhos do homem, falando as coisas de Deus, e se imola sobre
a cruz para a sua redenção.
À luz da
figura do maná, Jesus, em relação à obra que realiza, se declara “o verdadeiro
pão que desce do céu e dá a vida ao mundo”.
A
Eucaristia, instituída pela consagração do pão no seu Corpo entregue à morte,
resume em si o significado do alimento sugerido pelo maná: a Sabedoria que
oferece um banquete com as suas verdades, o Cordeiro pascal do qual a
consumição da carne da vítima imolada nos torna participantes do seu
sacrifício.
As
verdades que Jesus anuncia só podem ser entendidas pela dialética da fé,
deixando que o Pai nos atraia para que, pelo Filho alcancemos a condição
definitiva.
“Em
verdade, em verdade vos digo: quem crê em mim tem a vida eterna. Eu sou o pão
descido do céu. Quem comer desse pão viverá eternamente”.
A relação
entre o alimento que a Sabedoria oferece, quando escutada, e o alimento que o
Cordeiro de Deus oferece, quando celebrado, é a afirmação final sobre a pão que
desce do céu e dá a vida ao mundo: “E o pão que eu darei é a minha carne para a
vida do mundo” (6,51).
A
doutrina que Cristo então anuncia é apresentada com a mesma solenidade com a
qual anunciou o alimento da Sabedoria: “Em verdade, em verdade vos digo, se não
comerdes a carne do Filho do Homem e não beberdes do seu Sangue não tereis a
vida em vós” (6,53). A vida que os judeus podiam alcançar nutrindo-se das
palavras da Sabedoria divina, abeberando-se à fonte do Espírito, na esperança
da vinda do realizador da Profecia, com o sacrifício que Jesus ofereceu de si
mesmo sobre a cruz, tem uma complementação necessária.
“Pois a
minha carne é verdadeira comida e o meu sangue verdadeira bebida” (6,55). A
Eucaristia é o alimento que o Verdadeiro oferece pelo Filho, ele também “o
Verdadeiro”.
“Quem
come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida em si”. A celebração da Morte
do Senhor é condição de vida eterna em nós, princípio de ressurreição: “E eu o
ressuscitarei no último dia” (6,54).
Pela
imolação de Cruz, Jesus se torna a salvação do mundo: “Deus tanto amou o mundo
que entregou o seu Filho para que todo o que nele crer tenha a vida eterna”
(3,16). A fé nele, com tudo o que o seu ensinamento implica, a alcança. A sua
Morte se torna Princípio e Modelo da nossa existência.
Em
síntese, Jesus fundamenta o seu ensinamento nas Escrituras (6,58) que oferecem
a figura a todos os níveis: alegórico (maná, serpente levantada no deserto) e
teológico (“Eu sou”, “Serão todos ensinados por Deus (Jr 31,33s). A figura do
maná da origem à linguagem metafórica para explicar de que forma devemos
entender que Jesus é o alimento (da Sabedoria que oferece um banquete – Is 25,6;
55). A figura do Filho do Homem ilustra a condição divina daquele que assumiu a
condição humana, segundo todas as implicações que encontramos em João (1,51; 3,14;
6,27; 8,28; 9,35; 12,23).
Desde Jo 1, estamos seguindo a
catequese do Senhor ao Israel de Deus,
que deve chegar a conhecê-lo sempre mais, enquanto nele se realiza a figura do
Filho do Homem (1,51; 6,62) até revelar-se a Casa de Deus e a Porta do Céu (Gn
28,17), pela sua Morte de Cruz (3, 13s), momento em que, elevado da terra, faz
sair do seu lado direito a Água que vivifica, como de um Templo (19,34; Ez 47).
As Bodas de Caná descrevem de que forma a sua Igreja participa da Glória do
Filho do Homem, enquanto a afirmação de Jesus no templo mostra de que forma o
Filho do Homem será glorificado (Jo 2). Em Jo 3, Jesus especifica de que forma
será glorificado e se tornará o Templo no céu do qual sai a Água, sacramento do
Espírito, da qual fala, extensamente, à Samaritana (Jo 4). Em Jo 5, Jesus se
apresenta como o Filho que faz tudo o que vê o Pai fazer e que, do Pai, recebe
o poder de julgar.
Notamos que, ao longo da apresentação
da catequese de Jesus, João não deixa de falar dele segundo o que já sabe da
sua condição divina e utilizando as Escrituras com tudo o que anunciam dele.
Aliás, é assim que ele quer que o acompanhemos porque, também nós, já
participamos da sua fé no Senhor ressuscitado, para que cheguemos a um
conhecimento sempre mais profundo do Senhor Jesus, dentro de uma celebração
eucarística, qual apresentada no momento da pesca milagrosa (21,9.12s), da qual
o alimento pascal é analisado em Jo 6.
A multiplicação
dos pães e a travessia do mar
(1-21)
1-9. Resumo. João
inicia a sua catequese sobre o Pão da vida com um quadro alusivo à instituição
da Eucaristia. Jesus atravessa o mar da Galiléia. Num lugar deserto, ao
levantar os olhos, se depara com uma multidão que o segue. Uma multidão que Ele
quer saciar na fome que tem de Deus e que manifesta pela fome que
tem da sua palavra. A festa da Páscoa está próxima. Pede, então, a Filipe que a
alimente. André, irmão de Simão Pedro, com Filipe, declaram a sua impotência.
Então Jesus manda que acomodem a todos sentados na relva e oferece alimento até
se saciarem. Um alimento que os Apóstolos continuarão a administrar
Comentário.
João acaba de apresentar uma situação similar àquela em que Moisés se encontrou
depois da travessia do Mar Vermelho, quando se viu diante do problema de como
alimentar todo aquele povo que tinha saído da terra da escravidão no dia em que
se tinha realizado a Páscoa do Senhor. Ao redor de Jesus está aquela comunidade
de discípulos que decidiu permanecer com ele porque reconheceu nele o Messias,
aquele do qual falaram Moisés e os Profetas (1,45), mas que, agora, são
convidados a aceitar que Jesus estabelecerá o Reino do Pai pela sua Morte de
Cruz; dos seus frutos participarão se nutrindo com a carne do Filho do homem,
cordeiro imolado.
10-13. Resumo. Jesus, então, toma a iniciativa e torna
possível uma refeição abundante, servida a comensais confortavelmente
acomodados, que comem até se saciarem.
Comentário.
O gesto de benzer e de distribuir o alimento de condição inesgotável e a ordem
que Jesus dá aos discípulos de administrar o alimento que ele propiciou, são
todos elementos simbólicos que servirão para ilustrar o seu ensinamento sobre o
alimento que o Israel de Deus deve procurar e que o “Filho do Homem lhes dará”
(v.27).
14-15. Resumo. O
sinal provoca um reconhecimento equivocado. Jesus é sim o Profeta, mas não pode
ser assumido como rei que ofereça vantagens terrenas. É por isso que Jesus se
retira sobre o Monte, assim como Moisés se retirou ao ver que o povo pecara.
16-21. Resumo. Quando começam a chegar as trevas, os
discípulos remam rumo Cafarnaum, uma tempestade ameaçando afundar o barco. Os
salva Jesus que se anuncia como o “Eu sou”.
Comentário.
Mais uma narrativa simbólica para mostrar à comunidade que tudo é fruto da
gratuidade divina e da fidelidade de Deus ao seu amor pela ação do “Eu sou”.
Análise.
Narrativa didática. - O ensinamento
catequético é preparado por uma narrativa que quer definir o gesto de Jesus
que, na condição de “Filho do Homem” instituirá uma refeição pascal da qual ele
mesmo será o alimento. É a nova Páscoa de um povo que segue o novo Moisés no
deserto, depois de uma nova libertação que Jesus realizará na condição de
Cordeiro vitorioso sobre a Morte. Benzer, dar graças e distribuir são os gestos
de uma refeição, mas que, neste caso, estão ligados diretamente à Fração do Pão
do Israel de Deus (Jo 21,9.13). Os discípulos terão que administrar esse
alimento que nunca se esgotará.
Reação humana. - Não obstante a
disposição das multidões e dos discípulos em seguí-lo e que, como Nicodemos,
reconhecem que Jesus vem “da parte de Deus como um mestre” (3,2), muitos cedem à tentação de subverter todo o
ensinamento do seu Mestre e querendo torná-lo rei para instaurar um reino
político. Mentalidade do tempo, lembrada por Gamaliel (At 5,36s). A sua reação
é terrena e não pode ser aceita por Jesus. A sua realeza acontecerá pela sua
Páscoa, que a refeição pascal perpetuará, mas não será segundo um “reino deste
mundo”. Por isso Jesus, como fez Moisés, se retira sobre o Monte permitindo que
os discípulos, desiludidos, o abandonem.
Reação divina. - Na sua misericórdia e
fidelidade ao Pai, Jesus volta a recuperá-los, depois de eles terem entendido
que sem ele nada podem fazer, e ao povo que o procura explica, na sinagoga de
Cafarnaum qual alimento devem realmente procurar.
Discurso na Sinagoga de Cafarnaum
(22-59)
Divisão
22-25
focaliza a multidão com a sua reação diante do acontecido.
26-35
Jesus expõe a sua doutrina precisando o sentido da multiplicação dos pães.
36-46
Trata-se de um inciso provocado pela desconfiança dos judeus (cf. v.52)
47-58
Jesus dá continuidade ao discurso sobre o alimento pelo qual os seus
interlocutores devem trabalhar. Ele é interrompido no v.52, um inciso que evoca
a incredulidade dos judeus, dela lembrando o elemento fundamental: “Como esse
homem pode dar-nos a sua carne a comer”?
Exegese
22-25 No “dia seguinte”, a multidão “procura” Jesus motivada
pela multiplicação dos pães e pelo sinal da barca.
26-35 Jesus, então, dá início à sua catequese cujo tema é:
“Trabalhai pelo alimento que o Filho
do Homem vos dará”. A figura do “Filho do Homem” é uma constante
na apresentação que João faz do Senhor da Igreja, aquele que chama a sua
comunidade ao redor da sua refeição pascal para que seu trabalho seja eficaz, possa dar testemunho dele e perseverar na
vigilância pela sua Vinda (Jo 21). É o homem, filho de José, o carpinteiro de
Nazaré, que profetiza a Natanael que o verá na condição gloriosa de Casa de
Deus e Porta do Céu. Dele Jesus descreve a maneira pela qual chegará à sua
glorificação no discurso a Nicodemos. Será pela sua Morte de Cruz. Por ela o
adão alcançará a sua perfeição e, como Cordeiro imolado, consagrará o seu Corpo
em Templo do qual jorrará o Espírito. Nele, então realizar-se-á a figura
profética do Filho do Homem de Ez 1,26-28, a Glória do “Eu sou”. No termo
“dará” já está a conotação que o alimento será sacrifical: “a carne dada”
(v.51). Os discípulos são chamados a dar a sua adesão de fé ao alimento pascal
daquele que se manifestará a Glória de Iahweh pela Morte de Cruz, na condição
de Cordeiro de Deus.
O alimento
pascal do qual Jesus instituirá o sinal sacramental pelo qual todos os que
crerem nele poderão participar para sempre enquanto é “carne dada para a vida
do mundo” (ibid.), torna os fiéis partícipes do sacrifício que Cristo ofereceu
de si mesmo sobre a Cruz. Resume em si todos os aspectos do seguimento de Jesus.
Por esse motivo, o fiel deve se preocupar em trabalhar todos os aspectos da
doutrina de Jesus. Por eles, o Espírito agirá de forma plena, uma vez que as
palavras de Cristo têm o Espírito sem medidas. Elas nos transmitirão o que o
Filho viu e ouviu, isto é o que sempre vê e ouve, do Pai, na condição de
Unigênito Deus, voltado para o Pai, no seio do Pai. “Graça sobre graça” nos
será transmitida em virtude de uma comunhão sempre mais plena com o Verdadeiro.
É preciso aceitar, em Jesus, a ignominiosa morte de Cruz e ver que, por ela, o
adão é glorificado, se torna o Templo do qual jorra a Água viva. Pedro parece
entender o discurso de Jesus quando exclama: “Senhor, a quem iremos nós, só tu
tens palavras de vida eterna e nós cremos e sabemos que és o Filho de Deus”. É
preciso aceitar, portanto, também, a observância dos mandamentos e o serviço
(1Jo, Mt 7,21).
A
multiplicação dos pães, enquanto está ligada à Páscoa, só quer ser um sinal do
Memorial da sua morte que Jesus instituirá criando uma nova Páscoa (Lc 22,15),
memorial da sua passagem atuada num gesto de amor supremo que realiza a
verdadeira libertação.
O maná que
Moisés deu ao povo é um alimento que veio do céu. Não é, contudo, o definitivo,
porque os que dele comeram, morreram.
O
verdadeiro pão é aquele que “desce do céu para subir novamente ao céu”, Aquele que
dá a vida aos que a ele dão a sua adesão, pondo em prática os seus mandamentos,
purificando-se a si mesmos como Deus é puro. Ele dará a vida eterna e
ressuscitará em definitivo os que dele comerão.
Estamos
diante de uma situação paralela à de Jo 1, onde os que procuram o Cordeiro são,
aqui, representados pela multidão, por Filipe, André e Pedro, aos quais o Filho
do Homem vai revelar de que forma poderão participar do seu sacrifício pascal.
O ensinamento de Jesus é exposto através de um
diálogo: “Qual é o pão que Jesus pode dar? Quem deu um pão diferente foi Moisés
no deserto!” Jesus responde que somente ele é capaz de dar um pão que alimenta
para a vida eterna, porque ele é Aquele que desce do céu e dá a vida ao mundo.
O que provoca a exclamação da multidão: “Senhor, dá-nos sempre deste pão!”, à
qual segue a proclamação de Jesus: “Eu sou o pão da vida!”
Jesus utiliza os pães da
multiplicação como metáfora para anunciar um alimento que “dá vida ao mundo”
(v.33). Para isso, pede fé nele. Os discípulos advertem logo que Jesus está
pedindo demais e exigem sinais. Jesus aceita o desafio. O sinal é a obra da sua
imolação (4,34), que ele profetiza (3,14), para que por ela cheguem a crer que
ele é o ‘Eu sou’ (8,28). Por ela terão o
alimento que não perece porque é a carne da vítima sacrificada que comunica o
Espírito que dá a vida. O maná é a sua figura, uma dádiva do céu para sustentar
em vida o povo no deserto, mas que não era o verdadeiro alimento. O é o
alimento pascal, que Aquele que desce do céu e, pela sua imolação, dá a vida ao
mundo, comunica a imortalidade. Quem crê naquele que o Pai enviou e faz do
alimento pascal o seu pão, tem a vida eterna. O alimento material é um pão que
não sacia. Aquele que desce do céu e dá a vida ao mundo é o verdadeiro pão. O
seu corpo é “verdadeira comida” (v. 55), porque põe em comunhão de vida com o
Verdadeiro; como faz, também, o seu sangue que é “verdadeira bebida” (ibid.),
porque é o sangue da Aliança pelo qual o Espírito da vítima do sacrifício é
comunicado. Aquele, portanto, que dá a sua adesão ao Senhor, nunca mais terá
fome de outro alimento a não ser do Pão da vida, nem sede de outra bebida a não
ser do sangue da vítima sacrifical que dá o Espírito (v.35).
A BJ, na nota de rodapé, adverte que
Jesus reafirmará por 7 vezes a sua condição de “Eu sou”. As repetições explicam
a eficácia da Eucaristia: “Eu sou a Luz do mundo. Quem me segue, não anda nas
trevas, mas terá a luz da Vida”. “Quando
for levantado da terra, reconhecereis que “Eu sou”. Se não reconhecerdes que eu
sou, morrereis nos vossos pecados. “Eu sou o Bom Pastor”. “Ninguém arrebata as
minhas ovelhas das mãos do Pai. Eu e o Pai somos Um”. “Eu sou a Ressurreição e
a Vida”. “Eu sou o caminho, a Verdade e a Vida”. “Eu sou a Videira”.
36-40 A renitência de uns interlocutores, que serão
especificados mais tarde (v.52), permite a Jesus avançar na exposição da sua
doutrina. Dela já anunciou o tema: “Eu sou o pão da vida” (v.35). Agora, começa
a sua explicação (v. 37): ele é o Filho que o Pai, no seu amor ao mundo, deu
como vítima de expiação. Por isso, a ninguém rejeitará. Aos que nele crêrem dá
a vida eterna e a ressurreição na carne.
A catequese sobre a Eucaristia, o pão
que os fiéis desejam porque crêem em Jesus Cristo (v.34), é objeto de
contestação por parte dos judeus que não se deixam atrair pelo Pai. Embora
sabendo disso, nem por isso Jesus renuncia em fazer a vontade do Pai que quer
que todos se salvem. Dessa forma, até no fim do 1º século, João, embora, como
Paulo, execre os seus irmãos segundo a carne pela falta de fé em Jesus,
continua afirmando a possibilidade de salvação deles, porque Jesus a ninguém
rejeita. Em virtude da sua morte todos são chamados à ressurreição.
É preciso estar abertos aos sinais
porque poderíamos ver e continuar a não crer, obcecados pelas nossas
convicções, enquanto é vontade de Deus que em Jesus todo homem encontre a sua
salvação. Jesus é, e ele mesmo no-lo anuncia, após ter-nos dado as provas da
sua messianidade, Aquele que desce do céu, isto é aquele que abdica à sua
condição divina, para fazer a vontade do Pai, assumindo a condição de servo
feito obediente até a morte. Como Bom Pastor está pronto para dar a vida pelas
suas ovelhas e merecer, para elas, a ressurreição da sua condição de morte, no
terceiro dia (Jo2,1; Os 6,2), o Dia do Senhor, da manifestação da sua Glória.
Temos que trabalhar para chegar a crer
no Filho do Homem que pela sua imolação se tornará Espírito vivificante, para
que, crendo no alimento que ele nos dá, estejamos de posse, para sempre, da
vida eterna.
O mundo está vendo-o claramente, porque
a argumentação de Jesus é irrefutável: testemunho de João, sinais, condição
profética de Jesus, Escritura. Nicodemos o reconheceu; os judeus, não. Jesus declarou
o porque: “nele não está o amor de Deus”. Quando o tiver condenado à morte,
então, nunca mais o verá (14,19). Mas os discípulos, aqueles que se deixaram
atrair pelo Pai, voltarão a vê-lo. Pela observância dos mandamentos chegarão a
ser sua morada com o Pai e o Espírito (14,). Nessa condição chegarão à vida
eterna e conhecerão a ressurreição da carne.
41-51. Resumo. A renitência dos interlocutores brota dos
seus critérios de análise acerca do verdadeiro Messias. Estão equivocados. O
Israel de Deus, deve estar aberto à ação de Deus que quer levá-lo ao Filho, em
quem se realizam todas as promessas. Ele é “que vem do céu e dá testemunho do
que viu e ouviu” (3,31s). Aquele que crê nele, portanto, alcança a vida eterna
pelo alimento da sua “carne dada para a vida do mundo” (v. 51).
Comentário (41-43). João, aqui, define
a posição dos judeus: não crêem em Jesus porque conhecem o seu pai e a sua mãe.
Não se curvam aos sinais de Jesus, sinais que lhes permitiriam descobrir a sua
verdadeira origem. Se um nazareno apresenta os sinais que indicam que ele vem
de Deus, alguém, prudentemente teria que duvidar ser um obstáculo o fato de ser
Jesus o filho do carpinteiro. Tomar posições segundo pensamentos carnais é
ridículo e simplório. Se as Escrituras falam de Jesus: Moisés, na Lei, e os
Profetas; se a elas Jesus apela e por elas se explica: serpente elevada, filho
de homem obediente segundo o Plano de Deus que deve ser levado a cumprimento;
se dele fala João Batista e, para os que chegaram à fé, fez as obras de Deus,
como testemunham os apóstolos que com ele estiveram desde o princípio, viram os
sinais, escutaram a profecia da sua morte, ouviram a doutrina, experimentaram o
Espírito prometido, entenderam, à luz da tumba vazia, a glorificação do Justo
na Morte de Cruz, como ainda duvidar? Opõem-se os que não têm em si o amor de
Deus, procuram sua própria glória, cujas obras são más. Jesus classifica a
atitude dos seus interlocutores como uma murmuração.
Comentário (44-47).
v. 44. Os que pensam segundo a carne têm que se desarmar e
se deixar atrair pelo Pai para que acolham o enviado dele. O Pai está
preparando a manifestação do Filho no Homem Cristo Jesus desde o momento em que
decidiu chamar os homens à participação da sua vida, segundo um Plano de
Redenção que revelaria todo o seu amor. Pela adesão a Cristo Jesus é possível
chegar ao último termo do Plano de Deus, que é a divinização do homem, com a
implicação da própria ressurreição na carne.
v. 45. A Profecia anuncia o que será realizado. Quando isso
acontecerá, então ficará claro o seu sentido. Os que estão de posse do
conhecimento dela, deveriam entender, pelos sinais que Jesus oferece, que é
nele que está se atuando.
v. 46. (É uma glosa): é diferente, contudo, ter sido objeto
da atenção de Deus que atrai, do fato de ter visto a Deus, como aconteceu
Àquele que vem de junto de Deus. Jesus, na condição de Palavra, sempre voltada
para o Pai, dá testemunho de tudo o que, desde sempre vê e ouve. Pela Palavra
que instrui, ensinando os caminhos da vida, até ser Caminho pela imolação,
doando o Espírito, o homem conhece a Deus: entra em comunhão de vida com Deus,
porque, motivado pelas palavras; no afã do amor, observa os mandamentos, que já
não são pesados (1Jo 5,3), sendo que se revelam libertadores dos vícios do
mundo. É o caminho da incorruptibilidade e da realeza (Sb 7,17-20).
v. 47. Estamos diante de um resumo de tudo o que foi dito
acima, anunciado em forma de sentença e que estabelece uma inclusão com 6,32,
explicitação do v.29. Aquele que dá adesão ao Filho do Homem, renunciando
pensar segundo o homem que é da terra, para aceitar sua Morte de Cruz e sua Lei
que é interpretação, segundo o espírito, da Lei de Moisés, comunica plenamente
com o Adão verdadeiro, que é Princípio de vida eterna.
Comentário
(48-58)
Depois de
ter exposto o Plano de Deus que se realiza pelo Filho Jesus Cristo e ter
descrito quanto os que dão a sua adesão de fé ao Filho do Homem, que único,
desceu do céu, enviado do Pai, se beneficiam do Espírito de Deus que conduz a
toda verdade, Jesus anuncia o memorial da sua imolação. O alimento sacrifical
que dá a vida, enquanto põe o discípulo em comunhão com ele, é a carne do Filho
do Homem. Por ela o Verdadeiro, na condição de Sabedoria divina que oferece o
seu banquete, alimenta, e o Espírito, merecido pelo seu sacrifício, dessedenta,
para que não tenha mais fome nem sede. De fato, estará vivendo em virtude da
seiva que o Filho lhe transmite, da mesma forma que Ele, na condição de filho
de homem, vive pelo Pai.
v. 48. “Porque aqueles que reconhecem na sua Pessoa o meu
alimento pascal memorial da minha morte, diz Jesus, por ele recebem o
Espírito”. A Palavra que sai da boca de Deus é alimento de vida eterna porque
é, com o Pai e o Espírito, o “Sou”: o Unigênito Deus que, tendo assumido a
Humanidade, manifestará a Glória de Deus pela sua Morte.
v. 49. O maná só pode ser figura: não podia dar a
imortalidade.
v. 50. O Filho do Homem que o Espírito marcou com o seu selo
é ele mesmo o “Sou” que desceu do céu e tornou-se Princípio de imortalidade e
glorificação na carne para todos os que dele se alimentam, a partir da escuta,
que já comunica o Espírito, até à aceitação da sua Morte de Cruz, pelo
sacramento da sua Morte.
v. 51. O “Sou” é portanto Palavra viva, porque é do céu.
Quem se alimenta da Palavra que saiu da boca de Deus e se fez carne para dar
testemunho da Verdade e participa plenamente do seu Espírito pela sua imolação,
tem a vida divina em si. A plena comunicação da vida do Espírito que a
Testemunha fiel e o Primogênito dos mortos é capaz de dar, atuar-se-á quando
tiver realizado a sua imolação pela Morte de Cruz. Então, os que participarem
do seu sacrifício, comendo das carnes da vítima imolada pela salvação do mundo,
terão em si a Vida. Pelo alimento pascal da Fração do Pão comungamos das carnes
da Vítima. Nos é dada, então, a salvação que Deus oferece pelo Filho. Celebrar
a Eucaristia significa estabelecer as condições da comunicação do Espírito por
Aquele que, pela sua imolação, de alma vivente se tornou Espírito vivificante
(1Cor 15,45).
Síntese
A “obra de
Jesus, o sinal que ele dá” é “a sua carne para a vida do mundo”. O maná era
figura. De fato, os que dele comeram, morreram. O “Eu sou”, na condição de
vítima sacrifical, é condição de vida eterna porque é o Filho que o Pai enviou.
Quem nele crê tem a vida eterna e dele recebe o princípio da sua ressurreição
na carne, desfecho final de toda a obra que tem seu início na ação pedagógica
do Pai para entregar os que são seus ao Filho. Nesse, os fiéis encontram a
explicação última porque ele é o Unigênito Deus que desde sempre vê e ouve o
Pai. É superior a Moisés que deu a Lei, porque dá a graça sem medida: a graça
da remissão dos pecados, mais a graça da plena comunhão com o Pai, pelo
Espírito.
13 de Maio de 2011
6, 52-57
6,52 Estamos diante do tema que será desenvolvido e que
explicará a Eucaristia. A afirmação de Jesus, enquanto apresenta um aspecto
novo do Pão da vida, contém uma doutrina humanamente incompreensível.
Relacionado ao rito de participação do sacrifício mediante a consumição das
suas carnes, tornava-se de difícil solução.
6,53 Jesus solucionará o nosso enigma instituindo o Memorial
da sua Morte mediante o Pão partido e o Cálice oferecido. Por esse versículo, é
sua preocupação nos dizer o que os símbolos realmente oferecem. A vítima é
participada sob o aspecto de alimento. Realiza-se, dessa forma a figura que a
preanunciava.
6,54 A participação ao sacrifício que o Filho do Homem
realiza implica o seguimento, o trabalho para participar do seu Espírito,
princípio de vida eterna e de ressurreição na carne, a partir da aceitação da
doutrina que o Cristo anuncia em nome do Pai, deixando ser atraídos por ele.
6,55 O Pão partido será realmente a Carne de Cristo Jesus
entregue em sacrifício pelo Pai, o Verdadeiro.
6,56 A vivência de tudo o que a participação ao sacrifício
de Cristo oferece, mediante a celebração do seu Memorial, permite a plena
comunhão com o Filho, pelo Espírito.
6,57 A comunhão com o Filho leva à comunhão com o Pai.
6,58 Estabelecida a relação entre o alimento que o maná
preanunciava e a “carne para a vida do mundo”, fica explicado como Jesus pode
nos dar a sua carne a comer e quais são os efeitos de quem dá a ele sua adesão
de fé.
Resumo. A partir de um justo questionamento, porque Jesus
passou de uma condição de fé nele para uma fé no alimento do seu Corpo dado e
seu Sangue derramado, Jesus declara que este será realmente a sua carne e o seu
sangue que, respectivamente, comido e bebido, serão fonte de vida eterna e de
ressurreição. Porque a sua carne e o seu sangue levam à comunhão com o
Verdadeiro, pelo Espírito, que estabelece a plena comunhão do fiel com Jesus
Cristo. Dessa forma, como ele vive pelo Pai em virtude da sua plena comunhão
com ele pelo Espírito, o fiel, que está em plena comunhão com ele pelo mesmo
Espírito, vive por ele.
Comentário
v. 52. O pensamento de uma lógica terrena que já recusou
Jesus, não obstante os sinais que comprovam a sua messianidade, quais curas,
testemunho de João, obras e Escritura, porque surpreende pela argumentação
declarando-se superior a Moisés, cria desconfiança, sendo que sua origem é
conhecida, agora, repele a afirmação que para ter a vida de Deus em nós,
precisa aceitar a sua Morte de Cruz porque é a imolação do Cordeiro pascal,
realizando-se nele, dessa forma, a figura do Filho do Homem de Ez 1,26-28
segundo Gn 28,10-22 e Dn 10,5s; 40,3; 47, pela realização da figura do Servo de
Iahweh.
v.53. Jesus não tem dúvidas que a obra
pela qual o Pai o enviou é fonte de vida. Quem aceita a sua imolação de Cruz
tem em si a vida. Dela é possível participar pelo alimento pascal que ele
instituiu e que atua pela Fração do Pão porque, então, aquele que, pela
Encarnação se tornou um adão, pela glorificação se tornou Espírito vivificante,
na condição de Casa de Deus e Porta do Céu, Templo consagrado pela imolação do
Cordeiro pascal, fonte do Espírito.
v.54. Quem come das carnes da vítima
pascal e bebe do sangue que fundamentou a Nova Aliança, recebe a vida que o
Filho do Homem é capaz de dar porque ele á Aquele que desceu do céu e veio com
o Espírito de Deus. Os efeitos da sua imolação chegam até à ressurreição da
carne.
v. 55. As carnes do seu sacrifício, das
quais comungamos pelo alimento pascal que nos deu e que o Pão abençoado e
partido simbolizam, nos comunicam a vida do Verdadeiro porque são as carnes do
Filho que o Pai deu ao mundo para que renasçamos na água e no Espírito.
v.56. Ao participar do sacrifício de
Cristo, o Espírito nos põe em plena comunhão de vida com ele.
v. 57. Dessa forma, vivemos por ele, da
mesma forma que ele vive pelo Pai
58s. Resumo. - Estamos diante da conclusão que nos mostra
como o discurso de Jesus sobre o alimento
que o Filho do Homem doa como sacramento da sua “carne dada para a vida
do mundo” está todo relacionado ao maná que Moisés deu ao povo de Deus no
deserto e como a própria multiplicação dos pães deve ser interpretada à sua
luz.
Comentário
v.58. O alimento pascal é o Corpo e o Sangue da Palavra que
se fez carne e perpetuou a total manifestação da sua Glória pela Morte de Cruz.
O maná é a sua figura que ele transcende porque somente ele é capaz de dar a
vida eterna.
v.59- A especificação do local indica
que Jesus está falando ao homens de boa vontade, sem fazer distinção entre
discípulos e multidões.
A catequese de Jesus. - Diante das
multidões que insistem em segui-lo, Jesus corrige a sua perspectiva equivocada:
dele não devem esperar vantagens humanas, porque o alimento que quer dar aos
seus irmãos é de outra natureza: não é pão material, e sim pão que “permanece
até à vida eterna” (v. 27); quem dele come “nunca mais terá fome”. Trata-se
dele mesmo: “Eu sou o pão da vida” (v. 34). Pela sua refeição pascal, ao comer
a sua carne “dada para a vida do mundo”, o Israel de Deus comunicará com Ele
pelo Espírito. Deve, portanto, entender que o sacrifício da sua vida é a única
condição de realização do Plano de Deus. O “filho de homem” deve seguir os
ditames do Espírito porque é por ele que realiza a obra pela qual o Pai o
enviou (4,34). Os seus devem acolher o seu testemunho para chegar a entender
que o Plano do Pai é o único verdadeiro. A ele corresponde a imolação do adão,
condição de glorificação. É por ela que o ‘filho de homem’ se mostra obediente
até à morte e por isso o Pai se compraz nele. Dar a sua adesão Àquele que se
imola é a obra que os discípulos devem realizar.
A doutrina sobre o Pão da vida. -Se
existe um sinal sacramental que o comunica, contudo, o Pão da vida é a Pessoa
d´Aquele que veio ao mundo para dar a vida aos homens pela imolação. Por ela os
discípulos comungam com Aquele que é a Vida por meio da “carne dada”. Dessa
forma resulta claro que ninguém perde a sua identidade enquanto usufrui da
graça merecida por Jesus Cristo. O homem é santificado pela ação do Espírito
que Jesus mereceu. E o Espírito de Cristo Jesus age na proporção em que o fiel
acolhe o Plano de Deus, aberto aos ensinamentos das Escrituras e ao testemunho
d´ “Aquele que vem do céu” (3,31). Ele sabe e testemunha que o Espírito é
imprevisível como o vento (3,8). O fiel deve acolher o ensinamento de Jesus que
afirma que é no alimento pascal que está a vida, que é, mais precisamente, “a
sua carne dada para a vida do mundo” (6,51). Pela celebração, portanto, do
Memorial da sua Morte, ao comer das carnes sacrificais da vítima, é que o
Espírito põe o fiel em comunhão de vida com Cristo Jesus. Dessa forma o Filho,
pelo Espírito, realiza a obra do Pai, cooperando o homem pela sua adesão de fé
à Palavra que se fez carne, a que dá testemunho de tudo o que viu e ouviu
(3,32).
O Reino de Deus se torna presente no
homem quando, à iniciativa da Sabedoria, que está oferecendo o seu banquete (Sb
6,12; 9,1-6), corresponde o esforço nosso da instrução, unido ao afã do amor
pela observância dos mandamentos. Isto purifica os corações. Destes é o Reino
dos céus (6,17-20). Pela instrução que a Palavra nos dá, corrigimos as
interpretações do Reino de Deus que são segundo a carne e descobrimos o valor
da Pessoa de Jesus o Cristo. Ele é a Testemunha fiel, marcada pelo Espírito.
Todos os que têm em si o mesmo selo do Espírito, porque se deixam atrair pelo
Pai, dão testemunho que Jesus vem de Deus e o imitam na imolação.
Reflexão.
Estamos diante da catequese inspirada
de São João sobre a Palavra que se fez carne e que, pela doação que fez de si,
se tornou alimento de vida eterna para todos os que crêem nele. Enquanto Palavra
que sempre vê e ouve o Pai, porque sempre acompanhada pelo Espírito nos
transmite palavras que tem o Espírito sem medida. Enquanto Filho do Homem que
acaba nos dando o alimento que dura para a vida eterna, ao se tornar o cordeiro
pascal e consagrando o seu corpo como
Templo de Deus, se torna a fonte do Espírito, que jorra do seu lado direito.
A imolação é simbolizada pelo próprio
tempo da Páscoa durante o qual se realiza a multiplicação dos pães que Jesus
benze (eucaristésas v.11) e distribui, símbolo, por sua vez, da
Eucaristia (eucaristésantos tou Kuriou
v.23).
Enquanto Jesus realiza a Eucaristia,
além do mar, ele se apresenta na figura do verdadeiro Moisés, Guia supremo e
Salvador (At, 7,31). Nós o seguimos para alcançar a pátria celeste, nos alimentando
dele, a Sabedoria que nos proporciona o banquete pelo qual nunca mais temos
fome nem sede. Ele é, assim, o Profeta que Moisés anunciou (Dt 18,18) que,
pelas suas palavras que têm o Espírito sem medida (Jo 3,34) e pelo sacramento
do seu corpo, nos dá o Espírito de vida.
Os judeus tinham dificuldade em aceitar
Jesus dessa forma porque não queriam renunciar a uma visão política de Israel
e, tão pouco, aceitar um messias derrotado e humilhado. Assim pensavam, também,
os Apóstolos que acabaram abandonando o seu Mestre. Não eram capazes de seguir
o seu Mestre, porque ainda não tinham o Espírito. Ainda não tinham compreendido
o Caminho da glorificação do verdadeiro Adão, daquele que veio para servir e
não para ser servido e dar a sua vida em resgate de muitos e que sabe que é
pela obediência e imolação que o homem encontra a sua última realização.
Jo 6,11 liga todo o capítulo à
instituição da Eucaristia, momento em que: “Tomou, então, Jesus os pães e,
depois de dar graças, distribuiu-os aos presentes, assim como os peixinhos,
tanto quanto queriam” (Jo 6,11). Estamos diante de uma refeição que inova a
Páscoa, a festa dos judeus (v.1). O pão e os peixes representam o banquete que
a Sabedoria oferece (Sb 9,1-6; Jo 6,34). Trata-se de um quadro alegórico que se
repete após a Ressurreição: “Jesus aproxima-se, toma o pão e o distribui entre
eles; e faz o mesmo com o peixe” (Jo 21,13). Os quadros de Jo 6 e 21, ilustram
o quadro dos discípulos de Emaús que dá o nome à Eucaristia de “Fração do Pão”:
uma refeição festiva que o Senhor ressuscitado oferece para que nos alimentemos
dele sem mais ter fome nem sede. Os valores eternos nos nutrem pela visão que
temos de uma vida eterna que se atua em nós enquanto somos capazes, pelos
Espírito de viver seguindo o Verdadeiro Adão que se imola em obediência ao Pai.
Os seus ensinamentos são espírito e vida e tornam presente em nós a vida
eterna.
A adesão a Jesus é condição de
imortalidade e de ressurreição na carne, que, por si, não é do homem. É-lhe
dada porque Deus, desde antes a criação do mundo decretou dá-la aos homens pelo
Cordeiro imolado. O extremo do amor do Pai é continuado pela obra do Filho,
embora no mesmo contexto de culpa e miséria do primeiro homem.
Temos que trabalhar operando a adesão
ao Filho do Homem elevado na Cruz. Esta é a obra que devemos fazer. A
Eucaristia é a manifestação da nossa aceitação da Morte de Cristo, que
celebramos comendo das carnes da vítima, para, por nossa vez, dar testemunho.
Reflexão
Diante das
afirmações do v. 58 concluímos que Jesus realizou o sinal da multiplicação dos
pães à luz da figura de Moisés que deu o alimento a Israel no deserto depois de
tê-lo conduzido para a liberdade pela travessia do Mar Vermelho, eventos todos
eles lembrados para sempre pela celebração pascal do cordeiro imolado cujas
carnes eram comidas na ceia da Páscoa hebraica.
Quando
vemos João ligar a refeição que Jesus prepara à beira do lago à multiplicação
dos pães de Jo 6, entendemos que a catequese desse capítulo é toda ela dedicada
ao sentido da Fração do Pão que o Novo Israel é chamado a celebrar com o seu
Senhor para que o apostolado seja eficaz, o testemunho seja possível, e os
fiéis de cada igreja vivam na vigilância, na expectativa da Vinda do Senhor.
Para ainda
uma maior compreensão de Jo 6, é bom notar que a catequese é formulada sempre
pelo Filho do Homem em redor do qual começou a se reunir o Israel de Deus que,
à luz do Dia do Senhor encontrou o Messias, aquele de quem escreveram Moisés,
na Lei e os Profetas. Ele tem que entender que o Messias deve ser escutado para
que seja entendida a natureza do Reino de Deus que ele veio instaurar. Devem
ser abandonados os critérios de tradição humana, enquanto devem ser assumidos
como prova da messianidade de Jesus os sinais que ele oferece e que o próprio
Nicodemos admite (3,2). São eles que levam a ver a superioridade de Jesus em
relação a João Batista e ao próprio Moisés que Jesus cita como testemunha em
seu favor (5,46). Estabelecida a
messianidade de Jesus, é possível, também, admitir a sua condição divina que
Jesus proclamou quando se declarou o Filho que o Pai enviou, para dar a vida
pela sua Morte, a quem entregou todo poder de julgar. Depois da cura do
paralítico se proclamou o Senhor do sábado, guia ao Pai com quem sempre
trabalha, com o qual faz tudo o que vê fazer. Como ele, tem o poder de dar a
vida e de receber igual adoração. Essas verdades não puderam ser entendidas até
que ele manifestasse ser o “Eu sou” pela sua Morte profetizada e selada pela
ressurreição. Mas, agora, o Israel de Deus pode relembrá-las e entendê-las
enquanto João as redige lembrando, sob a guia do Espírito do Senhor, tudo o que
Jesus disse.
Divisão
À
luz da análise acima exposta, a catequese de João sobre o Pão da vida resulta
apresentada da seguinte forma:
1- O quadro alegórico da multiplicação
do pães.
2- O quadro alegórico da tempestade no
mar.
3- O discurso de Jesus na sinagoga de
Cafarnaum cujos pontos são:
1º) o Israel de Deus deve trabalhar
pelo alimento que dura para a vida eterna.
2º) o Filho que o Pai ungiu e enviou ao
mundo o dará na condição de “carne dada para a vida do mundo”
3º) O Israel de Deus deve crer nele,
deixando que o Pai o atraia
4º) Pelo Pão da vida terá a vida eterna
e, por ela, o penhor da ressurreição na carne.
5º) A carne do Filho do Homem é comida e
o seu sangue bebida que nos permitem comunicar com o Verdadeiro.
6º) A participação ao sacrifício do
Filho do Homem comunica a vida eterna e é princípio de ressurreição na carne
7º) porque o Espírito que ela propicia
põe o fiel em comunhão de vida com ele.
Síntese
Em Jesus, Deus tem a sua suprema
manifestação como “Eu sou”, porque ele realiza em si a figura do “Filho do
Homem”, a “Casa de Deus e a Porta do céu”, consagrada Templo pelo Cordeiro
pascal do qual sai o Espírito de Vida. Deus será assim lembrado para sempre,
todas as vezes que aquele que se tornou Senhor da Igreja, em virtude da sua
glorificação, reunirá ao seu redor os seus para que, em virtude do alimento
pascal renovem a eficácia do seu apostolado, a firmeza no seu testemunho e
perseverem na expectativa da Vinda dele. Será lembrado o novo Êxodo, comendo as
carnes do Cordeiro imolado, celebrando a libertação obtida pelo sangue que
marcou as portas dos hebreus. Pelo mesmo alimento será lembrado o maná no
deserto que Moisés deu ao povo de Deus. Mas o alimento pascal do Filho do Homem
transcende a figura porque não se trata mais de um animal, mas do próprio Jesus
imolado como Servo de Iahweh, levado como um cordeiro ao matadouro. A sua Morte
expia, de uma vez por todas, os pecados dos homens. As carnes do seu sacrifício
são daquele que desce do Céu e dá vida ao mundo. Quem se deixa conduzir ao
Filho pelo Pai recebe a justificação e o penhor da sua ressurreição na carne.
Os fundamentos da sua argumentação são
os sinais que ele dá, a obra do Pai que ele cumpre, o testemunho de João
Batista, as Escrituras que ele realiza, o próprio Moisés que testemunha em
favor dele. Quem argumenta alegando conhecer seu pai e sua mãe, enquanto se
nega às argumentações de Jesus, está se negando ouvir palavras daquele que tem
o Espírito sem medida.
A Igreja que celebra o sacrifício de
Cristo e del participa comentdo a carne do Filho do Homem entra em plena
comunhão com ele eo Pai pelo Espírito, tem em si o penhor da sua ressurreição
na carne. Pelo sacrifício de Cristo comungamos com o Verdadeiro, permanecemos
em Cristo, vivemos pelo Espírito. Nos é dada um condição de imortalidade.
Tema: O Pão da Vida
Por Jo 21 entendemos que o Pão da vida
está relacionado à Fração do Pão, à qual o Senhor chama a sua igreja para se tornar
eficaz no apostolado, no testemunho e vigilante na expectativa da Vinda do
Senhor. Por ele, abençoado e distribuído, comungamos da “carne dada para a vida
do mundo”, isto é, com Filho do Homem, mediante o Espírito. Isto acontece pela
nossa adesão de fé a Jesus, movidos pelas suas palavras segundo o Espírito.
Reconhecemos nele o “Eu sou”, particularmente pela profecia da sua Morte que
depois se realizou e que a sua ressurreição selou. Temos a vida eterna pelo
Espírito que Jesus mereceu porque o Espírito é o Espírito da vítima do
sacrifício do Filho do Homem. Tornado, de alma vivente, Espírito vivificante
(1Cor 15,45), pelo seu Espírito nos faz passar de glória em glória (2Cor
3,17s). “Pão da vida” significa, portanto, que o alimento pascal que Jesus abençoa
e distribui é o Cordeiro imolado que comunica o Espírito que sai do seu lado
aberto.
João 6 é exaustivo na explicação do
sentido do pão na Eucaristia de Jesus. Mas, enquanto a ele associa os termos
“vida”, “vivo”, oferece uma vasta teologia do Espírito. Em Jo 3 falou da água e
do Espírito d´Aquele que faz renascer pela sua Morte de Cruz. Agora explica
como esse Espírito passa do Esposo para a Esposa: pela adesão de fé desta ao
sacrifício do Filho do Homem. Em relação à Morte de Cruz, o Espírito é, antes
de tudo, o dom do Cordeiro pascal (Jo 14,). É como a seiva de uma videira que
permite a plena união dos ramos a ela e os torna capazes de viver por meio
d´Aquele que comem; o que faz ver claramente o gratuito divino na vida que é
comunicada, o Princípio de ação pelo
qual podemos produzir frutos de vida eterna e a condição de vida que adquirimos
enquanto damos nossa adesão de fé ao Filho do Homem. Disso resulta, também,
toda a importância de, continuamente, nos compenetrarmos da grandeza do Plano
de Deus que contempla a ação do Pai que atrai os homens ao Filho e a Sabedoria
e Poder com que, pelo Filho, o “Eu sou” realiza, no Espírito, a regeneração do
homem.
Enquanto Jesus liga o Espírito ao
alimento que o Filho do Homem dá pela sua Morte de Cruz, nos esclarece acerca
da natureza da vida que nos comunica. O maná que Moisés deu ao povo de Deus que
tinha saído da escravidão e vivia no deserto, era só figura do verdadeiro pão,
isto é daquele que Deus dá enquanto doa o Filho ao mundo. Os ancestrais dos
hebreus comeram o maná e morreram. Os que comem d´Aquele que desce do céu tem a
vida eterna. O Espírito que Jesus glorificado em virtude da sua imolação de
Cruz nos oferece, é princípio de imortalidade porque nos faz permanecer unidos
a ele. Aqueles que subsistem até que Deusdeles retire o seu espírito e, então
perecem, pela ação do Espírito do Adão que se tornou Espírito vivificante, vive
para sempre, na condição, contudo que viva os mandamentos de Cristo, condição
de permanecer nele.
O
Espírito que a Morte de Cristo nos comunica não é só princípio de vida eterna
enquanto nos comunica a Vida da Trindade Santa. Ele, também, a promove, nos faz
passar de glória em glória. É o Espírito do Pai que nos conduziu até Cristo e é
o Espírito de Cristo que nos promove até à estatura adulta dele, fazendo-nos
entender os ensinamentos do Filho e viver por meio dele (v.57).
Tema: “A carne dada para a vida do
mundo”
O alimento
pascal ao qual o Senhor da Igreja chama os seus realiza em si a figura do
cordeiro cujo sangue marcou as portas das casas dos hebreus e provocou a sua
libertação da escravidão. Enquanto é lembrado pelo pão ázimo resulta ser,
também, o maná que Moisés deu ao povo de Deus. Dessa forma é figura do Pão que
Jesus dá ao Novo Israel enquanto caminha para a Pátria definitiva. Tudo isso
acontece a partir do momento em que Jesus, na última Ceia institui o memorial
da sua Morte pelo Corpo dado e o Sangue derramado. O sacramento do seu
sacrifício de Cruz se torna fonte do Espírito de Vida, como Água que sai do
lado aberto pela lança de Cristo na Cruz.
A minha
carne é verdadeira comida e o meu sangue é verdadeira Bebida: em virtude do
Espírito que põe em comunhão com o Verdadeiro.
Quem come a
minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna: em Virtude do Espírito merecido
pelo sacrifício do Filho.
Como o Pai
que vive me enviou e eu vivo pelo Pai, quem come de mim viverá por mim: sempre
em virtude do Espírito que põe em comunhão perfeita de vida o Filho com o Pai;
quando comunicado pelo perfeito sacrifício, do qual participamos comendo das
carnes da Vítima, nos faz viver pelo próprio Cristo Jesus.
A realidade
transcende a figura porque o alimento pascal é o Filho, Aquele que desce do céu
e, pela sua imolação de Cruz, dá a vida ao mundo. O maná, embora dádiva do céu,
não era alimento que dura para a vida eterna. Os hebreus, no deserto comeram um
pão que perece e morreram. Somente aquele que se alimenta do “Eu sou”, o Pão da
vida, tem a vida eterna.
06 de Maio de 2011
Alcançamos
uma melhor compreensão de Jo 6 quando lembramos o que o Apocalipse nos ensina.
João escreve à Igreja perseguida. De um lado reafirma a vingança de Deus, em
favor dos seus santos. De outro lado, todavia, lembra que a tribulação até
morrer, se for preciso, pela espada é o caminho da nossa realização. O foi para
Jesus, que pelo sofrimento levou a sua humanidade à glorificação. Quando,
portanto os fiéis celebram a Fração do Pão, enquanto se nutrem das carnes da
vítima, querem repetir em si o triunfo que Jesus realizou ao aceitar o cálice
da sua Paixão. É dessa forma que a doutrina cristã podia ser ensinada até aos
escravos que eram dissuadidos de qualquer reivindicação de cunho social, uma
vez que os ideais da Morte do Senhor podiam ser realizados, até de forma
privilegiada, na condição em que estavam.
O
mesmo Filho do Homem que ensina no Apocalipse e determina como condição de ser
sua Igreja o ardor da caridade inicial, em Jo 6 exorta a não ficar satisfeitos
com o pão que sacia a fome do corpo, mas a procurar “o alimento que dura para a
vida eterna”. É por ele que quem crê nele e dá a sua adesão a ele não terá mais
fome nem sede. Alcançará a mesma glória que a humanidade de um filho de homem
que a Glória de Iahweh assumiu pela Encarnação alcançou pelo seu sacrifício.
Viver os mesmos ideais é caminho seguro para alcançar a glorificação. No árduo
caminho da sua imolação será assistido por aquele que já alcançou a
glorificação “vivendo pelo Pai”, o sumo sacerdote que sabe confortar por ter
sofrido por primeiro.
11 de Maio de 2011
Reação dos
discípulos (60-71)
58-70. Resumo. A catequese pronunciada por Jesus na sinagoga
encontra o terreno duro que repele a Palavra. Seu coração está endurecido,
apegado à tradição humana, nos escribas e fariseus. Encontra o terreno que
sufoca a plantinha que brotou da semente, nos discípulos. Em Judas, dominado
pela cupidez do ouro, que é um idolatria, encontra o terreno cheio de abrolhos.
Encontra, enfim, a terra boa que acolhe
a Palavra e produz frutos de vida eterna no coração dos Doze.
As palavras
de Jesus são inaceitáveis por todos aqueles que em lugar de se abrir à ação do
Espírito, não obstante a força dos sinais que são apresentados, se apegam às
suas convicções, sem se aperceber que estão equivocadas. Dessa forma perdem a
oportunidade de escutar as palavras daquele que tem o Espírito sem medida, que
dá testemunho de tudo o que viu e ouviu,
que vem do alto enquanto eles são daqui, da terra. Sempre devemos nos deixar
ensinar por Deus e ficar na escuta do ensinamento do Pai. Mas o homem pode ser
corrompido, também pela idolatria do ouro que lhe faz preterir os valores do
Espírito. Foi o triste caso de Judas que chegou a uma atitude demoníaca com o
seu Mestre. As palavras de Pedro revelam toda a riqueza que o discípulo pode
adquirir quando segue a Jesus, renunciando a tudo, bens materiais e convicções
pessoais: a Palavra se torna fonte de vida eterna seja pelos seus ensinamentos
como pelos sinais que ele institui. Tudo isto será comprovado pela sua
glorificação. Então, até os corações mais empedernidos saberão ver na Morte de
Cruz o momento da glorificação do Filho do Homem (At ).
Reflexão
Jesus agiu num contexto religioso
norteado por convicções que deviam ser corrigidas (6,61). As expectativas de
Natanael se fundamentavam em critérios humanos (1,46). Assim, também, as de
Nicodemos (3,4.31) e dos discípulos, diante da Morte de Cruz do Filho do Homem
(6,60), que exigia uma adesão total de fé em quem, em virtude dos sinais que
operava, proclamava ser do alto e ter palavras de “espírito e vida “ (v. 63).
Mais perigosas e difíceis de ser vencidas eram as convicções dos escribas e
fariseus porque neles não estava o amor de Deus e procuravam sua própria
glória. Tendo feito da revelação uma tradição humana, levavam o povo a assumir
as mesmas convicções suas. Hostilizavam Jesus porque suas obras eram más.
Jesus, contudo, não deixou de dialogar com mingúem. Era fácil convencer um
Pedro, Natanael, Nicodemos, uma Samaritana, um funcionário do rei, paralítico,
cego, Marta e Maria. Difícil seria convencer os que negavam a evidência da
verdade. São estes adversários que provocam as respostas de Jesus que acabam
sendo o argumento valioso para o entendimento da Pessoa do Senhor. Vemos, de
fato, que Jesus apela para a sua Morte como argumento cabal que deve levar à
convicção da sua condição messiânica e divina a todos: dóceis e obstinados.
Para Jesus, o reconhecimento da sua condição divina é condição de salvação
(8,24). Por isso aceita a Morte de Cruz porque vê que deve acontecer segundo a
Profecia e porque condição da sua glorificação e porque, por tê-la profetizado,
uma vez que acontece, se torna o argumento que ele é o “Eu sou”. Jesus a tinha
comentado no seu aspecto esponsal desde o início e como condição de reedificação
do Tempo do seu Corpo: uma ilustração da afirmação feita a Natanael de que
veria nele a Casa de Deus e a Porta do Céu, porque nele se realizaria a figura
do Filho do Homem de Ezequiel, a partir do filho de homem qual poderia ser o
Jesus, filho de José, o nazareno. Em Jo 3 Jesus expõe a natureza da graça que a
sua Morte alcança: os homens renascem pela água e pelo Espírito do Filho do
Homem, o Templo consagrado pela imolação do Cordeiro pascal. Em Jo 6 vemos como
o Espírito que vivifica é comunicado. Jesus institui o Memorial da sua Páscoa
através do alimento que distribui, sacramento da sua “carne dada para a vida do
mundo” (6,51). Notamos que o dom é sempre o mesmo (2,9; 3,5; 6,56). Mas, também
o doador que é Jesus, é sempre identificado da mesma forma: o Filho do Homem.
Aquele que colocou a sua Tenda entre nós, que reergueu o Templo do seu Corpo,
que foi glorificado pela sua Morte é aquele que dará o alimento aos que o
seguem. Essa condição de alimento que “permanece para a vida eterna” encontra a
sua explicação no gesto de Jesus à beira do Mar da Galiléia (21,9.12s).
A Morte de Cristo que numa visão
terrena não é concebível como condição de cumprimento do Plano de Deus, de fato
é segundo as Escrituras. É até condição de glorificação da criatura. É sobre o
Adão que conduziu à perfeição a sua humanidade pela obediência e imolação que
Deus opera a transformação da criação e torna Jesus o Filho que, com ele recebe
a mesma adoração. Pela Morte de Cruz, o Adão se torna Templo definitivo na
condição de Espírito vivificante e Senhor que envia o seu Espírito. Tosos
aqueles que, pelo Pão partido comungam do seu sacrifício pascal vivem por Ele
porque, pelo Espírito permanecem unidos a ele (6,56).
Tema A murmuração
Nesse trecho final de Jo 6 encontramos
a murmuração de discípulos que consideram o ensinamento de Jesus sobre o Pão que
desce do céu algo inaceitável. Fazem sua a murmuração dos judeus a quem Jesus
dirigiu a exortação de se deixar atrair pelo Pai. A motivação é a sua condição
de Filho do Homem, que voltará para o céu de onde veio.
Erram as pessoas que persistem nas
argumentações da razão humana uma vez que Jesus realizou sinais claros que ele
é o Filho que o Pai consagrou e enviou ao mundo.
Em Jo 6 o evangelista repete a
argumentação que Jesus utilizou com Nicodemos. Uma vez que os sinais realizados
comprovam que ele vem de Deus, aquilo que ele ensina deve ser aceito na fé. É a
obra que devem realizar. No início do diálogo, citaram o alimento que Moisés
deu ao povo no deserto. E ele explicou que aquele era figura. Com ele, pela fé
naquele que o Pai enviou, se alimentarão para não mais ter fome, Indo aq ele,
não terão mais sede. Aquilo que ele anuncia, Ele é capaz de realizá-lo. Quem
nele crê alcança a vida eterna por aquilo que institui: o Memorial da sua Morte
ao qual terão acesso pela purificação do
Batismo.
Ele
vem do alto, tem o Espírito sem medida. Aquele que vai a ele, atraído pelo Pai
alcança a vida eterna e por ela o princípio da sua ressurreição final. Ele á
Aquele que desce do céu e dá a vida ao mundo (Jo 6), porque é a Luz do mundo
(Jo 8), o Filho do Homem (Jo 9), o Bom Pastor, “Um com Pai” (Jo 10), a
ressurreição e a Vida (Jo 11).
A renitência têm as suas causas. Nos escribas
e fariseus, a procura da sua glória e a falta do amor de Deus. Nos discípulos,
o apego aos critérios humanos. Por não acreditar no Filho de Deus, os homens
perdem a vida eterna. Se tornam estirpe de Deus os que nascem de Deus acolhendo
a Palavra que se fez carne.
Evangelho
de João (12) Jo 7
Os
adversários reconhecem que, embora não tenha freqüentado nenhuma escola, Jesus
é um entendido nas Escrituras. Não obstante isso, mantêm uma atitude hostil e
procuram todos os meios para eliminá-lo. Realmente neles não vive o amor de
Deus, não querem se renovar mediante uma interpretação das Escrituras segundo o
espírito dos seus ensinamentos. Vivem ligados à tradição humana da qual são
expertos conhecedores e na qual procuram manter o povo, preocupados com a sua
própria glória. Quando, portanto, Jesus tenta estabelecer um contato com eles,
dialogando sobre as Escrituras, o resultado é uma posição sempre mais
exacerbada por parte dos escribas e fariseus que o obriga a pronunciar uma
denúncia sempre mais severa. Esse foi o caminho que o levou à morte: ele testemunhando
a verdade, os adversários retrucando com a
mentira.
Jesus vivia animado com a
esperança de conversão por parte dos seus interlocutores, enquanto
cumpria fielmente a sua missão de enviado pelo Pai à casa de Israel. Mas
acontecia que os seus interlocutores que chegavam a odiá-lo sempre mais, ao
contrário, inclinavam-se de forma sempre mais decidida para uma conduta
homicida. Sabia que o mundo o reconheceria como Messias somente após a sua
Morte (14,31). O evangelista explora a diatribe para nos propor o ensinamento
de Jesus.
O
primeiro desses ensinamentos podemos dizer que é a constante de todo o
ensinamento de Jesus desde o seu momento inicial: é preciso que abandonemos a
forma humana de interpretar o seu ensinamento divino. Os escribas a ela se
apegavam como pretexto para denegrir a pessoa de Jesus diante do povo. O povo a
absorvia na sua ingenuidade. Jesus de Nazaré não deixa de ser o Rebento da raiz
de Jessé, portanto a Descendência chamada a reinar sobre as tribos de Jacó, uma
vez que se realiza nele a profecia. São os seus sinais que indicam a sua
origem, não o lugar de onde pretensamente ele teria a sua origem. A sua
competência relativamente às Escrituras deveria indicar suficientemente que ele
possui o espírito da profecia e que, portanto, vem de Deus. As suas obras o
comprovam, assim como a sua doutrina. A sua messianidade não foi anunciada por
João Batista? A proclamação da sua Divindade que interpretada segundo a figura
do Filho do Homem, é algo que deve ser aceito diante de toda a série de
comprovações já aduzidas.
Não
obstante a rejeição, não obstante a calúnia e os propósitos homicidas dos seus
adversários, Jesus aproveita a festividade do Templo para indicar que dele, o
verdadeiro Templo, sairá a Água da vida. Trata-se de uma antecipação da
apresentação de Jesus na sua condição definitiva e gloriosa de ressuscitado que
por ter merecido com a sua Morte o Espírito, o doará à sua Igreja no primeiro
dia da semana.
Candidatam-se para esse dom todos aqueles que reconhecem que a sua doutrina é
de Deus, aqueles que aceitam a sua origem
divina e aqueles que saberão ver na sua Morte a ereção do Templo
verdadeiro do qual jorrará o Espírito.
Devemos notar, nesse capítulo, a presença de Nicodemos, membro do Sinédrio, que
desmascara a arbitrariedade das autoridades religiosas em relação a Jesus, ao
mesmo tempo nos mostrando como devemos ser discípulos dele de forma plena,
estando sempre abertos ao ensinamento das Escrituras que falam de Jesus, para
chegar à compreensão da sua condição divina e do caminho para renascer da água
e do Espírito.
Perguntas para reflexão:
1ª) Por que Jesus dialoga com os escribas e fariseus?
2ª) O que impede a nossa compreensão da Pessoa de Jesus Cristo?
3ª) Por que as autoridades religiosas se recusam a aceitar a messianidade
de Jesus?
Evangelho de João (13) Jo
8
Torna-se fundamental reconhecer que Jesus é o “Eu sou”, o Deus que se revelou a
Moisés na sarça ardente, o “Unigênito Deus”, que ao se manifestar, enquanto
assume a natureza humana, “Resplendor da Glória de Deus, Imagem do seu Ser” (Hb
1.3), é a Luz do mundo. Ele se torna a Palavra, a Vida eterna, manifestada na
carne para que o homem não morra nos seus pecados. Pela fé naquele que se
apresenta a nós na condição de Filho do homem, e realiza a nossa redenção ,entramos em comunhão de vida
com o Verdadeiro. Diante da obstinação do homem, que Deus compreende, porque
dele conhece a ínfima condição de entender, e que manifesta preferir, porque
corrompido, as trevas à luz, Jesus acena a uma ação irresistível pela qual o
homem terá que se render ao Deus bondoso e fiel. Elevado da terra, o Filho do
Homem atrairá todos a si. Por aquele sinal, selado pela sua ressurreição,
reconhecerão que ele é o Senhor, o Nome pelo qual será, para sempre, celebrado
na sua Igreja.
O diálogo de Jesus com os escribas e fariseus, conhecedores da Lei e seus fiéis
cumpridores, visa enfatizar a importância da graça que, em Jesus o Enviado, o
Pai quer nos conceder.
O homem pensa como criatura terrena. Até o judeu que estava de posse da Lei,
entregue aos homens pelos próprios anjos, não estava em condição de se
aproximar de Deus porque ainda devia vir aquele que a realizaria e a levaria à
perfeição, comunicaria o Espírito,
o único capaz de promovê-la nos
que acreditam nele. Os judeus tinham reduzido a Lei a tradição humana, observância de prescrições. O homem
tem que se abrir às perspectivas que o Unigênito Deus apresenta, ele que vive
em plena comunhão de vida com o Pai, que conhece o Pai. O testemunho de João
Batista, que liga Jesus a toda a Profecia, os sinais que este opera e que
mostram que ele vem de Deus (3,1), e as Escrituras que falam dele (5,41) são os
fundamentos da sua credibilidade. Por tudo isso, os seus interlocutores devem
acolher o seu testemunho, que é válido, porque acompanhado pelo testemunho do
Pai com o qual ele sempre age. Ele o conhece. Nós, também, poderíamos chegar a
conhecê-lo se acolhêssemos o Filho.
Com a aberta declaração da sua filiação divina, Jesus reafirma a sua condição
de Pessoa divina, já declarada quando da cura do paralítico (Jo 5). É uma forma
para nos alertar sobre a importância da sua presença que o mundo poderá
aproveitar enquanto é o Dia do Senhor (Jo 1). A partir do momento em que chegar
a hora das trevas, o mundo nunca mais o verá. O verão somente os seus que,
contudo, terão que observar os seus mandamentos para se tornar morada dele e do
Pai. O fiel tem que permanecer nele, porque, então, permanecerá na Verdade,
pela ação do Espírito, única condição de viver a liberdade. De fato, ninguém
pode se considerar livre somente porque é descendência de Abraão, ou porque se
gloria de conhecer o único Deus verdadeiro.
Ao mesmo tempo que os judeus não acolhem o que Jesus viu junto de seu Pai,
querem matá-lo. Isso revela que eles são do diabo, homicida(s) desde o princípio. Com essa aberta acusação, Jesus pronuncia uma
sentença de condenação contra aqueles que não querem ir até ele para ter a
vida. São gente que se deixa dominar
pelo Mal, a ponto de querer matar aquele que veio de Deus para lhes comunicar a
verdade e a vida. Dominados pela ambição de procurar sua própria glória, não
têm em si o amor de Deus (5,42.44)
Por essas palavras de Jesus entendemos claramente que a serpente tentadora,
belzebul, o dragão, satanás, o diabo, o maligno são figuras do mal do qual o
homem é culpado porque se deixa voluntariamente dominar ( Gn 4,7). Uma vez que
o homem cede à tentação, o mal vai sempre mais escravizando-o, a ponto de
somente Deus, com a sua força, estar em condições de reintegrá-lo na sua
condição de liberdade, na qual permanecerá na medida que lutar contra as
concupiscências que o escravizam, na força da Palavra que continuamente recorda
o Plano redentor de Deus pelo Filho. Nisso está o exercício da vida cristã,
acompanhado pelos mistérios celebrados da nossa redenção. Em Cristo, temos
sempre a condição de nos recuperar até quando voltamos novamente ao pecado (1Jo
2,1-2).
O propósito homicida dos escribas e dos fariseus nos revela o âmago da miséria
moral que o homem pode atingir. Nesse caso, nos mostra, também, que ele é
alcançado quando a realidade mais santa, que é a virtude de religião, é
manipulada por intuitos de uma ambição desordenada.
Perguntas para reflexão:
1ª)
O que significa que Jesus é o “Eu sou”?
2ª)
Quais são as provas que Jesus apresenta da sua divindade?
3ª)
Porque Jesus acusa os escribas de ser do diabo?
Evangelho de João (14)
Jo 9
Estamos diante de uma narrativa
catequética, oportunamente inserida no contexto da declaração de Jesus de ser a
“Luz do mundo”, com a finalidade de explicar mais um aspecto do “Filho do
Homem” (v. 35). Mais uma vez os que se vangloriam de conhecer a Lei, achando,
portanto,que são capazes de enxergar, darão prova de ser os cegos (v.41). Os
fariseus que já recusaram a explicação de Jesus (7,22-24) sobre o espírito da
Lei, e a sua comprovação de ser de Deus (8,46-47), porque, sendo do diabo, não
podiam escutar a sua palavra (8,43-44), insistem em ensinar ao povo que Jesus
não vem de Deus (9,16).
A abertura de Jo 9 nos indica que a
narrativa da cura do cego deve ser lida em chave alegórica. Jesus quer reafirmar
a sua condição de Luz do mundo e o faz por um sinal que aponta para a
realização da obra que o Pai lhe ordenou de levar a termo.
A alegoria começa com o gesto de
enviar o cego para a piscina do Enviado. Esse título messiânico foi
insistentemente lembrado por Jesus. O define como o Anjo do Senhor, o Filho que
o Pai consagrou pelo Espírito e enviou ao mundo para dar a vista aos cegos e
fazer os surdos
ouvir e os mudos
falar.
João explicita o sentido desse
título construindo um primeiro diálogo dedicado a reafirmar o título que Jesus
quer que lembremos: ele é o Enviado e o sinal irrefutável da cura do cego é a
prova. Um segundo diálogo entre os fariseus e o cego curado faz lembrar a
interpretação dos mestres da Lei. Ela está fundamentada na tradição humana, uma
forma errada, sobre a qual Jesus já tinha alertado (7,24-25). Os escribas e
fariseus deveriam entender, diante dos repetidos milagres realizados em dia de
sábado, que ele vinha de Deus, ainda mais que não podiam acusá-lo de pecado
(8,46). As curas indicavam que ele era um profeta, alguém que devia ser
escutado porque dava claros sinais de ser o Enviado de Deus (10,25).
O terceiro diálogo, o dos fariseus
com os pais do cego curado, quer mostrar a intransigência das autoridades
religiosas que, a princípio, hostilizam Jesus.
O quarto diálogo volta a apresentar
os fariseus interrogando o cego curado. Este último, vai dizendo tudo o que ele
chegou a crer diante do sinal e que os fariseus não conseguem interpretar.
Diante do fato, deveriam entender que aquele que o curou vem de Deus (3,1), que
foi atendido por Deus porque já provou ser sem pecado. É por isso que Deus o
escutou. João está, aqui sintetizando o que Jesus explicara antes. Os fariseus
hipocritamente apelam à figura de Moisés, embora saibam que Jesus já declarou
que Moisés falou dele e que os acusará porque não acreditaram nos seus escritos
(5,47).
O quinto diálogo acontece entre o
cego curado e Jesus. Os que têm a coragem de aceitar ser expulsos da sinagoga por optar por Jesus
chegam a conhecer o Senhor, que se apresenta aos homens na condição de Filho do
Homem até que os mistérios da sua Paixão, Morte e Ressurreição o revelem o
Filho com poder, tornado,de alma vivente Espírito vivificador (1Cor 15,45).
O ensinamento final da alegoria é
grave: aquele que os homens têm que reconhecer como enviado de Deus é, de fato,
o próprio Deus que se manifestou na carne. Os que dão a sua adesão a ele sairão
das trevas. Os que não o acolhem, porque preferem as trevas, porque suas obras
são más, nunca mais o verão.
Perguntas
para reflexão:
1ª)
Qual é o ensinamento dessa narrativa catequética?
2ª)
Qual é a gravidade da culpa das autoridades religiosas judaicas?
3ª)
Qual é a graça concedida aos que crêem no Filho do Homem?
Evangelho de João (15) )
Jo 10
Jo 10 é a conclusão do longo
contraditório que Jesus iniciou com os escribas e fariseus em Jo 5, na
tentativa de convencer acerca da sua messianidade (10,24-25). Não obstante o
reconhecimento por parte dos seus interlocutores da sua competência quanto às
Escrituras (7,15), estes se recusam curvar-se diante da correta interpretação
da Lei (7,24). A posição obstinada daqueles que de interlocutores passam a ser
adversários acaba sendo denunciada no momento em que Jesus os declara cegos
(9,41).
São guias que nem entram, nem deixam
entrar no Reino dos céus. Tornaram-se ladrões e salteadores, tentando arrebatar
das mãos do Pai as suas ovelhas. Ele é a Porta! Ele é o Pastor e Guia de um
rebanho que reconhece a sua voz e não mais a voz de quem se tornou um estranho!
Por isso segue a Jesus que guia as suas ovelhas para as pastagens, indo e
voltando em segurança. Ele é o Pastor, a Bondade que sempre age no amor, cuja
suprema manifestação será a da sua imolação. Em virtude desse seu gesto
redentor, a resposta ao seu chamado se tornará, desde o seu início, pleno
conhecimento por parte das ovelhas. O seu chamado contemplará todos os povos e
línguas, tribos e nações.
A união plena a ele por parte de cada
fiel será o princípio do único
rebanho. A imolação que Jesus realiza em prol das ovelhas é o máximo da
glorificação que o Filho do Homem presta ao Pai. Por ela é revelada,
ao mesmo tempo, a sua condição divina porque, após ter entregue a sua
vida, ele a retoma.
Na festa da dedicação, ao reiniciar o
seu contraditório com os fariseus, Jesus define a sua condição divina quando
declara ser “Um com o Pai” (10,30). Ele é o Filho que “o Pai consagrou e enviou
ao mundo” (v. 36). O Pai está nele e ele está no Pai (v.38).
Dez capítulos se passaram desse manual
catequético que estamos lendo. À luz de tudo aquilo que o Apóstolo João ensinou
da Palavra da Vida que se manifestou, está nos dando uma compreensão sempre
mais profunda e abrangente de Jesus, o Cristo, Filho de Deus. Ele é a Luz que
resplandece nas trevas. Atribui a si o título de Filho do Homem e quer que,
segundo esse título, o reconheçamos em sua condição divino-messiânica. A
Nicodemos apresenta o que o Filho do Homem realiza. Entregue pelo Pai ao mundo,
elevado da terra, pelo Espírito que merece pela sua imolação dá origem a uma
nova criação. Na sinagoga de Cafarnaum, anuncia o Memorial da sua morte. Os que escutam a sua voz, confirmados na fé
por Pedro, o celebrarão o para sempre, para ter em si a vida eterna e ressuscitar no último dia. Na festa
das Tendas, revela que será o Templo do qual jorrará o Espírito, o “Eu sou”,
Aquele que existe antes mesmo de Abraão, cuja manifestação gloriosa acontecerá
exatamente pela Cruz. Naquela hora, a sua humanidade conhecerá a condição de
participar da glória da Vida Trinitária, o Filho do Homem redimirá os seus de
toda condição de pecado e Deus Pai verá o seu Plano de divinização do homem
plenamente realizado em virtude do Filho que efundirá o seu Espírito sobre toda
carne.
Ajudados pelo Apocalipse que fala do
Senhor Jesus como o Filho do Homem-Cordeiro imolado, podemos entender melhor
porque este diz de si mesmo que é a Porta (Ap 3,8; 4,1) e o Pastor das ovelhas
que dá a vida eterna àqueles que escutam a sua voz (7,17). E quando o autor
lembra os mártires que vencem Satanás pelo Sangue do Cordeiro, entendemos as
palavras de Jesus no momento em que proclama que ninguém arrebata as suas
ovelhas da sua mão (12,11). Somente Aquele que descido do céu pode subir ao céu
está em condições de nos por em comunhão com Deus. Não haverá adversário que
possa vencer o poder
daquele que é “Um com o Pai”.
Perguntas para reflexão:
1ª) Quais são as prerrogativas do Bom Pastor?
2ª) Qual é o título divino-messiânico que Jesus atribui a si mesmo e que
é o tema do Evangelho de João?
3ª) Por que Ap 4,1-3 e 7,15-17 ilustram as metáforas da Porta e do Pastor
que Jesus utiliza para explicar a sua condição de Filho do Homem?
Com a ressurreição de Lázaro, Jesus chega ao ápice da sua atividade messiânica
no meio da Casa de Israel. Por ela prova que realmente o Pai deu ao Filho
o poder de ressuscitar os mortos, “para que todos honrem o Filho como honram o
Pai” (5,23). A ressurreição de Lázaro quer ser o sinal do seu poder de dar a
vida a todos os que a ele derem a
sua adesão de fé. Na condição de Senhor da Vida, confirma o que disse quando se
apresentou como “o bom pastor que dá a vida pelas ovelhas” (10,11): “Tenho o
poder de entregá-la e de retomá-la” (10,18). O fará na condição de quem o Pai
consagrou e enviou ao mundo com esse específico preceito. Ele é o Cristo do
Senhor que se manifesta “Ressurreição e Vida”, pelos gestos da sua humanidade,
assumida pela encarnação.
Jesus, diante do sepulcro de Lázaro, sinaliza a sua condição de Pessoa divina,
qual a Transfiguração ilustra pela Lei e os Profetas. Naquele momento,
Jesus, conversando com Moisés e Elias, interpreta, para os Apóstolos que o
contemplam, o sentido da sua Morte. Ao ressuscitar Lázaro, Jesus antecipa a
condição que a sua ressurreição revelará. Será a condição definitiva que, por
um momento, a transfiguração mostrou. Então, os Apóstolos entenderão qual vida
o seu Senhor e Mestre veio trazer aos homens, que somente podia ser alcançada
pela sua imolação. De fato, com a sua imolação, a glorificação definitiva
alcançada para si, será, também, para todos os que se dispuserem a segui-lo
carregando a cruz, realizando em
si o que a Palavra da Verdade, a Vida, Vida eterna (1Jo 1,1-2) realizou na
humanidade assumida pela obediência até a morte e morte de cruz (Fl 2,8).
A ressurreição de Lázaro não quer, de forma alguma, indicar para que Jesus veio
ao mundo e sim, apontar para uma imortalidade que, os que cressem nele,
alcançariam. Não obstante a grandiosidade do gesto que fez estremecer pelas bases a liderança que as autoridades
religiosas judaicas, ela queria ser, simplesmente, mais um dos sinais pelos quais as ovelhas
da casa de Israel chegariam a crer que ele vinha da parte de Deus como mestre e
que Deus estava com ele (3,2).
De fato, Jesus assim falou a Nicodemos: “É necessário que seja levantado
o Filho do Homem a fim de que todo aquele que crer tenha nele a vida eterna”
(3,15). Trata-se de uma vida que não é alcançada somente pela ação onipotente
do Filho que oferece a sua vida como sacrifício de expiação, como, também, por
um compromisso moral pelo qual o discípulo permanece em Cristo. O que ocorre
quando o discípulo vive segundo o Espírito do Senhor que morreu e ressuscitou.
A ressurreição de Jesus vem, contudo, garantir que, com a glorificação que o
discípulo alcança enquanto, à semelhança do seu Senhor e mestre vive a sua
imolação no serviço, que haverá, também, uma ressurreição na carne.
Disso, a ressurreição de Lázaro é uma comprovação. Haverá, com certeza, uma
ressurreição dos mortos que não reconduzirá à vida transitória, ma que
estabelecerá numa condição definitiva e gloriosa o homem que nessa terra só
recebeu uma forma de vida transitória.
Perguntas para reflexão:
1ª) Qual é o sentido da
ressurreição de Lázaro?
2ª) Qual é o caminho
para alcançarmos a condição gloriosa?
3ª) Por que o Senhor
ressuscitado é princípio da nossa ressurreição na carne?
Evangelho de João (17)
Jo 12
Jo 12 é a conclusão da primeira parte
do Evangelho de João. De um lado apresenta o balanço da atividade messiânica de
Jesus, enquanto, de outro lado, é a abertura à Paixão do Senhor. Na sua
primeira parte, se liga a Jo 6, onde temos a narrativa da multiplicação dos
pães, dentro da perspectiva da Páscoa judaica. A introdução se dá com as mesmas
palavras “Ora, a Páscoa dos judeus estava próxima” (11,55; cf 6,4). Temos, em
seguida, uma complementação daquilo que deve ser a celebração do memorial,
instituído por Jesus na última ceia. É o quadro inicial do gesto de Maria, irmã
de Marta e de Lazaro, que derrama um vaso de nardo sobre os pés de Jesus e os
enxuga com os seus cabelos. O próprio Jesus interpreta o gesto dizendo: “Ela o
fez em vista da minha sepultura” ( v. 7). Isto nos ensina que o Memorial da
Morte do Senhor deve ser celebrado com a disposição de quem, como Maria, chega
ao pleno conhecimento de Jesus por ter-se tornado discípula que escolheu a
melhor parte, e, também, porque reconheceu, pela ressurreição do seu irmão
Lázaro, aquele que é a Ressurreição e a Vida.
Segue-se um segundo quadro que
ilustra a condição messiânica de Jesus, enquanto é aclamado Rei de Israel e
Filho de Davi. Os aspectos devem, contudo, ser aprofundados porque, quando
Filipe e André lhe apresentam gregos,
isto é pagãos, que querem ver Jesus, este reponde alertando sobre o
verdadeiro Jesus que, tanto judeus, como pagãos,
como também os Apóstolos devem chegar a ver claramente: o Filho do Homem que
vive a sua glorificação através da sua imolação,como o grão de trigo que cai na
terra e morre para produzir muitos frutos.
Isto, contudo, não isenta a sua
humanidade da angústia diante da Paixão que terá que enfrentar. Uma angústia
que Jesus voltará a sentir no Horto das
Oliveiras, momento em que invocará o Pai para que o poupe de beber o cálice da
amargura. Todavia, na condição de verdadeiro Adão, que sabe que a sua plena
realização depende de uma obediência até a morte e morte de cruz, logo volta a
abraçar os ideais do Plano sapientíssimo, pelo qual será glorificado o Nome do Pai. Será pela
vitória sobre o príncipe deste mundo. Devemos contemplar com os olhos da fé a
humilhação da Morte de Cruz que Jesus sofreu para saber reconhecer no seu gesto
o caminho do seu triunfo, aliás, claramente proclamado por ele ao dizer:
“Quando for elevado da terra, atrairei todos a mim (v.32).
Toda a visão gloriosa da Paixão do
Senhor está sintetizada no título que
Jesus, desde o início do Evangelho de João, atribui a si, o de “Filho do
Homem”, constituido no tema do próprio
evangelho. Vemos que Jesus exorta os judeus a reconhecê-lo dessa forma, porque,
então, caminharão na Luz que para eles começou a resplandecer na sua Pessoa, a
partir da luz que João irradiou como seu precursor.
Infelizmente o evangelista João teve
que constatar que os judeus da geração de Jesus voltaram a repetir a conduta
que levou o Deus de Israel a cegar-lhes os olhos e a endurecer-lhes o coração
(v. 40). Todos os sinais que ele realizou não foram suficientes para
determiná-los a reconhecê-lo como Messias, não obstante a convicção a que
chegaram de muitos chefes que creram nele, mas que não quiseram professar a sua
fé “para não serem expulsos da sinagoga” (v. 42).
Jesus é o enviado do Pai, a Luz do
mundo. A suas palavras são “mandamento de vida eterna” porque é tudo o que o
Pai lhe prescreveu dizer.
Perguntas para reflexão:
1ª)
O que nos ensina o gesto de Maria aos pés de Jesus?
2ª)
Qual Jesus devemos ver naquele que se proclama o Filho do Homem?
3ª)
Qual riqueza de Verdade perdem os que não reconhecem em Jesus o Cristo de Deus?
Evangelho de João (18)
Jo 13
13,1-3
A Páscoa do Senhor
A Hora da Morte foi para Jesus a
“hora de passar deste mundo para o Pai”, hora portanto da sua glorificação.
Foi, também, o momento da manifestação suprema do seu amor em favor dos seus.
Os fiéis que, a exemplo do seu Mestre e Senhor, após terem compreendido, praticarem
o que ele ensinará pelo gesto do Lava-pés, terão que se considerar
“bem-aventurados” (v.17) porque alcançarão a mesma glorificação.
A Fração do Pão que celebramos,
enquanto é Memorial da Ceia do Senhor, nos faz compreender sempre mais o seu
preceito: “não há maior amor do que dar a vida pelos amigos”, porque estaremos
em plena comunhão de vida com ele se “nos amarmos uns aos outros como ele nos
amou”. Nos faz compreender que Jesus recebeu todo o poder divino do Pai
exatamente por ter obedecido ao seu preceito de entregar a vida pelas suas
ovelhas (10,18). Por nossa vez, estaremos em plena comunhão com ele se
observarmos os seus mandamentos (15,10).
A Primeira Carta de São João nos
explica como a observância dos mandamentos de Cristo é, de fato, a forma pela
qual amamos, de verdade, o irmão. Se, portanto, em virtude disso, estamos em
Cristo, entendemos as grandes vantagens que ele acarreta: 1ª) vitória sobre o
mundo; 2ª) condição de produzirmos
frutos que permaneçam.
13,
4-20 Lava-pés
O gesto do lava-pés é uma alegoria
que quer explicar o sentido da Morte do Senhor. A lembrança da mesa liga a
Morte do Senhor à mesa da Eucaristia e àquilo que o Memorial sobre ela
celebrado significa. A divindade se despoja do seu Poder e Glória, cujo símbolo
é o manto. O homem Cristo Jesus, que se deu em resgate por todos (1Tm 2,5), se
cinge, para viver a sua imolação que propiciará a Água que purifica os que
querem ter parte com ele na herança do Reino. Pedro e os outros Apóstolos não entendem.
Deixam que o seu Senhor e Mestre lave os seus pés porque vivem a ilusão que o
reino seja aquele no qual esperam ser ministros. Não conseguem entender que
Jesus fala de um Reino que será conquistado pelo amor, mediante o serviço.
Somente de posse desses sentimentos e por eles vivendo, é que estarão à altura
da missão para a qual Jesus entende enviá-los: “Nisso reconhecerão todos que
sois meus discípulos se tiverdes amor uns pelos outros” (13,35).
Na morte dessa forma anunciada, os
Apóstolos terão que ver a manifestação da Glória do “Unigênito Deus” e
celebrá-la para sempre com o Nome do “Eu sou”.
13,
21-36
Após a saída do traidor, Jesus
sintetiza o ensinamento manifestado pelo lava-pés: 1º) A sua Morte é a sua
glorificação porque, quanto em favor da humanidade assumida pela encarnação,
ele chega a alcançar as condições de entrar em comunhão plena com a Vida
Trinitária. De alma vivente, se torna Espírito vivificante (1Cor 15,45; 2Cor
3,18): a sua humanidade assume, de forma gloriosa, as condições da sua Pessoa
divina. 2º) A sua imolação, enquanto aceita para a purificação do mundo
inteiro, glorificará a Deus, de forma única. 3º) Disso tudo resulta que aquele
que sendo de condição divina, aceitou, por causa da condição humana assumida,
ser um pouco inferior ao Pai, em virtude da glória que propiciou a Deus, chegou
a participar, de forma plena, da sua Glória. 4º) Os seus, que ainda nada tem
dos seus sentimentos, somente poderão segui-lo quando receberem o Espírito da
Verdade (1Jo 3,24). Então, estarão em condições de perseverar no seu seguimento
porque terão compreendido que o serviço é a condição da sua realização e
viverão o amor aos irmãos, pondo em prática os mandamentos do seu Senhor e
Mestre.
Perguntas para reflexão:
1ª)
Quais são as graças que devemos pedir quando celebramos a Eucaristia?
2ª)
Quando é que o discípulo segue o seu Mestre?
3ª)
Por que está em nós o amor de Deus somente quando vivemos os mandamentos de
Cristo?
Evangelho
de João (19) Jo 14(i)
Estamos
diante de um pronunciamento que Jesus faz na sua condição de Filho. Exorta os
seus a crer nele com a mesma fé segundo a qual crêem
em Deus. Ele é o “Eu sou”, a Revelação do Pai, enquanto, do Pai, realiza a
obra. Não devem, portanto, desanimar diante do anúncio da sua morte, causada
pela traição de Judas Iscariotes. O Maligno não tem poder sobre ele. Aliás,
será pela sua Morte que o mundo saberá que ele ama o Pai e que, por ele, se
realizou o seu desígnio. A sua Morte criará as condições para que tenham em si a vida divina, na condição de filhos
adotivos, destinados a estar com ele no lugar para onde vai com a sua
humanidade glorificada. Ele voltará para levá-los consigo.
Os
Apóstolos, contudo, devem entender que, para isso, devem observar os seus
mandamentos, condição para neles despontar a vida divina que, depois, o
Espírito Santo, a ser por ele enviado, renovará
com os seus dons. Dessa forma, os levará a toda verdade. Entenderão o sentido
da sua morte e viverão em segurança porque ele provará que venceu o mundo,
estando sempre com eles, juntamente com o Espírito.
É
sua vontade que realizando obras ainda maiores daquelas que ele realizou
enquanto estava no mundo, o Pai seja neles glorificado pelo Filho.
Nessa
primeira parte do discurso que se estenderá por mais três capítulos, vemos que
Jesus completa a descrição da sua condição divina, que vinha apresentando de
forma sempre mais clara nos capítulos anteriores do evangelho de João.
Apresenta-nos
também a vida que a Igreja apostólica deve
promover para estar à altura da sua vocação e assim viver a paz que Cristo lhe
mereceu.
O
Espírito Santo é descrito na sua função determinante em relação à santificação
da Igreja.
A
Morte de Cristo é anunciada em toda a sua grandeza e importância.
Os
Apóstolos constatarão a sua marcante transformação ao receber, do Senhor, o
Espírito Santo quando a eles se apresentará ressuscitado com suas chagas
gloriosas. João nos ditará, então, em sua primeira carta, as condições que o
próprio Deus prescreve para que tenhamos a vida eterna: crer que Jesus é o
Cristo o Filho de Deus, observar os mandamentos que nos deixou, para estarmos
em comunhão de vida com Deus; doutrina por nós conhecida “pelo Espírito que ele
nos deu”. (1Jo 3,23-24).
Constatamos,
pela grandiosidade da doutrina que Jesus dita em Jo 14, qual é a importância da
vida que Deus nos deu pelo Filho. Tornados filhos adotivos em virtude da redenção,
estamos sob a ação do Espírito que nos leva a toda Verdade, isto é nos permite
a comunhão de vida com a Vida Trinitária.
O
compromisso que assumimos, todavia, é sériio.
Estaremos com Cristo em Deus se perseverarmos na purificação dos pecados, na observância
dos mandamentos de Cristo para que desabroche em nós o perfeito amor que
afugenta todo temor. É somente nessas condições que, na nossa oração,
alcançaremos tudo o que pedirmos em vista da difusão do Reino de Cristo.
Jo
14, pela doutrina nele contida, é uma preciosa fonte de entendimento da Vida
Trinitária, da riqueza da Graça que nos é merecida pela imolação do Servo e da
condição gloriosa que Jesus alcança. Jesus quer que vejamos nele, sobretudo em
virtude da sua Morte que o “príncipe deste mundo” lhe inflige, a Glória de
Iahweh que se manifesta em todo o seu esplendor. Pela sua Morte que ele aceita
como vontade do Pai, Aquele que os judeus esperavam como Messias, se revela na
condição de Filho do Homem que todos verão vir “sobre as nuvens do céu, com
todo poder e glória”. Diante dele “todos se baterão no peito, até aqueles que o
transpassaram”. A Igreja pode se alegrar porque ele “sentou-se à direita da
majestade de Deus, nas alturas”. Pelas suas obras, chegamos a entender, através
do amor que ele manifesta, qual é o amor de Deus, e, assim, por ele, conhecer o
Pai.
Perguntas
para reflexão:
1ª) Com quais características Jesus
proclama a sua divindade?
2ª) Qual é a função do Espírito que
Cristo Jesus mereceu para a sua Igreja?
3ª) Quais são os compromissos exigidos
para que nos tornemos morada de Deus?
Evangelho de João (20) João
14 (ii)
Os temas desse capítulo são: 1º) A
condição divina de Jesus; 2º) A pessoa divina do Espírito Santo; 3º) A vocação
da Igreja; 4º) O caminho da santificação do fiel; 5º) O sentido da Morte de
Jesus.
A exposição dos temas, em si, é muito
sucinta. Há, portanto, adendos inseridos que a completam.
Divisão do capítulo. Notamos que há
uma introdução. Num contexto de palavras de conforto, Jesus anuncia a
finalidade da sua ida ao Pai: vai para que possamos nos tornar participantes da
vida divina (moradas do Pai com o Filho, no Espírito). A parte final quer nos
introduzir no tema seguinte: o “Caminho” (v.4), para nos tornarmos “morada”.
Jesus, ao declarar os Apóstolos
incapazes de compreender o que está acontecendo, se apresenta Caminho, na condição de Pessoa divina:
“Aquele que está no Pai e o Pai nele”, a Revelação do Pai. Um Caminho,
portanto, da máxima perfeição. Anuncia, também que, do Pai, enviará o Espírito
Santo, que será o Paráclito (o Defensor) que estará sempre com a sua Igreja, à
qual se unirá, após ter realizado a obra da redenção, para que os seus tenham
vida.
Os Apóstolos, porém, devem viver uma vida de
fé. Já deram os primeiros passos quando deram a sua adesão às suas palavras.
Terão que avançar nisso, abraçando a forma pela qual se realiza o plano de
Deus. O sinal do seu perfeito seguimento será a alegria de compreender e viver
a sua imolação, porque a sua Morte é um triunfo sobre o Maligno, libertando o
mundo da escravidão do pecado.
O Caminho ditado pelo próprio Jesus é aquele
que 1Jo relata: o da purificação, juntamente com o da observância dos
mandamentos, porque somos povo conquistado e marcado pelo selo do Espírito (Ef
1,13-14). Então desabrochará a caridade divina, cuja manifestação é o amor ao
próximo. Esse amor colocará os discípulos na condição de pedir o que quiserem,
porque tudo alcançarão uma vez que o Filho irá querer glorificar o Pai com
obras sempre maiores.
Esse tema tem uma versão em 1Jo
3,23-24, que o sintetiza e ao mesmo tempo o ilustra. Vida divina é dar nossa
adesão de fé, segundo a moção do Espírito, a Jesus Cristo, o Filho, promovendo
em nós a vida que o Espírito suscita com os seus dons, juntando à fé a virtude,
à virtude o autodomínio, a perseverança, a piedade, o amor fraterno, a caridade
(2Pd 1,5-10).
Por esta análise, podemos dizer que
estamos diante de uma primeira parte de uma aula catequética. Os seus pontos,
apresentados de forma sintética, devem ser desenvolvidos por meio de textos a
eles relacionados.
A condição divina abertamente
declarada por Jesus, quanto à sua Pessoa, está, necessariamente, relacionada a
Jo 10,30. O seu desdobramento é tudo aquilo que Jesus diz de si quando anuncia
a sua condição de “Eu sou” em Jo 8, 24.27.58. A explicitação de tudo o que se
refere à condição divina de Jesus, tem seu início em Jo 5, onde Jesus se
declara o Filho que faz somente o que vê o Pai fazer (Jo 5,19). As palavras de João Batista
já preparam a aberta declaração, por parte de Jesus, da sua divindade: “Ele é
aquele que vem depois de mim, mas que existia antes de mim” (Jo 1,30); “Ele vos
batizará nos Espírito Santo” (Jo 1, 33).
A condição divina de Jesus é
anunciada, embora implicitamente, também quando dele se fala mediante títulos
messiânicos. João Batista acrescenta à declaração da condição eterna e de
possuidor do Espírito sem medida, o título messiânico de “Filho de Deus”. É um
apropriado comentário ao título divino que encontramos em Jo 1,18: “O Unigênito
Deus se manifestou e do Pai, que ninguém nunca viu, nos deu a explicação”. Isto
significa que os títulos messiânicos nos ajudam a reconhecer a Pessoa divina
enquanto dela nos falam ilustrando a natureza humana que assumiu. Isso volta a
se repetir quando Jesus fala de si como Filho do Homem que deve ser elevado da
terra, porque, então, será reconhecido como o “Eu sou”. Jesus escolheu esse
título para qualificar a natureza da sua missão. Ele é o Filho que revela a sua
natureza divina todas as vezes que declara que veio por si mesmo: “Eu vim para
que tenham vida e a tenham em abundância”; “Por isso eu vim ao mundo para dar
testemunho da Verdade”. Quando porém fala de si na condição de Messias diz: “Aquele que o Pai consagrou e enviou ao
mundo”. Chegamos ao ponto de entender que é impossível falar de Cristo sem
reconhecer que ele é Deus, como é impossível falar do Filho sem pensar no homem
Cristo Jesus que se deu em resgate por todos. (2Tm 1,5).
Perguntas para reflexão:
1ª) Quais são os títulos divinos de
Jesus que até agora encontramos no
evangelho de João?
2ª) Por que os títulos messiânicos nos
ajudam a entender melhor os títulos divinos de Jesus?
3ª) Qual é o caminho que devemos
trilhar para seguir a Jesus?
Evangelho de João (21) Jo 14 (iii) “Crede em mim”
Jesus, a partir de 14,1, assume, de
maneira acentuada, o tom de quem possui autoridade divina. Proclama abertamente
que é “Um com o Pai” e nos convida a crer nele pelas obras que ele cumpre. Na
sua autoridade divina, enviará o Espírito do Verdadeiro que estabelecerá uma
relação inquebrantável entre os seus e o Deus Trinitário. Sua condição será a
observância dos seus mandamentos, porque, então, Jesus se manifestará a quem os
observa: o fiel viverá nele que, vivo, pelo Espírito, o porá em comunhão plena
de vida com ele e o Pai. O Espírito o conduzirá a toda verdade.
Os discípulos devem chegar a
entender o sentido pleno da sua Páscoa, passagem deste mundo ao Pai, e se alegrar
no Espírito. Pela sua imolação que expiará as culpas do mundo inteiro,
libertará definitivamente os homens da escravidão em que estão, oprimidos pelo
mal que os acorrenta. Na liberdade de filhos de Deus, produzirão muitos frutos
como ramos de uma videira. Então, o Pai será, neles, glorificado pelo Filho.
Pela observância dos seus mandamentos, terão em si a vida divina, porque, pela
sua prática, viverão o amor aos irmãos. Estarão em Deus da mesma forma que ele
está no Pai, porque guardou os seus mandamentos.
O Apóstolos que fizeram a
experiência da sua transformação, nos testemunham, pelo Espírito que receberam,
quem é Jesus que seguiram desde o princípio. Foi o Messias que João Batista
apontou como o Cordeiro que tira o pecado do mundo, a quem deram a sua adesão
de fé, convidados a interpretá-lo à luz da figura messânico-divina do Filho do
Homem, a Glória de Iahweh que veio para julgar a cidade pecadora. Creram nele,
induzidos pelos sinais que realizava. Acataram a sua condição de Esposo, de
Templo do qual jorra a Água da Vida, de Salvador do mundo, pela sua imolação que
desejava que se cumprisse quanto antes, de Senhor do sábado, o Filho que sempre
trabalha com o Pai, que tem o poder de ressuscitar e julgar. Perseveraram na
sua fé até diante da desistência de muitos, viram nele o Mestre que interpreta
as Escrituras e o reconheceram como a Luz do mundo, o Bom Pastor que dá a vida
pelas ovelhas, a Ressurreição e a Vida, o Filho que anseia pela sua
glorificação depois de ter percorrido fielmente o caminho da sua realização, o
Senhor e Mestre que lavou seus pés e que proclamou sua iminente morte como
definitiva glorificação do Filho do Homem.
Conforme o próprio Jesus declarou,
essa fé os purificou, os manteve em comunhão de vida com ele. Não foi todavia
suficiente para superar a provação que adveio com a Paixão. Da forma que Jesus
predissera, fugiram. Não conseguiram crer nele nem sequer diante da prova da sua
divindade quando os adversários caíram por terra diante da proclamação de Jesus
de ser o “Eu sou”.
Tornava-se necessária a ação do
Espírito Santo. Por ela, chegaram a ter em si o testemunho do Espírito, por
quem viram claramente que Jesus é o “Cristo, o Filho de Deus”. 1Jo 1,1-3
descreve essa radical transformação e nos explica o sentido que, para os Apóstolos,
começaram a ter os gestos do Senhor, ao serem lembrados. Pelo Espírito que
Jesus lhes comunicou (3,26), os interpretaram como manifestações da Palavra da
Vida, a Vida, Vida eterna. Entenderam tudo da Palavra da Vida: o que ela é na
sua condição divina, Palavra criadora, Vida que, ao se manifestar se revelou
Luz para os homens, por tudo que falou e
realizou. A graça nos inundou. A Vida do Verdadeiro nos foi participada pela
sua encarnação. Comunicamos em tudo com o Pai pelo “Unigênito Deus” que nos deu
a explicação do Desígnio. Pelo espírito de entendimento e de sabedoria,
reconhecemos o poder com que Deus constituiu Cabeça da Igreja o seu Cristo. No
seu Espírito vivemos a purificação dos pecados em vista da conquista da herança,
da qual fomos chamados a participar. Devemos, contudo, nos abrir à esperança
pela perseverança que coroará a nossa perfeita caridade (Rm 5,3-5).
Perguntas para reflexão:
1ª)
Quais são as características da vida plena alcançada pela observância dos
mandamentos de Cristo?
2ª)
Quais são as etapas que promoveram a fé dos Apóstolos?
3ª)
O que faltava aos Apóstolos para poder seguir a Jesus na sua Paixão?
Evangelho de João (22) Jo 15, 1-17 (i) O compromisso dos
discípulos
Os
discípulos, como ramos de uma videira, devem produzir frutos. Cristo Jesus os
chamou para serem os que darão continuidade, no tempo e no espaço, à sua obra. Em
primeiro lugar, nunca poderão esquecer que a eficácia da sua ação dependerá do
fato de “permanecer” em plena comunhão de vida com o seu Senhor e Mestre. A
eficácia da ação depende dele, a “Verdadeira videira” da qual o Pai é o
agricultor e o Espírito é a sua linfa vital. O termo “permanecer” é repetido
oito vezes em Jo 15,4-7, para indicar que os ramos dependem, em tudo, da ação
da Vida Trinitária. Em segundo lugar, Cristo explica que permanece nele aquele
que observa os seus mandamentos. Disso ele é o modelo, porque ele permanece no
Pai exatamente porque observou os seus mandamentos (v.10). Jesus lembrou essa
condição em Jo 14,21. Por ela, os discípulos lhe dão condição de, Vivo,
ressuscitado dos mortos, ir e a eles se manifestar. Por ela, criam, também, a
condição do Filho e do Pai ir até eles e “fazer sua morada neles”, pelo
Espírito que os conduzirá a toda Verdade. A observância dos mandamentos é a
condição para termos em nós a vida divina, porque é a condição de amarmos os
irmãos, ser ter mais em nós motivo algum de tropeço (1Jo 2,10). A observância
dos mandamentos é, portanto, a condição necessária para que a Vida trinitária
esteja no discípulo. A plena comunhão do discípulo cria as condições para ele
viver, na sua plenitude, a vida de imolação que Cristo viveu e pela qual
experimentou a alegria própria daquele que a ele se associa na Paixão.
Ela
é vida perfeita porque é vida de perfeita caridade com os irmãos. Enquanto o
discípulo, à semelhança de Jesus, observa os mandamentos do Pai, vive o
perfeito amor aos irmãos. Jesus realizou esse perfeito amor dando a vida por
aqueles que o acolheram na fé. Os seus discípulos realizarão em si a mesma
coisa, se observarem os seus mandamentos.
Jesus
conclui a sua exortação lembrando as etapas da sua missão. Na condição de
Unigênito Deus, que vive voltado para o Pai e conhece o Pai, ao assumir a
condição de filho de homem, dele nos deu a conhecer “o amor e a verdade”. Na condição de Filho a
quem o Pai entregou todo poder, enviou os seus discípulos para “ir e produzir
fruto” e para serem mediadores de tudo o que o Reino necessita. Por isso devem se
amar uns aos outros, preceito que resume as obrigações que Jesus explicou, para
que o Pai seja glorificado pelo Filho, pelas obras que realizarem.
A
vocação do discípulo transforma a vida do cristão. Dá um sentido escatológico à
sua existência sujeita à vaidade das leis da criação. As gerações cristãs
passarão, mas a sua atividade terá transformado a sua existência num valor que
transcende a caducidade da existência humana sobre a terra. O seu amor aos
irmãos lhe propiciará a glorificação que Cristo Jesus experimentou ao viver o
amor aos irmãos pela doação da sua vida. Aliás, essa condição definitiva já é
antecipada, na fé, quando o fiel se torna morada do Filho e do Pai em virtude
da santificação que nele opera o Espírito da Verdade que “permanece” naquele
que vive os mandamentos de Cristo. Nessa missão, a Igreja tem a condição da sua
glorificação, ela que é chamada a dar continuidade à Vida Trinitária naqueles
que a acolhem como anunciadora do Filho e do Pai.
Perguntas
para reflexão:
1ª) De que forma o fiel se torna
instrumento da ação salvadora de Cristo Jesus?
2ª) De que forma os mandamentos de
Cristo realizam em nós a vida divina na sua plenitude?
3ª) De que forma a vida eterna já está
no discípulo quando promove o Reino?
Evangelho de João (23)
João 15,1-17 (ii) “Eu sou a videira, vós os ramos”
A Liturgia do Tempo Pascal visa nos
levar a compreensão do Senhor ressuscitado, o “Mistério de Deus”. Abre-se com a Vigília pascal que começa a nos
falar do Senhor da Igreja a partir do sinal do túmulo vazio. Ao longo da oitava da Páscoa, nos ilustra o
acontecimento inesperado com os quadros da aparição de Jesus a Maria Madalena,
aos discípulos de Emaús e com as outras narrativas dos evangelistas sobre as
aparições de Jesus aos apóstolos. O 2º Domingo da Páscoa narra a aparição de
Jesus aos Apóstolos, no Cenáculo. O Senhor se apresenta com as suas chagas
gloriosas, comunica o seu Espírito aos que serão enviados na condição dos que
darão continuidade à sua obra. Dos Apóstolos, pela boca de Tomé, o Ressuscitado
recebe a adoração na condição de “Senhor e Deus”. Ao longo da semana, lemos o diálogo de Jesus
com Nicodemos, em que Jesus nos fala da sua ação criadora por meio do Espírito
que, na criação, já agiu pairando sobre as águas para gerar a vida. Elevado da
terra, ele efundirá esse Espírito para que os homens nasçam para a condição de
filhos de Deus. No 3º Domingo lemos a narrativa da aparição de Jesus aos
Apóstolos que ressalta a função do Espírito em relação aos Apóstolos. Ele os
levará à compreensão da Pessoa do Senhor através da compreensão daquilo que as
Escrituras falaram do Messias (Anos A e B). Ao longo da semana que se segue
meditamos, então Jo 6, a grande catequese sobre a Eucaristia, que se abre com a
exortação de Jesus para que trabalhemos pelo alimento que ele nos dá com a sua
imolação de Cruz. A Eucaristia não se limita à celebração do memorial da Morte
do Senhor, ela implica o seguimento de Cristo. Por ela, nos dessedentamos com
as suas palavras que têm o Espírito sem medida, da forma segundo a qual o
reconhece Pedro quando exclama: “Só tu tens palavras de vida eterna!” (Jo 6,68).
No 4º Domingo, Jesus se apresenta como o Bom Pastor que dá a vida pelas suas
ovelhas. As leituras da semana nos ilustram as suas prerrogativas. Ele é o
Filho que o Pai ama porque dá a vida pelos seus. Mas Jesus especifica que ele
tem o poder de dar a vida e de retomá-la, condição divina ilustrada pela
afirmação que imediatamente se segue: “Eu e o Pai somos um” (Jo 10,30). Quando
chegamos ao 5º Domingo, Jesus nos
responsabiliza em ganhar a vida eterna produzindo frutos como ramos de uma
videira. Isto é possível se observamos os seus mandamentos, condição para
promovermos a vida divina em nós. Preparados por tudo aquilo que refletimos
sobre a sua pessoa divina e a obra que nos tornou filhos de Deus, pela ação do
seu Espírito, reconhecemos que os seus mandamentos não são pesados porque é
pela sua observância que vencemos o mundo, isto é, nos desvencilhamos do poder
do Maligno. Segundo aquilo que os Apóstolos nos transmitem como mensagem de
Jesus, reconhecemos que começamos a
nos purificar a partir do momento em que, movidos pelo Espírito, damos a nossa
adesão de fé à Pessoa do Senhor e continuamos a nossa purificação vivendo o mandamento
novo que Jesus nos deixou. A 1Jo especifica que isso ocorre quando observamos
os mandamentos de Jesus, palavra do Pai, preceito de vida eterna (Jo 12,50).
Devemos chegar a não sentir mais em nós o temor, porque, então estará em nós a
caridade divina em toda a sua perfeição que nos permitirá agir em plenitude.
Teremos certeza que “tudo o que pedirmos nos será dado”, porque agimos
exclusivamente em vista da construção do Reino. Essa é a condição à qual Jesus
quer que cheguemos, porque, então, seremos os ramos que produzem muitos frutos,
os verdadeiros discípulos do Filho do Homem (Jo 8,31).
Perguntas para reflexão:
1ª)
Qual é a doutrina que nos motiva a sermos ramos que produzem muitos frutos?
2ª)
Quais são os compromissos que devemos assumir?
3ª)
Quando se realiza em nós a condição perfeita para produzirmos os devidos
frutos?
Evangelho de João (24) João
15,1-17 (iii) A nossa missão
Bem no meio de João 15, 1-17, temos
um ensinamento de Cristo que define a nossa missão como Igreja: “Meu Pai é
glorificado quando produzis muito fruto e vos tornais meus discípulos” (v.8).
“Produzir muito fruto” significa dar testemunho da Verdade, à semelhança de
Jesus, a Testemunha fiel, que chega a dar a vida para que o mundo reconheça que
ama o Pai, sempre fazendo a sua vontade (14,31). Quando o fiel observa os
mandamentos de Cristo, e, com isso, permanece no seu amor, é-lhe dado de pedir
qualquer coisa ao Pai, no Nome de Jesus, e de alcançá-la. Pelo seu amor
alcançará a salvação dos irmãos, porque o mundo o reconhecerá como verdadeiro
discípulo de Cristo Senhor.
Jesus, Aquele que o Pai consagrou e
enviou ao mundo, desde o início da sua ação messiânica, chama irmãos para dar
continuidade à sua obra. Os discípulos recebem uma purificação inicial pelas
suas palavras, que têm o Espírito sem medida, porque ele á Aquele que vem do alto
e que subirá ao céu porque desceu do céu. Devem, contudo, avançar na sua
justificação porque a sua fé tem que se desvencilhar da uma visão carnal que,
como um diafragma, impede a visão de Deus. De fato, os judeus esperavam um
Reino pelo triunfo do seu Messias, d´Aquele de quem falavam Moisés e os
Profetas. Julgavam com critérios humanos os sinais que Jesus realizava. Por
isso, nada esperavam de um Galileu (Jo 7,52). Muitos discípulos chegaram até a
abandonar Jesus diante do discurso sobre “o alimento que permanece para a vida
eterna” (6,27). Jesus falava segundo o Espírito que João Batista reconheceu ter
descido para permanecer sobre ele; um Espírito que ainda não tinha sido dado aos
homens porque Jesus ainda não tinha ressuscitado. Pedro, todavia, tinha recebido
a revelação do Pai do céu e professara: “A quem iremos nós, só tu tens palavras
de vida eterna e nós cremos que és o Santo de Deus” (Jo 6,69). Tratava-se de
uma fé fruto do ensinamento profético de
Jesus, que recordava, ao mesmo tempo, a
necessidade de perseverar nele (Jo 8,31), para chegar à liberdade dos filhos de
Deus. Isto nos faz compreender que liberdade significa, também, posse da
Verdade. O moralismo obscurantista é fruto de falta de compreensão do
Verdadeiro, por não termos chegado a conhecê-lo por não estarmos seguindo a
Jesus na sua imolação. Jesus dá testemunho da Verdade diante de Pilatos e até está
em condições de julgá-lo porque, como Filho do Homem, além de possuir o
Espírito profético, vive a mais perfeita santidade, em virtude da sua imolação.
Vemos quanto os Apóstolos ficam
desconcertados diante do Lava-pés, sinal que os chamava à missão à qual o seu
Senhor e Mestre os destinava ( Jo 13). Vemos como o desânimo tomou conta deles
quando Jesus anunciava um traidor no meio deles, declarava que não podiam
segui-lo e que Pedro o renegaria. Havia um abismo entre os discípulos e o
Mestre que estava para glorificar o Pai com a obra que levaria o mundo a
reconhecer que ele amava o Pai. Ele, o Adão verdadeiro, sempre soube conduzir a
humanidade assumida pela encarnação para que chegasse, pelo amor aos seus até o
fim, a manifestar em si a Gloria da Vida Trinitária. Com a Morte que o mundo
lhe infligia, chegaria a hora do seu Batismo, que sempre desejou que se
cumprisse para ressurgir na Glória. Para ele tinha-se preparado, sempre
cumprindo os mandamentos do seu Pai.
Os Apóstolos serão capazes da mesma
imolação se observarem os seus mandamentos. Neles viverá a vida divina, porque
pela sua prática, estarão amando os irmãos como ele os amou, até estar prontos
a dar a vida por eles. Os Apóstolos terão em si a vida de Jesus se cumprirem
aquilo que está mandando. Serão, então, capazes de produzir muitos frutos.
Tendo em si a perfeita caridade, alcançarão tudo o que pedirem e o Pai será
glorificado neles pelo Filho, a Vide Verdadeira (15,1).
O Princípio eficaz será sempre o
Filho, na condição de Cabeça da Igreja. Com ele e por ele, contudo, sempre agem
o Pai e o Espírito. Devemos sempre ver em Jesus a sua condição de Mediador,
porque nela foi constituído ao se tornar um de nós. Somente nesse sentido o Pai
é maior do que ele. De fato, a obra redentora é obra da Vida Trinitária. Ela se
manifesta pelo Filho que se imola, que media o Espírito da Verdade e que,
ressuscitado, volta aos seus. Quando manifesta o seu amor para quem vive os
seus mandamentos, ele faz dele a sua morada com o Pai, pelo Espírito que ele
mediou (Jo 14,23).
Os discípulos, portanto, estão à
altura da sua missão quando neles está a plenitude da vida divina que despontou
pelas palavras do Filho, que tem o Espírito sem medida. Contudo, ela deve
crescer pelo Evangelho (Cl 1,5-6 ; 3,16), para que o Espírito, com os seus dons,
produza seus frutos (Jo 20,30s). Deve crescer pela observância dos mandamentos
de Cristo. Os discípulos estarão, então, amando os seus irmãos como Cristo os
amou, prontos a dar a vida por eles.
Perguntas para reflexão:
1ª)
Como poderíamos definir a nossa missão?
2ª)
O que impedia aos Apóstolos de serem verdadeiros discípulos?
3ª)
Por que a observância dos mandamentos de Jesus é condição de vida divina em
nós?
Evangelho de João (25)
Jo 15,18-16,33 (i)
Depois de ter definido a sua missão
(Jo 14) e de ter lembrado aos Apóstolos a deles (15,1-17), Jesus descreve o
contexto em que eles serão chamados a atuar. Serão tratados pelas autoridades
religiosas judaicas da mesma forma com a qual o trataram. Elas são uma raça
perversa que, porprincípio, renega a verdade. Nelas não está o amor de Deus,
procuram sua própria glória. Por isso odeiam a ele e ao Pai (15,18-25).
Os Apóstolos, contudo, prevalecerão, porque o mesmo Espírito que a eles virá
para conduzi-los a toda Verdade os tornará capazes de dar testemunho (v.26s). E
eles não esmorecerão nem quando os expulsarem da sinagoga e nem quando os
levarem à morte (16,1-4).
Se, agora, a tristeza toma conta
deles diante do anúncio da sua morte e das perseguições que terão que sofrer
por causa dele, quando o Defensor vier a eles, os tornará capazes de
compreender quanto os judeus são culpados por não terem acreditado nele.
Também, saberão ver quanto Deus fez justiça ao glorificá-lo, chamando-o a si.
Verão, enfim, que, pela sua morte, o Príncipe deste mundo foi julgado
(vv.5-11).
O Espírito Santo, além de torná-los
capazes do testemunho, porquepromoverá neles a compreensão da Verdade, lhes
revelará as coisas futuras e qual será o destino final do mundo e dos mártires.
Em todo esse processo, o Espírito
glorificará o próprio Jesus porque pelos seus que chegarão a realizar obras
sempre maiores, o Pai será glorificado (vv.12-15).
Tudo isso acontecerá num breve
espaço de tempo. Será como quando uma mulher dá à luz. A tristeza da provação
logo passará porque voltarão a vê-lo. Então, tudo compreenderão e tudo
alcançarão do Pai e a sua alegria será completa. Nem precisará que peçam em seu
Nome porque serão amados por ele, por ter levado à plena caridade a fé que
depositaram nele, o Filho que saiu do Pai e veio ao mundo e que, tendo chegado
a hora de voltar para o Pai, o glorificará, vencendo o mundo. Chamados a viver
a sua hora, também eles o vencerão pela confiança que têm nele.
A síntese da nossa perícope
apresenta dois temas, fundamentais para entender o contexto e o princípio de
força que torna a Igreja capaz de levar a termo a missão que Jesus lhe confiou.
Os Apóstolos são chamados a viver um embate com o mundo que, a princípio,
estarão em condição de vencer, em virtude da sua fé em Jesus, levada à perfeita
caridade. O princípio de força é o Espírito Santo que Jesus, na condição de
Senhor da Igreja enviará do Pai. Ele é capaz de levar a toda verdade e de
infundir nos espíritos o testemunho inquebrantável, porque que os convencerá acerca do pecado do
mundo, da injustiça que perpetrou e quanto à condenação que mereceu. Tudo se
realizará num tempo breve. Será como o tempo de um parto. Após breve sofrimento,haverá alegria.
Mundo e Espírito são os temas que
desenvolvidos nos próximos artigos nos levarão à compreensão da doutrina que
João está expondo.
Perguntas para reflexão:
1ª)
Qual é o modelo que Jesus utiliza para descrever o mundo?
2ª)
Qual é a ação determinante que o Espírito realiza na Igreja?
3ª)
Por que o cristão não deve desanimar diante da provação?
Evangelho de João (26)
Jo 15,18-16,33 (ii). O mundo (15,18-25)
O mundo é o homem que, em lugar de
se revestir da glória de Deus, guardando a paz com o seu criador e a criação,
se contamina com toda sorte de perversão ao rebelar-se contra o seu Criador.
Este, pela obediência, o conduziria à perfeição, tornando-o sempre mais capaz
de se realizar, até conseguir a imortalidade. Infelizmente, o homem, levado
pela insensatez, opta ditar para si o caminho da sua realização. Enquanto se
afasta de Deus, as concupiscências da carne, a idolatria do ouro e a ambição
desmedida o escravizam. Ele acha que reina, de fato, ele se torna escravo do
Mal que o acaba dominando.
Deus, na sua misericórdia, fiel a si
mesmo, não deixa de querer o bem do homem. Leva até as últimas consequências o
seu amor e se determina em salvá-lo pelo Filho, isto é, suscitando de mulher um
irmão capaz de neutralizar a condição de escravidão em que ele acabou reduzido.
É evidente que contra a Palavra da
Vida que se faz carne e que quer ser Luz para os que jazem nas trevas, os que
são do mundo, isto é os que resistem à ação misericordiosa de Deus e não se
deixam por ele atrair para que, dando a sua adesão de fé ao filho de homem que ele “consagrou e
enviou ao mundo”, os salve e os glorifique, insurgem-se e querem a sua morte.
Eles chegam até a odiá-lo. As autoridades religiosas se tornam a mais perversa
categoria dos homens porque chegam a odiar Jesus sem motivo, recusando
a evidência da verdade. Negam-se a um diálogo que os salvaria, alcançando a
salvação da forma mais glorificadora, uma vez que Jesus aceita discuti-la na
base da sua familiaridade com as Escrituras. A sua salvação dos escribas e
sacerdote acontecerá com a pregação de Pedro (cf. Atos 2, 15s). A infinita
misericórdia de Deus alcançará, num só dia, a conversão de três mil judeus, que
se tornarão cinco mil, no dia da segunda pregação após Pentecostes, segundo a
profecia de Jesus à sua geração “má e perversa”. Serão o fruto do seu último
sinal.
Ao longo da história da Igreja, o
mundo inicialmente representado pelos Sumos Sacerdotes e Anciãos do templo, se
manifestará nos anticristos, lembrados pela Primeira Carta de São João. Neles
se refletirá a mentalidade obtusa de todos aqueles que acham que podem
interpretar a Pessoa e a missão de Jesus com critérios humanos, quando deveriam
abraçar a fé, fundamentados no testemunho daqueles que Jesus constituiu arautos
da sua mensagem (1Jo).
O mundo é constituído, também, por
todos aqueles que se deixam levar pela cobiça e por causa disso, matam; pela concupiscência e por isso se
tornam adúlteros; pela ambição
desmedida que torna as pessoas despóticas. O mundo é também constituído pelos
que se deixam governar pela “maldade, malícia, devassidão, inveja, difamação,
arrogância, insensatez” (Mc 7,22).
Jesus veio para resgatar o homem
dessa condição de pecado. E o fez na condição de Cordeiro levado ao matadouro,
o Servo de Iahweh que “achávamos amaldiçoado por Deus, mas que, de fato,
carregava sobre si as nossas culpas” (Is 53).
Perguntas para reflexão:
1ª)
De qual Maligno Jesus nos liberta?
2ª)
Por que as autoridades religiosas foram as que mais hostilizaram a ação
salvadora de Jesus?
3ª)
Quais são os pecados que podem neutralizar
a ação salvadora do “Filho que o Pai consagrou e enviou ao mundo”?
Evangelho de João (27) Jo 15,18-16,33 (iii) O Espírito (15,26-16,15)
O
Espírito é, para a Igreja, o Defensor. Assistidos pelo Espírito Santo, e em
virtude de seus dos de sabedoria, entendimento, conselho, fortaleza, ciência,
piedade e temor de Deus, os fiéis chegam a toda verdade. A sabedoria, enquanto encabeça
a lista, resume em si todos os outros dons e constitui-se em vida divina em
nós, à semelhança de Jesus.
Os dons do Espírito acompanham a
humanidade de Jesus desde a sua concepção, promovidos pelo mesmo Espírito que está
sempre com ele. Nós os recebemos participados, por ter Jesus possibilitadoa
ação do Espírito em nós em virtude da purificação dos pecados obtida com a sua
Morte. Configurados a Cristo Jesus, sacerdote, profeta e rei pelos dons da fé,
da caridade e da esperança, somos chamados a desenvolver a vidadivina firmando-nos
sempre mais na vitória sobre o mundo, juntando à fé a virtude, o autodomínio, a
perseverança, a piedade, o amor fraterno (2P 1,5s). Esse processo ascético nos
permite andar como Jesus andou porque nos ajuda na observância dos mandamentos
de Jesus. A respeito disso, São Paulo é explícito quando nos exorta a
promovermos a fé porque é por ela que se revela a justiça (Rm 1,17). A
compreensão das verdades divinas promove o dom do conselho que, com o dom da fé
promove em nós a fortaleza e a ciência. A piedade terá então as condições de
nos relacionar mais profundamente com Deus, nos tornando homens cheios de temor
diante dele, sábios, portanto.
O
Espírito é o precioso dom que desce sobre nós do Pai das luzes e que nos conduz
à posse do Verdadeiro enquanto repete em nós o processo que realizou na
humanidade de Jesus até torná-la capaz, levada à perfeição, de participar da
Glória da Vida Trinitária. Esse processo se realizou nos Apóstolos de forma
carismática, devido à sua vocação para serem testemunhas de Cristo e arautos da
sua mensagem. Logo compreenderam a condição de Jesus como Cristo de Deus e,
consequentemente o sentido da sua Morte. De imediato, e o vemos particularmente
em Pedro, se tornaram capazes de dar testemunho do seu Mestre. Realizava-se
neles a profecia de Jesus que anunciava que somente mais tarde estariam em
condição de segui-lo. Vemos, então, que, quanto à doutrina, eles entendem o
pecado cometido pelos adversários de Jesus e que Deus o glorificou. Entendem,
em terceiro lugar, qual é o verdadeiro Reino que ele estabeleceu. Trata-se do
Reino do Filho no qual o Pai nos transportou, arrancando-nos do poder das
trevas (Cl 1,13). Entendem, enfim, “qual é a riqueza da herança destinada aos
santos” (Ef 1,18) que Cristo Jesus dará quando vier pela segunda vez.
Perguntas para reflexão:
1ª)De que forma os dons do
Espírito se relacionam às virtudes lembradas por 2Pd 1,5s?
2ª)Por que o cultivo da fé tem
que ser o primeiro dos nossos compromissos cristãos?
3ª) De que forma o Espírito
tornou os Apóstolos aptos para a sua missão?
Evangelho de João (28) Jo 15,18-16,33 (IV). Provação (16,16-27)
A
Igreja, chamada por Jesus a viver a sua hora, recebe, nesse momento, o seu
conforto. No Apocalipse, voltamos a ouvi-lo quando o Senhor da Igreja, que já
exortara a igreja de Esmirne a perseverar para não perder a sua coroa, exorta a
igreja de Filadelfia. Porque sabe que ela tem pouca força, ele garante que a
tribulação que terá que sofrer por causa das perseguições do mundo será de
breve duração. Será como num parto, animada pela perspectiva de uma nova vida.
Aquele
que persevera na tribulação chega a entender que, por ela, alcançou a condição
de experimentar a vida que Jesus viu sempre mais desabrochar na sua Paixão,
enquanto se aproximava a consumação da sua imolação. Na perfeição da sua
caridade, Jesus vivia a alegria do Espírito Santo que se tornava sempre mais
intensa, na medida em que se aproximava a sua glorificação. Podemos dela ter
uma ideia quando Jesus mostra ser capaz de rezar pelos seus inimigos. Naquele
momento, o seu amor aos irmãos é tão puro que torna possível nele a mais plena
vida divina, a ponto de poder estar no Pai, também, segundo a sua condição de
homem.
Essa
condição de perfeição de vida divina se reproduz em cada discípulo de Jesus
quando, como nos ensina João na sua Primeira Carta, nele, o amor aos irmãos é
tão perfeito que expele o temor. A condição de poder pedir a Deus o que
quisermos, porque, certamente ele no-lo concederá é o sinal dessa perfeita
caridade.
No
momento em que Jesus anuncia essas condições, os Apóstolos estão longe de
compreendê-las. De fato, João as lembra em virtude do Espírito que recebeu mais
tarde. Era ilusão aquela de ter compreendido os ensinamentos de Jesus, tanto é
verdade que, como lembrou naquele momento o seu Mestre, eles se dispersaram
quando chegou para elesa provação.
Para vencer o mundo não basta ter
alcançado o amor do Pai pela fé no Filho que enviou. Torna-se necessário
perseverar na tribulação. Disso porém é capaz somente aquele que, tendo
recebido do Senhor o fruto da Paz, na força do Espírito que ele mereceu, dá
testemunho na perseverança.
Evangelho
de João (29) Jo 15,18-16,33 (V). “Eu venci o mundo” (16,33)
Foi vencedor do mundo o
“Unigênito Deus” (Jo 1,18) que, na condição de enviado do Pai, tendo assumido a
natureza humana, realizou a purificação dos pecados.
Os
Apóstolos alcançaram a condição de segui-lo somente após o envio do Espírito
Santo, que Jesus mereceu com a sua Morte de Cruz. Ao entrar no céu com o seu
sangue o compartilha com aqueles que ama e que começam a se purificar escutando
as suas palavras. O Espírito se uniu a ele, que voltou vivo para estar para
sempre com os seus, para que vivam, no amor, pela prática dos mandamentos.
Conduzidos, então, a toda Verdade, se tornarão morada do Pai e do Filho, porque
Jesus se manifestará a eles. Unidos a ele, estarão em comunhão com o Pai. O
Espírito que Jesus compartilha dará testemunho neles. Realizar-se-á neles a
plena condição de vida eterna porque estarão se amando uns aos outros como ele
os amou. Foi dessa forma que o Filho proporcionou a plena comunicação de vida divina
à sua humanidade. Guardando os preceitos do Pai, permaneceu nele, fazendo sua
vontade até doar a vida pelos seus, numa manifestação suprema de amor. Quem
permanece nele pela observância dos mandamentos alcança a mesma condição de
vida, como “filho adotivo em Jesus Cristo” (Ef 1,6). Esses são preceitos de
vida eterna porque são palavras que o Pai ordenou que o Filho no-las
transmitisse. É nessa condição que os Apóstolos honrarão o Pai, produzindo
muitos frutos, porque terão chegado a ser verdadeiros discípulos de Jesus.
No
seu discurso ao longo da Última Ceia, Jesus, nos revela que age de forma
irresistível. A maldade humana não poderá detê-lo. Pelo contrário, o mundo será
instrumento da sua glorificação e da glorificação do Pai, pela obra que ele
realizará e da qual dará continuidade pela sua Igreja que, por sua vez, se
tornará irresistível, porque a ela Jesus enviará o Paráclito (o Defensor), que
confundirá o mundo quanto ao pecado, à justiça e ao julgamento, com ela
permanecendo para sempre. Os Apóstolos até se alegrarão ao compreender toda a
grandeza da sua Morte. Quando João escreve o seu Evangelho, a Igreja, há vários
decênios, celebra o memorial da Morte de Cristo no dia do Senhor (Ap 1,9), o
dia em que ficaram contentes ao vê-lo, em que os discípulos de Emaús sentiram
seu coração arder quando Jesus lhes explicava as Escrituras, o dia em que
receberam o Espírito Santo para o testemunho.
O
ânimo destemido dos Apóstolos nos explica as suas afirmações: “Nós somos de
Deus”, “Quem nos escuta é da verdade”, “Sabemos que amamos a Deus quando amamos
os irmãos pela observância dos mandamentos, pelo Espírito que nos deu”. A
transformação foi radical. De uma ambição de poder, passaram a amar o serviço,
lembrados de Cristo Jesus que ensinara: “O Filho do Homem não veio...”.
Dispuseram-se a dar a vida pelos irmãos porque viram, no amor, desabrochar uma
esperança que não permitia que mais pudessem ser separados de Cristo.
Nisto constataram uma efusão do Espírito Santo neles, que os levou pelo entendimento, conselho,
fortaleza, ciência e piedade, a toda sabedoria. De uma compreensão inicial da
messianidade de Jesus, chegaram ao conhecimento da sua divindade, recordando,
pela ação do Espírito, “tudo o que Jesus lhes tinha dito”. E puderam
testemunhá-lo e anunciá-lo. Desapareceu neles o pavor diante do mundo pérfido e
violento. Enfrentaram-no, inspirando o Espírito o
que deviam dizer e até alegrando-se por terem sido achados dignos de sofrer
pelo Nome do Senhor.
O
mundo é exatamente a realidade que o “Unigênito Deus” veio vencer: uma
humanidade dominada por um sistema perverso, montado pelo homem que, na sua
rebeldia se afastou do Criador, para enveredar o seu caminho de realização.
Longe de Deus, pensando ser sábio, entregou-se a toda obra de injustiça. Os
vãos arrazoados da sua mente o levaram a prestar culto divino a aves e répteis,
quadrúpedes e homens. Por causa disso, nele se apresentou a concupiscência da
carne. É a realidade que não crê no Filho que o Pai enviou no seu amor, não
obstante todas as provas de ele ser de Deus. Isto porque suas obras são más e
prefere as trevas à luz. Na sua perversão, chega até a odiar. Até a justiça
humana não encontra motivo algum. De fato, o motivo aduzido pelos escribas é a
verdade que só não aceitam porque procuram a sua glória (Jo 6, 42.44).
Os
Apóstolos estiveram em condição de enfrentar o mundo porque o Espírito enviado
por Jesus os assistiu. Com isso, além da ciência, além da compreensão dos
mandamentos de Jesus, os Apóstolos têm uma terceira prova da presença do
Espírito neles, a da compreensão da doutrina acerca da Pessoa de Jesus.
Entendem qual é o pecado do mundo, a justiça que Deus fez glorificando o Filho
injustiçado, a vitória da Cruz.
Pelo
discurso de Jesus, vemos como ele tem a perfeita noção do sentido da sua Morte,
da missão dos Apóstolos e do mundo no qual terão que vivê-la.
Perguntas
para reflexão:
1ª) De que forma a vitória de Cristo
se torna a nossa vitória?
2ª) De que forma a vitória de Cristo
se manifesta na vida da Igreja?
3ª) Qual é a realidade perversa do mundo?
Jo 17
A oração que Jesus eleva ao Pai, após
uma longa instrução dirigida aos Apóstolos, que começou como o gesto do
Lava-pés, apresenta uma teologia da Vida que ele nos mereceu com a sua Morte de
Cruz.
Pela sua Morte, Jesus se consagra,
isto é, se oferece como vítima sacrifical, para que os Apóstolos e, por eles,
todos os que crerem nele, “sejam consagrados na Verdade” (17,19). Trata-se de
uma condição necessária para que os Apóstolos, enviados, e a Igreja, possam ter
credibilidade diante do mundo e, para que todos os que crerem em Jesus
perpetuem o testemunho dos Apóstolos.
Enquanto Jesus estava na terra,
guardou os seus, no Nome do Pai, isto é, na força do Poder que o Pai a ele
concedeu sobre toda carne. Trata-se do Espírito que Jesus possuía sem medida;
que “repousava sobre ele”, como já tinha anunciado João Batista, e que agia
pelas palavras com que comunicava os preceitos de Deus. Os Apóstolos , ao
escutá-lo chegaram a crer nele e o reconheceram como o Enviado de Deus. Essa condição,
embora os santificasse, não era ainda plena Vida divina. De fato, o próprio
Jesus, o Mestre, declara a Pedro que ele não pode segui-lo, não obstante todo o
seu entusiasmo (13,37s).
Torna-se necessário que o Pai guarde
os Apóstolos, no seu Nome, isto é envie o Espírito para que cheguem a toda
Verdade. Dessa forma terão os mesmos sentimentos de Cristo, Caminho, Verdade e
Vida. Para isso, Jesus aceita a sua imolação de Cruz.
As palavras que formulam a sua
aceitação devem ser interpretadas com as palavras que encontramos no início da
sua oração, momento em que, pela sua imolação, Jesus pede a sua glorificação
que o porá em condições de impetrar do Pai que, por ele, os seus sejam, por sua
vez, glorificados. Os seus estarão, então, em condições de tornar a sua vida
“um sacrifício espiritual”.
Rm 5,1-5 ilustra essa condição
perfeita na vida do cristão, que permite experimentar a “alegria do Espírito”,
porque o fiel chega a viver em si os sentimentos que Cristo experimentou na sua
Paixão: “Justificados pela fé, tenhamos paz com Deus” (Rm 5,1). Existe perfeita
vida cristã no fiel quando vive em plena comunhão com o Pai e com o Filho: o
que acontece quando “conhece”, isto é, vê claramente de que maneira o Espírito
age nele.
No terceiro momento da sua oração,
Jesus pede que os seus estejam com ele. Isto será uma participação da Glória
divina, após eles terem glorificado na terra o Pai, à semelhança do seu Mestre.
Os Apóstolos percorreram a duras
penas o caminho da sua santificação. Foi duro para eles renunciar à perspectiva
nacionalista que tanto teriam gostado que o seu Mestre realizasse. Também na
condição de homens de fé, foi árduo viver o seu testemunho no meio de tantas
perseguições. A própria perspectiva de glorificação, não encontrava tantas
testemunhas que os encorajassem.
Devemos nos considerar felizardos
porque a doutrina da messianidade de Jesus se tornou uma preciosidade para nós,
que os de religião hebraica ainda não alcançaram. Também, porque podemos nos
confortar ao ver como o heroísmo dos Apóstolos em seguir Jesus no Caminho da
Cruz torna realmente o fiel capaz de glorificação; porque, enfim, podemos ver
“qual é a riqueza da Glória reservada aos santos” (Ef 1,17).
Precisamos pôr Jesus em condições de
agir como Cabeça da Igreja porque, ao ressuscitá-lo dos mortos, Deus o
constituiu Plenitude que plenifica tudo em todos, pelo Espírito (Ef 1,23). Isto
acontecerá se, como nos lembra Rm 5,3-5, nos gloriarmos nas tribulações para
alcançarmos a constância que fará desabrochar uma esperança que coroará a nossa
caridade, a ponto de nada nos fazer esmorecer no testemunho da nossa fé.
Perguntas para reflexão:
1ª)
Qual é a graça que Jesus nos mereceu com a sua imolação?
2ª)
Qual é o caminho para chegar a toda Verdade?
3ª)
Com que termos Rm 5,1-5 descreve o processo da nossa santificação?
Jo 20
É surpreendente ver como os
discípulos de Jesus chegam à experiência do fato mais importante do homem
Cristo Jesus, que se declarou para eles Caminho Verdade e Vida, da forma mais
comum, em relação a um amigo recém-sepultado. São as piedosas mulheres que se
apressam quando ainda está escuro, na manhã do primeiro dia da semana, após o
repouso sabático. Elas, então, continuariam com a sua rotina de crentes
hebreus, dentro das suas tradições. Jesus seria lembrado como um entre os
profetas de Israel. As coisas não mudam nem quando Maria Madalena descobre que
o sepulcro foi violado. Reage como o previsto. Corre para avisar Pedro que, por
sua vez, corre para constatar o que a mulher lhe relatou. É o discípulo amado
que capta a novidade do ocorrido, ensinado pelo fiel seguimento do seu Mestre.
Aos pés da cruz, depois das palavras de Jesus que o levou a receber em sua casa
a sua Mãe, na condição de filho, tinha sido agraciado com a intuição de estar
diante do Templo do Filho do Homem, ao ver sair do lado direito do peito
trespassado pela lança, a Água, fruto do derramamento do sangue do Cordeiro
imolado. Isto o levou a reconhecer, juntamente com Maria, o Servo de Iahweh que
acabava de oferecer a sua vida em sacrifício e que por isso veria prolongados
os seus dias, seria abençoado por uma descendência e faria deslanchar o Plano
de Deus (Is 53,10). A tumba vazia, com os lençóis dobrados e o sudário colocado
num lugar a parte, eram um claro sinal daquilo que as Escrituras tinham
anunciado do Justo sofredor. Pedro assim se expressará, no dia de Pentecostes,
movido por sua vez pelo Espírito: “O Santo, que Davi chama no salmo de Senhor,
não podia conhecer a corrupção”. Ele tinha realmente ressuscitado da forma que
predissera: “O Filho do Homem devia sofrer e ser posto a morte, mas ao terceiro
dia ressuscitaria”.
A verdade à qual João chega pelas
Escrituras, é conhecida por Maria Madalena, por uma aparição que Jesus lhe
concede. Vemos, contudo, que Jesus a adverte que ela deve viver a realidade da
sua ressurreição somente contemplando-o como aquele que está sentado “à direita
da Majestade”, “o Sumo Sacerdote que entrou no céu passando pelo véu do seu
corpo”.
Quando Jesus aparece aos discípulos
reunidos no Cenáculo, ali nos revela os valores da nossa religião. O Caminho
para uma vida gloriosa é aquele que é ditado pelas chagas que ele mostra. É uma
alegria constatar que é realmente aquele que esteve morto e que, agora está
vivo. Mas é sobretudo uma garantia que não o seguiremos em vão se carregarmos,
na perseverança, a cruz de cada dia. A celebração, portanto, da sua Morte,
acompanhada pelo propósito de segui-lo, é o serviço litúrgico pelo qual o
Espírito nos será concedido por aquele que foi “elevado na Cruz”. Por ele
viveremos a nossa purificação e a nossa adoração dos mistérios de Deus que se
revelam na Pessoa do Senhor Jesus Cristo.
Não podemos esperar por um outro
Tomé. Se chagarmos a crer sem ter visto, teremos a certeza de estar no caminho
que João nos indicou pela fidelidade no seu seguimento do Filho do Homem, de
quem falam a Lei e os Profetas.
Evangelho de João (33)
Jo 21 O dinamismo da Igreja
No fim Jo 21, somos surpreendidos
por palavras que, enquanto se relacionam de forma específica, ao final de Jo
20, estabelecem uma inclusão que faz de Jo 21 um testamento espiritual do
discípulo que Jesus amava.
A Igreja, em primeiro lugar, deve
lembrar que, sem o Senhor, nada poderá realizar, enquanto sob a sua lida, tudo
o que ela empreende e que sabe que deve empreender, chegará à sua plena
realização. A pesca superabundante obtida pela obediência ao seu comando é uma
clara demonstração.
Em segundo lugar, os discípulos do
Senhor, terão que continuamente voltar à Eucaristia para refazer as suas
forças. O pão e o peixe assado que a representa, são os símbolos que já foram
recordados em Jo 6.
Em terceiro lugar, a Igreja é
constituída sob a lida de Pedro. Nele está um amor maior do que nos outros
porque conheceu um perdão maior. Nessa condição que o habilita, recebe o
mandato de Cristo Jesus de apascentar o seu rebanho.
Todo e cada fiel assim confirmado na
fé por Pedro, porque reconhece a sua condição pecadora, mas que não obstante
isso, confia, se torna capaz de seguir o seu Senhor. Trata-se de uma clara
vontade que compreendemos pela ordem que Jesus dá a Pedro: “Segue-se”. O
Apóstolo se tornará capaz até de acompanhar Jesus assemelhado a ele pela morte
de cruz.
Todos, de qualquer forma, terão que
assumir a atitude do discípulo amado, qual é aquela de viver a sua vida na
vigilância.
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